MP-RO pede suspensão de lei que perdoa crimes ambientais: Foto: Reprodução/MP-RO
Em um momento decisivo para o futuro das florestas tropicais, o Consórcio da Amazônia Legal apresentou, no dia 19 de novembro, o primeiro diagnóstico integrado dos crimes ambientais na Amazônia Brasileira, uma entrega construída coletivamente no âmbito da Câmara Setorial de Segurança Pública do Consórcio, com participação ativa das secretarias de segurança pública dos nove estados da Amazônia Legal.
Desenvolvido em parceria com o Instituto Igarapé, o documento reúne evidências inéditas sobre dinâmicas criminais, capacidades operacionais e desafios enfrentados pelos estados na proteção do maior bioma tropical do planeta.
O estudo evidencia o esforço dos governos estaduais para fortalecer suas estruturas de fiscalização, inteligência e investigação. Foto: divulgação
O estudo
O estudo evidencia o esforço dos governos estaduais para fortalecer suas estruturas de fiscalização, inteligência e investigação. A análise também demonstra a importância de ações articuladas e do compartilhamento de dados entre os estados para enfrentar de forma mais eficiente os ilícitos ambientais que operam de maneira complexa e transnacional.
Um dado importante que o diagnóstico revelou diz respeito à capacidade operacional dos estados: toda a Amazônia Legal dispõe de apenas 19 aeronaves e 24 helicópteros para operações policiais, um número reduzido para um território que ultrapassa 5 milhões de km². O levantamento evidencia um desequilíbrio profundo entre a estrutura disponível e a dimensão real dos desafios, especialmente diante da expansão das atividades ilegais e da dificuldade de acesso às áreas mais remotas.
O secretário e Felipe Vital ressaltou que “essa integração evidencia que os desafios enfrentados pelos estados da Amazônia Brasileira são os mesmos e que o Brasil e o mundo precisam voltar seus olhos para essa realidade. Fico muito feliz com esse trabalho conjunto dos nove estados, e é justamente por isso que queremos construir o Centro Integrado de Proteção Ambiental da Amazônia: para fortalecer nossa capacidade de inteligência e aprimorar o combate aos crimes ambientais em toda a região”.
Operação contra crimes ambientais. Foto: divulgação
COP30
Pela primeira vez, o Consórcio da Amazônia Legal levou a pauta da segurança pública para a COP. Lançado quarta-feira 19, no Hub Amazônia – Blue Zone da COP30, o evento foi um marco que simboliza a compreensão de que não há como enfrentar os desafios ambientais sem fortalecer a segurança pública na região. A presença coordenada das secretarias estaduais e o trabalho conjunto na construção do diagnóstico evidenciam esse compromisso.
A diretora-executiva do Consórcio da Amazônia Legal, Vanessa, destacou a importância estratégica desse esforço coletivo:
“Pela primeira vez, contamos com um diagnóstico integrado de crimes ambientais na região, construído com base em evidências e na colaboração entre os nove estados. Os estados da Amazônia têm feito um esforço extraordinário para enfrentar a criminalidade ambiental, mesmo diante de um território imenso e de desafios históricos. O desafio é grande, sim e nenhum estado deve enfrentá-lo sozinho. É por isso que a atuação coordenada no âmbito do Consórcio da Amazônia Legal é tão essencial: ela transforma dados em estratégia, e estratégia em ação conjunta, fortalecendo nossa capacidade de proteger a floresta e as pessoas que vivem nela”.
O painel de apresentação também contou com a participação de Melina Risso, Diretora de Pesquisa do Instituto Igarapé; André Velasco, Coordenador da Comissão de Segurança da OTCA; Felipe Vital, Secretário da SESDEC de Rondônia e Coordenador da Câmara Setorial de Segurança Pública do Consórcio; e o Coronel Henrique Barbosa, Diretor-Executivo da SESDEC Rondônia.
Melina Risso destacou que “o diagnóstico é apenas o início. Agora entramos na fase de ação: vamos promover capacitações, fortalecer as equipes nos estados e planejar como reforçar essa atuação conjunta. A Amazônia é imensa e desafiadora e temos o privilégio de contar com o Consórcio da Amazônia Legal para construir respostas articuladas e eficazes para a região”.
Ao consolidar informações antes dispersas, o documento inaugura uma nova etapa de coordenação entre os estados amazônicos e reforça o compromisso da região com soluções estruturantes que unam proteção ambiental, desenvolvimento sustentável e segurança pública pilares indispensáveis para enfrentar os desafios atuais e futuros da Amazônia.
Livro ‘Diário de Pilar na Amazônia’ ganhou versão em live-action. Foto: Divulgação
A Amazônia, com sua riqueza natural, diversidade cultural e histórias repletas de mistério e encantamento, tem inspirado grandes obras, da literatura e das produções audiovisuais. Diversos livros ambientados na região bem que poderiam se tornar filmes e séries, não é?
E sim, alguns já foram adaptados para as telas, levando ao mundo a força narrativa e o imaginário amazônico. Conheça algumas dessas produções recentes que transformaram palavras em imagens e transportaram o público para o coração da floresta:
Diário de Pilar na Amazônia
O livro Diário de Pilar na Amazônia, de Flávia Lins e Silva, ganhou uma aguardada adaptação cinematográfica em 2025. A série literária sobre a jovem aventureira Pilar ganhou inclusive o público internacional, sendo publicada em oito países e com mais de 800 mil cópias vendidas somente no Brasil.
A versão em live-action, com filmagens em Belém e Alter do Chão (PA) e Rio de Janeiro (RJ), acompanha Pilar em uma jornada pela floresta amazônica através de uma rede mágica, presente de seu avô.
Lá, ela conhece Maiara, uma ribeirinha que perdeu sua comunidade, e, com a ajuda de seres folclóricos, tenta impedir o desmatamento da floresta. A história combina aventura, ecologia e cultura popular, conquistando crianças e adultos.
Baseado no livro homônimo do escritor amazonense Milton Hatoum, o filme Órfãos do Eldorado foi lançado em 2015. A trama gira em torno de Arminto, um homem que retorna à sua cidade natal na Amazônia e se vê envolvido em memórias dolorosas e paixões proibidas.
Com elementos de realismo mágico e o clima melancólico do fim do ciclo da borracha, a obra retrata o contraste entre a riqueza passada e o vazio existencial do presente.
O longa reforça a força poética e simbólica do universo criado por Hatoum, autor também de Relato de um certo oriente, Dois irmãos e Cinzas do norte.
Ainda falando de obras de Hatoum, o romance Relato de um Certo Oriente ganhou adaptação cinematográfica em 2024 dirigida por Marcelo Gomes.
A coprodução ítalo-brasileira aborda a saga de imigrantes libaneses que se estabelecem na Amazônia após fugirem da guerra em 1949.
O filme, assim como o livro, explora temas como identidade, memória, fé e pertencimento, mostrando as complexas relações familiares e os choques culturais entre tradições do Oriente Médio e a realidade amazônica.
Lendas Amazônicas
O mais antigo dessa lista, produzido em 1998, é na verdade uma série de filmes brasileiros dirigida por Moisés Magalhães e Ronaldo Passarinho, com coprodução da GNT (Globosat): Lendas Amazônicas.
