Compreender e prever as chuvas é um grande desafio, principalmente em regiões remotas como a Amazônia, onde a infraestrutura de monitoramento é limitada. Pesquisadores do Instituto Mamirauá desenvolveram uma abordagem que utiliza gravações de som para medir a intensidade da chuva, medindo o som das gotas ao atingir superfícies. Um artigo detalhando este método inédito foi publicado recentemente na revista Geophysical Research Letters: ‘Measuring Amazon Rainfall Intensity With Sound Recorders‘.
A técnica foi desenvolvida no campus do Instituto Mamirauá, em Tefé, no Amazonas, e testada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Mamirauá. A partir das gravações do som da chuva, um modelo de aprendizado de máquina foi treinado para prever taxas de precipitação. O método foi testado com sucesso em áreas com diferentes tipos de vegetação e até 30 km de distância do local de calibração, algo inédito para esta técnica.
Essa metodologia, segundo pesquisadores, é promissora, principalmente em regiões com pouca cobertura de sensores tradicionais, como a Amazônia, que enfrenta desafios devido à densa cobertura vegetal, dificultando o uso de métodos convencionais.
Segundo Rodrigo Xavier, pesquisador associado do Instituto Mamirauá e primeiro autor do artigo, “o estudo da geoacústica é uma área nova e em rápida expansão, nosso estudo mostrou que mesmo um modelo relativamente simples, treinado em um ambiente de floresta tropical secundária, é capaz de estimar a intensidade da chuva em locais com vegetações bastante distintas, como o chavascal e a várzea baixa. Isso demonstra o potencial real de se usar o som da chuva como um novo método para realizar medições meteorológicas”.
Foto: Reprodução/Instituto Mamirauá
Esse avanço tecnológico pode auxiliar na expansão do monitoramento climático em áreas sub-representadas, contribuindo para a gestão de recursos hídricos e a adaptação às mudanças climáticas.
Além disso, há potencial para integrar essa técnica a outros campos, como a ecologia, fornecendo dados sobre o impacto das chuvas no comportamento de espécies e ecossistemas tropicais.
*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Instituto Mamirauá, escrito por Miguel Monteirio
Cuias ANT. Br. 193 e ANT. Br. 194. Museu da Ciência da Universidade de Coimbra (Foto de foto de Renata Martins, Coimbra, Portugal, 2023. Imagem reproduzida com permissão da Portuguese Research Infrastructure of Scientific Collections)
Utensílios domésticos ou objetos de uso ritual, as cuias estão presentes em vários ambientes culturais do Brasil, especialmente em comunidades indígenas ou ribeirinhas, mas também em grandes cidades da região amazônica, como Belém do Pará.
“Acredita-se que na Amazônia as cuieiras estejam entre as primeiras plantas cultivadas, e que provavelmente seu uso seja ainda mais antigo do que o das cerâmicas”, diz a pesquisadora Renata Maria de Almeida Martins, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e coordenadora do Labya-Yala – Laboratório de Estudos Decoloniais – e do projeto “Barroco-açu: a América Portuguesa na geografia artística do Sul global” , contemplado com Auxílio à Pesquisa da FAPESP na modalidade Jovens Pesquisadores Fase 2.
“As cuias eram fabricadas por mulheres indígenas, que empregavam técnicas sofisticadas para criar um acabamento preto, brilhante e durável, como uma ‘laca da Amazônia’. Esses frutos tiveram seus campos iconográficos modificados, e foram ressignificados por decorações com motivos inspirados na flora e fauna locais, mas também por padrões para bordados europeus e asiáticos, que circulavam globalmente, refletindo o intercâmbio artístico da época – como também ocorreu com objetos recobertos com o mopa-mopa, também chamado de barniz de Pasto, na Colômbia, ou com o maque, a laca mexicana”, diz Martins.
Importante destacar que essas cuias não eram feitas espontaneamente e de forma aleatória, mas produzidas em manufaturas mantidas por colonos ou no âmbito de missões religiosas na Amazônia. O ofício de pintoras de cuias era reconhecido no início do século XVIII. Os produtos dessas “fábricas” eram destinados majoritariamente ao mercado europeu, participando, portanto, do que, já naquele tempo, constituía um processo de globalização.
Dona Marinalva Correia de Sousa e cuias em diferentes etapas da produção (foto: Renata Maria Martins, Carapanatuba, Pará, 2023)Cuia sendo preparada por dona Marinalva Correia de Sousa (foto: Renata Maria Martins, Carapanatuba, Pará, 2023)
As cuias ressignificadas eram produzidas principalmente na Vila de Monte Alegre (antes aldeia indígena de Gurupatuba, atual Monte Alegre, Pará), em outras localidades da região do Baixo Amazonas e também em Belém, capital do Estado do Grão-Pará e Maranhão. O naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira (1756-1815), em sua Viagem Filosófica, coletou diversas delas, que, atualmente, fazem parte dos acervos do Museu Maynense da Academia das Ciências de Lisboa e do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra. Em seu relato, Ferreira afirma que entre 5 mil e 6 mil cuias eram produzidas na Vila de Monte Alegre por ano, a maioria delas enviada para Lisboa. “Suas decorações diversificadas e complexas, referenciadas nas tradições indígenas e/ou com inspirações asiáticas e europeias, são exemplos que evidenciam práticas criativas e artísticas de resistência de mulheres indígenas, africanas e mestiças”, informa Martins.
