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Murumuru: semente popular no mundo da beleza pode ser utilizada na construção civil

A manteiga de Murumuru tem se popularizado como cosmético. Seu óleo tem sido utilizado em uma infinidade de produtos de beleza, desde cremes para o cabelo à hidratantes para a pele. Proveniente da Floresta Amazônica a semente, rica em vitamina A, é considerada extremamente benéfica para a saúde da pele por possuir ação anti-inflamatória, antiviral e antisséptica. 

O famoso óleo é obtido por meio da prensagem das sementes provenientes do murumuruzeiro. Sua vantagem em relação a outros óleos de beleza está relacionado a baixa acidez e sua função amplamente hidratante, tendo aplicação ideal em cabelos ressecados. A manteiga é particularmente recomendada para cabelos cacheados e crespos, que possuem maior capacidade de absorção do produto.
Porém, seu uso vai muito além do mundo da beleza e da saúde.

Recentemente, cientistas descobriram outra função para o murumuru: a fabricação de concreto sustentável mais leve e com maior impermeabilidade quando comparado ao concreto tradicional.

O estudo, publicado na revista ‘IBRACON de Estruturas e Materiais‘, revela que as cinzas da casca da semente de murumuru, que antes seriam descartadas, podem ser misturadas ao cimento para gerar um concreto mais sustentável.

A utilização das cinzas do murumuru beneficiam não somente a construção civil, mas se alia também a preservação ambiental, especialmente quando se considera o descarte incorreto de materiais utilizados pelas construtoras. As alternativas de concreto mais sustentável facilitam o descarte e contribuem com o meio ambiente.

*Por Diego Fernandes, estagiário sob supervisão de Clarissa Bacellar

O estabelecimento de assentamentos na Amazônia equatoriana

Os proprietários mecanizaram as operações agrícolas e recorreram à mão de obra contratada, enquanto milhares de famílias de camponeses foram expulsas de suas casas.

O sistema de parceria que definia a posse da terra nas terras altas do Equador antes da reforma agrária era conhecido como “huasipungo”, uma palavra quechua que descreve a relação entre proprietários de terras e agricultores arrendatários. No entanto, o fim desse sistema feudal teve um resultado radicalmente diferente quando comparado ao Peru e à Bolívia, porque os proprietários de terras se anteciparam ao confisco de suas terras expulsando os agricultores arrendatários. 

Os proprietários mecanizaram as operações agrícolas e recorreram à mão de obra contratada, enquanto milhares de famílias de camponeses foram expulsas de suas casas. Alguns se mudaram para centros urbanos, mas muitos optaram por migrar para as fronteiras agrícolas nas planícies tropicais da Amazônia e da costa do Pacífico.

Foto: Rhett A. Butler

O esforço oficial para promover assentamentos na Amazônia equatoriana começou em 1957, quando o governo democraticamente eleito criou o Instituto Nacional de Colonización (INC). Em 1964, um governo militar promulgou a Ley de Reforma Agraria y Colonización, que fundiu o INC ao recém-criado Instituto Ecuatoriano de Reforma Agraria y Colonización (IERAC).

Entre 1964 e 1994, o IERAC distribuiu cerca de cinco milhões de hectares de terra com o apoio da USAID e da Aliança para o Progresso; cerca de 1,8 milhão de hectares estavam localizados dentro das cinco províncias amazônicas. A terra foi distribuída em lotes de 40 hectares, o que sugere que cerca de 45.000 famílias adquiriram lotes na Amazônia durante esse período de 30 anos.

As províncias equatorianas de Sucumbíos e Orellana foram abertas à colonização na década de 1960 com a descoberta de petróleo. Na década de 1980, a distribuição de propriedades de 40 hectares estava bem avançada, assim como o estabelecimento de duas plantações de dendê em grande escala (a; b). A fronteira foi essencialmente fechada, mas o desmatamento continua nas margens da zona de assentamento e em propriedades individuais. Fonte (ambas as placas): Google Earth.

Infelizmente, o IERAC não forneceu aos colonos documentos equivalentes a um título legal, pois a propriedade dependia da residência e da evidência de desenvolvimento. Os colonos receberam uma escritura provisória que exigia uma ação administrativa futura para ser convertida em um título legal completo. O IERAC não incorporou essas informações em um arquivo nacional; em vez disso, as informações foram preservadas em “pastas” armazenadas em seus escritórios regionais.

Em 1994, uma nova lei substituiu o IERAC pelo Instituto Nacional de Desarrollo Agrario (INDA) e, como no Peru e na Bolívia, um dos principais objetivos era introduzir a economia de mercado na economia rural como parte das políticas de “reajuste estrutural”.

A lei centralizou o processo de titulação de terras em Quito e, em 2002, foi apoiada por uma iniciativa financiada pelo BID para criar um banco de dados digital. No entanto, essa iniciativa teve um sucesso limitado e, em 2010, um total de 700.000 “pastas” estavam esperando para serem processadas quando o INDA foi dissolvido e suas funções foram transferidas para a Subsecretaria para Tierras y la Reforma Agraria no Ministério da Agricultura.

As responsabilidades da nova agência foram fundamentalmente alteradas, no entanto, porque a constituição de 2008 devolveu a autoridade administrativa sobre a posse da terra aos governos municipais. No entanto, a lei incumbiu o governo nacional da responsabilidade de compilar e manter um banco de dados digital, o que levou à criação de um cadastro nacional conhecido como SIGTIERRAS. O BID apoiou o esforço com outro empréstimo que incorporou as experiências do projeto piloto da década anterior.

O processo de posse de terra agora é gerenciado pela Autoridad Agraria Nacional (AAN), uma nova entidade com um portfólio expandido de obrigações que foi criada pela Ley de Tierras de 2016. Esse ato legislativo de grande alcance busca melhorar a desigualdade de posse de terra no Equador e estabelece limites para as dimensões máximas das propriedades: 200 hectares para as terras altas, 500 hectares para a costa e 1.000 hectares para a Amazônia. Ela também concede à ANN o poder de confiscar propriedades maiores do que essas dimensões ou que não atendam aos critérios de função econômica e social. Apesar de seu apelo populista, a lei de terras gerou críticas porque não incorporou protocolos específicos para resolver as reivindicações das comunidades indígenas das terras baixas.

Embora seus direitos territoriais estejam consagrados na constituição e codificados pela Ley de Tierras, há apenas algumas entidades indígenas totalmente demarcadas. Como em outros países, elas podem ser organizadas em duas categorias amplas: propriedades de terra comunitárias associadas a uma (ou poucas) aldeias em paisagens de fronteira e grandes reservas que se estendem por paisagens selvagens com várias aldeias isoladas. Os territórios indígenas mostrados em mapas preparados por organizações da sociedade civil apresentam os dois tipos de categorias de posse. A maioria dos territórios indígenas foi estabelecida por decreto presidencial, mas apenas algumas das propriedades de terra das aldeias foram formalizadas e demarcadas. A maioria representa reivindicações apresentadas ao governo. Seu tamanho final e os limites exatos estão aguardando o processo de revisão da posse da terra que está em andamento há pelo menos duas décadas.

Assim como no Peru e no Brasil, o processo de regularização fundiária (saneamiento) no Equador está sendo organizado por meio de campanhas de campo voltadas para municípios específicos, a fim de maximizar a participação dos proprietários de terras e alcançar uma cobertura total. Em outubro de 2017, a AAN havia registrado 1,4 milhão de propriedades rurais em 59 municípios, um número significativo, mas apenas uma fração dos que aguardam regularização nos 221 municípios do país. Por mais incompleto que possa ser, esse número altera drasticamente as estimativas anteriores sobre o número, o tamanho e a distribuição das propriedades rurais no país.

O censo agrícola de 2000 enumerou um total de 850.000 Unidades de Producción Agropecuaria e relatou que cerca de setenta por cento havia obtido o título legal. Embora tenham mais de vinte anos, essas estatísticas foram reproduzidas em relatórios subsequentes e usadas para orientar políticas. Os resultados preliminares do projeto-piloto do BID registraram cerca de 2,7 milhões de parcelas e sugeriram que cerca de 10 por cento não tinham título de propriedade válido. Os resultados do segundo projeto do BID colocariam o número de propriedades de terras entre quatro e cinco milhões. A pesquisa mais recente constatou que aproximadamente 75% dos proprietários de terras possuem algum tipo de documento legal que comprove sua posse, embora menos de um quarto deles tenha registrado sua propriedade nos escritórios regionais de terras.

