O cookie tradicional norte-americano é feito com gotas de chocolate. Mas, em Roraima, a receita ganhou um sabor amazônico: tucupi preto, cumaru e castanha-de-caju. Já pensou? A jovem Natália Fuhrmann, de 26 anos, sim. Ela inovou na receita e aposta na criação para lucrar durante o Festival Mormaço, em Boa Vista.
E não para por aí. O cookie amazônico ainda é servido com sorvete de cupuaçu. O doce custa R$ 22 e Natália garante que o cliente não vai se arrepender de provar.
“Espero mostrar que a Amazônia é rica de possibilidades e ingredientes para a produção de pratos e, inclusive, adaptação de pratos de outros países, como o cookie, que com o toque da Amazônia fica muito bom”, garantiu.
Cookie é um biscoito em formato achatado, feito à base de farinha de trigo. Pode ser doce, com recheios, salgado ou acompanhado de especiarias. A versão com gotas de chocolate, mundialmente conhecida, foi criada nos Estados Unidos.
Natália vende doces desde 2024, por meio de pedidos pela internet. Esta será a primeira vez que participa de um festival, com público grande. Para aproveitar a oportunidade, decidiu inovar e pesquisou ingredientes locais que pudessem render um sabor único de cookie. Disso, nasceu o “tucookieaçu“.
Cumaru, a ‘baunilha brasileira’, e o tucupi preto feito por indígenas
O primeiro ingrediente que Natália decidiu usar foi o cumaru, semente nativa da Amazônia, também como “baunilha brasileira” por ter o aroma e sabor adocicado.
Em seguida, Natália escolheu o tucupi preto, um condimento feito a partir da redução do tucupi amarelo, caldo fermentado da mandioca, para dar sabor mais intenso ao cookie. O ingrediente é produzido por mulheres indígenas da região da Serra da Lua, no município de Cantá. Por último, incluiu a castanha-de-caju à receita.
“O tucupi que utilizo vem da comunidade indígena da Tabalascada. Meu interesse também está no fortalecimento do empreendedorismo feminino. Na comunidade, o tucupi é produzido por mulheres indígenas”, lembrou.
Com a ideia e os ingredientes definidos, Natália colocou a mão na massa e testou diferentes receitas. Depois de vários experimentos, percebeu que o sorvete de cupuaçu seria o toque ideal para trazer frescor no calor do Mormaço.
Finalmente, “os humilhados foram exaltados” e Natália cravou o “tucookieaçu”: um cookie que leva cumaru, tucupi preto e castanha-de-caju misturados à massa amanteigada, e servido com uma bola de sorvete de cupuaçu e uma leve calda de tucupi preto.
A massa do cookie leva cumaru, tucupi preto e castanha-de-caju — Foto: Nalu Cardoso
“O cumaru me chamou atenção. É super aromático, um verdadeiro ouro da Amazônia, e ainda é pouco usado. O tucupi preto também é incrível, e às vezes vejo ele sendo mais valorizado em outros lugares. Trazer esses ingredientes pra receita foi uma forma de valorizar o que é nosso e mostrar que temos sabores únicos que podem — e devem — estar presentes nas nossas receitas”.
Com o tempo, mesmo sabendo fazer vários doces, Natália decidiu investir na produção de cookies, vendendo-os online por delivery. Atualmente, a loja dela, chamada ‘Malukies‘, oferece 12 sabores diferentes do biscoito.
“O que eu espero mesmo é mostrar que a Amazônia é rica de possibilidades e ingredientes para a produção de pratos e, inclusive, adaptação de pratos de outros países, como o cookie, que com o toque da Amazônia fica muito bom”.
O cardápio da Malukies tem cookies sabores: clássico, black, capuccino, churros, limão siciliano com geleia de morango, kinder bueno, coconut, red velvet, tucookieaçu, cookie funfet, clássico com sorvete, black e sorvete. Os preços variam de R$ 5 a R$ 22.
Brasil concentra grande área de florestas tropicais com Amazônia e Mata Atlântica. Foto: Reprodução/Acervo MMA
O Brasil encabeça uma das iniciativas que deve modificar a forma do mundo enxergar a conservação ambiental. O Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês) – que deve ser lançado durante a COP 30 – irá viabilizar pagamentos para países que garantam a conservação dessas florestas. A iniciativa visa fortalecer a manutenção das florestas em pé, demonstrando que sua proteção vale mais que a derrubada.
No total, mais de 70 países em desenvolvimento com florestas tropicais podem receber os recursos deste que seria um dos maiores fundos multilaterais já criados no planeta.
A valoração da preservação ambiental em dinheiro pelo TFFF se dá com base na compreensão de que biomas como a Mata Atlântica, a Amazônia, as florestas da Bacia do Congo e do Mekong/Borneo, são fundamentais para a manutenção da vida como conhecemos hoje.
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Brasil, Marina Silva, afirmou que este é o momento de mudar a forma como a humanidade lida com os recursos naturais do planeta.
“Já exploramos demais a natureza para gerar recursos financeiros e bens materiais. Agora, é hora de usar os recursos que geramos com essa exploração para proteger a natureza. Somos constantemente cobrados por depender apenas de dinheiro público para essa proteção, mas o Fundo Florestas Tropicais para Sempre representa uma virada de chave”, enfatizou.
“Não é doação, mas uma iniciativa que opera com lógica de mercado, alavancando recursos privados a partir de investimentos públicos. Para cada dólar aportado pelos países, espera-se mobilizar cerca de quatro dólares do setor privado, criando um fundo fiduciário permanente. É uma nova forma de financiar a conservação, com responsabilidade compartilhada e visão de futuro”, complementou a ministra.
O assessor especial de Economia e Meio Ambiente do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), André Aquino, explica o papel dos biomas que poderão ser contemplados pelo TFFF.
“Nós sabemos que as florestas tropicais são fonte da estabilidade climática, porque elas retêm carbono e garantem ciclos hídricos, – os rios voadores na Amazônia que conhecemos hoje muito bem no Brasil, por exemplo. Mais de 80% da biodiversidade terrestre de todo o mundo estão nas florestas tropicais. Logo, elas fornecem serviços ecossistêmicos para a humanidade a nível global. O que o TFFF busca é que o mundo remunere parte desses serviços. É remunerar a florestas como base da vida, como base da economia, pelo nosso bem-estar”.
O secretário-executivo adjunto do Ministério da Fazenda (MF), Rafael Dubeux, reforça que o mecanismo dá materialidade ao valor das matas.
“Para quem é proprietário de uma área, há uma espécie de custo de oportunidade – para usar uma expressão econômica. Ele poderia, em tese – e não é uma boa opção – considerar destruir aquela área para colocar gado, para fazer uma plantação. Para quem é dono daquela área, não é tão visível o dinheiro, o valor daquela floresta preservada. O TFFF está criando uma solução para que a gente deixe claro que não é apenas um slogan a ideia de que a floresta em pé vale mais do que é derrubada. A gente vai verdadeiramente monetizar, viabilizar, pagar pelo serviço de preservação da floresta”, frisou.
