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Prefeitura de Boa Vista inaugura iluminação em LED na avenida Brasil

A obra contempla mais de 9 km de extensão, com 264 postes e mil luminárias. Foto: PMBV

Dezembro chegou ainda mais iluminado, sobretudo em uma das principais vias de acesso à capital Boa Vista. Nesta segunda-feira, 1º, o prefeito Arthur Henrique inaugurou a iluminação em LED da avenida Brasil (BR-174, sentido sul). O trecho vai da Praça Simón Bolívar até o viaduto do Anel Viário, no bairro Airton Rocha. A obra contempla mais de 9 km de extensão, com 264 postes e mil luminárias, garantindo mais segurança, mobilidade e qualidade de vida para a população.

“A iluminação da Avenida Brasil representa um avanço significativo para Boa Vista, especialmente por se tratar de uma das principais entradas da cidade, com grande fluxo de veículos e pedestres. A obra só foi possível graças à municipalização do trecho em 2022 e agora estamos garantindo mais segurança e qualidade de vida para quem circula por aqui. Boa Vista segue avançando, sendo uma das primeiras capitais do país com iluminação 100% em LED”, disse o secretário municipal de Conservação Pública, Daniel Lima.

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As luminárias de LED oferecem maior durabilidade, economia de energia e melhor qualidade luminosa. Foto: PMBV

Os recursos para a obra foram destinados por meio de emenda parlamentar do senador Chico Rodrigues e executadas pela Secretaria Municipal de Conservação Pública.

Eficiência

As luminárias de LED substituem as antigas de vapor de sódio, oferecendo maior durabilidade, economia de energia e melhor qualidade luminosa. Com até 60 mil horas de vida útil, reduzem custos de manutenção e
são ambientalmente mais seguras, por não conterem metais pesados e ajudarem na redução das emissões de CO₂.

Conforto, segurança e qualidade de vida em Boa Vista

Maria das Neves aprovou iluminação. Foto: PMBV

Durante a inauguração, moradores acompanharam o acendimento das luzes e comemoraram a tão aguardada iluminação. “Era muito difícil passar aqui. Esse trecho era tanto escuro quanto deserto, a partir de certa hora. Ficava perigoso. Agora está essa maravilha. Nós esperamos muito por isso. É muita história e lembranças, a gente se emociona”, contou Maria das Neves, moradora do São Bento há 20 anos.

Moradores conferiram acendimento das luzes. Foto: PMBV

Aos 12 anos, a estudante Geovana Lima acompanhou o acendimento ao lado da irmã e da avó, Nilza Batista. “Aqui era muito perigoso. Eu não via nada quando a gente brincava do lado de fora e agora está muito iluminado. Eu achei muito bom!”, contou a estudante.

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Para Nilza, o sentimento é de conquista e transformação. “Antigamente, a gente vivia na escuridão, uma escuridão onde as crianças não podiam nem brincar direito. E eu fico grata hoje. Por esse trabalho de iluminar a nossa avenida. É qualidade de vida para nós, moradores”, destacou.

*Com informações da prefeitura de Boa Vista

Estudante do Amapá vence prêmio por criação de kit solar portátil para castanheiros

Estudante do Amapá venceu Prêmio Jovem Cientista. Foto: Divulgação/Ifap

A estudante Manuelle da Costa Pereira, de 23 anos, do Instituto Federal do Amapá (Ifap), venceu a categoria Ensino Superior do 31º Prêmio Jovem Cientista com um kit de energia solar portátil criado para castanheiros da Amazônia.

Ela é a primeira pesquisadora do estado a conquistar o prêmio. O anúncio foi realizado em cerimônia realizada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em Brasília, no dia 26 de novembro.

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O projeto foi apresentado na COP30, conferência da ONU sobre mudanças climáticas realizada em Belém (PA). A solução busca substituir os motores a diesel, caros, poluentes e pesados, que dificultam o deslocamento dos extrativistas na floresta.

“Nosso objetivo é transformar a expectativa em realidade: um equipamento acessível, adaptado às necessidades locais e capaz de reduzir a pegada de carbono. Para isso, será essencial obter financiamento e apoio institucional”, disse a estudante.

O kit passou por várias etapas de prototipagem até chegar ao modelo final. O peso caiu de 1.000 litros para apenas 50, o que permite transportar o equipamento em uma mochila. O custo foi de cerca de R$ 2,8 mil, com reaproveitamento de bombonas descartadas.

Kit de energia solar portátil criado para castanheiros da Amazônia. Foto: Divulgação/Ifap

Segundo a pesquisadora, o kit atende às necessidades básicas dos castanheiros, como iluminação noturna, preparo de alimentos e comunicação. Antes, a maioria dependia de geradores a diesel, que têm alto custo e impacto ambiental.

Pesquisa de campo

A pesquisa começou em 2022, com apoio de uma bolsa de Iniciação Tecnológica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Isso permitiu que Manuelle estudasse soluções sustentáveis sem sair de sua cidade natal, Laranjal do Jari (AP).

Integrante do Centro de Estudos em Ecologia e Manejo na Amazônia, ela acompanhou o cotidiano de extrativistas da vila São Francisco do Iratapuru.

