Foto: Puré Juma/Agência Pública
A Terra Indígena (TI) Juma está a apenas 5 quilômetros da BR-230, que termina na cidade amazonense Lábrea. Isso significa que, por terra, invasores só precisam andar por cerca de três horas na floresta amazônica para chegar ao território onde vivem os Juma, um povo de recente contato que, em 1964, sofreu um massacre.
Mais de 60 pessoas morreram. Exatos 60 anos depois, os sobreviventes, seus filhos e netos, seguem ameaçados. Desta vez, pelo avanço do desmatamento no sul do Amazonas, antes considerado uma das áreas mais preservadas do estado. Como são poucos, se sentem em risco.
“Os invasores entram e alegam que não sabem os limites do território do povo indígena Juma”, afirmou a cacica Boreá Juma.
Ela conversou com a reportagem da Agência Pública em sua língua nativa, a Kagwahiva, da família Tupi-Guarani, falada por sete povos na Amazônia. Boreá sabe bem o que está acontecendo em seu território e nas redondezas de sua terra tradicional, na qual nasceu, cresceu e viu seus ancestrais partirem e deixarem legado e histórias para contar.
De acordo com a cacica, as derrubadas de mata e as queimadas feitas ao redor da TI “são para fazer grandes pastos de fazendas e criação de gado”. O foco dos grileiros, pessoas que desmatam e se apossam de terras públicas, são áreas não destinadas, ou seja, regiões sob responsabilidade de governos estaduais ou federais que ainda não tiveram sua finalidade definida.
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Por que isso importa?
- Avanço do desmatamento no sul do Amazonas tem ameaçado a sobrevivência dos Juma e de outros povos originários na região.
- Povos indígenas de recente contato, como o Juma, devem ser protegidos pelo Estado com ações específicas.
“Hoje a gente está passando ameaças que vêm do grileiro e do fazendeiro. Naquele tempo que aconteceu o massacre era do sorveiro [pessoas que entravam na floresta para extrair sorva e seiva de árvores raras]”, explicou Mandeí Juma, vice-presidente da associação Jawara Pina, que representa seu povo. “A gente vem passando, sobrevivendo, desde o começo”, finalizou.
Ainda que o desmatamento na Amazônia tenha reduzido 30,63% entre agosto de 2023 e julho deste ano, a maior taxa de redução em 15 anos, os números seguem altos, com o sul do Amazonas se consolidando como a nova fronteira do desmatamento.
No ano passado, por exemplo, a cidade de Lábrea, que fica a pouco mais de 90 quilômetros da TI Juma, superou Altamira, no Pará, como a líder no ranking de municípios com maior área desmatada no Brasil. Mesmo quando ocorrem fora dos limites do território Juma, os crimes ambientais afetam a sobrevivência dos povos originários, pois geram a escassez de alimento, com a fuga de animais, além de levar poluição a lugares sagrados.
“Aqui na aldeia tinha muitas araras-azuis, mas elas desapareceram. Talvez foi por causa do calor, ou falta de alimento, ou a derrubada [de árvores] que afastou as araras. Não foi só arara, também os porcos-do-mato não aparecem mais, os peixes diminuíram, os nambu e os jacamim não se encontram mais, e as frutas estão produzindo em época diferente”, finalizou a cacica.
Invasores deixam rastros
Além do caminho pela floresta, também é possível chegar à TI Juma pelo rio Assuã, um afluente do rio Purus, em um trajeto de cerca de 40 minutos de barco. A facilidade de acesso ao território deixa os indígenas cercados e expostos a diversos perigos, como o próprio desmatamento e a possibilidade de confronto, verbal ou físico, com suas lideranças.
No trajeto que fazem pelo rio para chegar à TI, os Juma costumam observar suas margens, em busca de caça ou para registrar as clareiras que são abertas pelos madeireiros, que entram em áreas protegidas para roubar madeira. Em junho de 2024, quando a reportagem foi até a aldeia, isso aconteceu. De longe, o grupo de cerca de cinco indígenas que estava no barco a motor viu restos de árvores derrubadas em um local com marcas de pegadas. Encostaram a embarcação na margem e registraram o caso.
*O conteúdo foi originalmente publicado pela Agência Pública, escrito por Puré Juma