Segundo o secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores (MRE), embaixador Mauricio Lyrio, consolidar o TFFF na COP30 fortalecerá o multilateralismo. “É motivo de orgulho que no Brasil, em Belém, ou seja, no meio da floresta Amazônica, nosso país lance uma iniciativa que partiu do próprio Sul Global, da articulação do Brasil com outros países em desenvolvimento que têm florestas tropicais. Tem uma importância histórica”, avaliou.
O Brasil lidera os esforços pela criação do TFFF desde a COP28, realizada em Dubai, em 2023, quando o tema foi abordado publicamente pela primeira vez pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Até o momento, outros cinco países que possuem florestas tropicais integram a iniciativa: Colômbia, Gana, República Democrática do Congo, Indonésia e Malásia. Além disso, cinco países potencialmente investidores também participam do processo de fundação do mecanismo: Alemanha, Emirados Árabes Unidos, França, Noruega e Reino Unido.
Foto: Kelvin Uchoa/PeldMaua-Inpa
Recursos e atratividade
A expectativa é que as nações investidoras disponibilizem um aporte inicial de 25 bilhões de dólares. Com esta injeção, deve ser possível alavancar mais 100 bilhões de dólares (capital sênior) do setor privado ao longo dos próximos anos. Os governos, ao aceitarem o papel de capital júnior, consentem em incorrer em um risco um pouco maior do que o setor privado, atraindo estes investidores privados.
As projeções dos responsáveis por elaborar o TFFF apontam também que o mecanismo deve viabilizar 4 bilhões de dólares anuais para a preservação ambiental, o que representa um valor próximo do triplo do volume aplicado globalmente para a proteção das florestas tropicais por meio de recursos concessionais.
De maneira inovadora, os recursos disponibilizados pelo TFFF serão disponibilizados aos países com florestas tropicais, que contarão com uma fonte de recursos previsível e em grande escala para financiar objetivos de longo prazo. O TFFF espera que os pagamentos aos países sejam adicionais aos recursos do orçamento hoje empregados para a conservação das florestas, que são extremamente limitados. “Isso daria uma capacidade de investimento em políticas públicas muito forte”, frisou André Aquino.
De acordo com Rafael Dubeux, o fundo mudará a forma de aplicar capital em prol do meio ambiente.
“Ao contrário de experiências anteriores que são muito baseadas em doações, filantropia, o TFFF traz uma inovação porque pressiona menos o orçamento de todo mundo, já que é um investimento”, destacou.
Trata-se de um fundo fiduciário, similar aos “endowments” que sustentam as grandes universidades privadas dos EUA.
Ainda conforme Dubeux, se as previsões se concretizarem, este será um dos maiores fundos multilaterais já criados no planeta, atrás apenas do Banco Mundial.
Veja onde estão as 74 nações que possuem florestas elegíveis para integrar o fundo:
74 nações que possuem florestas elegíveis para integrar o fundo. Imagem: Reprodução/ICMBio
Funcionamento do Fundo
Os países com florestas tropicais que aderirem ao TFFF deverão apresentar ao conselho do fundo relatórios anuais que comprovem a conservação das florestas, com monitoramento via satélite. O Brasil já faz este acompanhamento por meio do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), e poderá ser exemplo para as outras nações, segundo o MMA.
As cifras encaminhadas às nações com florestas seguem o cálculo de 4 bilhões de dólares por hectare preservado. Os repasses poderão ser cortados, caso seja constatado que houve desmatamento e degradação florestal.
Os países beneficiários terão autonomia para definir o destino final dos recursos. No Brasil, o MMA projeta que a verba poderá fortalecer uma série de medidas de preservação ambiental, como o Programa Bolsa Verde, a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais e ações de incentivos à bioeconomia.
“O TFFF apoia os países que já têm baixo desmatamento, aumentando os recursos para seus programas e políticas de conservação, uso sustentável e restauração”, afirma Garo Batmanian, diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro.
Apesar de garantir a liberdade na aplicação dos recursos, o TFFF tem regras de elegibilidade. Os países devem ter sistemas de gestão financeira transparentes, e concordar em separar 20% dos recursos especificamente para povos indígenas e comunidades tradicionais.
Quanto aos investimentos feitos pelo fundo para remunerar os países, a aplicação em projetos que envolvam combustíveis fósseis é vetada. A prioridade é optar por ações e títulos de governos e companhias de países emergentes e produtos considerados verdes.
O TFFF será uma das principais defesas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na 80ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), que será realizada esta semana, em Nova Iorque. Segundo o Itamaraty, na ocasião, o Brasil promoverá um evento para debater a proposta com líderes mundiais.
“Estamos trabalhando para que os países sinalizem fortemente o aporte de recursos a partir da COP30”, enfatizou a ministra Marina Silva.
Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
O embaixador Mauricio Lyrio destacou que o fundo de florestas é uma demonstração de que o multilateralismo é capaz de entregar resultados concretos e inovadores, num momento em que a cooperação internacional é questionada em algumas partes do mundo.
“Não é algo que é imposto do Norte ao Sul, como a gente chama. Isso é muito importante para reforçar o multilateralismo na área de clima. É um sinal de vitalidade”, pontuou o presidente da COP30.
Para além dos membros do comitê que está construindo o fundo, a iniciativa já recebeu manifestações positivas de outros países, como dos líderes dos BRICS, e de países amazônicos. Em setembro, o governo da China saudou a iniciativa brasileira de instituição do TFFF, afirmando que a nação está ansiosa pelo impacto positivo que isso pode gerar para um planeta saudável.
Ainda conforme o representante do MRE, a pasta tem dialogado com países em todas as partes do mundo, tanto por meio das embaixadas brasileiras no exterior como das embaixadas estrangeiras em Brasília.
Indígenas e comunidades locais
Uma das regras previstas para o TFFF é que 20% do valor repassado a cada nação com florestas tropicais deve ser encaminhado para populações indígenas e comunidades locais. A forma de aplicação do recurso deverá ser definida pelos governos nacionais em articulação com essas populações, garantindo a soberania dos países.
“Os povos indígenas são os maiores guardiões da floresta e da biodiversidade. É comprovado já em muitos âmbitos. E a gente sempre fez isso sem recurso nenhum. Tendo esse recurso, vai garantir a autonomia dos povos indígenas, essa estrutura que se precisa para a implementação dos seus projetos, suas iniciativas, diretamente nos territórios”, afirmou a ministra dos Povos Indígenas do Brasil, Sonia Guajajara.
Um relatório de 2021 da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe (FILAC) atesta a declaração da ministra, demonstrando evidências de que territórios nas mãos de povos indígenas e tradicionais sofrem menos desmatamento e emitem menos carbono. Conforme o documento, a eliminação de vegetação nativa em territórios demarcados como terras indígenas no Brasil é 2,5 vezes menor que em outras áreas.