O processo de regularização, que foi realizado em três dos 41 municípios da Amazônia equatoriana, também mostra que as suposições anteriores subestimam seu número e superestimam sua dimensão. Por exemplo, o número de propriedades rurais registradas em um único município foi maior do que o número relatado pelo censo para toda a província. A discrepância pode ser causada, em parte, por uma expansão da fronteira agrícola; no entanto, a maior parte da diferença pode ser explicada pela subdivisão das propriedades existentes. A distribuição original na década de 1970 tinha, em média, entre 40 e 60 hectares; em contraste, os imóveis registrados no SIGTIERRAS tinham, em média, entre dez e vinte hectares, indicando que muitos foram legalmente subdivididos, provavelmente por herança, em unidades menores.

O censo de 2000 relatou um total de 46.000 propriedades rurais no Equador amazônico, cobrindo um total de 2,5 milhões de hectares (cerca de 27% da área total). No entanto, a área total identificada como paisagens modificadas pelo homem (consulte os Capítulos 1 e 2) abrange aproximadamente 3,9 milhões de hectares. Supondo que o tamanho médio de uma propriedade privada esteja entre 20 e 40 hectares, então deve haver entre 75.000 e 150.000 propriedades que precisam ser registradas, validadas e incorporadas ao SIGTIERRAS.

A resolução do problema das terras indígenas também não está concluída. Suas reivindicações de terras comunais somam aproximadamente 2,5 milhões de hectares distribuídos em mais de 4.000 terras comunais. Apenas 85 foram de fato demarcadas e receberam um título legal, todas dentro dos três municípios que se beneficiaram do projeto SIGTIERRAS, o que confirmou que as reivindicações indígenas frequentemente se sobrepõem às propriedades privadas. Esse foi particularmente o caso em Morona-Santiago, onde as famílias Shuar reivindicaram propriedades individuais usando as opções legais disponíveis para elas nas décadas anteriores ao reconhecimento das propriedades comunitárias pelo Estado.

O estado tem a infraestrutura necessária para resolver essa obrigação administrativa de longa data com seus cidadãos rurais. A ANN tem escritórios em todas as cinco capitais provinciais e um aplicativo on-line onde os proprietários podem fazer o autoregistro de suas propriedades. Esperamos que o BID financie uma terceira fase do projeto SIGTIERRAS que permitirá ao governo concluir a tarefa. 

*“Uma tempestade perfeita na Amazônia” é um livro de Timothy Killeen que contém as opiniões e análises do autor. A segunda edição foi publicada pela editora britânica The White Horse em 2021, sob os termos de uma licença Creative Commons (licença CC BY 4.0). 

** O conteúdo foi originalmente publicado pela Mongabay 

Ativismo alimentar: estudo da UFPA analisa relação entre a comida e as transformações político-sociais

A pesquisa demonstra como fatores econômicos, sociais e educacionais colaboram para a insegurança alimentar existente na sociedade e, por outro lado, como a agroecologia e o ativismo alimentar podem ser meios de resistência ao sistema dominante.

Do quintal de casa às ilhas que circundam a cidade, a agricultura se faz presente na realidade da capital paraense. Uma produção que pode atender desde o consumo próprio até a comercialização em maior escala. Nesse cenário, Belém (PA) também tem se destacado como palco de diversos movimentos sociais em torno da alimentação, por isso o chamado ativismo alimentar vem ganhando cada vez mais espaço, incentivando não apenas a produção de alimentos em regiões urbanas, como também mais reflexões sobre a importância de um consumo alimentar político.

Tanto a agricultura urbana e periurbana quanto o ativismo alimentar buscam incentivar um consumo de alimentos com menos agrotóxicos e fertilizantes químicos, criticando cadeias agroalimentares hegemônicas e buscando construir sistemas mais democráticos, saudáveis, sustentáveis, éticos e de melhor qualidade. 

Foi à luz desse tema que a discente do curso de Nutrição da Universidade Federal do Pará (UFPA) Maria Lorrane Lopes Conde desenvolveu uma pesquisa de iniciação científica intitulada Agricultura urbana e periurbana: uma análise de experiências com enfoque no ativismo alimentar em Belém do Pará.

Foto: Alexandre de Moraes

Com orientação de Monique Medeiros, docente do Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares (Ineaf), a pesquisa explica que o agronegócio faz parte do sistema agroalimentar hegemônico e que, por buscar uma alta produtividade, produz alimentos de muita durabilidade, mas de baixa qualidade e valor nutricional, o que gera uma concentração de renda e impacta o meio ambiente.

Tal estudo mostra, por um lado, como fatores econômicos, sociais e educacionais colaboram para a insegurança alimentar existente na sociedade e, por outro, como a agroecologia e o ativismo alimentar podem ser meios de resistência ao sistema agroalimentar dominante e ao nutricídio contemporâneo.

“Llaila Afrika define ‘nutricídio’ como o impacto negativo das escolhas alimentares inadequadas na saúde”, explica Maria Lorrane Conde.

“Vivemos em uma realidade em que há um número expressivo de pessoas em situação de desnutrição, obesidade e sob complicações das mudanças climáticas. Eu acredito que esteja tudo muito relacionado. Como as pessoas foram condicionadas a se alimentar desse sistema hegemônico, consomem alimentos mais baratos, mas com um valor nutricional muito baixo. Uma vez que submetidas à Sindemia Global da desnutrição, obesidade e mudanças climáticas, o cenário não contribui para que elas tenham poder e acesso a uma alimentação livre de agrotóxicos”,

destaca.

Agricultura e ativismo alimentar para além da saúde 

Segundo a pesquisa, a globalização faz com que a alimentação seja apenas uma necessidade básica e deixe de ser uma forma de promover o bem-estar coletivo e a sustentabilidade global. Além disso, evidencia a separação da experiência gastronômica de seu contexto cultural, menosprezando as singularidades expressas na culinária local.

Para a jovem pesquisadora, o estudo mostra como a agricultura urbana e o ativismo alimentar trazem muitos outros benefícios que vão além da saúde. “Falar sobre a produção de alimentos limpos e sem agrotóxicos é falar sobre uma agricultura realmente sustentável. Nunca esqueço a fala de uma agricultora, a dona Teo, que visitamos no Assentamento Mártires de Abril, em Mosqueiro”, recorda. “Ela disse que, quando plantamos, estamos produzindo vida. O produzir agroecológico é um dos principais movimentos dentro do processo de produção e uma manifestação que contribui beneficamente para quem vai receber aqueles produtos posteriormente”, defende.

O trabalho conclui que, ao abordar as complexidades dos ativismos alimentares amazônicos, essas pesquisas têm o potencial de impulsionar esforços mais eficazes em prol da sustentabilidade ambiental, justiça alimentar e preservação sociocultural das comunidades da Amazônia.

Sobre a pesquisadora 

Maria Lorrane tem 24 anos e está concluindo o curso de Nutrição. Para as meninas que pretendem seguir a área de pesquisa, ela diz que é importante criar uma boa rede de apoio. “Estejam juntas com quem está contribuindo para a sua formação. Apesar de estarmos à frente das nossas conquistas, elas não são feitas só da gente, existem muitas pessoas por trás de todo o processo. A jornada acadêmica não precisa ser uma jornada solitária”, aconselha.

Sobre a pesquisa

Este estudo foi apresentado ao XXXIV Seminário de Iniciação Científica da UFPA, promovido pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (Propesp) e contemplado pelo Edital Pibic Verão Destaque na Iniciação Científica da UFPA (edição 2023) como representante da área de Ciências Humanas e Sociais, Letras e Artes. A orientação foi da professora Monique Medeiros (Ineaf/UFPA), com financiamento Pibic/CNPq. 

*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Jornal Beira do Rio, escrito por Evelyn Ludovina 

Ameaçado de extinção, cachorro-vinagre é registrado pela primeira vez no Parna Montanhas do Tumucumaque

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Registro foi realizado durante monitoramento do ICMBio com o uso de câmeras.

Uma matilha de cachorro-vinagre, ameaçado de extinção, foi registrada durante um monitoramento da biodiversidade no Amapá. Essa foi a primeira vez que ocorreu o registro dessa espécie no Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, a maior unidade de conservação do país.