Baseada no livro ‘Visagens e Assombrações de Belém’, de Walcyr Monteiro, a produção combina ficção e documentário para recontar mitos e lendas tradicionais da região Norte, como ‘O Boto’, ‘Matinta Perera’, ‘A Cobra Grande’ e ‘Belém, Mitos e Mistérios’.
Com trilha sonora do violonista Sebastião Tapajós, o projeto é considerado um marco no cinema paraense por valorizar o folclore amazônico e transformá-lo em arte audiovisual.
Quando você pensa em um peixe, é possível que naturalmente lembre de um animal flexível. No entanto, algumas espécies podem surpreender, como o bacu-pedra ou bacu-da-rocha (Lithodoras dorsalis). Espécie de água doce pertencente à família Doradidae, este peixe ocorre na bacia amazônica e apresenta características únicas: aparência robusta e placas ósseas laterais que recobrem o corpo lembrando uma carapaça – daí o nome popular.
As placas, junto com os espinhos dorsais, funcionam como defesa natural contra predadores. E, embora já existam estudos como o do biólogo e ictiólogo Thiago Augusto Pedroso Barbosa – que aborda ecologia alimentar e a distribuição do bacu-pedra – ainda há lacunas no conhecimento sobre seu ciclo de vida completo, reprodução e padrões migratórios.
A espécie é típica de águas lentas – rios, lagos e canais da Amazônia – e habita o fundo dos rios, onde se alimenta e se abriga. Durante o período de cheia (enchente dos rios), costuma se deslocar para as áreas alagadas, onde encontra alimento em abundância e proteção natural. Na estiagem, retorna para os leitos principais dos rios.
Por isso, o acompanhamento das populações em diferentes pontos da bacia amazônica serve como indicador da saúde ambiental dos rios. Por depender diretamente da vegetação ribeirinha, o declínio do bacu-pedra pode sinalizar desequilíbrios ecológicos mais amplos, relacionados à perda de habitat e à degradação das águas.
No Brasil, pode ser encontrado em Mato Grosso, Pará, Amazonas, Amapá e Roraima, além de países como a Colômbia, Guiana Francesa e Peru.
Bacu-pedra também é uma espécie apreciada na pesca esportiva. Foto: Reprodução/Facebook – Salomão Rossy
Alimentação e função ecológica do bacu-pedra
De acordo com o estudo do biólogo Thiago Barbosa, o bacu-pedra não é apenas um ‘consumidor de fundo’. Em sua fase juvenil, o bacu-pedra apresenta dieta predominantemente herbívora com tendência frugívora, alimentando-se de frutos e sementes provenientes das florestas de várzea.
Essa característica o torna um importante agente de dispersão de sementes, contribuindo para a regeneração da vegetação ribeirinha.
Com o passar do tempo, a alimentação da espécie pode variar conforme a disponibilidade de recursos. Em períodos de cheia, há maior consumo de frutos e vegetais; na estiagem, aumenta a ingestão de detritos e matéria orgânica acumulada no fundo dos rios. Essa flexibilidade alimentar ajuda o peixe a se adaptar às mudanças sazonais do ambiente amazônico.
“A presença de frutos e sementes na dieta de Lithodoras dorsalis mostra que não se trata apenas de um simples consumidor de fundo, mas de uma espécie que conecta o ambiente ribeirinho terrestre com o aquático. A vegetação das margens fornece suporte alimentar que influencia tanto a nutrição da espécie quanto o funcionamento ecológico mais amplo”, aponta o estudo.
O bacu-pedra é uma das espécies de bagres comercializadas em feiras e mercados da região amazônica. Apesar de não estar entre os peixes de maior valor econômico, possui relevância na pesca artesanal, sendo consumido localmente e, em algumas áreas, utilizado na culinária regional.
Foto: Reprodução/ Fecabook – Estrela do Alto Solimões
A conservação da espécie depende diretamente da preservação dos habitats de várzea e das matas ciliares. De acordo com a classificação da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN), a espécie não está na lista vermelha, sendo considerada “pouco preocupante” no que diz respeito ao seu desaparecimento na natureza.
Porém, o desmatamento das margens, o assoreamento e a poluição dos rios representam ameaças diretas à sua sobrevivência. Alterações no ciclo natural das cheias e secas também podem impactar o comportamento reprodutivo e a oferta de alimento para a sobrevivência desse peixe.
Ângela Mendes, filha do jornalista e ativista Chico Mendes, na COP30. Foto: Bruno Peres/Agência Brasil
Ângela Maria Feitosa Mendes tornou-se uma ativista ambiental de referência, tal como seu pai, Chico Mendes. Ele foi assassinado aos 44 anos a mando de fazendeiros em 1988, na casa onde morava em Xapuri, interior do Acre, por sua luta em defesa da floresta e de seus povos.
Atualmente ela comanda o Comitê Chico Mendes, espaço que reúne ativistas por justiça social que se identificam com a luta do Mártir da Floresta que, se estivesse vivo, completaria 81 anos em dezembro. O comitê foi criado na noite do assassinato de Chico Mendes, por lideranças políticas e de direitos humanos para exigir que o crime não ficasse impune.
A reação fez com que, dois anos depois, em dezembro de 1990, a Justiça condenasse os fazendeiros Darly Alves da Silva e seu filho, Darcy Alves Ferreira, a 19 anos de prisão pela morte de Chico Mendes.
Em vida, o líder seringueiro lutou contra as condições precárias de trabalho de sua categoria, que praticamente vivia em estado de semiescravidão e levantou a voz para denunciar aqueles que financiavam a destruição da floresta amazônica.
Chico ajudou a criar a Aliança dos Povos da Floresta, em meados dos anos de 1980, reunindo lideranças dos povos indígenas e seringueiros do Brasil que se uniram para reivindicar demarcações de territórios e a criação de reservas extrativistas. Em uma justa homenagem, seu nome batiza a autarquia responsável pela gestão das Unidades de Conservação federais do país: o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Atualmente, as ações do Comitê se dedicam também à formação de jovens e mulheres que vivem na Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, no Acre. A inspiração para o trabalho parte de uma carta escrita por Mendes pouco antes de morrer e dedicada aos jovens do futuro.
Nela o seringueiro comemora a existência de um mundo que superou a exploração e onde resta “somente a lembrança de um triste passado de dor, sofrimento e morte”.
“Desculpem. Eu estava sonhando quando escrevi estes acontecimentos que eu mesmo não verei. Mas tenho o prazer de ter sonhado”, finaliza a carta.
Em Belém para participar da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), Ângela Mendes conversou com a Agência Brasil no espaço Chico Mendes, montado no Museu Paraense Emílio Goeldi. Ela avalia os resultados da conferência, critica a exploração de petróleo na Foz da Amazônia e revela de que forma seu pai enxergaria uma COP na Amazônia
A iniciativa integra as atividades paralelas à COP30 e foi concebida como um ambiente de aprendizagem, intercâmbio e reflexão sobre a relação entre natureza, cultura e sociedade. O espaço congrega ainda a Feira de Sociobiodiversidade, com produtos produzidos de maneira sustentável, em diferentes biomas do país. A feira a materializa o princípio defendido por Chico de que a floresta em pé vale muito mais.