Além de estudar as cuias do século XVIII, a pesquisadora visitou, em 2023, a comunidade de Carapanatuba, na região do Aritapera, Santarém, no Baixo Amazonas, onde esses objetos ainda são produzidos, agora por mulheres livres e empoderadas da região ribeirinha. Reunindo artistas das cinco comunidades do Aritapera, a Associação das Artesãs Ribeirinhas de Santarém (Asarisan), criada em 2003, atuou de forma fundamental para que o “Modo de Fazer Cuias do Baixo Amazonas” fosse inscrito em 2015 no Livro de Registro dos Saberes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), como Patrimônio Cultural do Brasil.
“Constatei, como outros estudiosos igualmente relataram, que, em sua maior parte, a fabricação ainda segue o mesmo processo descrito por Ferreira. Mulheres como dona Lélia Maduro, Silvane Maduro, Marinalva Correia, Francisca Pereira, Socorro Pereira e outras das comunidades da região do Aritapera retêm conhecimentos ancestrais sobre a natureza, os rios, as plantas, os animais do lugar. Bem como sobre o longo processo de preparação de cuias envernizadas com o cumatê e ‘bordadas’ com incisões”, conta Martins.
No jardim que circunda a casa de dona Lélia e de seu marido, o senhor Antônio, existem diferentes tipos de árvores cuieiras (Crescentia cujete), que produzem frutos redondos ou ovais de diversos tamanhos. Eles são colhidos pelas mulheres no ponto exato de maturação desejado: quando, ao serem percutidos, produzem um som específico.
Os frutos são, então, seccionados com facão ou serrote, e as cuias resultantes são colocadas em uma grande panela de água fervente, para que as cascas amoleçam. Depois, a casca externa de cada cuia é cuidadosamente raspada com uma lâmina, a borda é alisada com a língua áspera do peixe pirarucu (Arapaima gigas) e o interior com a escama do mesmo peixe. A preparação final para aplicação do verniz é feita esfregando-se o interior e o exterior com as grandes folhas da árvore embaúba (Cecropia), uma espécie também presente na área próxima à residência da família. A cuia tratada, mas ainda sem verniz, é chamada de “pitinga”.
O processo de “laqueação” é feito com aplicação de tintura de cumatê, um líquido avermelhado produzido a partir da infusão de cascas de outra árvore da região, o cumatezeiro (Myrcia atramentifera). Após serem pintadas com várias camadas de tintura, as cuias são deixadas para descansar sobre um leito de areia ou cinzas e borrifadas com urina humana, permanecendo cobertas por uma noite inteira. A reação química entre componentes da tintura e da urina transforma o tingimento avermelhado em uma espécie de “laca” negra brilhante. Essa técnica, desenvolvida por mulheres indígenas do Baixo Amazonas, produz um resultado comparável e até superior ao da melhor laca da China (Rhus vernicifera ou Rhus verniciflua), conforme relatos do século XVIII.
“Após todas essas etapas, as cuias são decoradas por meio de incisões feitas com uma pequena faca. A incisão remove o verniz e deixa aparecer o fundo claro. A pintura com aplicação de corantes vegetais ou minerais na superfície descoberta, muito utilizada nas cuias do século XVIII, quase não é mais adotada hoje na região, embora as plantas produtoras de corantes sejam conhecidas pelas artistas ribeirinhas”, informa Martins.
Nas cuias atuais, produzidas para uso ou comércio, a iconografia de origem indígena, composta de motivos geométricos e abstratos, voltou a ser cada vez mais utilizada. “Porém, mesmo na época colonial, a produção das cuias, além de servir ao mercado de exportação, também atendia a funções importantes no contexto ritual. Em suas memórias, Ferreira relatou a resistência das mulheres indígenas de Monte Alegre em vender certas cuias, que possuíam miçangas e muiraquitãs, por seus significados sensíveis nas relações sociais das comunidades”, pontua Martins.
Produzidas por mulheres, as cuias também são simbolicamente associadas à fecundidade, aos mitos de criação e às antigas práticas de cura dos povos indígenas, sendo ainda hoje muito utilizadas para preparar e verter banhos terapêuticos e benzimentos; como também para servir alimentos típicos da Amazônia, como o tacacá.
Mas, no século XVIII, as oficinas instaladas nas vilas e nas missões religiosas redirecionaram essa tradição ancestral para atender ao mercado europeu, ávido por artigos luxuosos, como também por objetos considerados “exóticos”. Peças asiáticas, ou europeias de inspiração asiática, como porcelanas, sedas, bordados e até crucifixos de marfim, serviram de modelos para objetos de produção local que reinterpretavam aqueles importados.
“Artistas indígenas e afro-indígenas utilizavam técnicas como o embutido, a incrustação e o douramento, adaptando materiais amazônicos e plantas como a copaíba (Copaifera langsdorffii) e o jutaí (Hymenaea courbaril), por exemplo, para criar efeitos similares ao dourado presente nos objetos asiáticos. A participação das mulheres indígenas, a sua intimidade com a natureza da floresta, foi fundamental nesse processo. Tal contribuição e protagonismo, muitas vezes invisibilizados, são essenciais para compreender a complexidade das relações culturais e artísticas na Amazônia da época colonial e na atualidade”, conclui Martins.
O artigo “Lacquers of the Amazon: Cuias, Cumatê and Colours by Indigenous Women in Grão-Pará in the 18th Century” pode ser acessado em https://www.mdpi.com/2571-9408/7/9/230.
*O conteúdo foi originalmente publicado pela Agência Fapesp, escrito por José Tadeu Arantes
Entre tantos títulos dos programas produzidos e apresentados por Edson Paiva, este foi o de maior destaque: “Esta Noite Feliz de Todos Nós”. Este era o título de um programa que fez muito sucesso na década de 70. Embalado pelo som da Jovem Guarda, que era grande sucesso na época, esse programa era obrigatório todos os sábados, quando Manaus ainda não tinha televisão. Foi um tempo em que, as rádios comandavam a programação. No comando, um disque jóquei de voz firme, porém agradável, que tratava as meninas da época por “guria” e prendia a atenção dos seus ouvintes. Seu nome: Edson Paiva, esse amigo de sempre.
