Foto: José Cícero/Agência Pública
“A verdade é que eu vivo de coração apertado porque nossos adolescentes estão todos na cidade”, diz Benedita Parintintin, vice-cacica da aldeia Canavial, onde vivem 46 indígenas nas margens do rio Ipixuna, no sul do Amazonas.
Sua fala é acompanhada em coro por outras mães que reclamam da saudade dos filhos que, para seguirem estudando, precisam se mudar para Humaitá, a cidade mais próxima, a mais de dez horas de barco, para terminar o ensino fundamental II e o ensino médio.
“A gente quer que nossos filhos tenham uma vida diferente da que nós tivemos – eu precisei sair da aldeia cedo para trabalhar de empregada doméstica. Eu queria que agora eles pudessem crescer no território ou pelo menos ver oportunidades aqui, para poderem voltar”, diz a cacica Maria de Lourdes Parintintin.
Nas falas de Maria de Lourdes e Benedita, a preocupação com o distanciamento da juventude da aldeia aparece seguida de uma expectativa: há meses elas estão tentando vender créditos de carbono de seu território para, segundo seus planos, investir na construção de uma escola e na melhoria da infraestrutura nas aldeias. Benedita diz que querem fazer com o dinheiro do carbono aquilo que o governo não faz.
A construção, manutenção e gastos para o funcionamento de escolas indígenas – como contratação de professores e material – é de responsabilidade do poder público. Quando a reportagem visitou a Terra Indígena Ipixuna, as crianças estavam sem nenhum professor do ensino fundamental há mais de um mês, enquanto os adolescentes, que não largaram os estudos para trabalhar no garimpo, tentavam encontrar alguma forma de se sustentar na cidade para concluir o ensino médio.
Lá, então, a promessa dos milhões de reais que podem chegar com os créditos de carbono vira facilmente uma boia de salvação no imaginário local.
O dinheiro do carbono tem ocupado um espaço grande nos sonhos e planos dos moradores da aldeia desde 2022, quando assinaram um contrato para desenvolver um projeto de créditos de carbono vinculado a Michael Greene, empresário estadunidense que há mais de sete anos tenta desenvolver projetos de carbono em diferentes regiões da amazônia brasileira, mirando territórios de comunidades tradicionais e povo indígenas.
No território Ipixuna, os créditos gerados no projeto não trouxeram ainda os prometidos repasses financeiros para a comunidade. Por conta de projetos desenvolvidos no Pará, Michael Greene responde à acusação de grilagem de terras públicas, em uma ação promovida pela Defensoria Pública do estado.
Em junho de 2024, a Funai pediu a órgãos federais que investigassem e considerassem pedir a anulação dos contratos assinados entre as empresas de Greene e os povos originários, incluindo o contrato com os Parintintin, a partir de um relatório que apontava condições “extremamente desvantajosas” para os indígenas. Como ocorreu com outras aldeias da etnia Cinta Larga e Kayapó, segundo fontes ouvidas para esta reportagem, os contratos teriam sido assinados às pressas, com a promessa de milhões de reais falando alto.
No território Parintintin da Terra Indígena (TI) Ipixuna, desde a assinatura do contrato com o empresário investigado, muita coisa aconteceu.
“A gente foi estudar os créditos de carbono e fomos entendendo que esse é um produto nosso, que nós podemos comercializar, e não vamos desistir disso”, diz a cacica Maria de Lourdes.
Na pequena aldeia, visitada pela Pública em junho de 2024, os moradores conhecem os detalhes do projeto e estão buscando caminhos para negociá-lo à sua própria maneira.
“Nós entramos no mercado por conta do projeto do Michael [Greene, o empresário investigado por irregularidades], é verdade. Mas agora a gente pode seguir por conta própria. O território é nosso, o projeto é nosso, não é dele”, diz Thiago Castelano, coordenador da Associação do Povo Parintintin da Terra Indígena Ipixuna (APPTI). Desde que as denúncias contra Greene vieram à tona, a comunidade tenta fazer um distrato com o empresário, para gerir com autonomia os créditos gerados em seu território, dizem.
“Agora não vai ter mais isso de outra pessoa vender. As formiguinhas aprenderam a andar e querem caminhar com as próprias pernas”, diz.
