Foto: Oswaldo Forte
Rica e diversa, a culinária paraense é um farto exemplo do paladar amazônico. Conhecidos pelos seus aromas, seus pratos típicos incluem ervas e carnes, trazendo no sabor um quê inconfundível. Entre os sabores mais famosos da região, está o do açaí, típico acompanhamento das refeições nas mesas locais. De norte a sul do Brasil, a sua forma de consumo varia, mas do que ninguém discorda é do seu potencial. Pensando nisso, Benedito Brito de Almeida, graduado em Licenciatura Plena em Educação do Campo (Ênfase em Ciências Naturais) pela UFPA/Campus Abaetetuba, pesquisou quais têm sido as consequências advindas do aumento da produção do fruto.
Nascido e criado nas ilhas do município de Igarapé-Miri, Benedito trabalhou na produção do açaí até entrar na faculdade e viu seu município se desenvolver graças a esse fruto. A cidade está situada a 78 quilômetros de Belém, na mesorregião do nordeste paraense, conhecida como Baixo Tocantins. O município é reconhecido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) como a capital mundial do açaí, por ser um grande produtor e exportador do fruto. Dados do IBGE apontam que, somente em 2020, o fruto movimentou a economia local mais de R$1,57 bilhão, com mais de 420 mil toneladas produzidas.
A dissertação intitulada ‘O aumento da produção do açaí e as alterações socioambientais na várzea de Igarapé-Miri/PA’ teve como objetivo analisar as transformações na área de várzea, ocasionadas pela produção do açaí, por meio do olhar de sujeitos sociais que contribuem com a realidade atual da comunidade miriense. “Os debates realizados em sala de aula despertaram a minha curiosidade pelo processo de consolidação dessa produção, que tem importância inestimável para os ribeirinhos. Também quis entender seus impactos em três esferas: social, ambiental e econômico”, revela o pesquisador.
Fruto, palmito, biofertilizantes e artesanato
O açaí possui elevada qualidade nutricional e sua polpa pode ser utilizada de inúmeras maneiras; todavia outros componentes de sua palmeira também possuem importante valor comercial na cadeia de produção, nos níveis nacional e internacional. “Nos últimos anos, temos visto a exportação do palmito, que possui valor nutricional elevado, e também do caroço de açaí, considerado resíduo do fruto, para a produção de fibras, biomassas e biofertilizantes. Localmente, sua raiz é usada na Medicina tradicional; seu caule, como suporte para construção de pontes e casas; as folhas e as vassouras, como adubo orgânico; e seus caroços, como artesanato”, detalha.
Esse quadro contribui para que o açaí seja cada vez mais procurado e tenha suas áreas de plantação expandidas. Assim, buscando obter dados de forma segura sobre a produção do fruto, Benedito Brito de Almeida baseou a metodologia de seu trabalho em quatro abordagens: observações, entrevistas, aplicações de formulários e reuniões com grupos focais.
“A primeira entrevista aconteceu com um dos sócios fundadores da Associação dos Minis e Pequenos Produtores Rurais de Igarapé-Miri, o qual forneceu riquíssimas informações e documentos que direcionaram a pesquisa. Posteriormente, fizemos a aplicação de formulários com produtores, ao longo da várzea do município, e, por fim, reunimos com um grupo composto por agricultores de várias regiões para elaborar os mapas cognitivos, com suas percepções sobre a produção do açaí”, enfatiza o professor.
Com a pesquisa, Benedito de Almeida constatou que um dos principais danos socioambientais resultantes da elevada produção de açaí é a invasão de áreas de preservação permanente, o que culmina na retirada de matas ciliares e na redução de espécies de vegetais e animais (pescados e caças) que, segundo o autor, já foram a base da alimentação das comunidades rurais. Por outro lado, o aumento de renda da população é o fator positivo ocasionado pelo processo, visto que a produção gerou autonomia, melhorias de residências e acesso à educação, promovendo, então, maior conforto à comunidade local.
Economia e meio ambiente seguem rumos diferentes
O professor afirma que, na região pesquisada, economia e meio ambiente seguem rumos diferentes.
“Os resultados apontaram que as transformações observadas influenciam umas às outras, ou seja, com o crescimento econômico, surgem as transformações sociais e ambientais. O açaí se tornou uma alternativa produtiva extremamente importante para a região, tanto pelo aspecto social quanto pelo econômico. Quando comparamos as transformações econômicas com as ambientais, percebemos que elas caminharam em direções opostas: é evidente a importância do açaí para a economia local, mas as consequências deixadas na natureza são consideradas bastante negativas”, completa Benedito de Almeida.
Como alternativa para a redução dos danos ambientais, o professor ressalta que o estado pode incentivar a geração de renda com outras culturas além do açaí, auxiliando os produtores na entressafra do fruto. “O açaí é o carro-chefe da produção, mas é preciso investir em outras culturas, ou seja, trabalhar com o consórcio de espécies, agredindo menos o meio ambiente e produzindo o ano todo, pois a safra do açaí se concentra entre agosto e dezembro. Porém, para isso acontecer, precisa de investimento do poder público, principalmente em assessoramento, certificação e abertura de mercados”, enfatiza.
Filho de mãe professora e pai agricultor, Benedito Brito de Almeida segue os caminhos já percorridos pelos pais. O professor, que já foi produtor rural e, agora, é doutorando em Educação, conclui esta matéria reconhecendo o enorme potencial do açaí. “Antes, os produtores eram obrigados a procurar mercado para expandir sua produção, mas, depois que o mundo conheceu o sabor e os valores nutricionais do açaí, é o mercado que vem à sua procura”, finaliza.
Sobre a pesquisa
A dissertação O aumento da produção do açaí e as alterações socioambientais na várzea de Igarapé-Miri/PA foi defendida por Benedito Brito de Almeida em 2020, no Programa de Pós-Graduação em Cidades, Territórios e Identidades (PPGCITI), Campus Abaetetuba, com orientação dos professores Yvens Ely Martins Cordeiro e Norma Ely Santos Beltrão.
*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Jornal Beira do Rio, edição 172, da UFPA, escrito por André Furtado