Estudante do Amapá vence Prêmio Jovem Cientista com kit solar portátil para castanheiros. Foto: Divulgação/CNPq

Registro e próximos passos

Em 2023, Manuelle e o orientador Diego Armando Silva da Silva registraram o kit como modelo de utilidade no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), com apoio do Núcleo de Inovação Tecnológica do IFAP.

“A premiação recebida pela estudante Manuelle reconhece o trabalho da pesquisa realizada nos últimos anos no sul do Amapá, com foco em comunidades extrativistas e melhorias para comunidades tradicionais da Amazônia. A equipe está feliz com o reconhecimento nacional. A mensagem é de gratidão às pessoas e instituições, especialmente ao Ifap e à Fapeap, pelo apoio financeiro ao projeto”, descreveu o orientador.

O projeto está alinhado aos princípios da Amazônia 4.0 e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. A próxima etapa é aperfeiçoar o equipamento para ampliar sua eficiência nas comunidades extrativistas.

*Por Rafael Aleixo, da Rede Amazônica AP

Pesquisadores do Maranhão aprimoram carga e descarga em navios com inteligência artificial

Inteligência Artificial em carga e descarga em navios. Foto: Divulgação/Marinha do Brasil

Hora de tomar o café da manhã, com um pão quentinho! Mas você já pensou qual é o caminho trilhado pelo café, açúcar ou o trigo do pão até chegarem às gôndolas do supermercado? Uma grande parcela dessa resposta está no transporte marítimo.

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Gigantes que singram os mares de um canto do mundo a outro, por milhares de quilômetros, os navios graneleiros são equipados para transportar enorme quantidades de carga solta.

Isso significa que produtos como soja e minério de ferro, dentre outros itens em massa, podem ser movimentados de forma eficiente e econômica no comércio global.

Pesquisadores do Maranhão aprimoram carga e descarga em navios com inteligência artificial
A inteligência artificial do IFMA gerou um método mais barato, rápido e confiável para aplicação em operações portuárias. Foto: Reprodução/IFMA

Porém, o processo de carregamento de navios nos portos, especialmente dos graneleiros (grãos), é complexo e meticulosamente planejado, devido envolver muitas etapas críticas, desde a preparação inicial até o abastecimento final dos porões.

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Um dos grandes problemas no processo de carga e descarga de navios graneleiros é a chuva.

“Muitos produtos como fertilizantes, trigo e açúcar, dentre outros, são sensíveis à água e molhar a carga significa atrasos consideráveis e prejuízos com a perda do produto e aplicação de multas altíssimas no caso de atraso de entrega”, ressalta o pesquisador Omar Andres Carmona Cortes.

O projeto desenvolvido pelo professor do IFMA sugere a utilização de uma rede neural convolucional – uma solução inovadora baseada em Aprendizagem Profunda, que integra a Inteligência Artificial (IA) – para a detecção do momento de fechamento. “Trata-se de uma solução muito mais barata do que a baseada em Lidar e muito mais segura do que usar uma pessoa para essa verificação”, destaca o pesquisador.

Omar Cortes (1º à esq.) e os seus orientandos, Carlos Pimentel e Roberto Reis, que trabalham com aplicações portuárias. Foto: Reprodução/IFMA

Lidar (Light Detection and Ranging) é uma tecnologia óptica de detecção remota que utiliza a luz laser para medir distâncias e detectar objetos em um ambiente. “A tecnologia utilizada em outros portos, baseada em Lidar, permite escanear o navio, mas é um processo lento que exige uma infraestrutura de alto custo”, explica Omar.

Com a solução proposta, é preciso apenas uma câmera, que pode ser fixa ou até mesmo instalada em um drone.

“Essa característica abre portas para outras áreas acadêmicas, como o caso do drone, por exemplo, que pode gerar outros projetos para dar suporte à aplicação da técnica”, avalia Omar Cortes.

Sintonia entre pesquisadores e o setor produtivo

O projeto surgiu por meio da iniciativa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) em parceria com a Sociedade Brasileira para o Desenvolvimento da Indústria de Tecnologia da Informação (Softex).

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O objetivo foi promover o desenvolvimento da indústria de tecnologia da informação e comunicação (TIC) no país e popularizar o conhecimento em Aprendizagem de Máquina e Aprendizagem Profunda, subáreas da Inteligência Artificial.

O trabalho se transformou em uma dissertação de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Engenharia da Computação e Sistemas da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), onde Omar Cortes atua como professor permanente. “A base de dados está sendo incrementada e formas de melhorar a velocidade de detecção em tempo real estão sendo testadas”, mencionou.

Método e resultados

A metodologia da investigação utilizada foi a Cross Industry Standard Process for Data Mining (CRISP-DM), que pode ser traduzido como Processo Padrão Interindústrias para Mineração de Dados. “Ela é utilizada por especialistas em mineração de dados para atacar problemas reais, sendo adequada também para problemas a serem atacados usando Aprendizagem de Máquina”, frisou o pesquisador.