Até a publicação desta reportagem, a comunidade seguia buscando uma alternativa jurídica para se desvencilhar do empresário, sem perder acesso ao projeto, que já conta com créditos emitidos e certificados.
Quando foi criado, os documentos submetidos à certificadora afirmavam que o projeto pertencia aos indígenas e que a empresa de Greene – Agefor – atuaria apenas como consultora. Mas na prática, e pelo contrato assinado inicialmente analisado pela Pública, a empresa teria o poder de fazer toda a gestão do projeto, efetuando as vendas e controlando o uso que os indígenas poderiam fazer dos recursos.
Agora, o que os Parintintin buscam é transformar a ideia vendida à certificadora em realidade: se o projeto foi submetido como desenvolvido pelos indígenas, eles querem ser os reais negociadores dos créditos.
Após pressionarem o empresário e fazerem um aditivo contratual, hoje os indígenas da TI Ipixuna têm acesso à plataforma em que os créditos estão computados e conseguiriam, por exemplo, vender os títulos a um eventual comprador, independentemente do empresário. Mas seguem com dificuldades para conseguir vender os créditos e apontam que muitos compradores se desinteressam do projeto após saber que foi desenvolvido com Greene.
Desregulação e questionamentos pesam sobre o projeto
Os créditos de carbono dos Parintintin foram gerados com base na lógica que sustenta o mercado de créditos de emissões por desmatamento evitado. A ideia é que uma área de floresta conservada equivale a um reservatório de carbono. Se essa área não for desmatada, deixará de emitir na atmosfera uma determinada quantidade do gás.
Cada tonelada de carbono que deixaria de ser emitida equivale a um crédito. Então, essa “não emissão” contabilizada vira um produto: ganha um preço, estabelecido pelo mercado. Dessa maneira, os créditos podem ser vendidos por quem detém a floresta para pessoas ou empresas que queiram comprar as “moedas de não emissão” para compensar o que poluem.
Artigos científicos e investigações jornalísticas questionam a efetividade da compensação das emissões através desse tipo de créditos. Por um lado, cientistas apontam que estimativas exageradas sobre a conservação das florestas geram a emissão de milhões de créditos vazios, como neste artigo publicado na revista Science.
Por outro lado, uma investigação do The Guardian indicou que mais de 90% das compensações de carbono de florestas tropicais aprovadas pela principal certificadora do mercado não têm valor real. Mas, ainda que com a credibilidade questionada, o mercado voluntário de carbono continua aparecendo como uma oferta frequente para os povos e comunidades que vivem nas florestas.
Nos últimos anos, as terras indígenas brasileiras entraram na mira de empresas que comercializam créditos, principalmente por conta de suas enormes áreas de floresta conservadas e asseguradas em documentos de terra homologados. Para esse mercado, grandes áreas de floresta protegida com documentação fundiária regularizada são atrativas porque permitem gerar uma quantidade monumental de créditos em um único projeto.
Até junho de 2024, mais de 40 projetos para geração de créditos de carbono em territórios indígenas tinham sido criados. Vários estão parados na etapa de certificação e alguns foram descontinuados após denúncias de irregularidades.
Até a publicação desta reportagem, dois projetos – o dos Parintintin da TI Ipixuna (AM) e o da TI Inãwébohonana na Ilha do Bananal (TO) – haviam registrado a venda de parte dos créditos de suas florestas. No caso da TI Ipixuna, os lotes de carbono vendidos não chegaram em benefícios financeiros aos indígenas, como a reportagem detalha mais à frente.
O mercado de créditos de carbono não está regulamentado no Brasil, o que significa que até agora não há regras e condições estabelecidas para essas negociações nos territórios. O Ministério dos Povos Indígenas (MPI) tem orientado as comunidades indígenas a não assinar contratos antes da regulamentação, que tramita no Congresso Nacional.
O texto do Projeto de Lei (PL) 2.148/15 prevê que as comunidades possam participar da geração e venda de créditos de carbono de seus territórios, seguindo cláusulas contratuais que garantam o direito à consulta apropriada e indenizações em caso de danos coletivos. A expectativa é que a proposta de lei defina também como a repartição das receitas geradas pelas negociações deve ser feita, apontam fontes que acompanham a tramitação. A expectativa do governo é aprovar o texto até 2025.
