Estudo analisa área afetada pelo El Ninõ em 2015 e aponta aumento da mortalidade das árvores

Mais de 6 mil plantas foram monitoradas em 3 anos nas áreas que enfrentaram seca e fogo

Uma rede internacional de cientistas monitorou mais de 6 mil plantas nas áreas que enfrentaram seca e fogo, devido ao aumento das temperaturas e da intensidade da seca causados pelo fenômeno El Ninõ, em 2015.

A área estudada corresponde a 1,2% da Amazônia brasileira compondo 21 parcelas de 2.500m2 cada, estabelecidas desde 2010, em Santarém, no Pará. A região é conhecida como Baixo Tapajós, onde se encontram os rios Tapajós, Arapiuns e Amazonas. Os resultados encontrados foram extrapolados para uma região de 6,5 milhões de hectares, 1% de todo o bioma e 1,2% da Amazônia brasileira, de vegetação tropical pluvial, que, acostumada com a umidade, enfrentou a maior seca e aumento de temperatura desde 1998.

Um comparativo feito pela área das florestas queimadas, se representasse um país, ele seria o 15º maior emissor mundial de gás carbônico, registrando 495 milhões de toneladas de gás carbônico emitido na atmosfera. Essa parte afetada pelas queimadas emitiram quase 6 vezes mais carbono na atmosfera do que as que passaram apenas pela seca.

Uma das seis mil plantas monitoradas nesse estudo, que morreu em uma queimada florestal durante o El Niño de 2015. Foto: Reprodução/ Erika Berenguer

De acordo com os registros, apenas 37% desse carbono foi compensado com o crescimento de novas plantas. Os dados de um estudo internacional com participação da USP mostraram que, até o fim do monitoramento, houve excesso de mortalidade de árvores nas florestas afetadas pela seca. Já nas afetadas também pelo fogo, após dois anos e meio, a maioria das plantas monitoradas já não havia sobrevivido. O estudo também identificou que, nas áreas afetadas somente pela seca, as árvores com maior densidade de madeira tinham maiores chances de sobreviver. Nas florestas queimadas, as árvores localizadas em florestas que já haviam passado por outros distúrbios por ação humana no passado eram mais vulneráveis à morte. No total foram 2,9 bilhões de mortes de plantas registradas.

Uma das autoras da pesquisa, Erika Berenguer, da Lancaster University, no Reino Unido, afirma que naquele ano de 2015, as temperaturas estavam dois graus acima das médias dos outros El Niños, que já eram altas, e o período de estiagem foi o dobro do normal: o suficiente para transformar uma floresta úmida em inflamável. 

Na região, um milhão de hectares de florestas queimou, incluindo 8 das 21 parcelas incluídas no estudo, equivalente a cerca de sete municípios de São Paulo em chamas. Erika relata a dificuldade de se estudar o efeito do fogo nas florestas, devido à impossibilidade de saber com exatidão onde e quando acontece, e sobre as perdas materiais e afetivas ao ver a vegetação, com a qual a grupo tinha contato há oito anos, tornar-se fumaça. 

Foto: Queimada durante o El Niño de 2015 – Foto: Reprodução/ Erika Berenguer

 Depois do fogo, a equipe passou a estudar as áreas que enfrentaram apenas a seca (5,5 milhões de hectares) e as que sofreram o impacto da seca e dos incêndios (1 milhão de hectares), com zonas mais preservadas e com maiores indícios de ações antrópicas (realizadas pelo homem). A cada três meses, 6.117 plantas foram identificadas e monitoradas, de outubro de 2015 a outubro de 2018. Na floresta atingida apenas pela seca, árvores continuaram morrendo em excesso até o fim do estudo, que durou 36 meses, o que aponta o efeito em longo prazo desse impacto. Ja nas áreas também afetadas pelo fogo, o excesso de mortalidade ocorreu durante 2 anos e meio.

Segundo os cientistas, a morte pelo fogo é mais veloz e após o período, poucas plantas ainda sobrevivem. Os resultados mostraram que as florestas queimadas emitiram 5,7 vezes mais carbono na atmosfera. Em algumas áreas do estudo, 75% das plantas morreram. A estimativa ponta que 447 milhões de árvores grandes e cerca de 2,5 bilhões de árvores menores, morreram em 3 anos.

Um estudo brasileiro coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) foi publicado nesta quarta-feira (14), na revista britânica Nature, mostrou que o desmatamento diminuiu a capacidade da floresta amazônica de absorver gás carbônico. Segundo os dados, as áreas do bioma com mais de 30% de desmatamento apresentaram uma emissão de carbono dez vezes maior do que regiões com desmatamento inferior a 20%; a floresta passa consumidora para uma fonte de emissões de CO2.

Durante a coleta dos dados, além de verificar a sobrevivência ou não dos indivíduos, foram medidas 21 características funcionais, como altura, diâmetro, espessura da casca e da folha, área foliar e quantidade de carbono, nitrogênio e fósforo nas folhas. Nas florestas afetadas somente pela seca, a densidade de madeira se mostrou um fator determinante para a sobrevivência das árvores. As cientistas explicam que a Amazônia não evoluiu com secas e fogo como o Cerrado e, portanto, as cascas das árvores são finas, porque não precisam desse mecanismo de proteção térmica. Nas parcelas queimadas, o que aumentava a vulnerabilidade das árvores era a localização em florestas que passaram por distúrbios antrópicos (da ação humana) anteriormente. “Isso mostra que é essencial que diminuamos os distúrbios antrópicos na Amazônia, deixando a mata mais resiliente para quando ocorrerem essas secas extremas que vêm com o fogo”, afirma Erika. Ela destaca que as secas, mediadas por fenômenos climáticos como o El Niño, estão cada vez mais frequentes e com maior intensidade, o que pode prejudicar a recuperação da floresta.

Ainda que a floresta fique inflamável, o fogo não surge por vias naturais e sim na cultura de subsistência, na agropecuária e principalmente no desmatamento e adentra a mata. Para a pesquisadora, é essencial que se trabalhe melhor o manejo do fogo. “O fogo tem esse impacto catastrófico na floresta e se mostra importante reduzir as fontes de ignição. No caso do desmatamento, que em grande parte é ilegal, é ‘simplesmente’ combater crime”, completa.

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