Foram mais de três décadas atuando no rádio em Manaus. Edson Ribeiro Paiva, amazonense de Manaus, capricorniano e naturalmente torcedor do Clube de Regatas Flamengo. Sua primeira participação no rádio foi em 26 de março de 1956. Edson Paiva comentava sempre como fato inusitado.
Naquela época, a rádio Rio Mar que funcionava no antigo Iapetec estava contratando locutores comerciais. Duzentos candidatos fizeram a inscrição, dentre eles Edson Paiva e Deni Menezes, por ironia do destino Deni Menezes não fora classificado e mais tarde transferiu-se para o Rio de Janeiro, tornando-se repórter esportivo da Rede Globo.
Edson Paiva, Nonato Oliveira, Luiz Fabiano, Epami, com o cantor Roberto Carlos em sua primeira visita à Manaus, em 1968. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal
No dia seguinte, o grupo de amigos de Edson e Deni, que costumava se reunir na Praça Dom Pedro II, em frente a antiga sede da Prefeitura Municipal, parabenizava Edson Paiva, afinal ele havia sido escolhido por Wilma Pinheiro, considerada na época a mais bela voz feminina que o rádio amazonense já projetou.
Sob a direção de Alfredo Fernandes, a rádio Rio Mar era na época uma das maiores audiências do rádio em Manaus e, após alguns anos na emissora, Edson Paiva resolveu acompanhar com a amizade muito próxima de Deni Menezes, que se encontrava no Rio de Janeiro e trabalhava, na época, na área de esporte da rádio nacional.
Inicialmente, Deni Menezes tentou ingressar na Rádio JB, onde Alberto Cury comandava uma equipe de primeira linha que posteriormente cedeu aos argumentos de Deni Menezes, da equipe de esporte da Rádio Nacional.
A primeira participação de Edson Paiva como repórter de campo ocorreu no jogo Flamengo e Vitória da Bahia, com o Flamengo vencendo a Bahia por 4×1, em partida realizada em Teixeira de Castro. Além de integrar a equipe que, entre outros, contava com Jorge Cury e Oswaldo Moreira, Edson Paiva apresentava o musical Philips, no Rio de Janeiro, de grande audiência na época e tomava parte da resenha esportiva ‘Três no Mundo da Bola’.
Edson Paiva comentava com orgulho com os amigos que, em certa ocasião, faltou o terceiro apresentador e o programa foi ao ar com sua participação e de Deni Menezes, o que motivou uma declaração escrita por Deni no livro de Rádio Nacional (pela primeira vez dois amazonenses apresentam junto um programa no Rio de Janeiro).
Edson Paiva não esquecia sua cidade natal e resolve voltar a Manaus. A Jovem Guarda já começava a alcançar as paradas de sucesso, era comum na época os jovens usarem cabelos compridos, Roberto Carlos fazia sucesso com a música ‘Calhambeque’ e é nesse período que Edson chega a Manaus, naturalmente indo outra vez trabalhar na Rádio Rio Mar.
Walter Santos que era na época o representante da CBS, deixara a companhia, passando a Edson Paiva que resolveu montar um novo programa para alcançar principalmente um público jovem. Nascia assim, o programa semanal ‘Esta Noite Feliz de Todos Nós’, que era apresentado aos sábados, às 20h.
Da esquerda para a direita: João Silva, Epami, o cantor Carlos Alberto e Edson Paiva. Década de 1960. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal
Foi um programa de muito sucesso, as cartas e telefonemas eram constante mostrando que o novo programa tinha conquistado o público, cujo sucesso principal era os novos lançamentos da Jovem Guarda. Nas noites de sábado, Edson Paiva oferecia pelas ondas do rádio os cantores como Lenon e Lilian, Deny e Dino, Roberto Carlos, Wanderleia, Martinha, Os Vips, entre tantos, que marcaram época na Jovem Guarda.
Edson Paiva deixa a Rádio Rio Mar para trabalhar na Rádio Difusora, onde lançou o programa ‘Viva a Juventude’, que manteve novo sucesso, porém novamente sai da Difusora para a Rádio Baré, onde permaneceu até 1979.
Edson Paiva ficou um período afastado dos microfones até 1982, pois passou a representar a Empresa CBS em Manaus, como representante divulgador e, mais tarde, convidado que foi para Rádio Difusora FM, cuja passagem durou mais ou menos um ano. Foi chamado novamente para Rádio Rio Mar, onde assume a direção comercial da empresa. Na década de 80, apresentou o Jornal Baré da TV Baré (hoje TV À Crítica).
Entre as idas e vindas, ele declarava que não podia viver longe dos microfones. A prova disto é que estava de volta ao rádio, desta vez pelas ondas tropicais da Rádio Ajuricaba, onde de segunda a sábado apresentava o programa ‘Tempo de Amar’, que apesar da simplicidade tinha marca do bom gosto do apresentador. O programa destinava-se principalmente aos solitários, amantes da boa música romântica e procurava estabelecer um contato direto com seus ouvintes por telefone.
Na verdade não podemos ignorar a força do rádio, mas será possível que um “disc jockey” (DJ) evitaria que alguém cometesse um suicídio? Pois foi possível. Edson recordava que quando apresentava o programa ‘Esta Noite Feliz de Todos Nós’, costumava fazer a abertura com mensagens espirituais, com Emanuel ou André Luís, e um dia ele recebeu uma carta de uma ouvinte da região do Cambixe. Na carta, a ouvinte contava que, havia sido seduzida e só não chegara ao suicídio, porque ouvia as mensagens lidas no programa.
