Somente no Estado o consumo per capita do fruto chega a 17,8 litros por ano, sendo o principal produtor de açaí do Brasil, responsável por 95% da produção no país.
O açaí é fruto proveniente do açaizeiro, o Euterpe oleracea, e rico em vitaminas e antioxidantes, como Vitamina C, Vitaminas do complexo B e Vitamina E; Sais Minerais: Cálcio, Ferro, Potássio, Sódio, Fósforo; e Carboidratos, Gorduras e Proteína. Com farinha d’água, tapioca, com açúcar, sem açúcar, como almoço, suco ou sobremesa, assim costuma ser consumido o fruto. Mas independente da forma que se consome, após a extração da polpa sobram os resíduos, entre eles o caroço do açaí.
E dar um destino útil a esse caroço é o objetivo da pesquisa ‘Potencial do resíduo do açaí na produção de bioenergia e materiais nanoestruturados sustentáveis’, coordenada pela professora Lina Bufalino, da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), campus Belém. O projeto foi contemplado com a bolsa Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Segundo dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), somente no Pará o consumo per capita do fruto chega a 17,8 litros, por ano, sendo o estado ainda o principal produtor de açaí do Brasil, responsável por 95% da produção no país.
A partir desse consumo e produção, o que resta é o resíduo do açaí, o caroço que após a retirada da polpa é descartado. Segundo estudos da Ufra, no período da safra do fruto são gerados aproximadamente 24 mil sacas de resíduo de açaí, e 17 mil sacas na entressafra. E apesar dos batedores serem os responsáveis pela destinação desse resíduo, o material geralmente é recolhido junto ao lixo domiciliar e acaba indo parar nos lixões.
O propósito do projeto da professora Lina Bufalino, é desenvolver novas tecnologias alternativas para o resíduo do açaí a partir de duas linhas de pesquisa: bioproduto e bioenergia. Os estudos avaliam se o caroço pode ser transformado em energia se utilizado como biomassa, e as fibras, que são aqueles “cabelinhos” do caroço, em biomateriais, como o plástico filme, e assim ter o resíduo inteiro reaproveitado.
“Quando eu vi pela primeira vez o resíduo, o que me chamou muito atenção foram as frações, a semente dura e o ‘cabelinho’, que são as fibras. A fibra tem muito potencial de bioproduto, mas sobrou o caroço. A ideia é que o caroço vá para a bioenergia, então dessa forma, seria uma tentativa de propor a utilização do resíduo por completo”,
explica a professora.
Bioenergia
A bioenergia é a energia obtida através de biomassa, que é a matéria orgânica de origem vegetal ou animal, utilizada para produzir energia. No projeto, a biomassa seria o caroço do açaí. A professora explica que, se um resíduo (neste caso o caroço do açaí) for submetido a combustão, ele tem as ligações químicas quebradas, o que pode gerar energia térmica ou elétrica.
“No momento, estamos avaliando se o armazenamento inadequado do caroço do açaí afeta as propriedades do resíduo e quanto se está perdendo em bioenergia por causa disso. O armazenamento inadequado é quando o produtor produz a polpa, e deixa o resíduo largado em terrenos baldios, ou ensacados pegando sol e chuva”, disse.
E como isso viraria bioenergia? Segundo a professora, a transformação seria nos geradores de energia.
“Para transformar em energia são utilizados geradores, que geralmente utilizam combustíveis fósseis poluentes, por exemplo, o diesel. Com o avanço dos estudos, seria possível utilizar a biomassa obtida do caroço do açaí, e assim converter essa biomassa em energia elétrica, de forma mais sustentável”,
explica.
A professora explica que o trabalho para transformar esses resíduos em bioenergia ainda é longo, e precisa ser em conjunto com a comunidade. “Para isso ocorrer teria que ser um trabalho feito em conjunto com os produtores de açaí, e a comunidade, para juntar esse resíduo em um ponto de coleta, ou algo do tipo, para a partir dali utilizar para gerar essa energia”.
Bioproduto
Outra fase mais avançada da pesquisa é transformar aquele “cabelinho” do açaí em biomateriais. “A fibra é uma célula morta que tem como característica ser longa e fina, então cada fiozinho do caroço do açaí é uma fibra. Por exemplo, para fazer papel a partir de madeira, usa-se as fibras da madeira. E no açaí, temos a vantagem dessa fibra ser removível facilmente, até com as mãos”, explica a professora. A partir dessa retirada, a fibra passa por um processo químico até se transformar no bioproduto esperado.
Nos primeiros estudos já feitos pela professora, foi criado um tipo de plástico filme, através do isolamento da celulose, que é um dos componentes; “É o mesmo que se faz com o papel. A partir disso, fazemos um processo nanotecnológico, que é diminuir essa celulose de tamanho, até ganhar novas propriedades que a gente não teria com essa estrutura nas suas dimensões naturais”, comenta.
Com o isolamento da celulose, a pesquisadora fez um tipo de mistura com água, sem uso de químicos, apenas a água e a fibra do açaí: “Isso gera um gel, que você coloca em um recipiente, a água evapora e o resultado é um tipo de plástico filme que parece uma espécie de papel manteiga”.
Segundo a professora, esse filme pode ser aplicado em embalagens sustentáveis, e até em embalagens que podem mudar de cor, por exemplo, se a comida apodrecer. “Tudo isso tem muito potencial, já criamos o protótipo, agora estamos estudando para avançar. O que vamos fazer agora é tentar melhorar, em um processo mais intenso, misturar outros componentes para ver se mudam as características dessa fibra”, informa.
A intenção é que a partir dessas pesquisas sejam gerados muitos outros produtos em estudos futuros, como dispositivos para computadores, dispositivos solares, e a criação de um papel para impressão mais potente. ” Vamos também misturar as fibras com outras propriedades, além da água, como óleos da Amazônia, para ver se fica mais bioativo, se fica mais resistente à bactérias, pode ser interessante para proteção, tudo isso serão estudos futuros”, diz.
A equipe do projeto envolve oito alunos de graduação e pós-graduação da Ufra, professores parceiros da Ufra, além da Universidade Federal de Lavras, onde a equipe faz a utilização do equipamento de fazer nanofibras.