Ainda de acordo com a ministra, o governo mantém interlocução com povos originários de outros países para viabilizar o TFFF, via diálogos com a Aliança Global de Comunidades Territoriais (AGCT). A organização representa 35 milhões de pessoas que vivem em territórios florestais de 24 países na Ásia, África e América Latina.
Mobilização de recursos
A decisão de sediar a COP30 no coração da Amazônia foi inspirada, entre outros motivos, pela necessidade de mostrar ao mundo a importância das florestas tropicais para a manutenção da vida no planeta.
Um dos principais temas discutidos na agenda de mudança do clima é a mobilização de recursos para apoiar os países em desenvolvimento a implementar ações de mitigação e adaptação. Na COP29, em Baku, definiu-se como meta o levantamento de 1,3 trilhão de dólares para financiamento climático até a conferência, conforme o Roteiro de Baku a Belém. André Aquino ponderou que, apesar de ainda não fazer parte desta iniciativa, o fundo tem potencial para ser incluído.
“O TFFF não é formalmente um instrumento da UNFCCC, mas ele contribui diretamente para os objetivos de redução de emissões via conservação da floresta, preservação, conservação da biodiversidade, entre outros. Dessa forma, seus recursos poderiam vir a ser contabilizados nessa mobilização que estamos tentando fazer. Contudo, isso ainda está em avaliação”, pontuou.
De acordo com o secretário-executivo adjunto da Fazenda, uma das vantagens do TFFF frente a outras medidas debatidas no âmbito da COP30 é que, para entrar em operação, o fundo não precisa da concordância de todos os 196 países que estarão no evento, podendo ser viabilizado apenas a partir do aporte inicial das nações investidoras e com o trabalho dos países com florestas.
Esta premissa também vale para a proposta de criação de uma coalizão mundial de mercados de crédito de carbono.
Mercado de carbono e TFFF
Ao lado do TFFF, uma das principais propostas do Ministério da Fazenda para debate na COP30 é a criação de uma coalizão de mercados de crédito de carbono de vários países. Enquanto este mecanismo remuneraria atores que capturam o gás de efeito estufa, – podendo ser também através do reflorestamento, por exemplo, – o TFFF pagará estados nacionais que preservem suas florestas, criando uma complementaridade.
A ideia é que os integrantes da coalizão do mercado de carbono criem um limite de emissões global que vá sendo reduzido ao longo do tempo. O Brasil já aprovou a legislação que regula este mercado em território nacional. A medida está em fase de implementação.
Mais informações sobre a estrutura do Tropical Forest Forever Facility podem ser encontradas aqui. Todos os valores indicados são estimativas ainda em negociação pelos países que compõem os trabalhos de elaboração do TFFF.
*Com informações da Assessoria de Comunicação da COP30 e do MMA
Floresta Nacional do Tapirape Aquiri. Foto: João Marcos Rosa
Neste mês, em Manaus (AM), o governo federal lançou três novos editais do programa Restaura Amazônia, no valor total de R$ 79 milhões. O anúncio ocorreu durante solenidade que contou com a participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva.
Os recursos vão priorizar ações em Unidades de Conservação (UCs) localizadas no Arco do Desmatamento, região que atravessa sete estados amazônicos e concentra algumas das maiores pressões sobre a floresta.
A expectativa é recuperar até 2,2 mil hectares de vegetação nativa (um espaço equivalente a cerca de 3 mil campos de futebol), por meio de 13 projetos, além de gerar aproximadamente 880 empregos diretos e indiretos.
Em evento no último mês, o presidente do ICMBio, Mauro Pires, ressaltou o potencial da agenda de restauração. Para ele, além de constituir uma plataforma de desenvolvimento sustentável, produção e melhoria da economia com inclusão produtiva, esta agenda pode fazer com que o cidadão comum encontre razão na conservação ambiental.
“Um estudo recente mostra que as pessoas estão perdendo a conexão com a natureza, o que traz prejuízos de saúde, inclusive de saúde mental”, mencionou.
“E se a gente consegue uma agenda inclusiva, voltada à restauração, garantindo empregos, trazendo benefícios ambientais e promovendo uma conexão com a natureza, creio que aí sim vamos conseguir enfrentar esse cenário de emergência climática”, declarou ele.
Os recursos, provenientes do Fundo Amazônia, serão divididos da seguinte forma: R$ 26,9 milhões para Acre, Amazonas e Rondônia; R$ 30,7 milhões para Mato Grosso e Tocantins; e R$ 21,6 milhões para Pará e Maranhão. Os valores incluem a remuneração dos parceiros gestores do Restaura Amazônia – Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam), Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS) e Conservation International do Brasil (CI Brasil).
As propostas poderão ser enviadas até 10 de novembro de 2025. Já os projetos selecionados terão até 48 meses para implementação.
Foto: Marco Leal/Ipaam
O que é o Arco da Restauração?
A iniciativa faz parte do projeto Arco da Restauração, uma parceria entre o Ministério do Meio Ambiente (MMA), o ICMBio e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que prevê a recuperação de 6 milhões de hectares de áreas degradadas até 2030.
O objetivo é reverter o processo histórico de destruição no chamado Arco do Desmatamento, região onde a Floresta Amazônica tem sido mais impactada pela derrubada e pela expansão agropecuária. A estratégia é transformar esse território em um cinturão verde de proteção e restauração, fortalecendo a conservação e garantindo benefícios sociais e econômicos para as comunidades locais.
Restaura Amazônia: parte de uma estratégia maior
Lançado em 2024, o Restaura Amazônia é a principal ação dentro do Arco da Restauração. O programa conta com R$ 450 milhões do Fundo Amazônia para restaurar: Unidades de Conservação (UCs); Terras indígenas e quilombolas; Áreas de Preservação Permanente (APPs); e Reservas legais em assentamentos e pequenas propriedades rurais.
O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) lançaram, no dia 21 de março, Dia Internacional das Florestas, chamada pública para iniciativa ‘Restaura Amazônia‘ na área do ‘Arco da Restauração’, território crítico de desmatamento, que vai do leste do Maranhão ao Acre. O ato de lançamento aconteceu na sede do MMA, em Brasília (DF).
A iniciativa está alinhada ao Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), que busca cumprir a meta da Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Proveg), de restaurar até 12 milhões de hectares de áreas degradadas no Brasil.
Trânsito com complicações após incêndio em fiação de poste em Manaus. Foto: William Duarte/Rede Amazônica AM
O Amazonas foi apontado como o estado menos seguro do Brasil para dirigir, segundo um estudo divulgado nesta semana pelo Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV). A pesquisa avaliou os 26 estados e o Distrito Federal com base em um indicador de segurança viária.