Foto: Bruno Peres/Agência Brasil
Agência Brasil: Como nasceu o comitê e qual é o seu foco atualmente?
Ângela Mendes: O comitê Chico Mendes foi criado na noite do assassinato do meu pai, por seus companheiros e companheiras que, sob muita dor, entenderam que era necessário, diante do sentimento de impunidade que reinava naquele período, criar uma forma de mobilizar a sociedade nacional e internacional para exigir do governo brasileiro justiça contra os assassinos do meu pai. Por outro lado, era necessário que esse mesmo espaço reverberasse, cuidasse dessa memória de luta que ele nos deixou. Nesse sentimento foi criado o Comitê Chico Mendes.
De que forma ele reverbera essa luta?
Ângela Mendes: A gente imaginou a semana Chico Mendes que acontece exatamente no dia do seu aniversário até a data do seu assassinato. Ele [Chico Mendes] fazia aniversário dia 15 de dezembro e foi assassinado no dia 22, sete dias depois. Então o comitê seguiu realizando as semanas Chico Mendes de forma voluntária, de forma muito orgânica.
Em 2016, a gente imaginou que, como ele tinha deixado uma carta para os jovens no futuro, a gente pensou em ter essa carta como uma referência, uma inspiração para a gente começar a falar sobre a importância da juventude, sobretudo da juventude dos territórios.
Para isso, a gente criou o núcleo jovem do comitê, que passou a fazer outras atividades, para além das semanas Chico Mendes, fazer um trabalho dentro das escolas. E a gente começou também a instituir o programa Jovens Protagonistas das reservas extrativistas do Acre, na Resex Chico Mendes, tudo isso procurando mobilizar a juventude para olhar para essa carta.
E, desde então, a gente segue, inspirados pela carta e por tudo que o meu pai fez. Em 2020 a gente realizou o primeiro Festival Jovens do Futuro, que ocorre no dia 6 de setembro, a data da escrita dessa carta. E a partir desse primeiro Festival Jovens do Futuro, a gente entendeu que essa carta é visionária.
Por quê?
Ângela Mendes: Porque jovens de mais de 20 países, de forma online, porque naquele período a gente estava com a pandemia [de covid-19] muito forte, participaram [do festival]. Foi um dia todo de lives. E a gente entendeu como, de fato, os jovens do mundo estavam mobilizados nessa luta por um mundo melhor, por justiça social, que ele antevia nessa carta.
Ela foi um chamamento e a gente percebeu que existia ali um movimento de juventude ao redor do mundo que foi tocada por essa carta, sem ao menos conhecê-la.
E de lá para cá, quais ações foram feitas?
Ângela Mendes: De lá para cá, a gente se institucionalizou. Há quatro anos temos um CNPJ e entendemos a necessidade de termos mais estrutura para chegar no território com mais impacto e trabalhando forte para potencializar as vozes das juventudes das reservas extrativistas. E agora também voltando muito ao olhar para a questão da mulher.
Hoje são esses dois públicos. Nossa força criativa está indo para pensar como fortalecer, ainda mais, esses dois públicos que têm um papel tão fundamental na manutenção desses territórios.
Nós vimos agora, nessa primeira semana da COP30, diversos movimentos sociais, os povos da floresta, quebradeiras de coco, quilombolas e indígenas reivindicando maior participação nos espaços de decisão. A mensagem de que só é possível o enfrentamento da crise climática com as populações e os povos foi ouvida?
Ângela Mendes: Eu entendo que as COPs avançaram muito pouco no que diz respeito aos direitos dessas populações que estão nesses territórios, que também são estratégicos. Quando uma COP, que fala de justiça climática acontece aqui na Amazônia, a gente olha e vê como existe um desafio muito grande para as populações de floresta, para que essas pessoas, de fato, acessem políticas públicas que lhe garantam viver com dignidade.
Então, essas populações têm todo direito de fazerem suas reivindicações. Agora, eu não acredito que elas estão sendo ouvidas nesse contexto de COP. Mas ainda é cedo [para afirmar]. Acho que essa semana muita coisa está sendo definida. A gente ainda vai ter notícias sobre o que de fato saiu como resultado concreto. Eu entendo que todos estamos torcendo muito para que saia um acordo que possibilite o acesso a financiamento climático que possa fortalecer esses povos nos seus territórios.
Com a COP30 entrando na reta final, já dá para fazer um pequeno balanço? Dá para falar nela como a “COP da implementação”, a “COP da verdade”?
Ângela Mendes: Eu não sei te dizer porque não estou lá nos espaços de negociação. Eu acho que ainda não existem grandes definições sobre o resultado dessa COP.
O que posso dizer é que foi uma COP diferente, onde os movimentos, as organizações de base se mobilizaram, se articularam e fizeram muita coisa, deram seus gritos. A gente teve o Porongaço, que foi um movimento de populações extrativistas com mais de mil participantes. A gente teve a Marcha Mundial pelo Clima, que também reuniu mais de 70 mil pessoas, segundo as notícias. A gente teve a marcha dos povos indígenas e todos esses espaços paralelos de debate.
Muita coisa rolou em torno da COP que fez com que as autoridades que estão lá debatendo as soluções tenham percebido que na Amazônia existe muita resistência. E existe também muita produção de soluções para essa crise climática que a gente está vivendo. Acho que o que fica de entendimento é que as soluções para essa crise climática precisam incluir quem está no território
Voltando a esse debate de que as soluções têm que partir da escuta dos territórios, você acha que com a entrega da carta da Cúpula dos Povos, os próximos eventos como esse vão ter um espaço maior para esses movimentos?
Ângela Mendes: Acho que essa COP teve algo de inovador, que foram os processos que o governo brasileiro implementou, os espaços de diálogo, o balanço ético global, o papel também dos enviados, que são pessoas que fazem essa ponte da sociedade civil com a cúpula, com os negociadores. Eu acho que são importantes iniciativas que aproximam os povos dos territórios dessa alta cúpula dos líderes.
Acho que a produção dos documentos também traz uma certa força. Porém, há uma disputa que acontece ali. Por exemplo, de uma manifestação de um grupo de indígenas que foram ocupar a Blue Zone e foram tratados de forma violenta, como invasores. Mas, e os lobistas que estão presentes em todas as COPs, que estão em grande número, que têm dinheiro para pagar suas passagens, estadia nos melhores hotéis, para fazer com que essa indústria dos combustíveis fósseis não perca espaço?
Tanto é que a gente vai ter esse licenciamento para a exploração de petróleo na Foz do Amazonas. Então, ainda é um desafio muito grande a gente lutar contra o lobby dessas indústrias dos combustíveis fósseis. Os movimentos e povos se organizaram, fizeram todo esforço, fizeram suas pré-COPs, formaram suas lideranças no território sobre o que é e a importância dessa COP. Vão produzir documentos, vão produzir demandas. Se alguém vai ouvir, não sei, não me pergunte.