À esquerda: Edson Paiva, o cantor Carlos Alberto de João Silva, da Novidade Discos. À direita: Jogo do Nacional e Fluminense em 1957, repórter esportivo da Rádio Globo, Deni Menezes, ao lado do árbitro Odail Braga Martins. (Registro de Rui Heliandro Sá Valente). Fotos: Abrahim Baze/Acervo pessoal
Edson Paiva amou fazer rádio. Foram mais de três décadas. Homem que seguia as orientações espíritas e com humildade guardou consigo as orientações do amigo Jaime Rebelo, da Rádio Baré. Em termos nacionais, afirmava que Aroldo de Andrade era o símbolo da Rádio no Brasil.
Edson Paiva foi casado com Maria da Conceição Corrêa Paiva, em 28 de dezembro de 1965, fruto desse casamento nasceram dois filhos, Yara Cláudia Corrêa Paiva e Edson Ribeiro Paiva Júnior.
Edson Paiva nasceu em 3 de janeiro de 1938 e faleceu no dia 3 de novembro de 2013, escrevendo uma bela história do Rádio Amazonense.
Aeroporto de Ponta Pelada, 1968. Foto: Ediúcio de Castro Alves/Acervo pessoal
Como renasceu o amor …
“… Estava eu no aeroporto de Ponta Pelada, nos idos de 1962, para recepcionar uma tia que chegava do Rio de Janeiro, quando me deparo com a bela figura de um rapaz, também chegando do Rio.
Estávamos todos aguardando que passasse o temporal que se abatera na cidade quando, para minha surpresa (e alegria), o belo rapaz se aproxima de mim e se apresenta. Então, passamos a conversar assuntos triviais, apenas para justificar a aproximação.
Na época ainda não dispúnhamos da tecnologia de celulares e nem eu possuía telefone. Então, combinamos um encontro na boate de domingo no Atlético Rio Negro Clube, que funcionava no parque aquático, entre 20h e 23h.
No domingo seguinte, para minha tristeza o belo rapaz que se chamava Edson Paiva, não apareceu. Então pensei: “quem sou eu para chamar a atenção de um moço recém-chegado do Rio” … Enfim …
Mas … no domingo seguinte … estava no parque aquático quando vejo surgir Edson Paiva! Dançamos, conversamos, combinamos novo encontro.
Nesse novo encontro, eu que já estava caidinha pelo moço, ele me disse que tinha resolvido não voltar mais para o Rio de Janeiro, para se estabelecer em Manaus, onde morava sua família.
Mas … (novamente o mas …) não continuaríamos com nossos encontros, pois iria recomeçar do zero e não poderia assumir um compromisso comigo.
Então eu, audaciosamente, perguntei: “Eu não posso fazer parte desse recomeço?”
E foi assim que nosso Amor se reencontrou por 50 anos, nesta vida e, que seguirá pela eternidade, porque a Vida continua …
Eu sou Conceição Paiva e esta é a nossa história.
*Informações cedidas pela senhora Maria da Conceição Corrêa Paiva.
Sobre o autor
Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.
Além de essenciais para a manutenção da vida no planeta, as abelhas tem um complexo sistema de organização e diferentes formas de comunicação entre si e que variam de acordo com as espécies.
Para orientar outras abelhas campeiras sobre localização de alimentos, elas…dançam. “Já outras fazem movimentos com as asas e algumas fazem algum tipo de barulho”, explica a agrônoma Wilza Pinto, pesquisadora da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra).
Segundo a pesquisadora, essa são estratégias de comunicação importantes para a sobrevivência das espécies e das colônias. “Com esses movimentos, elas transmitem informações entre si sobre onde estão as fontes de alimento, incluindo a disponibilidade, a localização exata e o cheiro”, diz.
A coreografia e os movimentos conseguem transmitir com exatidão a localização. “Funciona como se fosse um gps”, diz Wilza Pinto.
Treme
A pesquisadora explica que as abelhas com ferrão Apis Mellifera fazem movimentos circulares para informar para o restante de suas companheiras de ninho a localização da fonte de alimento.
“Já as abelhas sem ferrão, ou nativas, podem se comunicar por meio de vibrações, assim como a Apis mellifera também faz. Elas literalmente fazem um treme treme. Quanto mais intensa a vibração, maior a qualidade do alimento”. E ainda há um terceiro grupo de abelhas sociais, conhecidas como mamangavas-de-chão, que produzem sons para transmitir informações.
Preservação
Essas pequenas dançarinas são essenciais para a vida no planeta. Estima-se que mais de 90% das plantas com flores dependem de polinizadores animais. Esses polinizadores estão distribuídos em 250 espécies, destes 87% são abelhas.
Wilza Pinto alerta que algumas espécies vegetais somente as abelhas polinizam. E que a relação entre abelhas e flores é de mutualismo, ou seja, ambas as espécies se beneficiam da interação.
“É importante preservar a vegetação primeiro para que as abelhas tenham condições de sobrevivência e vice-versa já que existe mutualismo na relação. Preservar o meio ambiente significa preservar todos os seres nele presente”.
Por Osíris M. Araújo da Silva – osirisasilva@gmail.com
Em editorial publicado no início de outubro, o Estado de S. Paulo fez pertinente análise da questão ambiental, salientando que, pressionado por governos, associações comerciais e produtores, a Comissão Europeia adiou em um ano a implementação de sua Lei Anti Desmatamento, que proíbe a comercialização de produtos de áreas desmatadas após 2020. É um alívio não só para o Brasil, mas para países diversos, dos EUA à China, além de nações latino-americanas, africanas e do Sudeste Asiático. O governo brasileiro tem um ano para trabalhar com produtores nacionais em busca de adaptação às regras, mas, sobretudo, para mobilizar sua diplomacia a se alinhar com outras partes interessadas ao redor do mundo e pressionar a Comissão Europeia: “o problema não é só, como ela alega, o prazo para a adequação às regras, mas os excessos dessas regras”.