Já o Distrito Federal aparece como o lugar mais seguro para motoristas. O desempenho da capital federal ficou muito acima dos estados da Região Norte, que registraram os piores resultados.
O índice é calculado a partir dos sete pilares do Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito (Pnatrans). A partir dessa avaliação, é feita uma média que organiza os estados em um ranking, do mais seguro ao menos seguro para dirigir.
O levantamento, chamado Indicadores Rodoviários Integrados de Segurança (IRIS), analisou fatores como qualidade das vias, educação no trânsito, fiscalização, atendimento às vítimas, promoção da saúde e normatização. O Amazonas ficou entre os piores índices em todos esses critérios.
Além dele, outros estados do Norte também aparecem nas últimas posições do ranking, como Pará, Roraima e Amapá.
O projeto IRIS avaliou os estados e o DF com base em sete pilares do Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito (Pnatrans):
Gestão da Segurança no Trânsito;
Vias Seguras;
Segurança Veicular;
Educação para o Trânsito;
Vigilância, Promoção da Saúde e Atendimento às Vítimas;
Normatização e Fiscalização;
Indicadores de Mortalidade.
Destaques por pilar: veja como o Amazonas se saiu em cada aspecto avaliado pelo estudo
Gestão da Segurança no Trânsito
Avalia governança viária, integração ao Sistema Nacional de Trânsito (SNT), qualidade dos dados do RENAEST (Registro Nacional de Sinistros e Estatísticas de Trânsito) e transparência dos Detrans.
Avalia comportamento dos condutores e efetividade da fiscalização.
Melhores: RS (10), TO (9,1), SC (9,1), ES (9,1), MG (8,5), SE (8,2);
Piores: PA (5,7), MT (5,6), PB (5,4), PI (3,3), RR (0,9), AM (0).
Vigilância, Promoção da Saúde e Atendimento às Vítimas
Considera número de profissionais de saúde, leitos per capita e estrutura hospitalar.
Melhores: RO (10), RS (9,0), GO (8,5), PI (8,1), PB (8,0), PE (7,8)
Piores: SP (4,0), AC (3,4), AP (2,7), PA (2,2), AM (1,1), SE (0)
Normatização e Fiscalização
Avalia cobertura tecnológica, eficiência na aplicação da lei e registro de infrações.
Melhores: DF (10), GO (4,5), CE (3,4), RJ (3,4), TO (2,7), PB (2,5);
Piores: AL (0,8), MA (0,6), RR (0,5), RO (0,3), AM (0), AC (0).
Indicadores de Mortalidade
Mede taxas de óbitos por veículos, habitantes e quilômetros rodados.
Melhores: SP (10), DF (10), RS (8,6), AP (8,5), RJ (8,5), AC (8,3);
Piores: PB (3,7), MT (3,7), MA (2,9), AL (2,4), TO (2,0), PI (0).
Desigualdades regionais
O painel revela contrastes claros: enquanto o DF, estados do Sul e parte do Centro-Oeste concentram os melhores indicadores, os estados do Norte dominam a faixa inferior do ranking.
Para os especialistas do ONSV, esse desequilíbrio expõe fragilidades históricas em infraestrutura, fiscalização e atendimento às vítimas nessas regiões.
“O objetivo é transformar os dados apresentados pelas unidades da Federação em informações mínimas para uma melhor gestão do trânsito nas respectivas áreas de atuação”, afirma o Observatório.
Em nota, o Departamento Estadual de Trânsito do Amazonas (Detran-AM) informou que os dados usados no estudo não refletem a realidade do Amazonas porque foram baseados em números de 2022, devido a uma falha no abastecimento da ferramenta Pnatrans. O órgão afirmou que já trabalha na atualização das informações.
Segundo o Detran, as fiscalizações no Amazonas resultaram em aumento de autuações: de 71.139 em 2023 para 95.069 em 2024. Em 2025, até setembro, já foram registradas 94.001 infrações, com expectativa de crescimento de quase 32% em relação ao ano anterior.
À esquerda, biojoias feitas com cerâmica marajoara pela artesã Thifany de Soure (PA); ao centro, fibra tururi extraída da palmeira ubuçu já tingida e pronta para fabricação de biojoias; à direta, colar de biojoias feito com sementes jarina e açaí pelas artesãs da AERAJ – Associação Educativa Rural e Artesanal da Vida de Joanes, Salvaterra, (PA). Fotos: Laize Almeida de Oliveira
O fazer artesanal sempre foi uma curiosidade para mim. Sempre olhei com admiração para as peças únicas, tecidas de histórias, de ancestralidade, de lágrimas e de alegrias. Como uma boa paraense que sou, me joguei em um mundo que, para muitos, é desconhecido, desvalorizado e frequentemente estigmatizado.
Sou uma pesquisadora paraense que precisou buscar formação em outro estado, já que não havia doutorado na minha área — de Administração — em universidades públicas do Pará. Ainda assim, sempre carreguei comigo minhas raízes, o orgulho do chão que sempre pisei. Por isso, decidi fazer minha pesquisa sobre o trabalho institucional com artesãs de biojoias na nossa Amazônia paraense.
Assim, embarquei em uma grande aventura, tecida de curiosidade, descobertas e acolhimento. Minha primeira parada foi uma visita exploratória em busca de artesãs de biojoias na Ilha do Marajó. Visitei as cidades de Soure, Salvaterra e Muaná. Mergulhei em uma imersão, em uma vivência profunda, e pude observar um campo vasto e produtivo, mas também marginalizado — com pouca visibilidade institucional, fragilidade normativa e estigmatização territorial.
Fui em busca de respostas e encontrei histórias, vidas e uma riqueza traduzida em adornos que refletem muito mais do que beleza.
Eles são enraizados em cultura, em um sentimento de pertencimento às próprias raízes. São resistência. Sim, muitas histórias resistem. São a própria resistência pela sobrevivência de um fazer artesanal que insiste em continuar, que preserva o meio ambiente ao se opor ao uso de produtos tóxicos e transforma sementes, cascas e folhas em matéria-prima rica em biodiversidade.
Nesse percurso, precisei desfazer meus próprios medos para ir mais longe. Foi quando, mesmo sem saber nadar, tive que percorrer o Marajó de balsa e em barcos menores — tudo em busca de lojas de artesanato, de artesãs. Eu não queria apenas observar: eu queria viver junto esse momento.
Nem tudo são flores, aliás, aqui, são sementes. Chegar até as artesãs não foi fácil. Em muitos momentos, pensei em desistir. Por onde eu passava, perguntava se conheciam artesãs de biojoias, e as pessoas iam me indicando lugares, nomes, histórias. Bati em muitas portas que guardavam, sim, uma riqueza e uma vivência no artesanato, mas ainda não eram as artesãs de biojoias que eu buscava. E por que tanta insistência nas biojoias? Porque, para mim, isso é um propósito. Não é apenas uma escrita científica.