Você tem falado sobre a necessidade de alianças para enfrentamento dessa crise ambiental. O que precisa ser feito, na sua avaliação?
Ângela Mendes: Eu vejo de forma muito clara. O meu pai deixa esse exemplo, junto com as lideranças indígenas que formaram a aliança original na década de 80, para avançar nas conquistas de políticas públicas, sobretudo de território.
Eu acho que cada parte, cada segmento da sociedade pode contribuir para as soluções. A aliança com as academias ela é superimportante. A academia produz conhecimento, pesquisa e a gente sabe: os cientistas dizem que ainda há muito a ser pesquisado na Amazônia que pode vir a trazer uma inovação tecnológica para esse lugar, a partir dos conhecimentos também de quem está nesse lugar. É a sociobioeconomia.
Os bancos podem também deixar de financiar apenas o agronegócio, o setor da mineração e entender que é importante também que abram linhas de financiamento para os pequenos empreendedores. A gente sabe a relação deles com agronegócio, com quem tem capital e para oferecer garantias ao banco. Isso [a relação] não vai mudar, mas que o banco repense a sua relação também com os pequenos.
As grandes indústrias, a indústria farmacêutica, a indústria cosmética têm uma capacidade grande de fortalecer os territórios também. Em vez de ficar explorando as comunidades, retirando as matérias-primas dos seus produtos, pagando um preço insignificante, indo beneficiar em outros lugares e vender por um preço absurdo, poderia muito bem repensar isso e incluir as comunidades nesse processo. Formar juventude para fazer essa manipulação, construir estruturas locais para fortalecer. Porque, veja bem, se um dia que essa floresta acabar, de onde eles vão retirar o muru-muru? Onde eles vão retirar o ipê branco, o pau-rosa para produzir os seus produtos?
Foto: Bruno Peres/Agência Brasil
Cada segmento tem potencial de contribuir…
Ângela Mendes: Acho que cada segmento, como eu falei, tem poder de impulsionar essa transformação que a gente quer. A Amazônia, às vezes, só é reconhecida a partir do que ela fornece para os mercados de commodities internacional. É a carne, a soja, a madeira, a mineração que só degrada a Amazônia, viola os territórios. Mas ela tem tantos potenciais.
A gente trouxe o Armazém da Sociobiodiversidade que mostra outras formas de se relacionar com essa floresta, com esses maretórios, com esse território de forma sustentável, garantindo esses ecossistemas não só para a presente, mas para a futura geração.
Da mesma forma para os demais biomas, né?
Ângela Mendes: Exatamente. Da mesma forma, porque a gente também tem que entender que estamos todos integrados. Tanto que aqui a gente tem produtos de todos os biomas: do Cerrado, do Pampa, da Caatinga. Porque eu acho que cada bioma está conectado. Cada um deles tem sua cultura que é resistência ao modo de vida capitalista, que a gente tem hoje.
Você acha que o seu pai teria visto com bons olhos uma COP aqui na Amazônia?
Ângela Mendes: Muita gente já me perguntou isso. Eu acho que ele teria olhado como uma grande oportunidade de construir a possibilidade de melhorar a vida dos companheiros e companheiras dele.
A luta dele não era só pela conservação da floresta, mas ela era também pela manutenção dos modos de vida tradicionais das populações. Ele era um lutador incansável pela justiça socioambiental.
Após um período de negacionismo na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, a gente teve uma mudança no governo acenando para retomada da política ambiental. Como você avalia esses três anos de governo Lula?
Ângela Mendes: Obviamente parece que a gente saiu de uma situação muito complicada, para falar o mínimo, para uma situação que aponta para outra direção. Mas, ao mesmo tempo, a gente sofre com o avanço do agronegócio em determinadas fronteiras agrícolas. A gente sofre com uma especulação sobre as terras, grilagem, pressão sobre os povos nos territórios.
O que está faltando para o Brasil encampar de vez essa agenda ambiental?
Ângela Mendes: Eu acho que existe hoje uma sensação de impunidade. O governo Bolsonaro deixou no ar essa sensação de que tudo se podia fazer, porque ainda existe um sistema que está entranhado dentro dos espaços. Esse sistema defende os interesses do capitalismo. É esse interesse que combate diariamente o direito de quem está nos lugares, nos territórios, lutando para sobreviver. Porque o capitalismo é violento, cruel, ganancioso, quer tomar posse dos territórios para explorar, seja minério, seja petróleo, para satisfazer a sua sanha gananciosa.
Esse sentimento de impunidade está presente hoje com muita força, tanto é que os assassinatos de defensores continuam acontecendo. A gente está falando, por exemplo, do assassinato, há duas semanas, de duas mulheres quebradeiras de coco babaçu aqui no estado do Pará. A gente sabe que os fazendeiros que têm os babaçuais nas suas terras estão fechando tudo, impedindo-as de continuar tirando o coco, colhendo o coco para se sustentar. Então, ainda é um sistema muito forte, muito poderoso, que está nos principais espaços de poder e que ainda dá suas cartas.
O presidente Lula resolveu uma série de questões. Mas a gente vem de quatro anos que foram realmente um desastre, uma crueldade que retrocedeu 40 anos, 50 anos de luta para conquistar o que estamos perdendo.
Apesar de estarmos com o governo progressista, a gente ainda tem esse Congresso que é fascista, a gente tem a maior parte dos governadores que são de extrema direita.
Tem um tensionamento ao redor do presidente também. Inclusive fico imaginando que, nesses momentos, o povo na rua faria diferença. A gente se acostumou agora a militar nas redes e a gente só vai para a rua quando vai ser votado a PEC da Impunidade.
A gente sabe dos graves problemas, essa questão da exploração de gás na Foz do Amazonas é extremamente grave. O governo precisava rever seu posicionamento também. A gente tem falado sobre transição justa, a gente tem falado sobre como o clima tem estado em crise por conta dos combustíveis fósseis.
Então, não justifica que a gente esteja aqui na Amazônia, recebendo a COP para pensar soluções e, de repente, a solução que o Brasil encontra é aquela que já mostrou que traz mais problema do que qualquer outra coisa. Para fazer esse processo de transição justa acontecer, a gente não pode sucumbir ao capitalismo, a gente não pode sucumbir a essa força que o agro diz que tem. A gente também precisa, enquanto população, parar de reclamar nas redes e ir para a rua.
Como é que ser uma mulher ambientalista em um país que tem essa infeliz marca de matar defensores dos territórios?
Ângela Mendes: Não é fácil estar na Amazônia, que é o bioma também, onde ocorrem mais violências contra esses defensores. Então, realmente, é a gente vencer desafios todos os dias, tentar se fazer de forte mesmo quando a gente está sofrendo, cansada, entender que cada um tem um compromisso a assumir. Acho que a gente nunca foge da luta porque entende que o que a gente está construindo é pelo presente, pelo futuro, por todos os que estão aqui e pelos que virão. Eu sempre penso nisso quando eu estou para desistir, para sucumbir.
E não é para deixar esses caras acharem que eles estão ganhando porque têm mais dinheiro, porque têm poder. Você falou nas alianças: é nisso que eu acredito, que a gente ainda está vivo hoje, ainda está resistindo, porque a gente está junto, se organiza em movimento e vai tocando.