Mas, enquanto o PL não é aprovado, negociações e projetos para emissão de créditos vão avançando em nível estadual ou territorial na Amazônia brasileira. No estado do Pará, o governador anunciou em setembro a negociação de 12 milhões de créditos que gerariam 1 bilhão de reais; enquanto no sul do Amazonas as lideranças Parintintin contam que em outubro participaram de duas reuniões com empresas possivelmente interessadas em comprar os créditos que a comunidade tenta há meses vender.
Uma fatia para os indígenas, uma fatia para o americano?
Os Parintintin da TI Ipixuna têm um projeto com cerca de 2 milhões e 869 mil créditos emitidos e certificados, que foram gerados englobando cerca de 215 mil hectares de seu território. Segundo contratos e aditivos contratuais analisados pela Pública, os indígenas detêm o poder de comercializar 70% desses créditos, enquanto o empresário Michael Greene detém os outros 30%.
O preço de cada crédito no mercado oscila, com casos de vendas registradas entre 2 e 18 dólares. Em uma estimativa simples, se os créditos dos Parintintin fossem vendidos a 5 dólares cada um, renderiam cerca de 10 milhões de dólares aos indígenas e 4 milhões a Greene. É com base em uma projeção similar, apresentada pelo empresário, que a comunidade planeja construir a escola, uma Unidade de Saúde Indígena, reformar as 11 casas da aldeia e construir um alojamento para começar.
Mas vender dos créditos de carbono e navegar no mercado em si não tem sido fácil, dizem os indígenas. Apesar de as projeções de ganhos financeiros fazerem parte dos sonhos dos moradores do território, até janeiro de 2024 a garantia de que 70% das receitas seriam de fato administradas pelos Parintintin não estava nem registrada em contrato.
Foi depois de cerca de um ano e meio do início do projeto que as lideranças Parintintin pressionaram o empresário para assinar um aditivo contratual que determinava, entre outras coisas, que teriam acesso à plataforma em que os créditos estão disponíveis e fariam a gestão independente de sua porcentagem.
Antes do aditivo assinado proposto pelos indígenas, o contrato dava poderes à empresa do americano de vender os créditos, terceirizar a gestão do projeto e até gerir as verbas que deveriam ser usadas pelos indígenas em “projetos socioambientais e de biodiversidade”.
Em junho de 2024, um relatório técnico da Funai analisou os contratos e indicou que nele existem “fortes indícios de violações aos direitos indígenas”. Segundo a análise, os termos do contrato levantam perguntas sobre a boa-fé da empresa e estabelecem condições excessivamente desvantajosas para os indígenas.
Mas meses antes de o relatório da Funai apontar as irregularidades, os Parintintin tentavam corrigir os abusos contratuais. Segundo relatam, foram cavando brechas para conseguir gerir os créditos.
A decisão de que eles próprios começariam a buscar compradores e fariam as negociações foi tomada pouco tempo antes de o empresário americano fazer uma primeira venda de créditos do projeto sem consultá-los.
Em abril de 2024, Greene repassou 17.605 créditos emitidos na Ipixuna para a empresa GreenLand Investments S.A.S., uma empresa agrícola registrada na Colômbia. Os indígenas não foram avisados sobre a negociação, como previa o contrato. Só descobriram quando viram a transação registrada no site da certificadora. A transação gerou desconforto e acendeu alertas entre os Parintintin.
Quando confrontaram o empresário, Greene teria dito que os créditos teriam saído de sua parte dos 30% e, portanto, que os indígenas não teriam direito a porcentagens do recurso. Depois de conversas, a situação se acertou, relataram as lideranças Parintintin. Em entrevista à Pública, apontam que agora não veem irregularidades na venda. “Foi da parte dele, e nós temos a nossa parte que queremos vender agora.”
Os Parintintin continuam defendendo o projeto apesar das inseguranças e incertezas que enfrentam. “Eu acredito que ninguém pode cancelar nosso projeto a não ser nós mesmos”, diz Thiago. “E nós queremos continuar, gerar mais créditos no ano que vem e testar isso.”
No inverno amazônico, o sol se põe de frente ao rio Ipixuna
Como ocorreu em ao menos outras três aldeias contatadas pela reportagem, em junho de 2022 os Parintintin assinaram o contrato com a empresa de Greene após uma reunião de poucas horas. No encontro, um representante da empresa do americano, apresentado às lideranças por um parente indígena, levou os contratos para a assinatura.