À esquerda, vista da embarcação que faz o transporte de passageiros entre o porto do Camará e Belém (PA. Acima e à direita, visita à Casa do Artesão em Salvaterra (PA). Abaixo e à direita, visita à Casa do Artesanato de Soure (PA). Fotos: Laize Almeida de Oliveira
Carregava comigo não apenas meu caderno de campo, mas também um coração acelerado, ansioso pelas conversas que estavam por vir. Dormi em pousadas simples; por ali também reencontrei amigos de longa data que foram meus primeiros informantes. Partilhei com conhecidos a alegria de um almoço em família, o tradicional açaí com peixe, uma delícia de vivência.
Quando o barco percorria as longas ruas amazônicas que são os rios, uma paz atravessava meu coração. Nunca vi tanta beleza: casas escondidas na mata, uma infinitude de pés de açaí, e o nascer do sol mais lindo que já presenciei. Tive que viajar de madrugada, saindo de Soure para pegar a balsa no porto, e chegamos ao amanhecer justo a tempo de ver o sol surgir das águas calmas do rio.
Em Soure e Salvaterra, mergulhei na cultura local. Vi nas peças feitas de sementes ou cerâmica os grafismos marajoaras. Que peças lindas! E o desejo daquelas artesãs de perpetuar o aprendizado transmitido por suas avós me comoveu. Com esse ímpeto, atravessei o rio em um barco pequeno e confesso: por não saber nadar, estava apreensiva. Mas fui com minha habitual retidão, porque estava indo em busca de mais histórias, de mais artesãs de biojoias.
Decidi, então, atravessar a Ilha do Marajó e voltei a Belém, para visitar o maior polo joalheiro do nosso estado: o Espaço São José Liberto. Que lugar rico! Mas era apenas uma passagem. Meu destino era Muaná, cidade mais ao sul da ilha.
A simplicidade do povo de Muaná me encanta e, ao mesmo tempo, me entristece. Lá, vivenciei a extinção de uma associação de mulheres que produziam biojoias. Havia ali, no passado, uma fábrica de biojoias construída pelo governo do estado do Pará. A região é rica não apenas em sementes de açaí, mas também em uma biodiversidade impressionante. Essas mulheres trabalhavam principalmente com a fibra do tururi, uma palmeira que, até então, eu desconhecia.
À esquerda, palmeira ubuçu, matéria-prima usado em biojoias, encontrada nos campos marajoaras da cidade de Muaná (PA). Acima e à direita, fibra tururi extraída da palmeira ubuçu já tingida e pronta para fabricação de biojoias. Abaixo e à direita, coco da palmeira ubuçu, encontrado nos campos marajoaras da cidade de Muaná, quando em visita a campo. Fotos: Laize Almeida de Oliveira
Minha alma curiosa me levou até os campos marajoaras, atrás dessa palmeira. Depois de alguns quilômetros percorridos numa moto pequena, acompanhada de um amigo, conseguimos encontrar o fruto e a fibra. Ali, pude ver o quanto essas mulheres se esforçam para preparar a matéria-prima e transformá-la em biojoias e outros adornos.
Sem contar que a moto quebrou no meio do nada. E o pensamento que me veio foi: “uns 12 km só empurrando uma moto… tudo bem com isso?” No fim, conseguimos improvisar uma gambiarra e voltar para a cidade.
Tudo isso me atravessou as histórias, os rios, os cheiros, o barro, o açaí. Ser pesquisadora na Amazônia é um compromisso ético, afetivo e político. É escutar com o corpo inteiro, molhar-se nas travessias e encontrar sentido nos olhos de quem compartilha sua história com esperança e dor.
Acima e à esquerda, vista de embarcações no porto de Muaná (PA); acima e à direita, percurso de barco entre a cidade de Soure e Salvaterra (PA); abaixo, porto da cidade de Muaná. Fotos: Laize Almeida de Oliveira
Encontrei mais que dados: encontrei memórias tecidas por resistência. Em cada semente nas mãos das artesãs, pulsa uma economia criativa silenciada pelas instituições, mas viva. Um saber que não está nos editais, mas que transforma vidas.
Ser mulher pesquisadora aqui é também enfrentar o machismo e o colonialismo acadêmico que deslegitima nossas escolhas e territórios. Escolhi olhar para o meu chão, para minhas raízes, para o fazer potente e invisibilizado dessas mulheres. Isso também é um ato político.
Ao final de cada entrevista, sentia que ganhava algo de volta. Meu caderno virou diário de campo e de afeto. Escrevo não só para a academia, mas para devolver voz e reconhecimento a essas mulheres. Nem toda joia brilha no ouro, algumas brilham no tururi, no açaí seco e na coragem de existir.
O fazer cotidiano das artesãs de biojoias, ainda que silencioso e afastado dos centros de poder simbólico, revelou uma capacidade de reconfigurar identidades, preservar saberes ancestrais e construir novos espaços de pertencimento, reafirmando que o trabalho institucional também nasce das resistências e dos gestos cotidianos, muitas vezes mediados pelas distintas formas de reflexividade presentes em seus fazeres.
Evidenciei, ao longo da pesquisa, que a atividade das artesãs de biojoias se insere em um campo institucional atravessado por cinco dimensões centrais: (i) assimetrias de poder; (ii) desigualdades regionais; (iii) fragilidade normativa; (iv) atuação fragmentada das instituições; e (v) resistência criativa. Entre tantas fragilidades, encontrei nelas um trabalho institucional que se revela como uma resistência social silenciosa, não feita de discursos grandiosos, mas de gestos cotidianos que contestam a desvalorização simbólica e reafirmam o direito à cultura. Foi principalmente entre mulheres que percebi essa força: são elas que, no fazer artesanal, tecem redes solidárias, preservam memórias, ressignificam identidades e transformam sementes em joias carregadas de pertencimento.
Com a colaboração de:
Laize Almeida de Oliveira, nascida na cidade de Bom Jesus do Tocantins-PA, é doutoranda em Administração pela Universidade Federal de Lavras (UFLA). Pesquisa o trabalho institucional de artesãs de biojoias da Amazônia paraense. Apaixonada por adornos regionais, dedica-se a experienciar esse campo vasto e produtivo do artesanato de biojoias da Amazônia paraense.
Sobre o Conexões Amazônicas
O coordenador da ONG Rede Conexões Amazônicas, Ayan Fleischmann, é pesquisador titular do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, sendo mestre e doutor em recursos hídricos. Em sua trajetória tem pesquisado as águas e várzeas amazônicas em suas múltiplas dimensões. É representante da ONG na coluna no Portal Amazônia, onde recebe pesquisadores convidados que contam os bastidores de suas experiências de pesquisa na Amazônia.
O período de estiagem abaixo da cota de 20 m deve ser de 60 a 85 dias – essa é uma cota de referência usada para o monitoramento da navegação, ainda que não necessariamente implique restrições a essa atividade. Atualmente, a cota é de 24,9 m (observada em 16/09).