Parte da equipe do projeto Softex que atua com inteligência artificial. Foto: IFMA

Os resultados preliminares mostraram que a Yolo v4 (You Only Look Once, algoritmo avançado de detecção de objetos em imagens e vídeos) possui alta acurácia na detecção, mas baixa velocidade em tempo real. Por outro lado, o Fast Yolo (versão otimizada do YOLO) possui alta velocidade de detecção, mas uma acurácia menor. Além disso, a Fast Yolo v4 se mostrou sensível a ausência de luz, enquanto a Yolo v4 é capaz de realizar uma detecção eficiente nesse cenário de baixa luminosidade. “Espero que outros mestrandos tenham interesse no tema para continuarmos a produzir melhorias tecnológicas e inovadoras”, ressalta Omar.

Leia também: Modelo de Inteligência Artificial para gestão e validação de patentes é desenvolvido no Inpa

O pesquisador aponta, ainda, os benefícios da pesquisa para o Maranhão. “Em primeiro lugar está o treinamento de pessoas altamente especializadas em Aprendizagem de Máquina, o que é fundamental para o desenvolvimento da ciência e tecnologia do Maranhã”, avalia. “E consequentemente, em segundo lugar, está o desenvolvimento do IDH [Índice de Desenvolvimento Humano] do Maranhão, já que há uma correlação direta entre o IDH e a produção científica”, aponta.

Omar Cortes e 20 anos de Inteligência Artificial 

Omar Cortes e 20 anos de Inteligência Artificial. Foto: UFMA

A experiência de Omar Cortes na aplicação de Inteligência Artificial na indústria começou por volta de 2005, envolvendo projetos desenvolvidos para as empresas Cemar e Alumar. Por volta de 2017, o pesquisador passou a trabalhar o tema de visão computacional inteligente, que corresponde à aplicação de Inteligência Artificial em imagens.

O trabalho se deu através da orientação de iniciações científicas no IFMA, direcionadas à identificação de câncer em imagens histopatológicas. “Com a experiência adquirida, passei a aplicar esse conhecimento no Programa de Pós-Graduação em Engenharia da Computação e Sistemas [PECS, da Universidade Estadual do Maranhão/UEMA].

O pesquisador do IFMA informa que a oportunidade de desenvolver o trabalho partiu de problemas apresentados pela EMAP durante a execução do Projeto Softex de Residência em Tecnologias da Informação e Comunicações (TIC).

Ainda no âmbito do Projeto Softex, o pesquisador se dedica à pesquisa de contagem de passageiros no ferryboat da Softex, também usando IA, com o orientando Roberto Reis. Omar Cortes também está desenvolvendo projeto de identificação de defeitos em defensores no Porto do Itaqui através de imagens. A iniciativa é financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo edital de Produtividade em Desenvolvimento Tecnológico.

“É o meu o projeto de bolsista produtividade, em que conto com estudante de mestrado e um de Iniciação Científica, em cooperação”, informa. O estudante de mestrado, Davi Matos de Carvalho, aluno regular do PECS – UEMA, está desenvolvendo o trabalho “Uma CNN para detecção de defeitos em defensas no porto do Itaqui” e João Pedro Ruas Brasil, de Iniciação Científica, aborda a Utilização de Redes Generativas Adversariais no Aumento de Dados na Detecção de Defeitos em Defensas”. “Temos bastante trabalho pela frente e espero que isso fortaleça o laço entre o IFMA e a EMAP”, conclui.

*Com informação do IFMA

Cartografia cidadã: como mapas se tornaram ferramentas para reivindicação de direitos

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Atlas do Chão: projeto de mapeamento digital identifica lugares no mundo relacionados com processos de colonização e urbanização. Imagem: Projeto Atlas do Chão/Ana Luiza Nobre e David Sperling (coords), 2020 – em andamento

Após mais de 15 anos de espera por um processo paralisado de demarcação de terras, em 2024 o povo indígena Borari, de Alter do Chão (PA), decidiu fazer por conta própria os mapas de seu território. O documento, elaborado com apoio técnico da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), incluiu rios, trilhas e áreas sagradas que não apareciam na cartografia estatal.

Já na comunidade de Poço da Draga, em Fortaleza (CE), os moradores utilizaram, em 2016, celulares e mapas digitais para registrar suas condições de saneamento e moradia. Os dados levantados contrariavam informações oficiais de censos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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Parte de um movimento global conhecido como virada espacial ou cartográfica, experiências como essas são analisadas pelo arquiteto e urbanista David Sperling, professor do Instituto de Arquitetura e Urbanismo e vice-coordenador do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos, no livro Cartografias críticas: Ensaios tecnopolíticos e geopoéticos (Rio Books).

Lançada em outubro, a obra é resultado de sua tese de livre-docência, defendida em 2023. No trabalho, o pesquisador mostra como nas últimas quatro décadas os mapas, que historicamente funcionaram como instrumentos de controle territorial por governos e organizações militares (ver Pesquisa FAPESP nº 318), foram ressignificados por comunidades, artistas e ativistas.

Tradicionalmente, os tipos de mapas mais comuns têm a pretensão de funcionar como espelhos da realidade: envolvem delimitações de fronteiras e divisões administrativas do território, relevo e elementos naturais na paisagem e também trazem informações sobre o clima, a população ou a economia de determinados lugares.