Como você vê hoje o papel das reservas extrativistas (Resex)?
Ângela Mendes: As reservas extrativistas são territórios estratégicos. Assim como as terras indígenas têm essa importância para a gente tentar manter o clima abaixo desse 1,5º C, que a gente não vem conseguindo.
A Resex vem nesse sentido de ser também esse território que é uma grande fronteira contra os desmatamentos e as queimadas, como também para garantir os modos de vida de populações que estão nesse território há década, séculos, que aprenderam muito do que sabem com os indígenas que aqui já estavam. São a garantia que esses modos de vida sejam resguardados, junto com a conservação da floresta.
Quando meu pai foi assassinado, ele não chegou a ver a criação de nenhuma Resex, que só surgiram a partir de 1990. No apagar das luzes do governo [José] Sarney, foram criadas as primeiras reservas extrativistas de floresta, hoje elas já são quase 100, são 96, sob a gestão do governo federal.
Isso porque a gente não está contando as reservas extrativistas sob gestão dos governos estaduais e municipais e outras formas de território de uso coletivo, como as unidades de conservação, reservas de desenvolvimento sustentável, projetos de assentamento extrativista, como as próprias florestas nacionais, que são unidades de conservação com pessoas dentro.
Num total entre terra, floresta e água, são protegidos hoje mais de 60 milhões de hectares de biomas, com esses componentes, onde vivem mais de 1 milhão de famílias. É um número bastante expressivo, mostra como a luta dele não foi em vão. A sua morte, a gente entende também que não foi em vão, apesar de entender que se ele estivesse vivo, hoje a gente teria avançado ainda mais.
Você está otimista com a possibilidade de resultado final dessa COP?
Ângela Mendes: Eu estou. Porque se fosse para ficar pessimista, a gente não teria feito todo o esforço que a gente fez para trazer esse espaço maravilhoso aqui para a COP.
*O conteúdo foi originalmente publicado pela Agência Brasil, escrito por Luciano Nascimento
Na foto está a ahama da Xwé Acè Nă Djohun, Gäniyäku Jokolosy, dando a benção aos filhos. Foto: Divulgação/Xwé Acè Nă Djohun
As religiões de matriz africana estão ganhando espaço no Amapá e fortalecendo a identidade negra no Estado. O último censo apontou que a Umbanda e o Candomblé passaram de 0,1% da população para 0,5% no Amapá. No Brasil, o número triplicou.
No Estado, essas práticas religiosas se conectam a manifestações culturais como o marabaixo e o batuque, também de origem africana. Juntas, elas ajudam a preservar tradições que resistem há séculos contra a invisibilização e o preconceito.
Neste feriado de 20 de novembro, dia em que se celebra a Consciência Negra, o historiador Bruno Machado explica que as religiões de matriz africana são parte da construção da sociedade brasileira. Para ele, não existe uma única identidade negra, mas várias. Essa pluralidade está ligada às experiências transmitidas de geração em geração, principalmente pela oralidade, que valoriza saberes e costumes.
Nos terreiros, o culto a entidades espirituais reforça identidades que ainda sofrem com o racismo e suas violências físicas e simbólicas.
“Existem várias identidades negras e elas devem ser preservadas. Quem participa das religiões de matriz africana não necessariamente é negro, mas essas práticas reforçam sentimentos de pertencimento, autoestima e aceitação ao diferente. Ao contrário das religiões salvacionistas, elas têm mais abertura ao acolhimento e à diversidade”, afirma Machado.
Entre os desafios para manter viva essa tradição estão o resgate da memória afro-cultural e a valorização dos saberes ancestrais.
Segundo o historiador, essas religiões se diferenciam das dominantes porque seus conhecimentos e cosmologias estão diretamente ligados à natureza. “Pensar nisso também ajuda a fortalecer aspectos das identidades negras”, diz.
No culto afro, o axé é entendido como energia vital que vem das forças da natureza. Cada elemento carrega uma simbologia própria e representa o poder do sagrado.
🔍Você viu isso? A população quilombola do Amapá é de 12.524 pessoas, segundo o Censo Demográfico 2022. O número representa 1,71% de pessoas residentes no Estado, que é de 733.508 habitantes.
As casas de axé são mais do que locais de culto. Elas funcionam como espaços de aprendizado, onde sacerdotes e praticantes, chamados de pais e filhos, caminham juntos em constante evolução.
Nesse cenário, pais e mães de santo têm papel fundamental na valorização da cultura afro-amapaense e na formação de uma consciência coletiva sobre a negritude.
A liderança do terreiro Xwé Acè Nă Djohun, de tradição Djedje Savalu, no bairro Jardim Felicidade, em Macapá, é da Donέ Danielle Barriga. Iniciada em 2011, Danielle viu de perto o crescimento das religiões de matriz africana no Amapá e as mudanças que ocorreram nos últimos anos.
“É através do Candomblé, da Umbanda e de tantas casas de axé que mantemos viva a sabedoria dos povos que vieram antes de nós”, destaca a Donέ.
Conhecida como roça do Jardim Felicidade, a casa é mais que um espaço espiritual. Ela funciona como apoio comunitário em uma área periférica da capital. Diversas ações sociais são realizadas no espaço durante o ano.
O acolhimento é a essência dessas religiões. Muitos fiéis encontram ali consolo para suas fragilidades.
“Quando falamos de Consciência Negra, falamos também dos Povos Tradicionais de Matriz Africana, que preservam a memória espiritual dos nossos ancestrais e mantêm vivas tradições que resistiram à violência e à perseguição”, explica Danielle.
Na religião, o nome de santo de Danielle significa “aquela que nasce dos ventos”, em referência a orixá Oyá. Para ela, esse mesmo vento aponta para o futuro e mantém sua casa firme na tradição Savalu.
Matriz africana no Amapá
No Amapá, três religiões de matriz africana se destacam: Candomblé, Umbanda e Tambor de Mina. Cada uma tem sua própria tradição, que define os ritos e a doutrina de cada terreiro.
As diferenças aparecem nos rituais. No Candomblé, os fiéis cultuam os orixás, divindades ligadas aos elementos da natureza.
A Umbanda é uma religião afro-brasileira criada oficialmente em 1908. Ela nasceu da união de práticas espirituais mais antigas, mantidas por povos escravizados, indígenas e comunidades marginalizadas, que encontraram na fé uma forma de resistência cultural e sobrevivência.
O Tambor de Mina surgiu no Maranhão e também é uma religião afro-brasileira. Seus rituais são marcados pelo culto aos voduns, orixás e encantados.
O mês de novembro é marcado pelo Mês da Consciência Negra, com destaque para o feriado de 20 de novembro, que homenageia Zumbi dos Palmares, líder quilombola e símbolo da luta contra a escravidão.