O SGB ressalta que a comunidade de Manaus começa a sentir impactos mais severos para a navegação em torno da cota de 16 m e entra em alerta em torno da cota de 17 m. Ou seja, não se prevê impactos significativos a partir dos cenários traçados para a vazante de 2025. A nota técnica foi elaborada pelos pesquisadores do SGB Andre Martinelli Santos, Artur Matos, Bruna Gomes Amancio e Marcus Suassuna Santos.
As análises apresentadas mostram que, em um cenário hipotético mais severo – com descidas mais intensas e atraso no início da estação chuvosa, o rio Negro poderia se aproximar da cota de 17,3 m. O SGB reforça que essa é uma possibilidade pouco provável considerando a situação atual na bacia e que, mesmo que ocorra, ainda estaria dentro da faixa de normalidade para o período.
As projeções usam dados da série histórica do rio Negro (1903–2024), que reúne 122 anos de registros, e informações sobre os fenômenos El Niño e La Niña (ENSO), que influenciam os padrões de chuva na Amazônia. Para 2025, a expectativa é de neutralidade climática, o que sugere condições próximas à média histórica. Esse comportamento contrasta com as secas extremas de 2023 e 2024, associadas a um dos episódios mais intensos de El Niño já registrados.
Encontro das águas do Rio Negro e Rio Solimões. Foto: David Rego Jr.
Tendência de agravamento
A análise da série histórica confirma uma tendência significativa de agravamento das secas na estação de Manaus ao longo das últimas décadas.
“Desde o início do século passado, as mínimas anuais tiveram flutuações de longo prazo, contudo é observada uma redução média de 4,3 cm por ano desde 1970, o que indica que as vazantes têm sido cada vez mais severas”, afirma o pesquisador do SGB Marcus Suassuna.
Em 2024, o rio Negro atingiu 12,13 m, o menor nível já registrado, durante a seca extrema que impactou severamente a região.
Além disso, foi identificada forte correlação entre as cotas mínimas e a duração das estiagens: quanto mais baixos os níveis, mais tempo leva para o rio se recuperar.
“Essa relação é importante para qualificar a gestão dos recursos hídricos, uma vez que não só o mínimo é importante, mas também o tempo em que alguma restrição de uso pode ser observada”, indica a nota técnica.
Cotas máximas e mínimas tem variado nas últimas décadas
O SGB também chama atenção para a variação dos níveis dos rios ao longo do ano, ou seja, a diferença entre níveis mínimos e máximos em um mesmo ano, que tem aumentado nas últimas décadas.
Suassuna explica: “A diferença entre as máximas e mínimas cotas anuais era de cerca de 8,6 m em 1970 e atualmente essa amplitude média é de 12,8 m, um aumento estimado de 4,2 m. As diferenças entre os níveis máximos e mínimos anuais nos anos de 2023 e 2024 foram de 15,6 e 14,7 m, respectivamente, as máximas variações de nível de todo o histórico de monitoramento em Manaus”.
Essa oscilação cada vez mais intensa amplia os desafios para o manejo dos recursos hídricos e para a segurança das populações que dependem e vivem às margens dos rios na Amazônia.
O monitoramento em Manaus é realizado a partir de estação que faz parte da Rede Hidrometeorológica Nacional (RHN), coordenada pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e operada pelo SGB. As informações estão disponíveis na plataforma SACE e são atualizadas diariamente.
Sespa alerta à população sobre os acidentes ofídicos, que são as mordeduras de serpentes. Foto: Divulgação
A Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa) alerta à população sobre os acidentes ofídicos, que são as mordeduras de serpentes. Segundo a secretaria, entre janeiro e agosto de 2025, o Pará registrou 3.012 acidentes envolvendo serpentes.
O estado do Pará registrou 3.012 acidentes envolvendo serpentes. Foto: Divulgação
Os sintomas de uma mordedura de serpente podem variar dependendo do tipo de serpente envolvida, mas geralmente incluem dor intensa, inchaço (edema), manchas arroxeadas (equimose), sangramentos e, em casos mais graves, o surgimento de bolhas no local da picada.
Sintomas sistêmicos incluem náuseas, vômitos, sudorese excessiva, dor de cabeça (cefaleia), mal-estar geral e, em casos mais críticos, dificuldades respiratórias e choque. A falta de tratamento rápido e adequado pode resultar em complicações graves e até risco de morte.
A coordenadora estadual de Zoonoses, Elke Abreu, destaca que a prevenção é essencial e envolve cuidados tanto pessoais quanto ambientais. Entre as principais medidas preventivas estão o uso de calçados fechados, luvas e perneiras durante atividades rurais e de jardinagem, bem como a inspeção cuidadosa de calçados, roupas pessoais, roupas de cama e banho antes de usá-los.
Entre as principais medidas preventivas estão o uso de calçados fechados. Foto: Divulgação
Elke também recomenda o afastamento de camas das paredes, evitar acumular entulhos e materiais de construção, e a vedação de frestas em paredes, assoalhos e rodapés, além de utilizar telas e vedantes em portas, janelas e ralos.
Além disso, é fundamental manter os arredores das residências limpos e organizados, como jardins, quintais, paióis e celeiros, e evitar plantas trepadeiras e bananeiras próximas às casas.
Também é recomendado cortar a grama regularmente e limpar terrenos baldios, especialmente nas áreas próximas a cercas e muros (pelo menos de um a dois metros).
“As vítimas de serpentes devem ser tratadas com soro antiofídico específico. O tratamento rápido e preciso é essencial para reduzir os danos à saúde”, explicou Elke de Abreu.
A Sespa ainda orienta que, em caso de acidente ofídico, as principais unidades de atendimento no Estado incluem Prontos Socorros, Hospitais Regionais, Hospitais Municipais e algumas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). Caso ocorra uma mordedura, a recomendação é lavar imediatamente o ferimento com água e sabão e buscar atendimento médico imediato, não tentar tratar o ferimento de forma caseira e, sempre que possível, identificar a serpente para facilitar o diagnóstico e o tratamento correto.
Atenção aos tipos de serpentes
As serpentes mais comuns no Pará, responsáveis pela maioria dos acidentes ofídicos, são as jararacas, cascavéis e cobras-corais, sendo mais de 90% dos acidentes ocasionados por jararacas. A Sespa orienta que, ao se deparar com uma serpente, a população não deve tentar capturá-la ou matá-la, pois isso aumenta o risco de mordeduras. É recomendado chamar profissionais especializados para o manejo adequado desses animais.
A Sespa reforça que, embora as serpentes desempenhem um papel ecológico importante, os acidentes ofídicos são preocupantes, especialmente em áreas rurais e periféricas, onde o desmatamento e a urbanização desordenada podem forçar os animais a se aproximarem das áreas habitadas.