“Já os mapas contemporâneos, enquadrados no que chamamos de campo ampliado das cartografias, diferem dos tradicionais ao questionar sua natureza e função”, explica Sperling.

De acordo com o pesquisador, esses novos usos são marcados por duas dimensões. A primeira envolve a produção de mapas como ferramentas de disputa por territórios com o Estado e grandes corporações, misturando elementos físicos com aspectos culturais das pessoas que os habitam. Essa vertente compreende os mapas como construções sociais, priorizando a identificação de redes de relações socioespaciais, mais do que coordenadas geográficas e fronteiras políticas. Já a segunda dimensão abarca o uso simbólico e artístico de cartografias, entendendo esses documentos como plataformas para imaginar e criar novos mundos.

Para Sperling, essas transformações tiveram início nos anos 1980, quando um conjunto de geógrafos, filósofos, arquitetos, urbanistas e pesquisadores dos estudos sociais passou a questionar a ideia de que a cartografia era uma ciência objetiva.

Um dos marcos dessas reflexões foi o texto Deconstructing the map, escrito pelo geógrafo britânico Brian Harley (1932-1991), em 1989. Nesse trabalho, Harley se apoia em proposições de filósofos como Michel Foucault (1926-1984) e Jacques Derrida (1930-2004), que sustentam que mapas são dispositivos de poder e devem ser analisados tanto pelos elementos que incorporam como por aquilo que deixam de lado.

“Naquela década, ganhou força uma leitura que passou a enxergar a cartografia como uma construção ideológica atravessada por decisões políticas e estéticas. Assim, ela não apenas representa, como também produz realidades”, observa Sperling.

Outro marco dessa virada, de acordo com o geógrafo Renato Emerson Nascimento dos Santos, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), foi a promulgação da Constituição de 1988, que passou a reconhecer as culturas, línguas, os costumes e as tradições de povos indígenas do país. Além disso, a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 1990, estabeleceu direitos de autodeterminação para comunidades tradicionais de todo o mundo. No Brasil, as duas medidas abriram caminho para que esses grupos começassem a incorporar novas formas cartográficas para representar as suas territorialidades.

Na esteira desse processo, o economista Henri Acselrad, da UFRJ, recorda que a partir dos anos 1990 um movimento significativo de demarcação e titulação de terras envolvendo comunidades e povos tradicionais emergiu em diversos países da América Latina. “Esse fenômeno esteve frequentemente associado à disseminação de práticas conhecidas como mapeamentos participativos ou cartografias sociais. Essas iniciativas implicaram uma ruptura simbólica e política com o monopólio estatal sobre a produção cartográfica”, diz Acselrad, coordenador do coletivo de pesquisa Desigualdade Ambiental, Econômica e Política daquela universidade.

Segundo o pesquisador, em vez de retratar o território com pretensões objetivas, como se os mapas fossem espelhos fiéis da realidade, essas novas formas de fazer cartografia propõem que os documentos devam incorporar os elementos que a própria comunidade considera relevantes. Entre eles, por exemplo, estão espaços considerados sagrados para comunidades indígenas e regiões de rios e lagos onde as pessoas pescam.

“Em um sentido filosófico, esse tipo de cartografia transcende a simples representação do espaço geográfico, transformando-se em um método de pesquisa que mapeia processos e conexões, especialmente visando à produção da subjetividade”, comenta a geógrafa Gisele Girardi, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

Leia também: Entenda as etapas de demarcação de terras indígenas

Além desses movimentos, Santos, da UFRJ, aponta avanços tecnológicos registrados a partir da década de 1980 como outros fatores que motivaram a ampliação no uso e desenvolvimento de mapas.

“O cenário se transformou ainda mais entre os anos 1990 e 2000, com a disseminação de determinadas tecnologias. Sistemas de Informação Geográfica [SIG], dispositivos de posicionamento global [GPS], softwares de sensoriamento remoto e o livre acesso a bases de dados e imagens via internet ampliaram as possibilidades de atuação das comunidades”, reforça.

Com isso, segundo ele, a cartografia, que até então era restrita a instituições estatais e militares, passou a integrar práticas locais de planejamento e reivindicação territorial.

O projeto Quebradas Maps é voltado à cartografia de regiões periféricas de São Paulo Foto: Divulgação/ Quebrada Mapas

Nesse sentido, Santos menciona o projeto Grande Carajás, lançado pelo governo federal em 1982, que previa a construção de infraestrutura para exploração mineral na floresta amazônica, do Pará ao Maranhão. O mapa estatal elaborado para colocar a iniciativa em prática ignorava a existência de populações que viviam na região, como ribeirinhos, quilombolas e indígenas. Para questionar essas ausências, o antropólogo Alfredo Wagner Berno de Almeida, da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), criou em 2003, em parceria com outras instituições do país, o projeto Nova Cartografia Social da Amazônia.

