Esta é a primeira vez que pesquisadores constataram gravidez em peixe-boi da Amazônia (Trichechus inunguis) reintroduzida à natureza
Para a líder do LMA do Inpa, a pesquisadora Vera da Silva, a confirmação da gravidez da fêmea Baré, que foi resgatada, reabilitada e reintroduzida na natureza, é uma prova viva de que os procedimentos adotados pela equipe estão corretos e dando certo. “Esta gravidez mostra que o animal está bem, adaptado e integrado nessa população de peixes-bois. Isso para nós é uma grande satisfação, e é mais uma etapa na garantia da conservação dos peixes-bois da Amazônia”, destacou.
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De acordo com o coordenador do Programa de Reintrodução de Peixes-bois da Amazônia, o biólogo Diogo Souza, o filhote deve nascer até junho, período de enchente do rio Purus. A reprodução da espécie está associada ao ciclo hidrológico da Amazônia. O pico de nascimento ocorre depois que as águas sobem, quando há maior abundância de alimentos. Na natureza, o animal herbívoro se alimenta de plantas aquáticas, como capim membeca, mureru e capim-navalha. Em cativeiro, verduras complementam a dieta dos animais.
A detecção da gravidez aconteceu após captura de Baré, ocorrida em novembro, durante a vazante do rio Purus. A ação de monitoramento aconteceu 200 dias após a soltura de 12 animais reabilitados e levados de volta à natureza, considerada a maior reintrodução de peixes-bois da Amazônia da história do país. A equipe fez a biometria e verificou que desde a soltura, a fêmea Baré cresceu 11 centímetros e ganhou aproximadamente 130 quilos. A gravidez foi confirmada com análise das amostras de sangue.
“Conseguimos verificar a eficácia das etapas de resgate, reabilitação e soltura. Claramente o animal está adaptado à natureza, e futuramente contribuirá para o aumento da população da espécie. Nossa equipe e os moradores das comunidades da Reserva ficaram bem felizes com a gravidez da Baré. Isso dá ânimo para continuar com este trabalho, que é árduo e complexo, mas que atende a uma causa tão nobre”, comemora Souza.
Além da reprodução das fêmeas, existem outros indicadores de sucesso na soltura dos peixes-bois da Amazônia, como a sobrevivência e adaptação dos animais ao pulso de inundação dos rios (subida e descida das águas), interação com peixes-bois selvagens e ausência de contato com humanos.
Souza lembra que o apoio dos comunitários é fundamental. “São eles que realizam o monitoramento por telemetria VHF dos peixes-bois, e conseguem coletar dados inéditos que ajudarão a propor políticas públicas para a conservação da espécie em longo prazo”, diz o biólogo, lembrando que são ex-caçadores de peixes-bois que realizam o monitoramento dos animais.
Nova soltura
A Ampa lançou na última quinta-feira (27) uma campanha virtual de financiamento coletivo (crowdfunding/vakinha online) para arrecadar recursos para custear parte do monitoramento dos peixes-bois da Amazônia que serão reintroduzidos neste ano. A meta é arrecadar R$ 35 mil.
Os interessados podem colaborar até 19 de abril, por meio da plataforma do Kickante https://www.kickante.com.br/campanhas/devolvendo-peixes-bois-da-amazonia-natureza. Os apoiadores podem ganhar recompensas.
Há mais de 40 anos, o Inpa atua com pesquisas e ações de conservação para o peixe-boi. Em 2008, o Inpa implantou o Programa de Reintrodução de Peixe-bois da Amazônia, que em abril fará mais uma soltura na Reserva Piagaçu-Purus, desta vez com dez animais.
O peixe-boi da Amazônia vive em média 60 anos e só atinge a maturidade sexual, ou seja, só está pronto para se reproduzir com aproximadamente seis anos de idade. A gestação da fêmea de peixe-boi da Amazônia dura aproximadamente 12 meses. Nasce um filhote por vez, com raros casos de gêmeos. O cuidado da mãe perdura por aproximadamente dois anos, com o filhote sendo amamentado neste período. Segundo o biólogo, é de suma importância manter esses animais no ecossistema, principalmente as fêmeas. Sem elas, a recuperação da população dessa espécie fica comprometida.
A caça ilegal e captura acidental em redes de pesca são as principais ameaças ao peixe-boi da Amazônia, além de sofrer com a destruição e degradação ambiental. A caça do animal é proibida desde 1967, porém sua carne ainda é apreciada na região, o que exige um intenso trabalho de sensibilização ambiental e de fiscalização.