“A Amazônia tem sido uma fonte de fascínio, mistério e mal-entendidos para o mundo, principalmente para os europeus.” Assim começa o prefácio escrito por Nilson Gabar Jr., diretor do Museu Paraense, para o livro Amazónia: Viagem por uma ferida aberta no planeta (Editora Ideias de Ler, 272 páginas), do jornalista português Manuel Carvalho.
A obra nasce com fôlego de clássico. Com estilo direto e sensível, Carvalho constrói um mosaico de relatos que ajudam a decifrar esse universo verde — tão exuberante quanto ameaçado.
O livro revisita a história da colonização da Amazônia, mas seu foco é o presente. “Da criação do mundo até 1970, a humanidade destruiu 0,5% da maior e mais rica floresta tropical do planeta; daí até aos nossos dias, arrasou mais de 20%. E continua a arrasar”, alerta a sinopse. Essa constatação é o ponto de partida para uma narrativa que combina objetividade jornalística com análise sociológica afiada — da ocupação portuguesa ao neocolonialismo, passando pelos conflitos que envolvem indígenas, garimpeiros e produtores de soja.
Embora recheado de referências bibliográficas, o que mais se destaca é a vivência do autor. O livro é fruto de uma marcha de 12 mil quilômetros por estradas, rios e cidades amazônicas. De capitais como Belém, Manaus e Porto Velho a vilarejos dominados pelo agronegócio, Manuel ouviu vozes diversas — do povo simples aos especialistas — e não poupou críticas, inclusive às cidades que, segundo ele, deformaram paisagens milenares.
O livro lançado em Portugal. Foto: Divulgação
Do clichê turístico do encontro das águas entre os rios Negro e Solimões às imagens-denúncia da devastação ao longo da Transamazônica, o autor disseca com olhar crítico e escrita fluente temas que deveriam estar no centro do debate global. Porque a Amazônia, afinal, é um assunto planetário.
Mas a floresta ainda é, em muitos discursos, romantizada. Não no caso de Manuel, que a descreve com rudeza e ternura — em simbiose — como um cronista forjado nas redações dos grandes jornais portugueses. A biodiversidade, frequentemente tratada como ativo financeiro por setores do agronegócio, é também pauta de ativistas ignorados ou desacreditados pelas instâncias de poder. “Sustentabilidade”, nesse contexto, vira palavra malvista, associada a um suposto entrave ao progresso — como dizem seus detratores.
O olhar estrangeiro, como o de Manuel, revela o que os locais muitas vezes não enxergam. Não por acaso, os relatos de viajantes continuam entre as obras mais emblemáticas sobre a região — como Tristes Trópicos (1938), de Claude Lévi-Strauss, para ficarmos num exemplo.
A obra de Manuel Carvalho merece leitura atenta. Pela coragem de ouvir, pela capacidade de filtrar opiniões díspares e pela entrega ao trabalho de campo — algo raro em livros que saem dos muros acadêmicos.
QUEM É – Nascido em 1965, Manuel Carvalho é jornalista premiado, com carreira consolidada no jornal Público, um dos mais influentes de Portugal, onde atuou como diretor entre 2018 e 2023. Formado em Direito e História, é autor de obras como A guerra que Portugal quis esquecer (2015).
O autor, Manuel Carvalho. Foto: Divulgação
Sobre o autor
Júlio Olivar é jornalista e escritor, mora em Rondônia, tem livros publicados nos campos da biografia, história e poesia. É membro da Academia Rondoniense de Letras. Apaixonado pela Amazônia e pela memória nacional.
A história doAmapá é marcada por mudanças políticas, sociais e econômicas. Parte dessa memória está preservada em museus que mostram desde a colonização até os saberes dos povos tradicionais.
Os espaços têm entrada gratuita e oferecem uma imersão no passado, com exposições que ajudam a compreender a trajetória do Estado e de seus habitantes.
O Grupo Rede Amazônica preparou um roteiro que inclui temas como cultura indígena, vida ribeirinha, presença colonial, memória negra e até vestígios da Segunda Guerra Mundial:
Museu sobre a colonização portuguesa no Amapá
Dentro da Fortaleza de São José, no Centro de Macapá, o museu mostra como a coroa portuguesa participou do povoamento do Amapá. O espaço também destaca o uso de mão de obra escravizada na construção da fortificação.
O acervo inclui mapas e maquetes que retratam a influência portuguesa na região. A fortaleza é um dos principais símbolos da presença colonial no estado.
O Museu Kuahí, em Oiapoque, foi reaberto em julho após 12 anos fechado. O espaço abriga acervos das etnias Karipuna, Galibi Marworno, Galibi Kali’na e Palikur.
O museu tem cerca de 500 peças etnográficas, biblioteca, salas de exposição, espaço pedagógico, loja de artesanato, redário, refeitório e área voltada à produção artística indígena.
Funcionamento: terça-feira a domingo Horário: 9h às 17h Endereço: Avenida Barão do Rio Branco, n. 160, Centro, Oiapoque
Inaugurado em junho, o Museu de Artes, Culturas e Memórias Negras funciona em Macapá e é coordenado pelo Instituto Municipal de Promoção da Igualdade Racial (Improir).
O acervo valoriza os costumes da população negra do Amapá, com esculturas africanas, fotografias, objetos do dia a dia, cerâmicas quilombolas, arte contemporânea e livros.
Segundo o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Amapá tem 12.524 pessoas quilombolas.
Funcionamento: terça a domingo, das 9h às 17h Endereço: Rua Eliezer Levy, esquina com Avenida Mendonça Furtado
Foto: Emanuelle Gomes/Prefeitura de Macapá
Museu Histórico do Amapá Joaquim Caetano da Silva
Fundado em 1895, o Museu Joaquim Caetano da Silva é o terceiro prédio mais antigo do Estado e funciona como museu há 75 anos, sendo reaberto ao público em 2022.
O prédio já foi sede da Intendência, prefeitura e delegacia. Hoje, abriga uma biblioteca com itens raros de arqueologia, incluindo urnas do período pré-colonial.
Funcionamento: terça a domingo, das 8h às 18h Endereço: esquina da Avenida Mário Cruz com Rua Binga Uchôa, Centro de Macapá
Inaugurado em 1997, o Museu Sacaca é coordenado pelo Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (IEPA). O espaço homenageia Raimundo dos Santos Souza, curandeiro que popularizou o uso de plantas medicinais no estado.
O museu tem réplicas de casas ribeirinhas, malocas indígenas, casa de farinha, barco regatão, planetário e exposições sobre medicina natural e cultura amazônica.
O Museu Sacaca oferece uma imersão na cultura amazônica a poucos minutos do Centro de Macapá.
Funcionamento: terça a domingo, das 8h30 às 17h30. Fecha às segundas. Endereço: Avenida Feliciano Coelho, nº 1509, bairro Trem
No município de Amapá, a antiga Base Aeronaval construída em 1941 virou o Museu a Céu Aberto da Segunda Guerra Mundial. O local abrigou militares dos Estados Unidos e serviu como ponto de reabastecimento de aeronaves durante o conflito.