A iniciativa, considerada pioneira no país, busca apoiar povos e comunidades tradicionais na criação de seus próprios mapas, utilizando ferramentas tecnológicas. Ao reunir registros construídos a partir da perspectiva desses grupos, o projeto pretende oferecer um retrato da ocupação territorial na região e funcionar como instrumento de fortalecimento de lutas sociais.

“Quando os povos originários e tradicionais da Amazônia foram apagados do mapa estatal no projeto Grande Carajás, eles decidiram produzir um documento alternativo como estratégia para dar visibilidade à sua existência e defender o seu território”, explica Girardi.

Inspiradas por essa experiência, outras comunidades têm criado suas próprias cartografias para contestar lacunas identificadas em mapas oficiais. O geógrafo Dorival Bonfá Neto, que hoje atua como técnico em assuntos educacionais na Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), participa de algumas dessas iniciativas, acompanhando processos de autodemarcação territorial conduzidos por comunidades indígenas na região de Santarém (PA).

Um desses projetos envolveu o povo Borari, em Alter do Chão, que aguardava a demarcação de seu território pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) desde 2009. Os mapas oficiais utilizados no processo não abarcavam lugares centrais à vida da comunidade, incluindo áreas consideradas sagradas e outras no rio Tapajós utilizadas para pesca.

Entre o começo de 2024 e fevereiro de 2025, os indígenas Borari decidiram elaborar uma cartografia alternativa, por meio de apoio técnico do Núcleo de Pesquisas sobre Espaço, Política e Emancipação Social (Nepes), vinculado ao curso de geografia da Ufopa, onde Neto atuava como docente naquele ano. O projeto, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), envolveu a realização de sobrevoos com drones, mapeamentos por imagem, registros de uso e ocupação do solo, além da coleta de dados geográficos orientados por memórias e narrativas de famílias locais.

A partir dessas informações, foi elaborado um novo mapa, propondo a autodemarcação da Terra Indígena Borari de Alter do Chão (ver abaixo). O documento passou a fazer parte do processo oficial de demarcação da Funai e poderá subsidiar ações jurídicas, como demandas ao Ministério Público Federal (MPF).

Alexandre Affonso / Revista Pesquisa FAPESP sobre imagem de FERNANDES, R. Z. (coord.). Relatório de autodemarcação da Terra Indígena Borari de Alter do Chão. 2025

“A produção dessas cartografias dá visibilidade a territórios historicamente marginalizados e fortalece a capacidade de comunidades de reconhecer, nomear e defender seus próprios espaços”, enfatiza a arquiteta e urbanista Mariana Quezado Costa Lima, que faz doutorado na Universidade Federal do Ceará (UFC). No estudo, ela investiga de que forma comunidades urbanas de Fortaleza têm usado mapas como ferramentas para defender direitos, incluindo a negociação de planos diretores, a cobrança de infraestrutura e a resistência a remoções.

Um exemplo nesse sentido aconteceu em 2016, quando um grupo de moradores da comunidade Poço da Draga, na capital cearense, realizou um censo, incluindo variáveis como situação da moradia, escolaridade e renda da população. O resultado revelou discrepâncias com os dados oficiais. Outro exemplo citado pela pesquisadora é o uso de mapas pelo Observatório da Zeis Bom Jardim, organização de um conjunto de comunidades invisibilizadas e localizadas na periferia sudoeste de Fortaleza, para pressionar a gestão estatal a melhorar as condições de saneamento e moradia da região.

Girardi, por sua vez, comenta que o mapeamento de regiões vulneráveis se disseminou pelo país, especialmente com o uso de plataformas on-line como GoogleMaps e OpenStreetMap, sendo o Quebrada Maps uma iniciativa significativa elaborada na cidade de São Paulo desde 2015. O projeto trabalha com comunidades da periferia para criar mapas que destacam a cultura local, as histórias e os desafios enfrentados nesses espaços.

A arquiteta e urbanista Clarissa Sampaio Freitas, da UFC, explica que para realizar esse tipo de mapeamento as comunidades precisam, muitas vezes, apoiar-se em parcerias com universidades e organizações não governamentais. “Essas instituições oferecem oficinas de capacitação técnica para ensinar as pessoas a trabalhar com ferramentas para a elaboração de mapas, incluindo programas como o QGIS e o Google Earth”, comenta Freitas, ao pontuar que Fortaleza tem um dos maiores índices de assentamentos informais precários do Brasil.

Sobre iniciativas promovidas em outros países, Sperling menciona o projeto Iconoclasistas, criado em 2006 na Argentina com a proposta de articular metodologias de mapeamento colaborativo com comunidades periféricas e indígenas. Essa iniciativa oferece oficinas de formação, reúne e divulga resultados de processos de cocartografia que aliam saberes locais e acadêmicos, muitas vezes com apoio de instituições culturais e universidades públicas (ver mapas abaixo).

“No mundo, há mapeamentos feitos por skatistas que propõem repensar o direito da juventude à cidade, mapas feitos em tricô por grupos de mulheres para denunciar o descaso do poder público com inundações, plataformas com imagens on-line para combater o assédio sexual, denunciar crimes do Estado e de corporações econômicas contra populações minoritárias”, complementa Girardi.