Desde 2023, o Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro, é feriado nacional. A mudança foi aprovada pelo Congresso e sancionada em dezembro de 2023 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
*Por Mariana Ferreira, da Rede Amazônica AP (com adaptações)
Ilustração de Maria Firmina dos Reis. Imagem: Reprodução/Memorial de Maria Firmina dos Reis
Maria Firmina dos Reis, natural da cidade de São Luís, no Maranhão, nasceu no dia 11 de março de 1822. Firmina era filha de uma escrava liberta, Leonor Felipa dos Reis, e de João Pedro Esteves, um homem negro e sócio do comendador Caetano José Teixeira, que escravizou Leonor.
De acordo com dados do artigo ‘Escritoras, escritas, escrituras’ de Norma Telles (na obra ‘História das mulheres no Brasil‘, organizada por Mary Del Priori), Firmina, em sua infância, passou diversas dificuldades de educação, uma vez que no século XIX as mulheres não tinham o direito de estudar.
Ilustração de Maria Firmina dos Reis. Imagem: Reprodução/Memorial Maria Firmina dos Reis
Mesmo com a falta de acesso à educação por direito, Firmina era considerada autodidata e dominava a língua francesa. Ela até mesmo chegou a realizar algumas traduções de textos para jornais quando adulta.
A escritora tinha uma parente, Henriqueta, que tinha uma boa qualidade de vida na época e, de acordo com os estudos sobre a vida de Firmina, Henriqueta é quem a ajudava na área da educação.
Com muita luta, Maria Firmina se tornou a primeira professora concursada do Maranhão a exercer a profissão em educação básica, que ensinou habilidades como leitura e escrita em 1847 na Vila de Guimarães.
A maranhense é considerada a primeira escritora a publicar um romance abolicionista brasileiro, chamado ‘Úrsula’, no período de 1859-605. Esta obra foi denominada pela própria autora como um “romance original brasileiro” escrito por “uma maranhense”.
Capa da primeira edição do livro ‘Úrsula’ publicado em 1859 por Maria Firmina dos Reis, pela San’ Luiz. Imagem: Domínio público
A luta de Maria pela educação (de outros)
“Um ano antes de se aposentar, com trinta e quatro anos de magistério público oficial, Maria Firmina dos Reis fundou, a poucos quilômetros de Guimarães, em Maçarico, uma aula mista e gratuita para alunos que não pudessem pagar. Estava então com 54 anos. Toda manhã, subia em um carro de bois para dirigir-se a um barracão de propriedade de um senhor de engenho, onde lecionava para as filhas do proprietário. Levava consigo alguns alunos, outros se juntavam. Um experimento ousado para a época. Uma antiga aluna, em depoimento de 1978, conta que a mestra era enérgica, falava baixo, não aplicava castigos corporais nem ralhava, aconselhava. Era estimada pelos alunos e pela população da vila. Reservada mas acessível, toda passeata dos moradores de Guimarães parava em sua porta. Davam vivas, e ela agradecia com um discurso improvisado”, descreve o artigo de Telles.
A maranhense não se casou, mas cuidou de 11 crianças, entre filhos adotivos e afilhados, sendo alguns filhos de pessoas escravizadas. Já no fim da vida, Reis perdeu a visão e vivia com baixas condições financeiras. De acordo com Telles, a escritora faleceu com 92 anos, “na casa de uma ex-escrava, Mariazinha, mãe de um dos seus filhos de criação”. Firmina faleceu em 11 de novembro de 1917, na vila de São José Dos Guimarães, também no Maranhão.
Depois disso, sua vida foi esquecida dos livros sobre literatura no Brasil. Em 1962, o bibliógrafo Horácio de Almeida achou um exemplar da obra ‘Úrsula’ no meio de uma pilha de livros antigos que adquiriu em um sebo do Rio de Janeiro, e a partir daí, a história de Firmina passou a ser estudada e valorizada.
Ao longo da sua trajetória, Maria Firmina escreveu diversas obras, como músicas, romances e contos. No artigo de Camila Kulkamp, ‘Biografia de Maria Firmina dos Reis’, além de ‘Úrsula’ (1859), a autora aborda o caminho literário de Firmina.
Em 1861, a maranhense publicou um conto indigenista denominado ‘Gupeva’.
E 1887, publicou outro conto abolicionista: ‘A Escrava’.
Em jornais, Firmina publicava poemas e contos, nos veículos como: A Imprensa; Publicador Maranhense; A Verdadeira Marmota; Almanaque de Lembranças Brasileiras; Eco da Juventude; Semanário Maranhense; O Jardim dos Maranhenses; Porto Livre; O Domingo; O País; A Revista Maranhense; Diário do Maranhão; Pacotilha; e Federalista.
Em 1861, Firmina publicou dois poemas (‘Por Ver-te’ e ‘Minha Vida’) em uma antologia (coleção de textos em prosa) chamada ‘Parnaso Maranhense’.
Em 1871, reuniu todos os seus poemas na obra ‘Cantos à beira mar’.
Em 1888, ‘Hino da libertação dos escravos’ (1888)’.
De músicas, criou o “Auto de bumba-meu-boi”; “Valsa” (letra de Gonçalves Dias e música de Maria Firmina dos Reis); “Hino à mocidade”; “Hino à liberdade dos escravos” (1888); “Rosinha, valsa”; “Pastor estrela do oriente”; “Canto de recordação” e “À Praia de Cumã”.
Falar sobre crise climática é algo extremamente inquietante, ainda que necessário. A perspectiva de que o mundo caminha inevitavelmente para o fim é massificada pelos meios de comunicação, inclusive pelas mídias que constituem nosso entretenimento. Não é incomum constatarmos desastres climáticos nos últimos anos, talvez o tornado no Paraná sendo o exemplo mais recente, e pressionados pela crescente ameaça de um colapso ambiental, nos vemos diante de uma encruzilhada: ou olhamos diretamente para o abismo, a opção mais aflitiva… ou viramos o rosto.
Virar o rosto é a medida universal para nos livrarmos de tudo que é desconfortável. É a forma de nos eximir de responsabilidade, afinal, não podemos nos preocupar com algo que não conhecemos.
Há forças neste mundo que se beneficiam imensamente da nossa escolha de virarmos o rosto, pois é no ponto cego que está o que realmente importa. O advento das redes sociais, nesse contexto, não foi um fenômeno orgânico, impulsionado pelo fluxo natural da vontade do ser humano de virar rosto: é uma estratégia para que tenhamos o espaço perfeito para esquecer do mundo real, mesmo que, engajados em debates de cunho social, sejamos levados a acreditar que fazemos parte de algo maior que nós mesmos, e tudo isso do conforto de casa.
O metaverso se tornou a força que pauta nossas ações, ao passo que nos afasta do chão que pisamos, do ar que respiramos, da paisagem sobre a qual descansamos nossa visão. Não se trata de uma planície virtual onde as pessoas compram lotes imaginários, mas de uma maneira de ocuparmos o mundo sem dele nos ocuparmos. Fomos absorvidos pela realidade virtual, de modo que nem virar o rosto se torna necessário, basta baixá-lo para a tela imediata.
Eis o cenário perfeito para que a exploração que nos acomete nos tempos modernos se perpetue: somos Neo na Matrix, alheios à mecânica do universo que absorve nossa vitalidade em prol de um status quo tão acima de nós que mal vemos que o sustentamos. Naturalmente, um sistema tão consolidado precisa de recursos, e aí que entra o desastre climático, pois nem a natureza escapa desse parasitismo.