O registro foi feito por equipes do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que monitoram a área preservada, que possui cerca de 3,8 milhões de hectares e está localizada nos estados do Amapá e do Pará.

Registro ocorreu durante monitoramento da biodiversidade no parque. Foto: Divulgação/ICMBio

Fernanda Colares, analista ambiental do ICMBio, explicou que a aparição é rara. 

“É um canídeo raro e de difícil registro. Já havia sido identificado através de relatos de moradores da região, mas essas fotos confirmaram a existência da espécie no interior do parque”,

descreveu a analista.

Sobre o cachorro-vinagre 

Especialistas da reserva contam que o cachorro-vinagre é a mais rara dentre outras cinco espécies de cães selvagens que são encontrados no Brasil – lobo-guará, cachorro-do-mato, raposa-do-campo, graxaim-do-campo e cachorro-do-mato-de-orelhas-curtas.

O animal têm o corpo comprido, orelhas arredondadas e pernas curtas, com membranas interdigitais entre seus dedos, facilitando a locomoção na água. Possuem uma coloração castanho-avermelhada, e os filhotes nascem acinzentados.

É o menor entre os canídeos brasileiros, medindo entre 57 e 75 centímetros de comprimento, entre 12 e 15 centímetros de cauda e pode pesar de 5 a 8 quilos. 

Como ocorre o monitoramento 

Mais de 60 câmeras foram instaladas. Foto: ICMBio/Acervo

Para se conseguir os registros, mais de 60 câmeras fotográficas foram instaladas em pontos estratégicos do parque.

O registro foi feito durante o terceiro monitoramento, que integra o Programa Nacional de Monitoramento da Biodiversidade do ICMBio, em parceria com o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros (CENAP).

Esse trabalho vem tornando-se padrão em monitoramentos de florestas tropicais. A partir dele já foram registrados mamíferos e aves terrestres.

Os equipamentos foram feitos por jovens da comunidade Sete Ilhas, localizada na Perimetral Norte, no município de Pedra Branca do Amapari, que receberam treinamentos para operar o equipamento.

As outras espécies já registradas pelo programa foram: anta, irara, queixada, jacamim, mutum, onça-parda, capivara, veado, cutia, tatu, gato-maracajá, jaguatirica, entre outras.

O parque foi criado em 2002 e possui uma área total de 3.864.443 hectares na Amazônia, tornando-o o maior parque nacional do Brasil e um dos maiores do mundo.

A unidade está localizada entre os estados do Amapá e Pará e abrange os municípios amapaenses de Calçoene, Laranjal do Jari, Oiapoque, Pedra Branca do Amapari e Serra do Navio. Já do lado paraense o município de Almeirim é alcançado pelo parque.

O parque é atravessado pelas nascentes de 3 dos maiores rios do Amapá: Araguari, Oiapoque e Jari. A vegetação tropical pode ser vista a grandes distâncias, principalmente por conta do tamanho das árvores. 

Práticas de cura presentes nas religiões afro-amazônicas são estudadas no Pará

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A pesquisadora explica que quando uma pessoa chega nos espaços das religiões afro-brasileiras com algum problema, seja físico ou emocional, o religioso consegue ver além do que a medicina tradicional consegue oferecer.

As práticas de cura e cuidado nas religiões de matriz africana, afro-brasileira e indígena são o objeto de pesquisa da professora da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), Ana Lídia Cardoso do Nascimento. Ela está entre os 50 pesquisadores selecionados em todo o Brasil para uma bolsa de pós-doutorado na Universidade de São Paulo (USP), destinada exclusivamente a pessoas negras.
Com o projeto de pós-doutorado “Os significados da prática de cuidado e cura para construção de uma etnociência e bem-viver sob a lógica umbandista na metrópole paulistana”, Ana Lídia dá continuidade à sua tese de doutorado sobre o que ela chama de “Ciência do Sagrado”.

“A Ciência do Sagrado seria as práticas de cura e de cuidado presentes nas religiões de matriz africana, afro-brasileira e indígena. Foi isso que eu trabalhei na minha tese de doutorado. Então eu parto do princípio que existe uma ciência por trás dessas práticas e que está pautado no sagrado, no sobrenatural. É uma ciência específica que possui por conta disso uma epistemologia. Então existe uma ciência, não com um caráter da ciência racional, convencional, mas uma ciência por trás dessa epistemologia própria”,

comentou.

Foto: Ádison Ramos/Acervo g1 Amazonas

A pesquisadora explica que quando uma pessoa chega nos espaços de terreiros, tendas, templos, searas das religiões afro-brasileira, com algum problema, seja físico ou emocional, o religioso consegue ver além do que a medicina tradicional consegue oferecer. 

“Eles não veem que aquele problema é localizado, mas eles veem que tem alguma conexão com algum problema que essa pessoa, seja no campo da espiritualidade ou das relações interpessoais com alguém, de sentimentos. E que isso está gerando um problema que acaba se materializando, na sua estrutura biológica. Então eles têm esse olhar da pessoa como um todo, olhando holisticamente”, comentou.

Um dos campos de pesquisa de Ana Lídia foi em Juruti, oeste do Pará, onde encontrou com uma senhora que se definia como rezadeira devido ao preconceito, mas que tinha todas as características de uma mãe de santo. “Ela me dizia que tinha pessoas que chegavam lá carregadas, dizendo que estavam com dor no corpo todo, do de cabeça, que estavam afetadas com uma determinada dor enorme. Ela começava a conversar com essas pessoas, muitas vezes nem direcionando para o problema que ela tinha, conversando simplesmente, olhando no olho, com cuidado, fazendo essa pessoa sorrir e aquilo ia embora. Quando terminava aquela conversa, a pessoa já não estava sentindo toda aquela carga de negatividade que ela chegou dizendo que tinha”, disse. 

“É olhar para o outro. É cuidar. Essa é a questão do cuidado que se tem com o outro, ver o outro na sua inteireza, olhar o outro como ser humano que ele é, humanizar essa relação. Eu acho que isso, a biomedicina, a alopatia, deixa muito a desejar”,

afirmou.

Ana Lídia diz que é importante ter essas pessoas dentro dos serviços públicos e conta que trabalhou, em sua tese de doutorado, com os indígenas Tikunas na tríplice fronteira Brasil, Colômbia e Peru. E no município de Letícia, no lado colombiano, indígenas estão integrados no sistema público de saúde. 

A professora Ana Lídia no Santuário Nacional da Umbanda, em Santo André, São Paulo. Foto: Ana Lídia/Acervo pessoal

A professora também observou isso na Ilha do Marajó, no Pará, em que um técnico de enfermagem que também era pai-de-santo, que estava disposto a ajudar as pessoas além da medicina tradicional. “Ele dizia que o sonho dele era fazer um curso sobre medicina natural, porque ele dizia que as entidades que recebia, os índios, os caboclos da mata, eles passavam muitos conhecimentos, mas ele estava incorporado, então não sabia. Depois que ele retornava, as pessoas informavam a ele. Mas ele dizia que queria esse conhecimento para ele, porque o conhecimento da entidade está com a entidade. Então por isso que era o sonho dele fazer um curso sobre medicina natural”, contou.

“Quantas vezes a gente não tem nos sistemas públicos de saúde pessoas adeptas das religiões afro-brasileiras e que acabam não fazendo, porque se sentem inibidos e malvistos dentro desse processo”,

afirma a professora. 

O trabalho de Ana Lídia foi fundamental para a criação do Núcleo de Educação e Diversidade na Amazônia (NEDAM) da Ufra, na qual ela foi uma das fundadoras, em 2018. “O NEDAM foi pensado como um espaço para discussão de temáticas dentro de uma educação para a diversidade e de respeito às diferenças. Foi com esse sentido, com esse objetivo que o NEDAM foi criado.”

“Os nossos projetos de pesquisa e de extensão também estão vinculados às temáticas do NEDAM. Nós temos os grupos de trabalhos que tratam da questão da religiosidade afro-amazônica, assim com a questão sobre agroecologia, agricultura familiar, educação quilombola, questão da diversidade sexual, traz debate sobre a questão de assédio contra as mulheres, sobre homossexualidade, LGBTQI+, então a gente já fez muita coisa dentro dessa lógica, justamente para abrir um pouco a visão das pessoas, pois muitos tem uma visão muito equivocada, acabam criando pré-conceito, quer dizer, define já uma visão sobre aquilo que nem conhece, e é esse o objetivo maior do NEDAM, que traz essa possibilidade de revisão de conceitos e de concepções de mundo dentro da comunidade acadêmica da Ufra”, afirmou a professora.