Ela destaca que algumas dessas experiências foram compiladas no livro This is not an Atlas, publicado pelo grupo alemão Kollektiv Orangotango, em 2018.

Em relação a projetos que elaboram propostas de caráter artístico, Sperling menciona o Canal Motoboy, criado em 2006 por Antoni Abad. O artista catalão distribuiu celulares com câmeras para motoboys percorrerem espaços públicos e privados do estado de São Paulo, registrando imagens e vídeos que são publicados em um site. Ao descreverem seus registros com palavras-chave, esses profissionais colaboram para a construção de uma base de dados multimídia coletiva. “O projeto funciona como uma espécie de cartografia audiovisual da metrópole vista a partir do banco da moto, revelando percursos, ritmos e modos de vida dos motoboys”, propõe Sperling.

O pesquisador cita, ainda, o Atlas do Chão, plataforma colaborativa criada em 2020 por ele e pela arquiteta e urbanista Ana Luiza Nobre, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). A ideia é mapear pontos ligados a processos de colonização, descolonização e urbanização, permitindo que os usuários possam criar conexões entre lugares e compartilhar narrativas geográficas.

Outra iniciativa são os trabalhos do artista plástico brasileiro Marcelo Moscheta, que utiliza deslocamentos e fronteiras como matéria estética. Moscheta, que atualmente faz doutorado em arte contemporânea na Universidade de Coimbra, em Portugal, percorre trajetos mapeados por GPS e realiza coleta de dados no solo e por meio de geolocalização para criar obras que discutem “a precisão da cartografia e a falibilidade da experiência sensível”.

Um dos exemplos nesse sentido é a obra Fixos e fluxos, desenvolvida após uma residência artística realizada no deserto do Atacama, no Chile, em 2013. Em entrevista por telefone, Moscheta explicou que a obra tem como referência conceitos do geógrafo Milton Santos (1925-2001), segundo os quais os pontos fixos são representados por espaços de permanência e pela estrutura dos lugares, enquanto os fluxos são os deslocamentos que atravessam esses territórios.

Partindo dessas ideias, o artista percorreu de carro trechos do deserto chileno com o GPS ligado, gravando na tela a sua rota. Depois, buscou essas coordenadas no Google Earth, realizou capturas de tela em alta resolução e imprimiu-as sobre placas de alumínio. Em cada quadrante da imagem, ele inseriu uma chapa de cobre para criar uma composição que sobrepõe a representação algorítmica do satélite com a experiência corpórea do espaço. “Cartografia não é exatidão. É sempre uma interpretação, seja do cartógrafo, seja do artista”, sugere Moscheta.

Fixos e fluxos, obra do artista visual Marcelo Moscheta desenvolvida no deserto do Atacama, no Chile, com o uso de GPS e imagens de satélite. Imagem: Marcelo Moscheta/Galeria Vermelho/Divulgação

Sperling destaca, no entanto, que se por um lado a ampliação das cartografias impulsiona processos criativos e produção de mapas comunitários, por outro, grandes empresas do mundo da tecnologia, como o Google, que assentam seus negócios em aplicativos geolocalizados, convertem os dados gerados em mercadoria. No livro recém-lançado, o pesquisador da USP investiga as implicações políticas de tecnologias contemporâneas, questionando sua suposta neutralidade. “Sensores, sistemas de georreferenciamento e bancos de dados massivos são dispositivos atravessados por relações de poder, capazes de moldar comportamentos e intensificar mecanismos de vigilância e controle com base em algoritmos”, constata.

Como exemplo dessa dinâmica, o pesquisador menciona plataformas como Airbnb, que, com o aluguel de estadias temporárias, valoriza determinados bairros. “A expansão desse tipo de locação tem intensificado processos de gentrificação, encarecendo o custo de vida e expulsando populações de áreas centrais, enquanto o turismo avança sobre espaços tradicionalmente residenciais”, comenta.

Com a proposta de elaborar um projeto cartográfico independente de tecnologias de grandes corporações, o sociólogo Sérgio Amadeu, da Universidade Federal do ABC (UFABC), desenvolveu em 2020 um mapeamento colaborativo de ações de solidariedade durante a pandemia de Covid-19. Na ocasião, ele identificou, com uma equipe de pesquisa interdisciplinar, iniciativas organizadas por associações de bairro, coletivos culturais, sindicatos e organizações não governamentais em periferias e favelas da Região Metropolitana de São Paulo. “Esses grupos buscavam suprir lacunas nas políticas públicas, oferecendo apoio material e emocional a pessoas em situação de vulnerabilidade”, comenta.

Assim, o Mapa das Práticas Colaborativas de Combate à Covid-19 foi criado em código aberto e hospedado em servidores independentes. Iniciativas como distribuição de alimentos, produção de marmitas e apoio psicológico podiam ser registradas na plataforma. “No auge da pandemia, mais de 1,8 mil iniciativas foram cadastradas no sistema”, conta o pesquisador. O projeto, no entanto, enfrentou dificuldades estruturais ao deixar de receber recursos da universidade em 2021, de forma que o mapa foi retirado do ar. “Hoje estamos tentando reconstituí-lo com a proposta de seguir difundindo ações de solidariedade. Entretanto, sem financiamento de longo prazo, iniciativas como essa não se sustentam, especialmente se pretendem funcionar sem depender de tecnologias de grandes empresas”, finaliza o sociólogo.

