Portal Amazônia responde: Cobra e serpente são diferentes?

Um animal muito temido na Amazônia é a cobra. Outro muito temido na Ásia é a serpente. Mas qual a diferença?

Um animal muito temido na Amazônia é a cobra. Outro muito temido na Ásia é a serpente. Mas qual a diferença? A resposta é bem simples: nenhuma. É o mesmo animal, mas o que muda é a nomenclatura popular de região para região. O Portal Amazônia conversou com alguns especialistas para entender porquê essa confusão acontece.

O diretor do Museu Biológico do Instituto Butantan em São Paulo, Giuseppe Puorto, explica: “Existem vários nomes para se referir aos animais da Classe Reptilia [répteis], Ordem Squamata [répteis escamados], Subordem Serpentes [ou ofídios]. Estes animais podem ser chamados, dependendo da região no Brasil e fora, de serpentes, ofídios, cobras, mbóis, culebras, víboras”.

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Por tanto, os diversos nomes populares referem-se às espécies do mesmo grupo animal. “‘Cobra’ vem do vernáculo latino ‘Colubra’, ‘Serpente’ vem do latino ‘serpente’, ‘Mbói’ vem do tupi que significa ‘cobra'”, exemplifica.

Jararaca da Amazônia (Bothrops atrox). Foto: Gabriel Masseli/Cedida

Então por que tanta confusão?

Por conta dos nomes populares no Brasil – e mundo – afora. Assim explica a doutora em Biodiversidade e Conservação na Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e especialista em serpentes, Luciana Frazão: “São todos nomes comuns no Brasil e são sinônimos. Acaba surgindo essa confusão porque os nomes populares, como o próprio nome diz, é a forma como as pessoas popularizam o nome”.

De acordo com Luciana, a confusão pode ser em função da forma como os animais são nomeados em países como os Estados Unidos. “A confusão é pela tradução dos nomes do inglês. Essa diferenciação de nomes existe pois há nomes diferentes em inglês que se referem a grupos distintos de serpentes. As cobras “snakes“, quando referidas no inglês, são algumas cobras peçonhentas da família Elapidae, a mesma das corais verdadeiras, e servem para identificar espécies como a naja, por exemplo. Já víbora, vem do inglês Viper, traduzido para víbora, e é utilizado para espécies da família de serpentes Viperidae“, exemplifica a bióloga. 

Cobra verde, também conhecida como cobra cipó (Philodryas viridissima). Foto: Gabriel Masseli/Cedida

No Brasil esses termos acabam não fazendo sentido. “Por isso usamos cobra ou serpente para identificar qualquer uma, independente se é peçonhenta ou não, sendo que o mais popular é cobra mesmo”, completa Luciana.

O pesquisador doutorando no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI) e herpetólogo, Gabriel S. Masseli, confirma, mas também lembra de um detalhe importante: “Em geral é tudo a mesma coisa, taxonomicamente falando. Serpente é a nomenclatura utilizada de forma científica para esse grupo dentro de um grupo maior, chamado Squamata, onde estão também os lagartos”.

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Se cobra e serpente são nomes diferentes para o mesmo animal, e quanto ao termo “víbora”? Segundo o herpetólogo, as víboras são um grupo de serpentes, da família Viperidae, que no Brasil possui alguns gêneros. “A família Viperidae é composta por serpentes peçonhentas, sim (jararacas, cascavéis e surucucus). E também tem a família Elapidae, composta por corais verdadeiras. Mas, no fim, são todas serpentes”, explica.

A jararaca conhecida popularmente como papagaia, ou jararaca-verde, é peçonhenta e ocorre na Amazônia. As espécies de jararacas (família Viperidae) poderiam ser consideradas como “víboras” se essa denominação fosse comum no Brasil. Foto: Alexandre Almeida/Cedida

A importância da taxonomia

Taxonomia é a classificação básica dos seres vivos dividida em reino, filo, classe, ordem, família, gênero e espécie. Assim, a nomenclatura taxonômica serve para ajudar os pesquisadores, mas também a população:

“A taxonomia é a ciência que identifica e classifica os grupos dos organismos e que é conhecida mundialmente, assim qualquer pessoa vai saber qual espécie é aquela. Muitas vezes acham estranho a gente chamar pelo nome científico, em latim. A ciência determina que todo nome científico seja em latim justamente para que seja reconhecido em qualquer lugar do mundo. Então, se eu falar com pessoas em outros países o nome científico eles vão entender qual é o indivíduo, de qual espécie. E essa nomenclatura é composta basicamente por duas palavras, o gênero primeiro e o epíteto [descritor] específico em seguida”, justifica Masseli.

Existem diferenças que à olho nu as pessoas não conseguem distinguir e, por conta disso, segundo o biólogo, identificar somente pelo nome popular pode prejudicar, principalmente, os animais: 

“O nome popular acaba levando muito à matança desses bichos, pela confusão mesmo. Por isso é tão importante a nomenclatura taxonômica. A falta de identificação correta da espécie acaba atrapalhando também no atendimento a casos de acidentes ofídicos quando tem a inoculação de veneno por meio da picada. Na hora de identificar se é peçonhenta ou não, o nome popular pode acabar atrapalhando e tornar as providências médicas errôneas no momento da escolha de qual soro antiofídico aplicar e qual tratamento ser realizado”.

alerta Gabriel Masseli.

A coral verdadeira (Micrurus averyi) possui veneno. Foto: Gabriel Masseli/Cedida

Conscientização

Muito mais do que entender que “cobra” e “serpente” designa o mesmo animal, é preciso conscientizar a população sobre a forma como tratá-los. “Uma coisa que sempre acontece quando estou no interior aqui no Amazonas é que às vezes chega morador falando que tem, por exemplo, uma surucucu em casa. Mas quando chego é uma jararaca. Essa pessoa dá o nome diferente, certa que sabe qual animal é e acaba tendo mais essa confusão”, conta Gabriel Masseli.

Conforme ocorre o desmatamento e a população humana expande para a floresta, é comum encontrar as serpentes, mas em hipótese alguma matar esses bichos é a solução. É necessário que as pessoas aprendam mais sobre as diferenças entre esses animais.

“É preciso lembrar que todas as serpentes tem importância no ecossistema. Elas fazem controle biológico de espécies como roedores e é crime ambiental matar, apanhar, ferir ou perseguir esses animais”, 

pontua o pesquisador.

A jiboia (Boa constrictor) é uma espécie não peçonhenta e de comum ocorrência na Amazônia. Foto: Luciana Frazão/Cedida

Esses animais são protegidos pelas leis 9.605/98 (lei federal de crimes ambientais) e 5.197/67 (Lei federal de proteção a fauna). “É preciso respeitar e caso encontre esses bichos, entrar em contato com a Secretaria de Meio Ambiente ou a polícia ambiental que eles resgatam e dão o destino correto para o animal”, recomenda.

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Para quem mora em cidades no interior e não possuem resgate especializado, Gabriel Masseli aconselha que caso o animal não esteja na área que a pessoa mora, passe distante pelo menos dois metros, evitando contato. “No caso de encontrar em casa, aconselho ter um galho ou uma forquilha para ir espantando a cobra, empurrando em direção ao mato. Também é bom evitar entulhos, lixo nas casas, porque isso atrai roedores que fazem parte da dieta de várias espécies”, destaca o herpetólogo.

Confira a lista de contatos no Amazonas:

  • Polícia Ambiental AM: (92) 98842-1553
  • Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM): (92) 98441-3691
  • Delegacia Especializada em Crimes Contra o Meio Ambiente e Urbanismo (DEMA): (92) 99962-2340
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