A Lei europeia não distinguia entre desmatamento legal e ilegal, como previsto nas leis brasileiras. Na verdade, nosso Código Florestal é uma das legislações mais equilibradas e restritivas do mundo. Fazendeiros instalados na Amazônia são obrigados a manter a cobertura original de 80% de suas propriedades – nos outros biomas, esse porcentual é de 50%, sem serem remunerados pelos serviços ambientais prestados ao país. Segundo o IBGE, no Brasil, 66% do território é coberto por vegetação nativa, na Amazônia a cobertura é de 83%. Enquanto isso, na Europa, as reservas não ultrapassam, em média, 2% das áreas disponíveis, o que se pode constatar a olho nu. A agricultura brasileira ocupa apenas 10% do território, e, pelos critérios da ONU, tem baixo nível de emissões de CO2.
No que pertine ao bioma amazônico, particularmente, em novembro de 2023 os pesquisadores do Inpa, Charles Clement e Henrique Pereira, diretor do Instituto; Alfredo Oyama Kingo Homma, da Embrapa Amazônia Oriental, e Ima Vieira (Museu Goeldi) traçaram, em importante estudo, algumas considerações sobre o enigma bioeconomia e sua valorização econômica e social. O “paper” foi enviado ao Grupo de Trabalho da Sociobioeconomia, do MMA, e uma versão em inglês ao jornal holandês “Trees, Forests and People”, especializado em publicações (ciência e prática) relacionadas a recursos florestais. Conceitualmente, “parte do princípio de que a Amazônia está no centro das atenções mundiais em face dos altos índices de desmatamento e suas consequências ambientais”.
O documento enfatiza que “muitas propostas de desenvolvimento local baseadas nas cadeias de valor da bioeconomia florestal levam em conta a continuidade e a expansão do extrativismo de produtos da floresta, sem reconhecer as limitações deste sistema de produção nem seus impactos sobre o sistema capitalista observáveis quando a demanda do mercado consumidor aumenta”. Com efeito, “em um bioma com extensão continental como a floresta amazônica este é um desafio de grandes proporções”. Consideram que “a expansão de uma bioeconomia florestal associada à conservação do bioma requer atenção às pessoas do meio rural, tão importantes quanto a dimensão da biodiversidade, frequentemente esquecidas nas discussões”.
Os pesquisadores salientam a especial relevância de produtos alimentícios oriundos das florestas e defendem que políticas públicas e investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) “têm papel primordial no fortalecimento da bioeconomia no conjunto da sociobiodiversidade amazônica”. De sua efetiva implementação e avaliação de resultados derivam “a infraestrutura adequada para o desenvolvimento de novos produtos, garantia de preços mínimos, a valorização dos serviços ambientais prestados pelos povos tradicionais, a certificação de produtos, a busca de soluções técnicas e tecnológicas para aprimorar a produção com conservação e o melhoramento das plantas amazônicas potenciais, dentre outras iniciativas”. Em síntese, cabe à pesquisa apontar à instância política caminhos seguros para o desenvolvimento sustentável do bioma.
O fundamental a levar em conta no contexto da análise, entretanto, é reconhecer a extrema limitação da interação dos órgãos de ensino, pesquisa e extensão voltados a prover novos conhecimentos, produtos, processos e serviços para os setores industrial e agropecuário regional e brasileiro. É amplamente sabido que o trabalho de pesquisa realizado em profundidade, foco, comprometimento com as demandas da região e governança do sistema (de baixo nível) em articulação com entidades nacionais e estrangeiras líderes em cada setor são condições essenciais à otimização de investimentos públicos e em parcerias público-privadas tendo em vista a consecução desses objetivos.
Articulações, eficiência, produtividade são fatores que movem a ciência, baseada em informações e soluções que levam ao aumento da competitividade e sustentabilidade da economia. O que significa afirmar, por outro lado, a extrema necessidade de buscar parcerias públicas e privadas para pesquisa, criação, desenvolvimento, compartilhamento de infraestrutura visando manter um portfólio de ativos disponíveis para parcerias em diferentes estágios de maturidade tecnológica. Em síntese, são inúmeras as modalidades e as oportunidades para a inovação. Neste exato ponto é que se verifica o quanto o setor de pesquisa, desenvolvimento e inovação encontra-se distanciado, aqui e no Brasil, de nosso setor produtivo. Ao contrário do que ocorre na China, Japão, Coreia do Sul, União Europeia, Reino Unido e Estados Unidos.
Sobre o autor
Osíris M. Araújo da Silva é economista, escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA) e da Associação Comercial do Amazonas (ACA).
O professor Fernando A. F. Melo, do Centro de Ciências da Saúde e do Desporto, da Universidade Federal do Acre (Ufac), publicou, em inglês e coautoria, artigo na “Scientific Reports” (n.º 14), revista do grupo Nature, abordando a epidemiologia da lesão renal aguda (AKI) em pacientes críticos na Amazônia brasileira. Também assinam o artigo Emmanuel A. Burdmann e Dirce M. T. Zanetta, da Universidade de São Paulo (USP); Etienne Macedo e Ravindra Mehta, da Universidade da Califórnia.
