Sistemas usados para vigiar a floresta tropical foram a base para implementar iniciativas no Cerrado e outros ecossistemas.
O monitoramento por satélite do desmatamento na Amazônia serviu de base e inspiração para que iniciativas semelhantes fossem adotadas para acompanhar a evolução da supressão de vegetação nativa e o uso e a cobertura da terra nos demais biomas brasileiros.
Desde 2018, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mantém dois sistemas focados no Cerrado: o Prodes, para calcular a taxa anual de supressão de vegetação nativa em áreas de no mínimo 1 hectare (ha), e o Deter, para emitir alertas de cortes de raso nesse bioma
“Apesar de ter começado mais tarde, o Prodes Cerrado mapeou a supressão de vegetação nesse bioma desde o ano 2000”, explica o especialista em sensoriamento remoto Claudio Almeida, coordenador do programa de monitoramento da Amazônia e demais biomas brasileiros do Inpe.
Nos ecossistemas que não são majoritariamente florestais, como Cerrado, Pantanal, Caatinga e Pampa, o termo desmatamento é evitado, e os pesquisadores preferem falar em supressão de vegetação, que engloba o corte de gramíneas, arbustos e também árvores.
O dado deste ano do Prodes sobre o Cerrado foi divulgado no fim de novembro, pouco mais de duas semanas após a liberação da taxa anual de desmatamento na Amazônia Legal.
A área com vegetação suprimida no Cerrado em 2023 foi de 11.011,70 quilômetros quadrados (km²), 3,02% maior do que no ano passado.
Os dados do Prodes 2023 abrangem o período de agosto de 2022 a julho deste ano (ver quadro com evolução da supressão de vegetação). Neste ano, o Cerrado foi o bioma que mais perdeu vegetação.
A partir de 2022, o Prodes também passou a calcular a taxa anual de corte raso de vegetação nativa nos demais biomas (Pampa, Mata Atlântica, Caatinga e Pantanal), com dados retroativos começando em 2000.
Para esses ecossistemas, não há emissão de alertas pelo Deter. A exceção é o Pantanal, que, desde setembro deste ano, também é coberto pelo sistema de alertas do Inpe.
“O monitoramento da Amazônia foi fundamental para estabelecer e consolidar os protocolos e metodologias necessárias para expandir esse tipo acompanhamento para os outros biomas. Mesmo que sejam biomas de características fisionômicas diferentes, o aprendizado com a Amazônia serviu como base desse trabalho”,
diz a geógrafa Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), que estuda a Amazônia e o Cerrado.
Em setembro de 2022, o Ipam lançou o Sistema de Alerta de Desmatamento (Sad) do Cerrado, que usa imagens do satélite europeu Sentinel 2 em seu trabalho de acompanhamento.
Para o geógrafo Heinrich Hasenack, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o lançamento em 2004 da primeira edição do mapa dos biomas do Brasil foi uma das iniciativas importantes que impulsionaram o monitoramento da cobertura vegetal e do uso da terra em todos os ecossistemas nacionais, e não apenas na Amazônia Legal.
O mapa foi uma encomenda do Ministério do Meio Ambiente (MMA) ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Desde o projeto RadamBrasil, cujos dados de campo são da década de 1970, o país não tinha mais realizado o mapeamento da totalidade de seu território”, comenta Hasenack.
Atualmente algumas iniciativas da sociedade civil que monitoram com dados de satélite a situação dos biomas brasileiros se firmaram e ganharam destaque. Em 1990, a SOS Mata Atlântica produziu o primeiro atlas desse bioma, em parceria com o Inpe e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Hoje o levantamento está em sua 18ª edição.
Desde seu início, em 2015, o MapBiomas – uma iniciativa da organização não governamental (ONG) Observatório do Clima – acompanha a supressão de vegetação e o uso da terra em todos os ecossistemas do território nacional. Anualmente publica dados e relatório sobre o tema, sempre em parceria com universidades, empresas de tecnologia e entidades da sociedade civil. Hasenack, da UFRGS, coordena os trabalhos do MapBiomas sobre o Pampa brasileiro e Alencar, do Ipam, sobre o Cerrado.
*O conteúdo foi originalmente publicado pela Revista Pesquisa Fapesp, escrito por Marcos Pivetta