Com 623 hectares de área, a base foi usada como apoio estratégico para voos rumo aos Estados Unidos e à África.
Um projeto da Universidade Federal do Amapá (Unifap) quer transformar o museu em um parque histórico, incluindo áreas externas que também foram usadas durante a guerra.
Mosca da família Chironomidae preservada em âmbar. Foto: Mónica Solórzano-Kraemer/Museu de História Natural Senckenberg
Entre aproximadamente 113 milhões e 100,5 milhões de anos atrás, em uma floresta tropical bastante úmida localizada onde hoje é o Equador, mosquitos, moscas, aranhas, vespas e besouros circulavam entre dinossauros e pequenos répteis.
As árvores altas, finas e com longos galhos que existiam nesse ambiente pareciam um bom refúgio para esses insetos e aracnídeos, mas alguns acabaram em uma emboscada: as araucárias, muito parecidas com as que existem hoje, expeliam uma resina capaz de aprisionar os pequenos bichos para sempre.
“Essa resina é produzida para bloquear vírus, bactérias, fungos e outros patógenos que atacam as árvores e por isso tem propriedades que retardam a decomposição dos animais aprisionados”, conta o paleontólogo espanhol Xavier Delclòs, do Instituto de Pesquisa em Biodiversidade (IRBio) da Universidade de Barcelona, na Espanha, a Pesquisa FAPESP, por e-mail.
Ele é um dos autores de um artigo publicado no dia 18 de setembro na revista Communications Earth & Environment, que descreve as espécies de artrópodes encontradas no âmbar. “Se a resina se polimerizar e for enterrada, ela pode se transformar em âmbar e preservar restos de organismos de milhões de anos atrás em três dimensões, como se ainda estivessem vivos”. Os achados descritos são os primeiros da América do Sul com inclusão de animais. As araucárias desse período eram exceção, visto que a vegetação mais comum no Cretáceo era de ambiente mais árido.
O nível de resistência da resina varia de árvore para árvore. “Não é porque a resina foi produzida que ela vai virar âmbar”, comenta o geoquímico Ricardo Pereira, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que não participou do estudo.
“Ela pode ser destruída por vários processos ao longo do tempo e sua resistência varia conforme a composição química, que difere de uma espécie para outra”. O curioso é que as araucárias, que produziram o âmbar no Equador, têm resina frágil. Pereira pesquisou âmbar do Brasil ao longo mestrado e doutorado.
Camada de rocha com 70 centímetros de espessura e milhares de peças de âmbar na pedreira Genoveva. Foto: Xavier Delclòs/Universidade de Barcelona
Na pedreira Genoveva, província do Napo, onde os fósseis de insetos e os demais foram encontrados, o âmbar brilha entre as camadas escuras do sedimento ancestral. No passado, além da floresta, a região era cortada por rios que desaguavam em um lago.
“Às vezes, o âmbar é escuro por conta da reação com componentes do petróleo na rocha onde ele fossiliza, mas isso não impediu a identificação das espécies”, diz Delclòs.
Nos casos mais desafiadores, os cientistas usaram uma ferramenta potente, a luz síncrotron, para examinar melhor a anatomia dos insetos. “O petróleo é importante porque átomos de carbono e hidrogênio, os hidrocarbonetos, reagem com a resina da araucária e ajudam na sua preservação”, diz Pereira.
Ao todo, os pesquisadores identificaram 21 insetos
São eles:
mosquitos que se alimentam de sangue (Ceratopogonidae),
insetos que vivem perto da água (Chironomidae e Trichoptera),
vespas parasitoides (Scelionidae e Stigmaphronidae),
percevejos da família Hemiptera,
moscas-brancas (Aleyrodidae),
moscas comuns (Ceratopogonidae, Chironomidae e Dolichopodidae)
e um besouro da família Tetratomidae.
Em um fragmento de âmbar bem claro, a equipe encontrou fragmentos de uma teia de aranha. “É uma quantidade muito grande de material”, comenta Pereira, que faz uma comparação:
“Quando somo todo o âmbar dos depósitos que estudei, não chega a 100 gramas desse material. O que vemos no Equador é um verdadeiro depósito”.
As amostras de âmbar têm grande variação de cor. Foto: Mónica Solórzano-Kraemer/Museu de História Natural Senckenberg
É possível supor algumas interações com o ambiente a partir dos fósseis. “Os mosquitos provavelmente se alimentavam de vertebrados, como dinossauros. Já a teia de aranha pode indicar alguma relação de predação de animais voadores”, lista Delclòs. “Apesar disso, não encontramos nenhuma interação ecológica direta dentro do âmbar”.
O paleontólogo Marcelo Carvalho, do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (MN-UFRJ) ajudou a equipe a identificar amostras de pólen e esporos entre os sedimentos da pedreira. Para isso, submeteu o material a um processo químico com ácidos, que removeu os componentes inorgânicos e conservou os pólens.
Um pedaço de teia de aranha aparece como fios capturados pela resina. Foto: Enrique Peñalver/Instituto Geológico e de Mineração da Espanha
“Os pólens e esporos foram importantes para datar o material”, conta Carvalho, que explica que o âmbar não pode desempenhar essa função porque não tem nenhum componente datável. No caso das plantas, os paleontólogos sabem, com base em outras pesquisas, que determinadas espécies só viveram em um período específico. “Quando identificamos uma dessas espécies em uma camada sedimentar, sabemos que aquele sítio está dentro de determinado intervalo temporal”, acrescenta Carvalho.
Ao todo, a análise revelou 68 tipos de pólen, divididos entre representantes de gimnospermas – como os pinheiros, que não produzem flores nem frutos –, de angiospermas, que têm flores, e de vegetais vasculares sem sementes, as pteridófitas. “Essa análise ajudou a confirmar que o ambiente era bastante úmido”, conta Carvalho.
“As samambaias, por exemplo, abundantes na região, precisam de muita umidade para reprodução”. Isso chama a atenção porque o Cretáceo, entre cerca de 145 milhões e 66 milhões de anos atrás, foi um dos períodos mais quentes da história da Terra, marcado por condições áridas. “Já sabíamos que o Cretáceo tinha tido algumas fases úmidas, mas identificá-las precisamente no tempo e espaço é importante”, diz o pesquisador do Museu Nacional.
Outro ponto relevante foi a expressiva presença das angiospermas, que corresponderam a 37% dos exemplares. “Essas plantas já haviam surgido anteriormente, mas foi no Cretáceo que passaram por grande radiação e ampla dispersão, impulsionadas inclusive pela interação com animais, como os insetos polinizadores”, comenta Carvalho.
“É como se estivéssemos olhando para os indícios do que mais tarde seria o que chamamos hoje de floresta amazônica”.