O estudo envolveu 1.029 pacientes adultos internados em três unidades de terapia intensiva de Rio Branco, entre fevereiro de 2014 e fevereiro de 2016. O objetivo foi avaliar a incidência e os fatores de risco da AKI na região. Os resultados revelaram que 53,3% dos pacientes internados nas UTIs desenvolveram a condição, destacando-se a alta prevalência em uma área com desafios estruturais.
De acordo com Fernando A. F. Melo, os resultados da pesquisa são comparáveis aos de países de alta renda, mas com taxas de mortalidade mais elevadas, refletindo os desafios enfrentados no contexto amazônico. “A incidência da AKI foi alta entre pacientes críticos na Amazônia”, disse.
“A publicação desse estudo reforça a relevância de se investigar a saúde em regiões com menos recursos, mostrando que é possível realizar ciência de qualidade na nossa universidade”.
Melo relatou que a pesquisa foi sua tese do doutorado interinstitucional entre Ufac e USP e um “doctoral fellow” na Universidade da Califórnia, onde ficou quase um ano fazendo as análises estatísticas iniciais; antes ele passou dois anos coletando dados nas UTIs de Rio Branco. “Foi uma grande vitória publicar numas das maiores revistas científicas do mundo”, finalizou. “O trabalho teve a parceria dos maiores nefrologistas do mundo [que também assinam o artigo].”
O estudo recebeu apoio das Fundações de Amparo à Pesquisa dos Estados do Acre e de São Paulo, envolvendo mais de 20 alunos da Ufac, além de profissionais da saúde, estatísticos e matemáticos.
O documentário “Mestre Dikinho e Tambores do Pacoval – Carimbó de Encantaria” foi lançado no dia 19 de outubro na sede da Associação de Moradores do bairro do Pacoval (AMPAC), em Soure – na Ilha do Marajó. O evento ocorreu no barracão onde há 15 anos são realizadas rodas de carimbó que contaram com a presença assídua e determinante de Mestre Dikinho, artista paraense que formou gerações de tocadoras e tocadores da ilha, além de ser uma referência para todo o Pará.
Dikinho faleceu na madrugada do dia 17 de julho deste ano, aos 83 anos, causando grande comoção no cenário cultural regional, pela relevância de sua trajetória não somente no Carimbó, quanto em outras expressões da Cultura Popular paraense, como o Boi, o Carnaval e o Bolero.
O documentário apresenta uma natureza atemporal, lançando um olhar íntimo sobre a vida e obra do mestre, possibilitando a eternização do seu legado em imagem e som, e registra os costumes, a biodiversidade e a cultura da Amazônia, possibilitando um olhar do mundo para esse lugar; da vida de um Mestre e o repasse de seus saberes; muitos episódios inusitados em mais de 80 anos de história; o Carimbó; a vida no Marajó, tradição e modernidade; búfalos e motos; do Tambores do Pacoval e seu protagonismo na transformação da realidade de um bairro pela cultura e organização comunitária; mulheres no tambor e na liderança, gerações em convívio e permanente aprendizado.
“Finalizar esse trabalho audiovisual que iniciamos em julho de 2019 é um sonho antigo da comunidade que se encontrou com o sonho de produtores independentes e começou a se tornar realidade. Antes do conteúdo em si, é importantíssimo dizer que houve uma intensa vivência de cada pessoa que compôs o documentário com o Mestre, desde a equipe técnica, passando por cada entrevistado. Ter convivido e feito carimbó com ele, vivido de perto toda sua vasta produção no âmbito da Cultura Popular, foi de uma dimensão indescritível. Ele era gigante em sua delicadeza e poesia sensível à densidade humana, imaginária e natural da Ilha do Marajó. Fico extremamente feliz por estarmos entregando este documentário à memória coletiva de nossa região. Perco inclusive as palavras para conseguir descrever tudo que representa esse material, idealizado coletivamente, que consegui produzir e agora entregaremos ao mundo. Nele, nosso querido Mestre se manterá eternizado, podendo ser visto, ouvido e sentido por todas as gerações que vierem após ele e cada um de nós”, afirma Luciane Bessa, produtora executiva da obra.
Foto: Beatriz Maia
Mestre Dikinho foi compositor, violonista, cantor e artesão marajoara. Cresceu entre campos e rios trabalhando como vaqueiro e pescador, imerso na poesia e encantaria da região. Da sua vivência surgiram canções em vários ritmos: do carimbó ao samba, do bolero ao xote e ao boi, que foram tocadas magistralmente pelo mestre em diversos grupos, desde os anos 60.
Passou mais de década junto ao “Tambores do Pacoval”. Também fez parte do grupo “Os Mansos” nos últimos anos de sua vida, junto ao seu grande parceiro de estrada, Mestre César do Regatão, além de amigo fiel, Yuri Guimarães.
O documentário é uma coprodução da Associação de moradores do Pacoval e a produtora Cris Salgado Films com a Universidade Federal do Pará através do Programa Coroatá. O filme traz entrevistas com o Mestre, seus amigos e parceiros de carimbó, além de clipes e animações sobre a encantaria do Marajó e registro de momentos marcantes da cultura na ilha.
Por estar localizado na bacia da foz do rio Amazonas, o litoral amapaense não possui praias de águas cristalinas e nem grandes ondas. No entanto, para quem vive na Amazônia, aproveitar o período de calor em praias típicas da região é um refúgio. Conheça algumas opções imperdíveis no Amapá:
Praia do Goiabal
Localizada no município de Calçoene, a 22 km da capital do Amapá, a Praia do Goiabal tem pouco mais de 4 km de extensão. Com águas escuras, que clareia no período de julho a dezembro, a praia possui um difícil acesso por uma estrada de terra.
Por ser afastada, a praia não é muito movimentada, sendo ideal para quem deseja relaxar e aproveitar as belezas naturais ou até mesmo acampar.