Nessa altura, reuniões entre algumas lideranças e os representantes da empresa já haviam ocorrido. “O que aconteceu foi que um parente nosso foi em várias terras indígenas apresentando o funcionário da empresa [de Greene]. Quando um parente apresenta, é uma situação diferente, entende?”, relatou uma fonte que acompanhou as negociações, mas pediu que não fosse identificada.
“A proposta deles era que cada comunidade desenvolvesse seu próprio projeto. Eles pagariam um salário para um coordenador local e todos os dados do projeto, a organização de tudo, a consulta à comunidade, ficaria a cargo dessa pessoa. Eles só iriam cuidar mesmo da tradução e dos cálculos que a gente não sabe ainda fazer.”
Dois meses antes da assinatura dos contratos com a empresa de Greene, uma carta enviada ao escritório local da Funai em Humaitá pelas lideranças dos dois territórios Parintintin na região declarava que as comunidades estavam interessadas em desenvolver projetos de carbono e que para isso contratariam a consultoria das duas empresas do americano – a Agefor e Indigenous Carbon.
“Vale salientar que o povo Parintintin teve a iniciativa própria com o consenso de todos sobre o projeto de comercialização de créditos de carbono”, diz a carta.
Raimundo Parintintin, hoje coordenador regional da Funai em Humaitá, contou à Pública na época, tudo foi feito muito rápido.
“Não teve um esclarecimento de fato do que seria o projeto, de como esses benefícios chegariam ao território”, disse. Ele, que era coordenador da associação que reunia os Parintintin dos dois territórios do sul do Amazonas à época, afirmou que, mesmo se opondo, foi pressionado a assinar o contrato. “Eu não fiquei de acordo com aquilo, com a forma que estava sendo feito. Mas não tinha como ir contra todo o povo que estava animado com o projeto”, disse.
O contrato assinado na ocasião entre as lideranças e a empresa estabelece que a empresa de Greene seria a gestora do projeto, responsável por vender os créditos, enquanto os indígenas teriam a responsabilidade de garantir a conservação do território. Nos contratos iniciais, analisados pela Pública, chamam atenção imprecisões e erros, como a quantidade de hectares e até o nome da terra indígena indicado errado, em alguns trechos.
“A questão é que desde o começo o projeto gerou uma divisão entre nós, ou seja, teve um racha de próprio povo dividindo os territórios”, diz Raimundo. “Antes era uma associação para todo o povo, para dois territórios. Mas aí, por causa do projeto, foi criada uma outra associação [para a TI Ipixuna]. Isso já é uma separação que fragiliza o movimento.” Meses depois da assinatura dos contratos, foi criada a Associação do Povo Parintintin da Terra Indígena Ipixuna (APPTI), que é hoje o CNPJ através do qual os indígenas buscam vender os créditos gerados.
Entre 2022 e meados de 2024, depois do contrato assinado, algumas pessoas de cada comunidade, nomeadas para serem os coordenadores dos projetos, começaram a receber salários da Agefor para fazer os projetos andarem no território.
Foram criados grupos de WhatsApp que juntavam o empresário americano, seus funcionários e as lideranças nos quais eram trocadas informações dos projetos. Para além do grupo, a pessoa de cada território destacada para desenvolver os projetos, tinha contato mais direto com o empresário. Os coordenadores locais recebiam um salário-mínimo e, em alguns casos, organizavam a distribuição de cestas básicas enviadas pelo empresário.
O mecanismo se repetiu de maneira similar em ao menos outros três territórios com projetos desenvolvidos por Greene, apontam fontes ouvidas pela reportagem.
Na TI Ipixuna, ao menos um indígena foi contratado formalmente para coordenar o projeto e recebeu salários mensais do empresário. Um mês e meio depois de que os contratos já estavam assinados, Thiago Castelano, o coordenador do projeto no território, aplicou, segundo consta em relatório, os questionários para a “consulta livre prévia e informada” na aldeia. Fotos mostram o indígena visitando os parentes e recolhendo as assinaturas com as autorizações.