O NEDAM possibilitou a criação do Grupo de Pesquisa em Educação e Diversidade na Amazônia (GEDAM) em que a professora também faz parte. “Eu tenho uma linha de pesquisa dentro do GEDAM que é ‘Produção de saberes interdisciplinares nos contextos amazônicos: estudos das relações entre ambiente, cultura e o sagrado’. E um dos resultados dessa linha está no livro que será lançado agora ‘Educação e diversidade na Amazônia paraense: experiências e práticas educativas’, do GEDAM, e um dos artigos é justamente sobre epistemologia do sagrado, que eu escrevo junto com o discente do curso de Licenciatura em Língua Portuguesa, Matheus Augusto Soares, e que nós falamos sobre epistemologia do sagrado, a partir dos povos de terreiro”.

“A minha pesquisa, toda a minha produção, é sempre direcionada para essa discussão sobre a relação entre sagrado, cultura e natureza na Amazônia. Quando eu trato a questão do sagrado, geralmente pego as religiões afro-brasileiras e o sagrado indígena. A Pajelança Caboclo, por exemplo, tem a ver com um pouco do sagrado das populações ribeirinhas, que é um sagrado que tem uma especificidade muito grande, porque comporta dentro dele a relação com a natureza. Quando a gente fala dos nossos mitos amazônicos, eles são carregados também de visões que têm a ver com essa religiosidade cabocla”, 

finalizou a professora.

Em sua pesquisa de pós-doutorado em andamento na USP, a professora, que é praticante da Umbanda, está acompanhando as práticas de curas e cuidados nos terreiros dentro da cidade de São Paulo.

Luta por terras indígenas pode ser auxiliada por sítios arqueológicos na Amazônia

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Segundo especialistas, vestígios encontrados podem ajudar povos e comunidades a comprovar sua presença ancestral no território e pressionar pela demarcação de novas Terras Indígenas.

A Amazônia é considerada o lar de povos indígenas que, há milhares de anos, já trabalhavam a terra de maneiras com as quais estamos familiarizados hoje. Eles construíram valas, lagoas, poços e outras estruturas que mostram que a floresta tropical não era “intocada”, como muitas vezes se acreditava, erroneamente.

Séculos mais tarde, o desenvolvimento dessas populações foi violentamente interrompido com a chegada das primeiras embarcações europeias às Américas.

A verdadeira extensão dos assentamentos amazônicos e da transformação da paisagem por essas populações indígenas, no entanto, permanece incerta, apesar dos esforços de pesquisadores.

Agora, uma pesquisa recentemente publicada na revista Science revela uma estimativa sem precedentes do número de sítios arqueológicos pré-colombianos do tipo “obras de terra” ainda escondidas na floresta amazônica, tendo como base tanto estruturas já conhecidas quanto novas que foram descobertas e relatadas no estudo.

Os pesquisadores descobriram mais de 20 construções de terra sob o dossel da floresta amazônica no total, o que inclui uma vila fortificada, sítios defensivos e cerimoniais, montanhas coroadas, monumentos megalíticos e sítios ribeirinhos em várzeas. Tudo isso graças a uma tecnologia avançada de sensoriamento remoto conhecida como LiDAR, que significa “Light Detection and Ranging” em inglês (Detecção e alcance de luz).

Capaz de coletar informações sobre a estrutura da floresta e sobre o terreno abaixo da floresta, o sensor aéreo tem revolucionado a forma como as informações são obtidas sobre a superfície da Terra, permitindo descobertas arqueológicas em áreas densamente florestadas.

Os autores do artigo estimam que pode haver mais de 10 mil obras de terra ainda ocultas na floresta, e ainda identificaram mais de 50 espécies de árvores domesticadas que indicam a provável ocorrência de sítios arqueológicos desse tipo, o que sugere práticas ativas de manejo florestal indígena por sociedades pré-colombianas. 

Líderes indígenas marcham contra a tese do marco temporal na Esplanada dos Ministérios, em Brasília. Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil via Flickr, cortesia da EBC/Companhia Brasileira de Comunicação

“Nossas descobertas sugerem claramente que a Amazônia tinha populações humanas consideráveis, talvez totalizando de 8 a 10 milhões de pessoas. Esse número é superior às estimativas anteriores, que foram debatidas por décadas pelos antropólogos”,

diz William Laurance, ecologista tropical da Universidade James Cook, da Austrália, em Cairns, e coautor do estudo.

Charles R. Clement, pesquisador sênior recentemente aposentado do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, no Brasil, que não participou do estudo, mas colaborou com muitos de seus autores, disse  por e-mail que, segundo sua interpretação, essa é uma indicação clara de que haveria muitas pessoas em toda a Amazônia, especialmente na região sul — “provavelmente milhões”, diz ele.

Para os pesquisadores, as descobertas contribuem para o debate atual sobre a Bacia Amazônica ter abrigado a presença histórica de grandes populações indígenas. 

24 novos sítios arqueológicos 

O estudo envolveu uma equipe intercontinental de mais de 200 pesquisadores de 24 países, que identificaram 24 sítios arqueológicos pré-colombianos não relatados anteriormente nas regiões sul, sudoeste, central e norte da Amazônia, depois de escanear dados LiDAR de áreas que totalizam 5.300 quilômetros quadrados, o que equivale a menos de 0,1% da Amazônia.

Esses 24 sítios revelam uma variedade de estruturas que indicam que as pessoas estavam usando diferentes partes da Amazônia de diferentes maneiras.

Na região sul, seis obras de terra que poderiam ser parte de uma vila fortificada de uma antiga cidade-praça foram descobertas na Bacia do Alto Xingu, em Mato Grosso.

“Essas aldeias possuíam valas periféricas, estradas com meio-fio, calçadas elevadas, lagoas artificiais, diques, açudes para peixes e outras estruturas de terra”, o que revela a existência de “políticas regionais e organizadas entre pares e uma forma social intermediária entre aldeias autônomas dentro da bacia do Alto Xingu”, disse o geógrafo brasileiro Vinicius Peripato, doutorando em sensoriamento remoto no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e principal autor do estudo,.

No sudoeste da Amazônia, foram encontradas dez estruturas de terra que poderiam ser sítios defensivos e cerimoniais, conhecidos como “geoglifos”, diz o pesquisador, nos municípios de Senador Guiomard e Rio Branco, no Acre. Peripato explica que a presença de urnas funerárias nesses tipos de sítios e a ausência de solos e cerâmicas antropogênicas “são evidências de que o uso dessas estruturas era limitado a reuniões religiosas e comunitárias”.

Na região do Escudo das Guianas, foram descobertos seis sítios nos municípios de Laranjal do Jari, Ferreira Gomes e Oiapoque, no Amapá. As construções de terra encontradas nas montanhas coroadas, chamadas no estudo de “assentamentos permanentes”, eram usadas tanto para “funções cerimoniais quanto domésticas”, explica o pesquisador, enquanto as estruturas megalíticas serviam apenas como “sítios cerimoniais”.

Já na Amazônia Central, foram encontradas duas estruturas de terra nos municípios de Boa Vista do Ramos e Óbidos, no Amazonas e Pará, respectivamente. Acredita-se que estas, nessas regiões, serviam como sítios ribeirinhos em várzeas, “que eram usados para coletar alimentos aquáticos durante a subida e a descida do nível dos rios na Amazônia”, explica Peripato. 

A imagem acima mostra como a tecnologia LiDAR revelou as 24 obras de terra pré-colombianas encontradas pelos pesquisadores. A camada inferior é o dossel da floresta; a do meio, os relevos detectados na superfície plana; a de cima, as estruturas humanas em destaque por baixo do dossel. O desenho superior aponta o desenho de como seria a obra de terra destacada. Imagem de Andrés Alegría/Mongabay

Laurance diz que o estudo e trabalhos relacionados sugerem que os grupos indígenas da Amazônia tinham meios sofisticados de agricultura rotativa/itinerante, irrigação, desenvolvimento de aldeias e fortificações defensivas para ajudar a repelir ataques externos. 