É possível também visitar o Parque Arqueológico do Solstício, onde há um círculo de pedras, apelidado de “Stonehenge do Amapá” devido à semelhança com o ponto turístico da Inglaterra. De acordo com suposições, o monumento foi construído como antigo observatório dos povos originários da região.
Praia do Goiabal, em Calçoene. Foto: Reprodução/Governo no Amapá
Praia da Boca do Inferno
Com uma areia escura e cortada pelo Igarapé do Inferno, a praia fica localizada na estação ecológica da Ilha de Maracá, a 306 km de Macapá (AP) pela BR-156. Cercada por uma mata fechada, para acessá-la é necessário atravessar o igarapé.
A ilha é uma área de preservação e pesquisa, portanto na região é proibida a pesca e a caça de animais. A conservação da fauna e da flora se torna um dos pontos de apreciação na ilha, que possui espécies de aves do mangue, como o guará vermelho e as garças.
Praia da Boca do Inferno. Foto: Reprodução/Praias do Brasil
Praia da Fazendinha
Localizada no distrito de Fazendinha, no município de Macapá, a praia é de águas fluviais banhadas pelo rio Amazonas. Muito procurado pela proximidade, já que fica somente a 13 km da capital.
Com diversas atividades ao ar livre e restaurantes, a Praia da Fazendinha é um ponto turístico de mais fácil acesso para conhecer as belezas amazônicas, com a água do rio e ondas que alcançam a areia da praia.
Praia da Fazendinha. Foto: Jhon Martins/Governo do Amapá
E aí? Você conhece outras praias que poderiam estar nessa lista?
Solta-asa-do-norte (Hypocnemoides melanopogon) no período de cheia dos rios, alimentando-se de uma aranha próximo à linha da água. Foto: Anaís Prestes
As várzeas amazônicas são florestas extremamente dinâmicas, devido à sua forte sazonalidade que é dada pela água, e não pelo clima. Isso acontece devido ao aumento do volume de água nos rios, que transbordam e inundam grandes áreas de florestas ribeirinhas todos os anos, transformando ambientes terrestres em ambientes aquáticos por vários meses. A vegetação nesse ambiente precisa ser adaptada às inundações, e muitas espécies de plantas regulam seus ciclos de vida de acordo com o ciclo dos rios.
Mesmo com as grandes mudanças no ambiente, há muitos animais terrestres, sem habilidades para a vida aquática, que se aventuram em viver nestes locais por toda a sua vida.
Mas assim como o ambiente é sazonal, o comportamento e uso do ambiente por estes animais também precisam ser sazonais. Então, sabendo que o ambiente permanece alagado por meses e que grande parte da floresta fica submersa e indisponível para animais exclusivamente terrestres, como essas espécies se adaptam e vivem nas várzeas amazônicas?
Para os aracnídeos, como as aranhas e opiliões, já há algumas respostas, e é incrível como cada espécie pode utilizar diferentes estratégias para sobreviver. Existem aranhas que possuem seu ciclo de vida sincronizado com o ciclo anual da inundação. Quando está seco, as aranhas colonizam o solo da floresta, alimentam-se e reproduzem-se entre as folhas caídas.
Quando a água começa a subir, essas aranhas já estão no fim de sua vida, e são seus filhotes que permanecem na floresta, subindo nas árvores e ocupando o ambiente vertical disponível acima da linha da água. Nas árvores, os filhotes crescem e, quando a água começa a descer, eles recolonizam o solo assim como seus pais haviam feito.
Há também um pseudoescorpião (também chamado de “falso escorpião”) que utiliza uma estratégia diferente. Ele habita o solo e lá permanece quando a floresta é alagada, no entanto, este pseudoescorpião regula sua fisiologia do corpo para permanecer em um estado de dormência na cheia, e volta a despertar no período seco.
As adaptações não se limitam aos aracnídeos, elas também foram observadas nas aves, um dos grupos mais biodiversos e estudados do mundo. No entanto, até pouco tempo não se sabia sobre as adaptações das aves a estes ambientes efêmeros das florestas de várzea.
Embora seja fácil imaginar que as aves simplesmente poderiam deixar a região voando, na realidade, a complexidade é maior devido à grande diversidade de espécies de aves, o que implica em diversos comportamentos e hábitos de vida. Um caso que chama a atenção são as aves que se alimentam de insetos (insetívoras) e que vivem no sub-bosque da floresta, ou seja, em um estrato mais próximo ao chão da floresta. Para estas aves, espera-se que elas não consigam fazer grandes deslocamentos.
Fêmea de papa-formiga-de-sobrancelha (Myrmoborus leucophrys), uma das cinco espécies de aves insetívoras de sub-bosque estudadas na floresta de várzea. Foto: Anaís Prestes
Até então, o que se sabia é que espécies de aves insetívoras de sub-bosque são as mais sensíveis a mudanças do ambiente, principalmente as espécies que vivem em terra firme, um ambiente que não está sujeito a inundações. Essas espécies são as primeiras a desaparecerem da região quando há algum distúrbio no ambiente, muitas vezes evitando, inclusive, locais próximos à borda da floresta. Se essas espécies de aves são tão especializadas em viver apenas no sub-bosque da floresta, sendo sensíveis a bordas e mantendo-se longe do dossel, como se adaptam quando seu ambiente de preferência está inabitável?
Para entender isso, realizamos um estudo com cinco espécies de aves insetívoras de sub-bosque das áreas de florestas de várzea do baixo rio Purus.
Descobrimos que essas aves permanecem no ambiente mesmo no período da cheia, e a sua principal adaptação é a movimentação vertical na floresta, que ocorre do período da seca para cheia.