Qualquer um que já tenha se disposto a encarar o abismo já esbarrou em uma leitura fundamental: Ideias para adiar o fim do mundo (2019), de Ailton Krenak, um nome de peso no que diz respeito às filosofias indígenas. Qualquer um que queira explorar possibilidades de atravessar esse abismo já esbarrou com o discurso que ele fez durante A Assembleia Nacional Constituinte, em 1987, antes da redemocratização do país. Qualquer um que supere o desconforto e passe a entender verdades difíceis já se deparou com a entrevista em que ele afirma que indígenas e não-indígenas estão em guerra, e nunca pararam.
Em Ideias, Krenak aponta que a sustentabilidade é um mito, e a COP30, a Conferência entre as Partes realizada pela Organização das Nações Unidas para discutir a soluções para a crise climática, que acontece em Belém no momento em que redijo este texto, é a prova viva disso.
A sustentabilidade é uma mentalidade que procura conciliar as necessidades de consumo do mundo capitalista com a ilusão de que a natureza é capaz de supri-las. Acontece que consumimos demais, mais do que a natureza é capaz de suprir, e a parte engraçada é que nem é uma necessidade, é uma busca constante por luxo:
Estar com aquela turma me fez refletir sobre o mito da sustentabilidade, inventado pelas corporações para justificar o assalto que fazem à nossa ideia de natureza. Fomos, durante muito tempo, embalados com a história de que somos a humanidade. Enquanto isso — enquanto seu lobo não vem —, fomos nos alienando desse organismo de que somos parte, a Terra, e passamos a pensar que ele é uma coisa e nós, outra: a Terra e a humanidade. Eu não percebo onde tem alguma coisa que não seja natureza. Tudo é natureza. O cosmos é natureza. Tudo em que eu consigo pensar é natureza.
O texto de Krenak é absurdamente popular, mas me assusta sentir que ele mal é lido. Digo isso porque não há brechas para interpretações dúbias no texto do filósofo: não se pode sonhar com um futuro possível enquanto tudo o que pensarmos for consumo. O lucro não tem lugar em um mundo que respeita o tempo, e Krenak não é metafórico ao dizer que nosso distanciamento da natureza é o principal responsável pelo fim do mundo, uma vez que passamos a nos separar dela para enxergá-la exclusivamente como recurso.
A ideia de sustentabilidade parte desse princípio de que a natureza é um recurso a ser usado, mesmo que de forma “consciente”. Eis a questão: não somos superiores à natureza, não somos seres abençoados com o direito divino de explorá-la, a terra não é nossa herança. Quando nosso consumo é posto como prioridade, o tempo da terra, o nosso tempo, não é respeitado. Somos vítimas dessa fome que não enche barriga, por isso somos, com ela, consumidos.
Na ânsia por consumo, somos também devorados pelo mesmo sistema que come árvores, bebe rios e envenena o solo. Me arrisco a dizer que nenhum leitor deste texto se sente descansado, com a vida em ordem, despreocupado com a semana que vem, pois não vivemos mais o tempo. Nossa concepção de tempo está quebrada, sem estrutura, pois as telas não permitem mais o fim do expediente nem o foco no presente.
Falar de sustentabilidade é falar sobre a melhor forma de consumirmos sem que o solo ceda sob nossos pés, ou como afirma Davi Kopenawa, sem que o céu caia. O problema é que o solo está cedendo, o problema é que o céu já está caindo. Também nas palavras de Kopenawa, para salvarmos o planeta, o branco tem que nascer de novo.
Tendo a não ser muito otimista com relação aos resultados da COP, e mesmo Krenak, em entrevistas recentes, não parece estar. Afinal, não discutimos sobre a água consumida pelo agronegócio ou para resfriar os servidores de IA, um verdadeiro assassinato de rios e riachos. A permissão para a perfuração de poços de petróleo na Foz do Amazonas ainda está em vigor, não falamos sobre reforma agrária e a demarcação de terras indígenas, obrigação do Governo Federal desde que a constituição foi promulgada em 1988, não acontece sem que os próprios indígenas se coloquem na linha de frente, como foi o caso da manifestação majoritariamente Munduruku dos últimos dias.
As pautas que importam realmente não assumem a centralidade da discussão, e o sentimento é que a COP não deixe um legado significativo. O aspecto festivo da conferência é, mais uma vez, um ardil para termos o que olhar quando o rosto for virado, e as imagens de fim do mundo continuam pregadas como um apocalipse bíblico inescapável.
A literatura de Krenak, no entanto, vê no uso consciente de imagens (não as que atordoam os sentidos humanos e roubam nossa esperança de um amanhã possível) uma estratégia para o combate à crise climática:
O tipo de humanidade zumbi que estamos sendo convocados a integrar não tolera tanto prazer, tanta fruição de vida. Então, pregam o fim do mundo como uma possibilidade de fazer a gente desistir dos nossos próprios sonhos.
[…]
Para algumas pessoas, a ideia de sonhar é abdicar da realidade, é renunciar ao sentido prático da vida. Porém, também podemos encontrar quem não veria sentido na vida se não fosse informado por sonhos, nos quais pode buscar os cantos, a cura, a inspiração e mesmo a resolução de questões práticas que não consegue discernir, cujas escolhas não consegue fazer fora do sonho, mas que ali estão abertas como possibilidades. Fiquei muito apaziguado comigo mesmo hoje à tarde, quando mais de uma colega das que falaram aqui trouxeram a referência a essa instituição do sonho não como uma experiência onírica, mas como uma disciplina relacionada à formação, à cosmovisão, à tradição de diferentes povos que têm no sonho um caminho de aprendizado, de autoconhecimento sobre a vida, e a aplicação desse conhecimento na sua interação com o mundo e com as outras pessoas.
Gosto de pensar que nossa esperança está no sonho, em nossa capacidade de produzir imagens. As telas são confortáveis porque nos tiram a necessidade de fazê-lo, mas recuperar a autonomia sobre nossa própria mente talvez seja de fato a melhor ideia para adiar o fim do mundo. Sonhar é tornar o impossível, possível, e transformá-lo em ideia. Ideias levam a ações, e ações salvam o mundo.
Acredito que, posto dessa forma, temos uma metodologia indígena para adiar o fim do mundo, mas temos exemplos mais do que suficientes que atestam o desinteresse governamental em fazê-lo. Acontece que problemas enchem bolsos, soluções os esvaziam.
A literatura indígena é um verdadeiro atlas de tecnologias para salvar o mundo, mas como não são convenientes para os sistemas instaurados, não são interessantes para quem só pensa em lucro. Me agrada muito a fala da ministra Marina Silva sobre substituirmos a ideia de “desenvolvimento” por “envolvimento”, para que renovemos nosso pacto com a mãe-terra, mas enquanto os povos indígenas não liderarem a conversa sobre o clima e as empresas aprenderem seu papel secundário no debate, enquanto as enevas, alcoas e vales ainda tiverem seus lugares à mesa, essa ecologia realmente não passará de jardinagem.
