Meliponicultura: Entenda o universo das abelhas sem ferrão na Amazônia

Existem aproximadamente 120 espécies de abelhas sem ferrão na Amazônia. Isso se deve, em partes, devido à enorme diversidade da região.

Uruçú, tiúba, jupará, rajada, canudo, jandaíra e dezenas de outras espécies fazem parte do grupo de abelhas conhecido como abelhas sem ferrão. Contudo, diferente do que o nome indica, essas abelhas possuem ferrão, porém, é atrofiado e por isso, são incapazes de ferroar.

De extrema importância para a manutenção da biodiversidade da Amazônia, as abelhas são responsáveis, por exemplo, por cerca de 90% da polinização de flores na região. Ao passar de flor em flor, as abelhas transportam o pólen e proporcionam a fecundação de espécies da flora.

Nesse contexto, no dia 20 de maio é comemorado o Dia Mundial das Abelhas. O Portal Amazônia conversou com uma especialista e um criador de abelhas e aborda a importância deste inseto para o ecossistema amazônico e na produção de alimentos, além das particularidades das abelhas sem ferrão. Confira:

Foto: Reprodução/G1 Amazonas

Abelhas sem ferrão 

Existem aproximadamente 120 espécies de abelhas sem ferrão na Amazônia. Isso se deve, em partes, devido à enorme diversidade da região. As abelhas dependem da floresta para construírem suas colmeias, se alimentar do néctar e pólen e também realizar a coleta de materiais como resina e barro.

A pesquisadora titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) onde coordenadora do Grupo de Pesquisas em Abelhas (GPA), Gislene Zilse, acredita que isso é o resultado de um processo coevolutivo

“As plantas se desenvolveram precisando das abelhas para sua polinização e as abelhas se desenvolveram precisando das plantas para nidificar”

comenta.

Gislene explica que as espécies mais criadas no Amazonas são as do gênero Melipona, Melipona seminigra e a Melipona interrupta, popularmente conhecida como jupará. A principal característica dessas espécies consiste no fato de serem maiores, sendo visivelmente fáceis de ser encontradas. Elas também são boas produtoras de mel e pólen, além de se reproduzirem com facilidade. 

Melipona seminigra e a Melipona interrupta estão entre as espécies mais criadas. Foto: Embrapa/Divulgação

Serviços ecossistêmicos 

As abelhas são indispensáveis na manutenção do ecossistema. Em resumo, elas ‘prestam’ serviços à natureza. O primeiro serviço a ser citado é que elas produzem alimentos: o mel e o pólen que elas produzem, são disponíveis para o ser humano. A pesquisadora acrescenta:

“Além disso, elas prestam o serviço de polinização. É a base da reprodução das plantas. Todas as plantas da Floresta Amazônica, por exemplo, e mesmo as cultivadas aqui em cultivos agrícolas que dependem de polinização para sua reprodução, as abelhas sem ferrão fazem esse serviço. Há estimativas que aqui para a Amazônia, até 90% de espécies nativas de plantas dependem da polinização por abelhas sem ferrão para que elas consigam se reproduzir”

relata a coordenadora do Grupo de Pesquisas em Abelhas.

Outro serviço consiste na dispersão de sementes: as abelhas coletam algumas sementes e utilizam para construção da colmeia, dentre outras coisas e posteriormente liberam essas sementes na natureza, fazendo com que ocorra a germinação e desenvolvimento de uma nova planta. 

Meliponicultura 

Para esses serviços, existem lugares específicos para criação de abelhas sem ferrão: são os meliponários. Gislene os classifica em três tipos: os produtores que produzem em larga escala, através da construção de uma associação ou cooperativa com um entreposto de mel para o processamento de derivados.

Os produtores intermediários, que conseguem comercializar sua produção em feiras regionais. E por fim, os produtores em pequena escala, para consumo próprio ou para o núcleo familiar.

A pesquisadora informa que o Amazonas já possui dois selos Arte, que é o certificado de identidade e qualidade para comercialização nacional de produtos artesanais. Além disso, ela conta que o município de Iranduba já conta com o selo de inspeção federal, ou seja, há a possibilidade de vender para fora do país.

Dentre os produtores em pequena escala está o engenheiro elétrico Clebio Camilo. Ele conta que sempre se interessou por abelhas, mas pelo trabalho, nunca conseguiu tempo para conciliar a atividade de meliponicultura. 

Ao se aposentar, em 2021, começou a considerar a ideia de criar abelhas como um hobbie. 

“Assisti a vários vídeos feitos por criadores, fiz um curso on line pela USP e também um curso presencial na Associação de Criadores do Amazonas. Conhecimento é essencial para esta atividade. Um manejo errado, e pronto: você pode matar toda a colônia.”

relatou Clebio.

Quando percebeu que já tinha o conhecimento necessário, foi atrás do que precisava para a criação. Comprou duas caixas da Melipona seminigra e no sítio de sua tia começou a colmeia. Depois, realizou duas divisões e atualmente possui seis caixas.

Ele possui também uma colmeia da espécie Frieseomelita doederleine, conhecida como moça branca; uma colmeia da espécie Tetragonisca angustula, conhecida como Jataí e uma colmeia da espécie Melipona Melanoventer. 

Foto: Clebio Camilo/Acervo Pessoal

 Além disso, o meliponicultor credenciado pelo Idam (Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas) mostra que os produtos produzidos pelas abelhas sem ferrão tem um valor diferenciado. “Um litro de mel das meliponas, por exemplo, chega a custar 3 vezes o valor do litro de mel de Apis [Abelha com ferrão]”, explica.

Por fim, Clebio descreve que a região é um excelente local para criação de abelhas sem ferrão e que a atividade está se popularizando bastante nos últimos tempos. 

“Quando se cria e se protege as abelhas, a natureza agradece”

finaliza.

 Afinal, qual sabor do mel da abelha sem ferrão?

Você pode estar se perguntando então, qual a diferença entre o mel da abelha com e sem ferrão. A pesquisadora Gislene diz que basicamente há um tipo de mel na prateleira dos grandes supermercados: da Apis mellifera, conhecida como abelha africanizada.

Essa espécie foi introduzida com a colonização pelos portugueses. Somado a isso há o fato de que, mais recentemente, vieram abelhas vindas da África de espécies semelhantes. 

“Elas se cruzaram na natureza e hoje a gente tem um poli híbrido, ou seja, abelhas que são uma mistura de várias raças que definem essa apis mellifera. E basicamente é a única espécie que é criada no Brasil para produção de mel em escala e que também é usada na exportação de mel.”

 

Entretanto, a diferença básica dos méis é que o mel da abelha sem ferrão é mais ácido, possui maior teor de água, possui com mais intensidade o cheiro do néctar presente na flor, o que faz com que sejam produtos com uma diversidade de aromas.  

Manejo adequado

Para Clebio, o manejo inadequado pode matar uma colmeia inteira. Por isso, pesquisadores da área insistem na importância da participação ativa de órgãos reguladores no processo de profissionalização da meliponicultura, além da regulamentação da qualidade do produto.

Zilse acredita na capacitação técnica de pessoas para desenvolver a área e estabelecer parâmetros de qualidade. 

“Essa orientação técnica é extremamente importante no início da atividade porque ela orienta não só nos aspectos legais mas também na efetividade da prática da meliponicultura para que os meliponicultores tenham sucesso. Esse manejo orientado é essencial.”

finaliza.

 Confira no Amazonsat um episódio completo sobra abelhas no programa Amazônia Animal

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