Ou seja, como a floresta é alta, há uma parte da vegetação que não fica submersa, então as espécies ocupam uma altura da floresta quando está cheio de água e outra altura quando está seco. Apesar dessa movimentação, cada espécie possui sua preferência em relação à altura em que habita na floresta, algumas mais altas e outras mais próximas da linha da água.
Mesmo com a movimentação vertical na vegetação, algumas aves procuram permanecer em locais com a vegetação do micro-habitat, o local específico dentro ambiente maior, muito parecido com as que habitavam na seca. E outras espécies podem se adaptar ainda mais, procurando habitar locais específicos com a vegetação mais densa e fechada na cheia, comparada com os ambientes mais abertos que preferem na seca.
Os resultados da pesquisa evidenciam que as aves de sub-bosque das várzeas são altamente adaptadas às grandes mudanças sazonais da floresta.
Quando a água sobe, o espaço vertical da floresta para as aves diminui. As aves se adaptam movendo-se verticalmente, procurando ocupar parte desse espaço disponível, algumas preferindo ficar próximas à linha da água, enquanto outras optam por áreas mais elevadas na vegetação. Juntamente com elas, muitos insetos do solo e dos troncos também se adaptam, movendo-se verticalmente.
Isso pode ser vantajoso para as aves, uma vez que muitos desses insetos são suas presas. No entanto, há várias espécies ocupando um espaço menor, mas com a movimentação vertical dos insetos essas aves podem ter mais facilidade em encontrar alimento, já que durante a seca há mais locais de abrigo para esses insetos no solo da floresta.
Floresta de várzea na cheia com cigarras nos troncos das árvores próximo a linha da água. Foto: Anaís Prestes
Ciência se faz com parceria
O estudo apresentado neste texto é resultado da pesquisa realizada por Anaís Rebeca Prestes Rowedder durante seu curso de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ecologia, no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). A orientação foi realizada pelo professor Mario Cohn-Haft e co-orientação de Thiago Orsi Laranjeiras, também com a parceria do doutor Torbjørn Haugaasen e colega em campo Benjamin Gilmore. Esta pesquisa contou com o apoio financeiro do governo federal por meio da bolsa de mestrado do CNPq e da Faculdade de Ciências Ambientais e Gestão de Recursos Naturais (MINA) da Universidade Norueguesa de Ciências da Vida (NMBU).
Para saber mais:
Adis, J. 1997. Estratégias de sobrevivência de invertebrados terrestres em florestas inundáveis da Amazônia central: Uma resposta à inundação de longo período. Acta Amazonica, 27(1): 43–54. (acesse aqui)
Rowedder, A. R. P., Laranjeiras, T. O., Haugaasen, T., Gilmore, B., Cohn-Haft, M. 2021. Response of understory avifauna to annual flooding of Amazonian floodplain forests. Forests, 12(8), 1004. (acesse aqui)
*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Conexões Amazônicas, escrito por Anaís Prestes Rowedder
Cerâmicas milenares são encontradas em sítio arqueológico no Amazonas. Foto: Jean Beltrão/Rede Amazônica AM
A seca que afeta o Amazonas revelou cerâmicas milenares em um sítio arqueológico localizado no município de Urucará, no interior do Estado. As peças surgiram devido ao baixo nível da água, junto às rochas que exibem desenhos rupestres, descobertos ainda no ano passado durante outra estiagem histórica.
A baixa dos rios deste ano também revelou outros “tesouros” escondidos, como os destroços de um navio do século XIX, naufragado no Rio Madeira, e as ruínas do Forte São Francisco Xavier, submerso pelas águas do Rio Solimões, em Tabatinga.
Em 2024, o Amazonas enfrenta uma crise ambiental severa, com uma seca antecipada que já afeta mais de 800 mil pessoas, segundo a Defesa Civil.
Entre os artefatos encontrados, em Urucará, há um vaso de cerâmica bem preservado. A descoberta foi feita por um ribeirinho local, que pescava no Pedral do São José quando encontrou os vestígios históricos.
“Meu sobrinho que viu essa peça. Para gente é uma alegria, um privilégio ter encontrado algo tão grandioso no nosso município. Eu estou feliz, jamais tinha visto algo igual na vida, e ainda encontrar assim preservado é algo maravilhoso”, disse o pescador Edson Batista.
A cerâmica foi descoberta próximo a outro sítio arqueológico, onde gravuras rupestres vieram à tona, em 2023, e reapareceram este ano. De acordo com arqueólogos da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), os desenhos, que lembram “caretas”, têm mais de mil anos e estavam escondidos pelas águas.
Desde então, a preocupação com a preservação dos sítios arqueológicos têm crescido, especialmente com o aumento do interesse de moradores que visitam o local para ver de perto as marcas históricas.
O professor Arenilton Serrão, pesquisador da Secretaria de Educação e Cultura de Urucará, destacou a urgência de proteger a área.
“É uma preocupação muito grande da comunidade com esses locais de valor inestimável para o município. Nosso objetivo é manter esses locais, que se configuram como sítios arqueológicos, seguros e livres de depredações que possam danificar esse patrimônio, que não é só nosso, mas de toda a Amazônia”, declarou.
Segundo a prefeitura de Urucará, o município acionou o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), desde o ano passado, e aguarda a chegada de especialistas para realizar análises e estudos mais detalhados sobre as recentes descobertas.
A seca severa que afeta o Amazonas revelou cerâmicas milenares em um sítio arqueológico localizado em Urucará. Foto: ReproduçãoCerâmica foi descoberta próximo a outro sítio arqueológico, onde gravuras rupestres vieram à tona, em 2023, e reapareceram este ano. Foto: Reprodução