A reportagem acima foi publicada com o título “Cartografia ampliada” na edição impressa nº 357, de novembro de 2025.

Artigos científicos

ACSELRAD, H. e VIEGAS, R. N. Cartografía Social en Brasil y en la América Latina: Desafíos epistemológicos y metodológicos de mapeos contra-hegemónicos de los espacios y territoriosCuadernos de Geografia. v. 30. 2021.
COSTA LIMA, M. Q. e FREITAS, C. F. S. Do mapa à mobilização: Impactos da cartografia para reivindicação de direitos na periferia de Fortaleza. Anais do XXI Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (Sessão Temática). Campina Grande: Realize Editora, 2025.
COSTA LIMA, M. Q. e FREITAS, C. F. S. Subvertendo Censo, museu e mapa: Narrativas insurgentes em territórios informais de Fortaleza. Anais do Quarto URBfavelas: Seminário Internacional de Urbanização de Favelas. São Paulo (SP). USP, 2024.
FROTA, N. e FREITAS, C F. S. Descolonizando o planejamento para a proteção socioambiental: uma experiência na periferia de Fortaleza, Brasil. Bitácora Urbano Territorial [S. l.], v. 34, n. 2, 2024.
GIRARDI, G. Da necessidade de retrabalhar a cartografia geográfica em novos termos. Terra Livre. [S. l.], v. 2, n. 63, 2024.
SANTOS, R. E. dos. et al. Sobre cultura e cidade: Lutas por memória e as gramáticas espaciais urbanas. Versus: Revista de Ciências Sociais Aplicadas do CCJE/UFRJ. v. 12, 2024.

Livro
SPERLING, David. Cartografias críticas: Ensaios tecnopolíticos e geopoéticos. Rio de Janeiro: Rio Books, 2025.

Relatório
FERNANDES, R. Z. (coord.). Relatório de autodemarcação da Terra Indígena Borari de Alter do Chão. Santarém, 2025.Republicar

*O conteúdo foi originalmente publicado pela Revista Pesquisa Fapesp, escrito por

Foto rara mostra lenda do reggae Jimmy Cliff em show histórico em Roraima

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Foto rara mostra a lenda do reggae Jimmy Cliff cantando no Ginásio Canarinho em 1991. Foto: Marinho da Luz/Acervo pessoal

O público roraimense à loucura, um bingo e… um astro internacional do reggae? É difícil de acreditar. Mas isso aconteceu e está presente na memória e na história de quem viveu Roraima nos anos 1990. A lenda jamaicana Jimmy Cliff cantou para uma multidão apaixonada em um show histórico no Estádio Canarinho, em Boa Vista.

O show aconteceu no dia 6 de outubro de 1991 em um evento promovido pelo Sindicato dos Taxistas, logo após um bingo com prêmios. Não havia celulares, câmeras digitais ou filmadoras portáteis na época. Por isso, registros do momento são raros de encontrar — quem curtiu o show, realmente curtiu o momento.

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A imagem, tingida pelas luzes avermelhadas do palco e com textura típica de fotografia analógica, mostra Jimmy Cliff sorrindo, dançando com os braços, com energia e vestindo um traje característico, colorido, com detalhes que remetem à estética jamaicana.

A foto é do acervo pessoal do percussionista Marinho da Luz, de 56 anos, que – à época com 22 anos – tocou em uma das bandas que abriu o show de Cliff e pôde ver o astro do palco. O registro foi feito com uma câmera analógica emprestada de um amigo. Câmeras analógicas precisam que o filme seja revelado após tirar a foto.

“O show estava abarrotado. Era Jimmy Cliff, a lenda! Lotou de cabo a rabo aquele ginásio”, relembra Marinho.

Jimmy Cliff, lenda do reggae, morreu aos 81 anos, no dia 24 de novembro. De acordo com um comunicado divulgado pela mulher do cantor, Latifa, o músico sofreu uma convulsão seguida de pneumonia.

Ele é considerado um dos pioneiros do reggae e responsável por levar o gênero ao cenário internacional. O músico jamaicano ganhou dois Grammy com os álbuns Cliff Hanger (1985) e Rebirth (2012) – esse último também apareceu na lista dos “50 Melhores Álbuns de 2012” da Rolling Stone.

O show aconteceu em um momento que Cliff morava no Brasil. O artista tinha fortes relações com a Bahia: morou em Salvador, fez shows com Gilberto Gil, gravou com Margareth Menezes, Olodum e Ara Ketu, posou com a camisa do Bahia e teve uma filha em Salvador, a cantora e atriz Nabiyah Be.

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“Quem viveu, viveu para contar”

Marinho conta que o palco foi montado com tábuas de madeira. O mastro de bandeiras do estádio aparece ao lado do cantor, reforçando o improviso daquela noite — e a grandiosidade do momento.

Na foto, é possível ver instrumentos de percussão, cabos, estruturas metálicas e parte do público que cercava o palco improvisado, elevado com tábuas de madeira.