“Isso está fazendo com que os pesquisadores reavaliem seu pensamento sobre as habilidades técnicas dos povos nativos da Amazônia, que eram mais avançadas do que muitos pensavam”,

afirma o coautor. 

A luta pelo reconhecimento de território indígenas 

A pesquisa “demonstra que a Amazônia sempre foi o lar dos povos indígenas”, diz Toya Manchineri, coordenador-geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), que defende os direitos dos povos indígenas à terra, à saúde, à educação, à cultura e à sustentabilidade, em entrevista por telefone.

Ele ressalta que os dados são muito importantes, especialmente em um momento em que os povos indígenas no Brasil estão “travando uma batalha sobre a questão do marco temporal”, uma tese polêmica que restringiria o reconhecimento legal dos territórios indígenas em todo o país.

O marco temporal defende a invalidação de todas as reivindicações de terras indígenas que não estavam fisicamente ocupadas por comunidades indígenas em 5 de outubro de 1988, dia em que a Constituição brasileira foi promulgada. Embora essa doutrina tenha sido declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em setembro, o Congresso Nacional brasileiro aprovou um projeto de lei (PL 2903) com um objetivo semelhante, desafiando a decisão do tribunal. O PL foi parcialmente vetado pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para depois ter o veto derrubado pelo Congresso em dezembro.

Clement diz que os pesquisadores apontam que as obras de terra e as florestas domesticadas fornecem evidências diretas da habitação indígena ao longo de séculos e até milênios, o que contribui “para ajudar os povos indígenas a demonstrarem que têm direito a esses territórios”.

Ele acrescenta que isso é muito importante hoje, “já que a Bancada Ruralista no Congresso Brasileiro quer parar toda demarcação de territórios indígenas para que o agronegócio brasileiro possa se expandir sem ser incomodado”.

Manchineri explica que, com descobertas como as obras de terra, a ciência contraria os interesses de setores como o agronegócio ou os envolvidos na invasão de territórios indígenas. “É ruim para eles porque demonstra, com qualidade científica, que os povos indígenas sempre viveram na Amazônia e que a ação do próprio Estado foi dizimando várias populações indígenas”.

Ele diz que os dados do estudo também são importantes para as organizações e povos indígenas em seus esforços para demarcar novos territórios. A arqueologia, acrescenta ele, por meio da descoberta destes sítios, têm revelado “onde, como e por quanto tempo os povos indígenas viveram no passado”.

O coordenador explica que não é como se os povos indígenas quisessem agora retomar cidades, mas sim que o Estado brasileiro pelo menos reconheça o mal que foi feito a essas populações indígenas: “Auxiliem os que ainda vivem da melhor maneira possível, para que eles possam cada vez mais se fortalecer enquanto povos indígenas e fortalecer seus conhecimentos ancestrais”.

Manchineri também adverte: “Caso contrário, dado o nível atual de invasão, nós vamos ficar à mercê de muita coisa”. 

Milhares de obras de terra ainda podem estar ocultas 

Os autores do estudo afirmam que suas descobertas podem servir como base para a descoberta de evidências muito mais extensas de habitação indígena, pois estes estimam que entre 10.272 e 23.648 obras de terra ainda podem estar escondidas sob a Floresta Amazônica. A estimativa foi obtida combinando as 24 estruturas recém-detectadas com as mais de 900 obras de terra registradas anteriormente e modelagem estatística avançada.

O número sugere que as estruturas de terra previamente documentadas na Amazônia representam menos de 10% do total, com mais de 90% permanecendo não descobertas, de acordo com a pesquisa.

Os cientistas também mostraram a notável correlação de que “espécies [de árvores] domesticadas estão relacionadas à probabilidade de obras na área”, explicou Hans ter Steege, pesquisador do Naturalis Biodiversity Center e professor da Universidade de Utrecht, na Holanda, coautor do artigo.

Essa conexão foi estabelecida comparando os prováveis locais de obras de terra com registros históricos de espécies de árvores domesticadas na Amazônia. Das quase 80 dessas espécies, 53, incluindo cacau (Theobroma cacao), cupuaçu (Theobroma grandiflorum), pupunha (Bactris gasipaes), castanha-do-pará (Bertholletia excelsa) e outras, muitas das quais ainda estão sendo usadas, coincidiram com prováveis locais de obras de terra, diz ter Steege.

A esse respeito, Clement observa que, ao contrário do Oriente Médio, “onde a sociedade e a agricultura euro-americanas se originaram”, a Amazônia era habitada por pessoas envolvidas em arboricultura, “a cultura das árvores, das florestas e dos jardins”.

O pesquisador menciona que “não havia agricultura antes da conquista europeia. No entanto, os ecossistemas amazônicos, especialmente as florestas, alimentavam milhões de pessoas. O que a sociedade pode aprender com isso?”

Manchineri diz acreditar que esses resultados fortalecem a visão de que os povos indígenas têm muito a contribuir para o desenvolvimento do país. “É uma pena que os governantes não olhem dessa forma.”

Ele sugere que talvez o sistema de agricultura em larga escala atual possa olhar para o conhecimento indígena de uma perspectiva diferente, “e tentar se adaptar para trabalhar não depredando o meio ambiente”.

Um homem retira castanhas-do-pará no Peru. A espécie de árvore é uma das mais de 50 com registros históricos na Amazônia que se sobrepõem a prováveis locais de obras de terra. A correlação provavelmente sugere práticas ativas de manejo florestal indígena por sociedades pré-colombianas, conforme demonstrado pela pesquisa. Foto: Rhett A. Butler/Mongabay

Uma distribuição não uniforme 

Antigas estruturas de terra com funções sociais, cerimoniais e defensivas, como valas circulares, geoglifos, lagoas e poços construídos com técnicas de terraplenagem, são alguns dos tipos de formações pré-colombianas encontradas na Amazônia e fornecem evidências da ocupação indígena na bacia por sociedades que construíam com terra.

O estudo sugere que as sociedades pré-colombianas realizavam essas construções em todas as regiões da Amazônia, “cobrindo uma área mais ampla do que se pensava anteriormente”, embora esses locais não fossem distribuídos uniformemente, já que as obras de terra provavelmente estão mais concentradas em determinadas regiões, especialmente no sudoeste da Amazônia.

“Prevemos que 90% da floresta amazônica têm uma chance muito baixa de ter obras na terra, então esse tipo de modificação nas florestas amazônicas pode ter ocorrido principalmente em 10% de sua área”, afirmou ter Steege em um comunicado à imprensa.

O autor principal do estudo explica que a ocorrência dessas estruturas é mais comum nas transições da floresta tropical para as savanas, em locais que combinavam condições ambientais que “provavelmente facilitaram a construção com terra, oferecendo períodos com menos precipitação e temperaturas mais altas e solos com melhor textura”.

Laurance acrescenta que os grupos indígenas “eram evidentemente muito menos comuns, talvez até mesmo ausentes, em áreas de floresta tropical profunda, áreas mais úmidas onde a agricultura baseada em fogo é difícil, e nas grandes extensões da bacia que têm solos carentes de nutrientes”.

Ele diz ainda que o estudo reforça perspectivas anteriores que argumentam que as populações indígenas na Amazônia estavam “em grande parte confinadas a áreas mais secas ou marginais, onde a agricultura baseada no fogo era muito mais fácil do que em áreas mais úmidas”.

Um bioma “domesticado”  

Clement diz que as descobertas recém reveladas vão contra a crença das pessoas de que a Amazônia era “a última fronteira, quase intocada pelas mãos humanas até a conquista europeia, o desmatamento moderno e o fogo”.

Ele se opõe à ideia de que as culturas humanas teriam sido limitadas e determinadas pelo meio ambiente. Em vez disso, o pesquisador, assim como outros, apoia a suposição de que as culturas humanas teriam modificado o ambiente conforme desejado, assim como fazem hoje. “A Amazônia não era intocada como a maioria das pessoas imagina, mas foi completamente domesticada pelos povos indígenas, que foram exterminados pela escravidão, doenças e guerras europeias”.

Peripato explica que a sugestão de que pelo menos 10% da Amazônia pode ter sido modificada por sociedades pré-colombianas “baseia-se nesse tipo único e específico de formação pré-colombiana”, ou seja, as obras de terra. No entanto, diz Clement, “nem todas as sociedades movimentaram terra em grandes quantidades”. Isso significa que há outros tipos de evidências arqueológicas na Amazônia que indicam diferentes formas de ocupação e transformação da paisagem pelos povos indígenas.