Mas, se o projeto começou com uma assinatura de contrato feita antes da consulta à comunidade, na aldeia Canavial hoje o apoio ao projeto é unânime. Ao longo do tempo os moradores foram incorporando os créditos de carbono em seu horizonte de futuro e se apropriando da ideia. Na pequena aldeia, a ideia pegou.
O agora: os sonhos e as preocupações criadas pelos créditos de carbono
Em junho de 2024, a Pública visitou a TI Ipixuna em busca de ouvir dos moradores da pequena aldeia as impressões e reflexões sobre o projeto. Na Canavial, vivem cerca de 46 pessoas, em sua maioria descendentes de um mesmo núcleo familiar. A maior parte das casas da aldeia fica na margem direita do Ipixuna, umas vizinhas às outras, em torno de uma casa de farinha onde a comunidade processa a mandioca, para fazer farinha e tapioca.
Durante um dos dias da visita da reportagem, as mulheres se reuniram para cozinhar a farinha coletivamente, enquanto os homens foram colher o açaí. “A gente queria mostrar pra vocês a nossa tradição que vamos tentando manter. Vou ser sincera de que hoje em dia não é sempre que a gente faz isso junto, eu queria que fizéssemos mais”, disse uma das moradoras.
Ali, ao longo do trabalho com a mandioca, várias opiniões sobre o projeto de crédito de carbono foram aparecendo. Nas conversas aparecia um denominador comum – todos da comunidade apoiam e estão ansiosos pelas verbas geradas pelo projeto – acompanhado de uma diversidade de preocupações.
Para a cacica Maria de Lourdes e sua irmã Benedita, o dinheiro do carbono representa a esperança de encontrar uma forma de reter os jovens na aldeia. Mas ao mesmo tempo gera preocupações sobre a segurança do futuro.
“Se conseguirmos mesmo vender e tivermos muito dinheiro, acho que também vamos precisar melhorar a segurança da aldeia. Porque podemos ficar visados, imagina um sequestro. Talvez a gente precise construir uma guarita no rio, por exemplo”, diz ela.
Bernadete afirma que se preocupa com a gestão do recurso, para não gerar desentendimentos. “Nós fizemos um protocolo de consulta aqui. E acho que vamos ter que fazer tipo um documento desse também se conseguirmos vender [os créditos]: dizendo o que cada um pode ou não pode fazer com o dinheiro. E aí colocar esse documento na casa de cada um. Porque vai ter que ter regras, muitas regras”.
Até o momento, o que as lideranças da aldeia estabeleceram é que querem construir uma escola e investir na reforma das 11 casas da aldeia, se conseguirem fazer alguma venda. A curto prazo, o que têm planejado é investir em construções. “Quando a gente pegar um recurso bom, automaticamente a gente já vai definir um valor, ou seja, quanto vai ficar pra cada família, para determinar o valor para construção de cada casa”, diz Thiago.
Para ele, além do investimento em infraestrutura, o dinheiro do carbono representaria a possibilidade de cada família criar um empreendimento individual também. “Cada família vai poder ter o seu sistema agroflorestal ou, por exemplo, criação de animais de pequeno porte”, diz. “Aí vai ir do interesse de cada um, eu acho.”
Já Raimundo, parente Parintintin do território vizinho, se preocupa com a sustentabilidade a longo prazo do projeto. “Se for tudo feito certinho, pode fazer sentido, porque nós, indígenas, estamos protegendo nosso território há anos e às vezes não ganhando nada com isso. Mas tem que ser muito participativo para ser sustentável mesmo pra ter um resultado de longo prazo”, diz.
“Porque o que acontece muito é que a gente vê o dinheiro pelo lado muito positivo e muitas vezes tem o lado negativo também. Se o povo não tiver preparado, dependendo da forma que esse dinheiro chega, acaba gerando desunião. Mas eu acho que tudo é um aprendizado a mais, pro próprio povo, pras próprias lideranças.”
Para ele, este é um momento de aprendizado também para a própria Funai. “Então, a gente está nessa tratativa ainda interna. Porque para a gente é uma coisa nova também. A gente precisa se apropriar, até para não chegar de qualquer jeito nessa discussão, porque ela não é nada simples. Vai ser difícil pra todo mundo.”
*O conteúdo foi originalmente publicado pela Publica.org, escrito por Clarissa Levy