Pesquisador do Museu Goeldi participa de pesquisa que descobriu 3 novas espécies de cobras corais

A descoberta é resultado da pesquisa de doutorado de Lywouty Nascimento, sob a orientação da Dra. Ana Lúcia Prudente, do Laboratório de Herpetologia do Museu Goeldi.

Em estudo publicado na revista científica Systematics and Biodiversity, pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi, do Steinhardt Museum of Natural History e da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, apresentam três novas espécies de cobras corais do gênero Micrurus, distribuídas pelas regiões Nordeste e Sudeste do Brasil, em partes da Mata Atlântica e da Caatinga.

Micrurus bonita, Micrurus janisrozei e Micrurus anibal foram os nomes dados pelos pesquisadores às novas espécies de cobras corais. Micrurus bonita é uma homenagem à ‘Maria Bonita’, personagem histórica do cangaço e símbolo da cultura nordestina brasileira. 

Micrurus janisrozei homenageia o biólogo e especialista em cobras corais Janis A. Roze e a Micrurus anibal faz uma homenagem em memória de Anibal Rafael Melgarejo Gimenez, herpetólogo e toxicologista uruguaio radicado no Brasil que contribuiu para os estudos das cobras brasileiras, especialmente as cobras corais.

A descoberta é resultado da pesquisa de doutorado de Lywouty Nascimento, sob a orientação da Dra. Ana Lúcia Prudente, do Laboratório de Herpetologia do Museu Goeldi.

Leia também: Entenda a diferença entre as cobras coral-verdadeira e falsa-coral

A publicação também conta com as contribuições de Roberta Graboski, que atualmente realiza suas pesquisas no Laboratório de Herpetologia no Steinhardt Museum of Natural History, na Universidade de Tel Aviv e Nelson Silva Jr., do Programa de Pós-graduação em Ciências Ambientais e Saúde, da Pontifícia Universidade Católica de Goiás. 

Abordagem integrativa

Tradicionalmente, os estudos taxonômicos, responsáveis pela descoberta e descrição de novas espécies de seres vivos, são baseados em evidências morfológicas, isto é, a partir da análise acurada da forma e da estrutura dos organismos.

As características morfológicas desempenham um papel fundamental em diagnosticar a diversidade de espécies, como as cobras corais, todavia, para tornar ainda mais aprimorada a descrição de novas espécies, os pesquisadores do Museu Goeldi destacam a necessidade de uma abordagem integrativa, agregando outros tipos de análises para alcançar uma delimitação taxonômica mais precisa e minuciosa do gênero.

Segundo a publicação, algumas serpentes classificadas como sendo a Micrurus ibiboboca já foram confundidas com outras cobras corais do nordeste brasileiro devido às similaridades nos seus padrões de cor e no formato das suas escamas cefálicas, o que torna a identificação morfológica mais difícil e leva ao aumento de ocorrências de erros taxonômicos.

Para se ter uma ideia, atualmente o grupo de cobras Micrurus possui mais de 80 espécies reconhecidas e distribuídas geograficamente desde o sudeste dos Estados Unidos até o sul da América do Sul. No Brasil, 38 espécies já foram identificadas como sendo pertencentes a este grupo. Agora, com a nova descoberta, mais três espécies, até então confundidas com a Micrurus ibiboboca, passam a compor esse quantitativo. Como abordagem integrativa, além da análise morfológica, os pesquisadores também realizaram análises moleculares para chegar ao resultado da pesquisa.

Estudos taxonômicos incluindo conjuntos de dados moleculares são essenciais para avaliar e inferir de maneira mais acurada a diversidade do gênero Micrurus, e são uma poderosa ferramenta taxonômica para identificar e descobrir novas espécies. 

Coleções científicas

“As coleções servem de base para os estudos sistemáticos e taxonômicos. A descrição de uma nova espécie passa pelo processo de análise comparativa de espécimes preservados nas coleções científicas”, explica a Drª Ana Lúcia Prudente.

Os pesquisadores construíram um conjunto de dados geográficos com 492 amostras de 130 localidades para as espécies que fazem parte do grupo da Micrurus ibiboboca. Foram incluídos espécimes examinados em coleções científicas e utilizados apenas exemplares cuja identificação e origem foram confirmados. Para realizar este estudo, a equipe de pesquisadores visitou coleções herpetológicas de diferentes instituições científicas do Brasil, Estados Unidos, França e Reino Unido.

Ana Lúcia Prudente pontua que, “ao comparar esse material da Caatinga e da Mata Atlântica, observamos diferenças significativas no padrão de cor. Isso nos levou a uma investigação mais aprofundada de outros complexos de caracteres, incluindo as moléculas”.

Por meio de análises nas amostras das coleções, os pesquisadores descobriram que as diferenças significativas nos padrões de cores das populações de Micrurus ibiboboca estavam relacionadas à cor do focinho, número e comprimento dos anéis triadais e no padrão de cores dos primeiros anéis brancos das tríades (uma sequência de três anéis pretos, separados por dois anéis brancos e intercalados por dois anéis vermelhos).

Os resultados demonstram a importância das coleções científicas para os identificação de novas espécies e análise contínua da diversidade biológica. Além disso, evidenciam que as regiões da Mata Atlântica e Caatinga são áreas de alta biodiversidade, com incidência de espécies endêmicas e ameaçadas, o que chama a atenção para a necessidade fundamental de preservação desses biomas.

“Infelizmente não se sabe o status de conservação dessas espécies, pois a descoberta é a primeira parte desse processo. E cada espécie descoberta apresenta um potencial único, mostrando também o próprio potencial de biomas como a Mata Atlântica e a Caatinga em relação à descoberta de novas espécies”, destaca o pesquisador Lywouty Nascimento.

Muitas espécies do próprio gênero Micrurus ainda permanecem pouco conhecidas, com várias linhagens divergentes incluídas em complexos de espécies. Dados do Sistema de Alertas de Desmatamento da Mata Atlântica – SAD, evidenciaram uma queda contínua no desmatamento do bioma no ano passado, mas apesar desse registro, ainda assim a área desmatada entre janeiro e agosto de 2023 foi de 9.216 hectares.

Segundo Lywouty, “em um ambiente cada vez mais degradado, a gente perde a biodiversidade. Mas a pesquisa mostra que mesmo com toda a degradação que a Mata Atlântica sofreu e ainda sofre, ainda há espécies novas a serem descobertas”. 

*Com informações do Museu Goeldi

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