“Se considerarmos todos os tipos de registros pré-colombianos, como solo antropogênico e cerâmica, a extensão da modificação feita por essas sociedades em toda a Amazônia pode ser comprovadamente maior”, afirma Peripato.

O solo ao qual ele se refere, também conhecido como terras pretas da Amazônia, é um solo antropogênico enriquecido com nutrientes, amplamente aceito como indicação de assentamento de longo prazo por sociedades pré-colombianas, que foram encontradas especialmente em locais na Amazônia Central e Oriental.

Clement diz que há também as próprias florestas domesticadas, que provavelmente estão contidas em áreas semelhantes àquelas onde ocorrem as obras de terra pré-colombianas, mas também em outros locais.

Ele acrescenta que todas essas evidências arqueológicas podem ser encontradas em tamanhos variados ao longo de rios grandes e pequenos e, como também havia alguns povos indígenas que não costumavam se fixar, pode haver sítios mais dispersos e “ainda menores e mais efêmeros”.

O pesquisador relata que, onde quer que os arqueólogos pesquisem, encontram novos sítios, “às vezes com obras de terra, muitas vezes sem”, e afirma que toda a Amazônia foi domesticada, “mas isso não significa que cada árvore ou palmeira tenha sido plantada. Há muitas maneiras de criar uma floresta domesticada”.

“Alguns povos indígenas construíram obras de terra, outros não. Alguns praticavam a agricultura, outros não. Todos gerenciavam suas florestas para aumentar a disponibilidade de alimentos”,

continua Clement.

Um indígena Tikuna na Amazônia colombiana. Alguns pesquisadores se opõem à ideia de que as culturas humanas teriam sido limitadas e determinadas pelo ambiente e apoiam a noção de que elas modificaram o ambiente conforme desejado. Foto: Rhett A. Butler/Mongabay.

controvérsias sobre isso na comunidade científica, e há quem critique essa interpretação de uma Amazônia domesticada, argumentando que “populações densas e assentadas” teriam sido encontradas “em áreas ricas em recursos, como ao longo do principal canal do Rio Amazonas”.

De qualquer forma, a noção de uma Amazônia historicamente intacta e livre de pessoas influencia as lutas modernas. Clement diz que tal imagem ajuda nos sonhos de conservação das florestas sem seus povos, sejam eles indígenas ou tradicionais, além de alimentar projetos de desenvolvimento. “O poderoso agronegócio brasileiro diz que as florestas vazias devem ser substituídas por campos de grãos, por exemplo, monoculturas industriais de soja, milho, algodão e pastagens, para alimentar o mundo.” 

Pesquisa inovadora 

 Peripato explica que esse estudo contribui para o conhecimento em três áreas principais, uma das quais é “a própria arqueologia por meio de descobertas inovadoras e o destaque de várias áreas para prospecção arqueológica”.

Ele diz que, no campo das ciências ambientais, o avanço está em demonstrar o nível de interferência humana na região, “que pode ter implicações em seu funcionamento atual e na forma como modelamos seu futuro”.

Na computação aplicada, o pesquisador destaca um salto na capacidade de analisar milhares de pontos dentro dos dados coletados pelo sensor LiDAR, que “opera usando pulsos de laser para medir distâncias e criar representações detalhadas do terreno, objetos e estruturas em nosso ambiente”.

A modelagem estatística que permitiu estimar o número de obras de terra pré-colombianas ainda escondidas na floresta é outro progresso nesse campo. “Usamos as 24 novas descobertas, juntamente com as estruturas previamente catalogadas até aquele momento, e desenvolvemos um modelo de probabilidade para toda a Amazônia”, explica o autor principal do estudo.

Laurance afirma que a pesquisa ajuda a resolver o debate de longa data sobre o número de povos nativos que ocupavam a Amazônia, “favorecendo claramente números mais altos”. Segundo ele, trata-se de uma pesquisa inovadora. “Esse tipo de trabalho, em escala tão grande, nunca foi feito antes.”

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Mongabay, escrito por Michel Esquer

Ferrogrão: Governo pede desculpa a indígenas, mas retoma ferrovia da soja na Amazônia

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Ferrovia está prevista para ligar norte do Mato Grosso ao sul do Pará, em prol do escoamento de grãos. Projeto passa por dentro de terras indígenas e áreas preservadas e tem oposição de lideranças kaiapós e mundurukus.

Com um pedido oficial de desculpas a povos indígenas, o governo federal voltou à carga para destravar a polêmica Ferrogrão – sonho antigo dos produtores de soja e milho do centro-oeste e um dos mais ambiciosos projetos de logística do país. Totalizando 933 km de extensão, a ferrovia teria início no município de Sinop (MT), base da produção nacional de grãos, e cruzaria a Amazônia até chegar ao porto de Itaituba (PA), no rio Tapajós.

A reportagem teve acesso a um “pedido de retratação” que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), órgão federal responsável por gerenciar as concessões do setor logístico, apresentou em uma reunião realizada nesta quarta-feira (7 de fevereiro) em Brasília (DF), com lideranças indígenas do Instituto Kabu.

A organização do povo Kayapó Mekrãgnotí atua na defesa de indígenas das proximidades da rodovia BR-163, principal via de escoamento do agro no centro-oeste. A Ferrogrão seria construída paralelamente à estrada.

Segundo a ANTT, a agência quer garantir “o processo de consulta prévia, livre e informada, conforme previsto na Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), a qual, infelizmente, não foi devidamente observada”.

Com 933 km de extensão, Ferrogrão vai de Sinop (MT) a Itaituba (PA). Arte: Débora De Maio

Com o reposicionamento, o governo deixou claro que pretende levar adiante o projeto, ideia criada há mais de uma década, ainda no primeiro governo da então presidente Dilma Rousseff (PT), pelas grandes tradings de grãos que atuam no país: Amaggi, ADM, Bunge, Cargill e Dreyfus.

Não por acaso, o projeto há anos figura entre as prioridades da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Aprosoja), instituição já presidida, no Mato Grosso, pelo atual ministro da Agricultura, Carlos Fávaro.

“Esse projeto é de interesse nacional e deve ser realizado de maneira sustentável, considerando as melhores decisões socioambientais para a região e para todas as comunidades que a habitam”, afirma a ANTT, em documento assinado em 26 de janeiro. “Uma vez concluída, a Ferrogrão terá uma capacidade de transporte significativa, proporcionando competitividade no escoamento da produção pelo Arco Norte”.

Liderança da aldeia Baú e responsável pelas relações públicas do Instituto Kabu, Mydjere Kayapó afirmou à reportagem que a reunião e a retratação não significam a aceitação do projeto. “Não é por causa de uma carta de desculpas que diremos sim para a Ferrogrão. Isso não deve só a mim, mas a todos os indígenas que sempre foram desrespeitados nesse processo”, disse.

A tentativa de aproximação do governo com os indígenas procura vencer uma etapa paralisada em 2021, quando o processo de licenciamento da obra – estimada hoje em aproximadamente R$ 30 bilhões – foi paralisado por ordem do STF.

Naquela ocasião, o ministro Alexandre de Moraes deu uma cautelar contra o projeto, ao atender uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) apresentada pelo PSOL. A legenda questionava a redução dos limites do Parque Nacional Jamanxim, uma unidade de conservação ambiental no Pará, para a construção da Ferrogrão. Por decisão da própria corte, é proibido alterar limites de unidades para passagem de obras.

Lula e cacique Raoni Metuktire, do povo kaiapó, durante Acampamento Terra Livre em 2023. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Indígenas não ouvidos

O pedido de desculpas faz referência a uma sessão pública do empreendimento realizada em 12 de dezembro de 2017, em Brasília, na gestão do então presidente Michel Temer, para tratar do licenciamento da obra. Na ocasião, os indígenas não foram ouvidos. No encontro desta quarta-feira, representantes do Ministério dos Transportes e da ANTT se reuniram em Brasília com as lideranças indígenas, para oficializar a retratação.

Na prática, porém, o encontro, que teve participação da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), simboliza mais do que um mero pedido de perdão. Em defesa da ferrovia, a agência reguladora destaca, inclusive, o apelo ambiental do projeto, apesar das preocupações de ativistas com os impactos sobre o ecossistema local.