Imagem: Reprodução
Sobre o autor
Jan Santos é autor de contos e novelas, especialmente do gênero Fantasia. Mestre em Literatura pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e com graduações em Língua Portuguesa e Inglesa, é um dos membros fundadores do Coletivo Visagem de Escritores e Ilustradores de Fantasia e Ficção Científica, além de vencedor de duas edições dos prêmios Manaus de Conexões Culturais (2017-2019) e Edital Thiago de Mello (2022).
A pesquisa é uma das primeiras a abordar as perdas e danos na porção brasileira do bioma de maneira integrada, destacando a perspectiva social entre as áreas impactadas pelos efeitos das mudanças climáticas.
Novos dados
Os novos dados destacam que os prejuízos relacionados ao clima na região somam mais de 650 milhões de dólares por ano e chegam a 5,7 bilhões de dólares se considerado o período de 2000 a 2022. Segundo cientistas, as cidades amazônicas com menos de 50 mil habitantes são as que mais sofrem.
“As mudanças climáticas estão multiplicando a pobreza na Amazônia. Nossos dados mostram que os municípios menores — onde vivem a maioria dos povos indígenas — estão perdendo quase 10% do seu crescimento econômico por causa de desastres climáticos. Isso é o retrato de uma crise silenciosa e desigual que exige respostas urgentes baseadas em justiça”, avalia Patrícia Pinho, diretora adjunta de pesquisa do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) e uma das autoras.
De acordo com o estudo, as perdas econômicas na região devido a extremos climáticos cresceram 370% de 2000 a 2022. Os setores mais impactados são a agricultura, pecuária, além de infraestrutura e serviços de saúde.
Pessoas indígenas e de comunidades tradicionais da Amazônia são 75% da população afetada. Foto: Alex Pazuello/Secom-AM
Desastres climáticos na Amazônia
A pesquisa destaca a ocorrência de 4.792 desastres climáticos na Amazônia brasileira em todo o período analisado – considerando, ainda, que a frequência de fogo aumentou 10 vezes; de inundações, 5 vezes; de secas e ondas de calor, 3 vezes.
A variação no clima, em um ciclo criado e retroalimentado por atividades humanas, oferece riscos também à segurança alimentar e nutricional. Para a pesquisadora, isso faz com que os impactos na agricultura sejam subestimados.
Perdas residuais, como classifica o artigo, são consideradas na conta dos impactos, tais como a perda de território e de bem-estar. A dimensão subjetiva humana inclui a não mais identificação entre indivíduo e entorno, seja porque a localidade foi destruída e/ou perdeu condições de habilidade, seja pela perda de entes queridos.
“Crianças submetidas a situações de desastres iniciam a vida em desvantagem imposta, tendo como ponto de partida o déficit em saúde, alimentação, desenvolvimento, e socialização. Há riscos graves de erosão cultural e de aumento na migração forçada no Brasil, e sobretudo na Amazônia, pois eventos extremos climáticos estão ocorrendo com mais frequência, intensidade e de forma composta; as pessoas estão perdendo a capacidade de se adaptar”, acrescenta Pinho.
O estudo indica que não basta reconhecer desigualdades: deve haver colaboração com uma justiça distributiva e com suporte social e tecnológico para as pessoas atingidas pelos extremos do clima.
A principal recomendação é a criação de um fundo específico de perdas e danos para a Amazônia, a exemplo do fundo de perdas e danos global resultado da COP27, que prevê a destinação de recursos por países ricos, emissores históricos, a países pobres, insulares ou em desenvolvimento, que pouco contribuíram para o superaquecimento global e que, no entanto, enfrentam os maiores impactos.
“Criar um fundo de perdas e danos para a Amazônia, sobretudo perdas não materiais e econômicas, como perdas de saúde, modo de vida e cultura, da forma preconizada pelo Artigo 8 do Acordo de Paris, ajudaria a melhorar a resposta das cidades amazônicas que estão sob alto risco. Se a Amazônia está nos olhos do mundo, devemos ter condições de direcionar apoio para a proteção da floresta e da biodiversidade, sim, mas para a manutenção da vida das pessoas também”, conclui a autora.
O Bumbódromo Márcio Paz Menacho, em Guajará-Mirim (RO), foi palco de uma grande celebração no último fim de semana, com a realização do festival Duelo na Fronteira. O Boi-bumbá Malhadinho conquistou o título de campeão 2025, chegando ao tricampeonato.
A apuração ocorreu na segunda-feira (17) e marcou o encerramento de mais uma edição do festival. O evento foi realizado pelo governo de Rondônia, por meio da Secretaria de Estado da Cultura, Esporte e Lazer (Sejucel), com apoio da Prefeitura de Guajará-Mirim e da Associação Cultural Waraji.
Neste ano, o Boi Malhadinho apresentou o tema ‘Somos Amazônidas’ destacando a essência da identidade regional e a riqueza cultural da Amazônia. O espetáculo foi marcado por criatividade, efeitos visuais, alegorias grandiosas e coreografias que deram vida ao enredo.
Carregando décadas de história, o boi é símbolo de resistência cultural e mantém vivo o legado das comunidades que construíram essa manifestação artística ao longo dos anos.
Para o governador de Rondônia, Marcos Rocha, o festival é mais que uma competição, é uma das maiores celebrações da cultura do estado. “O evento é uma oportunidade de celebrar as tradições da nossa região. O governo tem investido e trabalhado para apoiar iniciativas que valorizem nossa identidade e fortaleçam a cultura do nosso povo”, ressaltou.
O secretário da Sejucel, Paulo Higo Ferreira, destacou o resultado e a qualidade da apresentação: “O Malhadinho trouxe um espetáculo belíssimo, inspirado no tema ‘Somos Amazônidas’ e demonstrou seu compromisso com a cultura de Guajará-Mirim. Continuaremos trabalhando para fortalecer o Duelo na Fronteira e todas as manifestações culturais do nosso estado”.
Entre os torcedores o clima era de festa e orgulho. O guajaramirense José Almeida, admirador do Malhadinho, expressou a alegria da nação azul.
“É emocionante demais! O Malhadinho representa nossa história, nossa gente. Esse tricampeonato enche o coração da gente de orgulho. É a vitória do povo!”, comemorou.
Comemoração do Boi Malhadinho. Foto: Bruno Erpidio
O presidente da Associação Cultural Waraji, Paulo Santos, evidenciou a importância do festival e o compromisso conjunto com o fortalecimento da cultura: “Cumprimentamos a equipe campeã e o povo guajamirense, pois é quem mais se fortalece com o evento, produzindo uma reação em cadeia na economia, no fortalecimento da cultura local e no bem-estar social da comunidade”.
Gigante e impressionante. Esta é a aranha-golias, a maior aranha do mundo, encontrada em áreas de floresta da Amazônia. Podendo chegar a 30 centímetros, ela assusta à primeira vista, principalmente quem sofre de aracnofobia.
Mas apesar do tamanho, essa caranguejeira não é tão perigosa quanto parece. Seu veneno paralisa presas, mas em humanos causa náuseas, suor excessivo e dor local, nada que represente risco de vida.