Instituto Peabiru avança no plano de criar um cinturão verde com colmeias no entorno de Belém para evitar desmatamento, capturar carbono, reduzir impactos do aquecimento global na cidade e aumentar a renda de comunidades amazônicas.
Com 30 caixinhas de colmeias no quintal, o produtor Ocivaldo Moreira aguarda o início da colheita de mel, na comunidade Boa Vista, no município de Acará, Região Metropolitana de Belém, no Pará, orgulhoso não só pelo dinheiro extra que complementará o orçamento da família, mas pela contribuição de manter a floresta em pé.
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Em meio a 4 mil pés de açaí e árvores polinizadas pelas abelhas nativas sem ferrão, o agricultor integra uma iniciativa que planeja constituir um cinturão verde de meliponicultura no território e entorno da capital paraense para auxiliar a mitigação da mudança climática e a adaptação aos impactos dessas alterações que já atingem a qualidade de vida na cidade – segunda maior da Amazônia.
“A região sofre com o clima mais seco, resultado do desmatamento, e fazer pequenos oásis pode ajudar no microclima da metrópole e no pensamento das pessoas ao redor, dando mais condições de amenizar os atuais e futuros impactos”, afirma João Meirelles, diretor-geral do Instituto Peabiru, instituição que completa 25 anos de ações socioambientais na Amazônia. O desafio de unir conservação da biodiversidade, mitigação climática e redução de desigualdades mobiliza as atenções em torno das abelhas.
Além da renda com o mel, que valoriza a floresta bem conservada, as abelhas prestam o serviço de polinizar árvores nativas, muitas delas frutíferas, contribuindo na reprodução vegetal, com captura de carbono da atmosfera e formação de uma barreira natural para proteção da metrópole. Segundo Hermógenes Sá, diretor-executivo do Instituto Peabiru, o objetivo inicial é abranger 200 famílias, nos próximos cinco anos, em áreas rurais de Belém, ilhas e municípios vizinhos de Ananindeua, Barcarena e Acará. “A condição para expandir é ter sempre floresta para a abelha ‘pastar'”, aponta o diretor.
Atualmente 40 famílias em nove comunidades já receberam 1,2 mil caixas de colmeias e assistência técnica para a reprodução e manejo do plantel. “As abelhas sempre estiveram nas áreas, mas faltava tecnologia para valorizar o recurso da floresta no contexto da bioeconomia”, afirma Sá, ao destacar o longo processo de aprendizados com a atividade nos últimos anos. “Trata-se de uma renda garantida para um trabalho que exige dedicação de poucas horas por mês, complementar a atividades como a roça de mandioca, a produção de farinha e a coleta de açaí”, completa.
Vitrine para adaptação à mudança climática
Iniciado em 2007 com apoio da Fundação Avina e banco holandês Abn Amro Bank, o programa de meliponicultura do Instituto Peabiru se expandiu por meio do financiamento do Fundo Amazônia entre 2014 e 2018, abrangendo 22 comunidades em cinco municípios do Pará e Amapá, no total de 5 mil caixinhas de colmeias. Com o desafio do beneficiamento, o trabalho resultou na produção do primeiro mel com selo SIF (Serviço de Inspeção Federal) de área com manejo ambiental autorizado – e criou capacidade produtiva para as comunidades caminharem por conta própria nesta alternativa de renda.
Desde 2020, o atual projeto do Instituto Peabiru no tema, o Amigo das Abelhas da Amazônia, é apoiado pelo Instituto Clima e Sociedade (ICs), com foco na região de Belém e entorno, para além da produção do mel. A iniciativa socioambiental, também financiada pela Embaixada da Eslovênia neste ano, enfatiza o serviço ambiental prestado na polinização da floresta pelas abelhas. A ideia é impulsionar as ações no contexto da COP-30, a conferência climática global que deverá ser realizada em Belém, em 2025, trazendo grande visibilidade para a região, com expectativa de aumentar a escala da bioeconomia.
Em todo o mundo, cresce o movimento de grandes cidades na adoção de planos climáticos, baseados principalmente na redução de emissões de carbono pelo transporte e consumo de energia, aumento de áreas verdes e sistemas de monitoramento e alertas contra enchentes e até contenção costeira contra a elevação do nível do mar. Em Belém, com a contribuição do Instituto Peabiru, ganham destaque as Soluções Baseadas na Natureza (SbN), entre as quais a conservação e ampliação de florestas, capazes de representar cerca de 37% da mitigação climática necessária para o planeta não ultrapassar o limite de 1,5 grau de aquecimento até 2050, segundo a ONU.
Dados do MapBiomas indicam que a capital paraense tem 28,6% do território coberto por florestas, mas a área não vegetada dobrou de tamanho em 2022 em relação a 1985. O município de Acará (PA), onde há comunidades com criação de abelhas sem ferrão, perdeu 28% de área florestal em quatro décadas.
Produtores descobrem o potencial das abelhas
Junto ao aspecto ambiental, a atividade envolve principalmente mulheres, estimulando o empoderamento e o debate sobre as questões de gênero, além de evitar o êxodo para as cidades com impactos sociais. “A abelha faz o que o ser humano deveria fazer mais”, diz a produtora Márcia Ramos, que trabalhava como doméstica em Belém e voltou para as origens na comunidade Boa Vista. Na esperança de dias melhores, a meliponicultura se soma à criação de galinha e pés de patchouli e priprioca para indústrias produzirem cosméticos. “Entrei no projeto das abelhas como forma de curar a mente após perder um filho para a depressão, e acabei descobrindo um novo mundo; em lugar de muitas carências, qualquer oportunidade temos que agarrar”, revela Ramos.
“O resultado já se reflete na qualidade ambiental da floresta que melhora a produção dos açaizais”,
revela Abimael Teles e Teles, morador local e técnico do Instituto Peabiru responsável pela assistência aos produtores, acompanhando a alimentação e o crescimento das colmeias.
Sobre o Instituto Peabiru
O Instituto Peabiru é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) brasileira, fundada em 1998, que tem por missão facilitar processos de fortalecimento da organização social e da valorização da sociobiodiversidade. Com sede em Belém, atua nacionalmente, especialmente no bioma Amazônia, com ênfase no Marajó, Nordeste Paraense e na Região Metropolitana de Belém (PA). É uma das organizações realizadoras do projeto Mangues da Amazônia.