“Este empreendimento contribuirá para o desenvolvimento nacional, alinhando-se a projetos estratégicos de infraestrutura de transportes, ao mesmo tempo em que respeitará o meio ambiente, promovendo a redução das emissões de CO² na atmosfera, em conformidade com a agenda ESG (ambiental, social e governança) do governo federal e os padrões estabelecidos pela Climate Bond Initiative (CBI) para certificação de iniciativas sustentáveis.”

Apesar de o Brasil ser signatário da Convenção 169 da OIT, o processo de consulta prévia nunca foi efetivamente respeitado no país. O que está em jogo, porém, é saber se os indígenas teriam, ou não, poder de veto ao projeto, a partir do diagnóstico de seus impactos. 

Fila de caminhões carregados de soja na BR-163 com destino ao porto de Miritituba, em Itaituba (PA). Foto: João Laet/Repórter Brasil

Busca de diálogo 

Durante o encontro com as lideranças indígenas, o subsecretário de sustentabilidade do Ministério dos Transportes, Cloves Eduardo Benevides, disse que não está definido se a obra será bancada por recursos públicos, se será uma concessão, ou uma Parceria Público-Privada (PPP). “Não há um desenho final, o que há é um debate público”, comentou.

O plano ferroviário retomado por Lula contraria frontalmente seu maior aliado quando o assunto é a representação dos povos indígenas: o cacique Raoni Metuktire. O líder indígena de 93 anos, que subiu a rampa do Planalto ao lado do presidente na cerimônia de sua posse, em janeiro de 2023, vive na região a ser cortada pela Ferrogrão.

Pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) já demonstraram que a criação de um terminal de cargas da Ferrogrão em Matupá, no norte do Mato Grosso, pode partir ao meio as terras indígenas do Xingu. É nesse ponto que a Ferrogrão afeta a Terra Indígenea Capoto Jarina, onde mora o cacique Raoni. A rodovia MT-232 atravessa trechos da Capoto Jarina e também do Parque Indígena do Xingu, que abriga 16 povos indígenas.

Mydjere Kayapó afirmou que seu povo tem um protocolo de consulta prévia. “Nós sabemos que, mesmo se dissermos não, eles estarão lá para construir. Então, queremos atuar para que não aconteça o que vimos em Belo Monte”, comentou, referindo-se ao conturbado processo de licenciamento da hidrelétrica erguida no rio Xingu, no Pará. 

“Não somos contra o desenvolvimento do Brasil, mas não aceitaremos que nosso direito seja atropelado e ignorado. Eles precisam fazer novos estudos da ferrovia e, antes de tudo, nos ouvir”,

defendeu a liderança.

Presidente da Associação Indígena Apiaká Iakunda’Y da comunidade Pimental, em Trairão (PA), Irleusa Robertino disse à reportagem que o povo indígena espera que as audiências sejam realizadas nas aldeias. “Não descansamos para fazer parte dessa discussão e queremos defender os direitos de nosso povo. Essas reuniões devem acontecer nos municípios diretamente afetados. Estamos solicitando isso”, comentou. 

“Apresentamos os protocolos de consulta dos povos Kayapó, Munduruku e Apiaká. Queremos ser ouvidos”.

Irleusa Robertino

Brent Millikan, membro da secretaria executiva da organização GT Infra e Justiça Ambiental, que acompanhou a reunião com os indígenas, diz que o saldo é positivo. “Ao menos, vemos agora um espírito democrático de abrir o tema para o debate, em vez da tentativa de atropelar e fingir que havia consulta”, comentou.

Em sua avaliação, as polêmicas da Ferrogrão expõem o contexto emblemático de como é feito o planejamento de grandes obras em territórios sensíveis. “São problemas crônicos. É preciso aprimorar o tema da viabilidade econômica e socioambiental do projeto, incluindo temas como o impacto cumulativo com outros empreendimentos, como a BR-163, a hidrovia do Tapajós, até considerando a possibilidade de não fazer a ferrovia”, disse.

Disputa bilionária 

Fora da arena ambiental, a Ferrogrão também divide interesses bilionários de empresas do setor ferroviário. Empresas como a VLI, braço logístico da mineradora Vale, querem que o projeto avance, para consolidar suas operações de transporte rumo ao “arco Norte” da Amazônia. Há, no entanto, fortes oponentes a essa ideia.

A Rumo, empresa do grupo Cosan que administra ferrovias nas regiões Centro-Oeste e Sudeste, assumiu bilhões de reais em novos investimentos na malha que já controla e teme que a nova abertura logística impacte seus negócios. Por isso, atua nos bastidores com posição contrária ao empreendimento.

Representantes de caminhoneiros também atuam contra o projeto, por temerem que o transporte de carga que hoje fazem pela BR-163 migre para os trilhos da ferrovia e inviabilize o modal rodoviário.

No ano passado, a Ferrogrão foi incorporada ao PAC 3 e passou a ser alvo de uma “análise dedicada”, conforme mencionou o chefe da Casa Civil, ministro Rui Costa. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, já declarou, porém, que o projeto depende da comprovação de sua viabilidade ambiental.

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Repórter Brasil, escrito por André Borges. 

Alertas de desmatamento diminuem na Amazônia e no Cerrado no primeiro mês do ano

Dados foram divulgados pelo Inpe a partir da análise do sistema de monitoramento Deter.

O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou, no dia 9 de fevereiro, dados que apontam para a redução nos alertas de desmatamento no Cerrado. A diminuição foi de 33% no comparativo entre os meses de janeiro de 2024 e 2023. Na floresta amazônica, a diminuição foi de 29% relacionada ao mesmo período.

Os dados divulgados pelo Inpe foram obtidos por meio da análise do sistema de monitoramento Deter, uma ferramenta que utiliza imagens de satélite para detectar e alertar sobre atividades de desmatamento.

Dados divulgados pelo Inpe indicam redução no desmatamento do Cerrado no mês de janeiro. Foto: Fernando Alves/Governo do Tocantins

Para Renato Jayme, presidente do Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins), a redução do desmatamento no Cerrado e na Amazônia, evidencia o êxito das medidas adotadas pelo Governo do Tocantins e a eficácia de políticas ambientais mais amplas no Brasil. “Essa redução aponta para o sucesso das estratégias implementadas, indicando que as práticas sustentáveis adotadas pelo Governo do Tocantins estão contribuindo não apenas para a preservação local, mas também para a proteção de um dos biomas mais importantes do país”, ponderou.

Para o gestor, os números refletem ainda o impacto positivo das ações coordenadas entre os estados amazônicos, incluindo Tocantins, na luta contra o desmatamento na maior floresta tropical do mundo. 

Tecnologia no monitoramento e fiscalização 

Para aprimorar informações de monitoramento e operações de fiscalização ambiental, o Governo do Tocantins tem investido em tecnologia de imagens via satélite. Em 2022, o Naturatins formalizou sua adesão definitiva à RedeMAIS, do Programa Meio Ambiente Integrado e Seguro do Ministério da Justiça e Segurança Pública. A plataforma web adotada como referência para o monitoramento e fiscalização permite o acesso e o compartilhamento das imagens de satélite diárias da constelação PlanetScope, composta por mais de 180 satélites.

Renato Pires, gerente de Monitoramento e Gestão de Informação Ambiental, detalha que outras plataformas como MapBiomas, Prodes, Deter e SAD Cerrado são consultadas periodicamente pelo Naturatins, e que “a eficiência no uso dessa tecnologia ressalta a importância dos sistemas de vigilância eficientes para combater práticas ilegais que ameaçam os ecossistemas”. 

Combate ao desmatamento ilegal 

Na celebração do Dia do Cerrado no ano passado, o Governo do Tocantins publicou a Portaria Conjunta nº 2/2023, do Naturatins, da Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh) e do Batalhão da Polícia Militar Ambiental (BPMA), que criou o Grupo de Trabalho (GT) para orientação das ações de combate ao desmatamento ilegal. 

A criação deu-se em função dos índices de desmatamento ilegal constatados no Tocantins e a necessidade de responsabilização dos infratores, e, assim, inibir novas condutas ilícitas, bem como a existência de passivo de áreas a serem fiscalizadas e autuadas referentes a desmates ocorridos entre os anos de 2021 e 2023. 

Equipe de Monitoramento e Gestão de Informação Ambiental do Naturatins avalia, diariamente, alertas de desmatamento em diferentes plataformas. Foto:Walker Ribeiro/Governo do Tocantins

Tremores de terra sentidos no Acre são reflexo dos Andes

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De acordo com o sismólogo Bruno Collaço, esses tremores são chamados de sismos andinos. Ele também aproveita para derrubar alguns mitos que cercam os terremotos

A região amazônica registrou dois tremores de terra em um intervalo de oito dias, sendo um deles o maior abalo da história do Brasil, no final de janeiro, no município de Tarauacá, no Acre. O sismólogo do Centro de Sismologia da USP, professor Bruno Collaço, responsável pela implantação da Rede de Sismográfica Brasileira, explica que os tremores não têm ligação com o Brasil, mas com a Cordilheira dos Andes, e que são chamados de “sismos andinos”. Foram registrados a uma profundidade de mais de 600 km, segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS).

É importante destacar que o Brasil tem tremores praticamente semanalmente, porém, em escalas menores, entre dois e três graus de magnitude, com 5 km de profundidade. Ceará, Rio Grande do Norte, sudeste de Minas Gerais e interior de São Paulo são as áreas que mais registram sismos.

Não existe qualquer relação entre mudanças climáticas e terremotos. Fotomontagem: Jornal da USP. Imagem: Domínio Público

Rota de terremotos 

Com tantas mudanças climáticas registradas, principalmente no último ano, a dúvida que fica é se o Brasil, além de enfrentar calor e frio extremos, pode também entrar na rota dos terremotos. Collaço diz que não existe relação entre mudanças climáticas e terremotos.

Como o terremoto do Acre foi muito profundo, não causou danos materiais ou ao meio ambiente, como fauna, flora e rios da Amazônia; com isso, são pouco percebidos pelas pessoas.

Outro mito, que é muito comum, é achar que os tremores têm relação com a estação do ano. Eles podem ocorrer a qualquer momento, em qualquer parte do mundo.

O Centro de Sismologia da USP possui um site onde as pessoas podem encontrar informações sobre terremotos no Brasil e, em caso de presenciarem um tremor de terra, podem usar uma ferramenta no site para reportar o tremor. 

*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Jornal da USP, escrito por Sandra Capomaccio

Pesquisa irá analisar impactos de mudanças climáticas na mortalidade das árvores do Acre

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O Acre é uma das regiões brasileiras mais afetadas por eventos climáticos extremos, o que tem se tornado recorrente, principalmente a partir de 2010.

A doutora em Biodiversidade e Biotecnologia, Simone Matias, está desenvolvendo uma pesquisa voltada para entender o impacto das mudanças climáticas na mortalidade das árvores da região e, consequentemente, o acúmulo de carbono em área do Acre

O projeto foi submetido e aprovado no Programa Primeiros Projetos (PPP), financiado com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Acre (Fapac), em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Simone explica que o objetivo é entender como as mudanças climáticas estão impactando na emissão e absorção de carbono nas florestas do Estado.

Pesquisa avalia impacto das mudanças climáticas na mortalidade de árvores e emissão de carbono. Foto: Marcos Vicentti/Secom AC

Um artigo elaborado por pesquisadores do Acre, intitulado ‘Extremos Climáticos na Amazônia: aumento das secas e inundações no estado brasileiro do Acre’, foi publicado na revista Perspectives in Ecology and Conservation, em dezembro do ano passado, e atesta que o estado do Acre é uma das regiões brasileiras mais afetadas por eventos climáticos extremos, o que tem se tornado recorrente, principalmente a partir de 2010.

A pesquisa de Simone pretende justamente avaliar parte desses impactos. 

“Essas mudanças têm contribuindo cada vez mais para a fragmentação de árvores, o que deixa essa floresta mais aberta, sujeita à entrada de fogo, por exemplo. Com isso, essas árvores acabam morrendo e, com essa maior mortalidade de árvores, vai diminuir a quantidade de carbono. Ou seja, aumenta a quantidade de carbono na atmosfera porque a floresta vai perdendo um pouco do serviço, que é essa absorção do carbono”, 

explica.

Estudos devem ter duração de 18 meses e disponibilizarão dados para tomada de decisões e outras pesquisas. Foto: Marcos Vicentti/Secom AC

Como será a pesquisa 

O estudo vai avaliar áreas como Humaitá (que faz fronteira com o estado acreano); Fazenda Experimental Catuaba, em Senador Guiomard, e Parque Zoobotânico, em Rio Branco. Algumas dessas áreas já foram limitadas em outras pesquisas pela Universidade Federal do Acre (Ufac). 

“Alguns pesquisadores já vinham analisando essas parcelas, que chamamos de parcelas permanentes, porque já é uma área marcada. Então, vamos naquela área, identificamos as árvores, é colocada uma placa e aí podemos acompanhar, no decorrer dos anos, se ela cresceu, se está viva ou morta e quantidade de carbono que está acumulando”,

explica.

 A ideia de delinear uma área no Parque Zoobotânico dentro da Ufac é poder acompanhar mais de perto, já que as outras áreas ficam em locais mais distantes. Já dentro da universidade, esse deslocamento é facilitado e pode ser feito mensalmente.

Para ter os detalhes desse cenário, cestos são colocados na base das árvores para que todas as folhas caiam nesse espaço delimitado. A partir disso, é feito a pesagem desse material e é calculada a biomassa desses orgânicos.

“Esse cesto vai pegar tudo de folha que cair ali naquela área. Com isso, a gente sabe quanto que as copas das árvores estão liberando de carbono. No Acre, não temos muitos estudos que falem da deciduidade das florestas, então agora a gente consegue acompanhar os meses, de agosto, setembro, avaliando se está caindo poucas ou muitas folhas, considerando esse volume de acordo com a sazonalidade”, esclarece.

Nesse processo, quanto mais a árvore perde folhas, mas ela emite gás carbônico, o que é ruim para o meio ambiente. Além dos cestos, a pesquisa envolve equipamentos como paquímetro, balança de precisão e estufas. Todo o material coletado no período do levantamento também será disponibilizado para outras pesquisas dentro ou fora do ambiente acadêmico.

“Outro dado importante que vamos obter é saber qual espécie de árvore é mais resistente às mudanças climáticas, o que vai nos possibilitar sugerir esse tipo de árvore para os trabalhos de recuperação e reflorestamento que já existem em todo o estado”,

relata.

Pela quantidade de folhas caídas pode-se avaliar emissão e absorção de carbono. Foto: Reprodução/Cedida pela pesquisadora

Incentivo à pesquisa 

Entre os seis projetos que tiveram o investimento de R$ 420 mil, Simone é a única mulher entre os aprovados. Ela disse que se sente honrada em ser a representante feminina, mas destacou que queria ver mais mulheres desenvolvendo trabalhos importantes para a ciência.

“Minha presença como única mulher também é uma forma de tentar fortalecer mais o público feminino na área da pesquisa no estado”, reforça.

A secretária do Meio Ambiente, Julie Messias, afirmou que o incentivo ao ambiente científico é fundamental para a geração de conhecimento, pois quando aplicado fortalece a gestão pública:

“Na área ambiental, a pesquisa científica tem o potencial de orientar as políticas públicas, gerando instrumentos que podem garantir maior eficiência da execução de ações de preservação, conservação, alternativas sustentáveis para a produção e outros”.

Pesquisa também deve apontar qual árvore é mais resistente às mudanças climáticas. Foto: Marcos Vicentti/Secom AC

Projetos 

A interação entre meio ambiente e desenvolvimento é definida como bioeconomia, e o governo do Acre, por meio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Acre (Fapac), em parceria com Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), está investindo R$ 420 mil em seis pesquisas que devem fazer o estado avançar nessa área, que tem sido um dos focos da gestão de Gladson Cameli.

Os recursos são provenientes do Edital nº 002/2023 – Programa Primeiros Projetos (PPP), que tem o objetivo de apoiar pesquisadores com, no máximo, oito anos de doutorado e que não sejam bolsistas de produtividade do CNPq. Todos os projetos são executados por pesquisadores da Universidade Federal do Acre (Ufac) e cada um teve o investimento de R$ 70 mil e tem prazo de execução de 18 meses, contando desde dezembro do ano passado.