A banda de Marinho fez o show de abertura e também o pós-show de Cliff. Ele destaca a forte comunidade maranhense que vive em Roraima e esteve em peso no show, afinal, São Luís do Maranhão é a capital nacional do reggae.

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“Nós ficamos a metros dele, sentindo a vibração da banda, do público, do som. Não tinha ninguém tirando foto, ninguém filmando. Era para viver. A gente tocou antes, depois esperou, acompanhou. Eu tinha umas duas ou três fotos dessa noite, mas o tempo levou. Só sobrou essa e ainda bem que sobrou”.

“A comunidade maranhense, que sempre amou reggae, estava inteira lá. Nunca vi o Canarinho como vi naquele dia. Quem viveu, viveu pra contar”, relembra o músico.

“Tocar antes de Jimmy Cliff parecia impossível. Eu tremia”

Outro músico que também participou de um dos shows que abriram para Jimmy Cliff foi Sousa Filho, hoje com 58 anos. Maranhense, ele havia se mudado há pouco tempo para Boa Vista. À época com 24 anos, tocou guitarra antes da lenda do reggae.

“Eu escutava Jimmy Cliff desde menino, lá no Maranhão. Era aquele sonho distante, inalcançável. Quando disseram que eu ia tocar antes dele, eu tremia. A gente ensaiava com medo de errar, medo de ser pequeno demais para um artista tão grande”.

“O estádio estava lotado de um jeito que eu nunca tinha visto. Era tanta gente que eu nem lembro se toquei certo”, relembra o músico que também assistiu a apresentação de Jimmy Cliff no palco.

Ele diz que a memória mais viva não é do que tocou, mas do que sentiu quando o cantor subiu ao palco. De acordo com Sousa, tinha gente que não conseguiu entrar no estádio e precisou apenas ouvir o show de fora.

“Quando ele apareceu, o estádio virou mar. Gente gritando, cantando, chorando, subindo em grade, em ombro, em arquibancada. Eu vi tudo de cima do palco, a poucos metros dele. E parecia mentira”.

Sousa relembra que o músico tentou encerrar o show três vezes — mas não conseguia, pois o público implorava por mais. Em um dos momentos mais emocionantes, Cliff voltou para o palco apenas com o tecladista e tocou a música “Peace”, que na época era sucesso por ser trilha sonora da novela “Felicidade”, de Manoel Carlos.

“Dizia tchau, virava as costas, e o público não ia embora. Parecia que ninguém aceitava que acabou. Quando as luzes quase apagaram, o tecladista puxou ‘Peace’, sozinho. Aí o estádio explodiu. Todo mundo voltou correndo, gritando, chorando, cantando”, relembra.

Foto rara mostra a lenda do reggae Jimmy Cliff cantando no Ginásio Canarinho em 1991 — Foto: Arquivo Pessoal/Marinho da Luz
Foto: Marinho da Luz/Acervo pessoal

“Eu cobri do palco. Ele era grande, mas simples”

A jornalista Consuelo Oliveira, hoje com 65 anos, tinha 31 anos, também estava ali cobrindo o evento pela Rede Amazônica (que à época se chamava TV Roraima). Ela não tem imagens, mas tem lembranças que nenhum arquivo poderia substituir.

Consuelo inclusive chegou a entrevistar Jimmy Cliff no hotel, antes do show. Algo que a jornalista relembra como uma “honra”.

“Você imagina a emoção bem pertinho dele, da banda, e vendo o público delirando, foi assim, uma coisa inesquecível, uma multidão mesmo, fantástico. Um dos pontos altos da minha carreira jornalística”.

Ela diz que o que mais marcou naquele dia não foi apenas o show, mas a pessoa por trás da lenda Jimmy Cliff.

“Se eu pudesse definir, seria isso: a simplicidade. Ele é um grande astro, né? Uma figura da dimensão dele, mas ele tinha uma simplicidade, atendeu a gente com uma tamanha gentileza, boa vontade, e também simplicidade na forma de olhar o mundo, de descomplicar as coisas, nas mensagens que ele deixava”.

Mesmo sem imagens, ela afirma que nada apaga o que viveu naquela noite, do hotel ao palco, do microfone à multidão.

*Por Caíque Rodrigues, da Rede Amazônica RR

Projeto reforça a resistência ancestral em Rondônia

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Imersão em arqueologia pública e educação patrimonial em Costa Marques, Rondônia. Foto: Divulgação/UNIR

Durante o mês de novembro, o Quilombo Forte Príncipe da Beira, localizado no município de Costa Marques (RO), foi palco do evento A Terra é Meu Quilombo. A iniciativa promoveu uma imersão em arqueologia pública e educação patrimonial, unindo moradores e moradoras do quilombo, pesquisadoras da Universidade Federal de Rondônia (UNIR) e da Universidade Federal de Sergipe (UFS), além de parceiros, em uma série de atividades que incluem escavações arqueológicas comunitárias, oficinas e rodas de conversa.

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O principal objetivo do evento é utilizar a arqueologia como instrumento de luta e fortalecimento identitário. A proposta vai além da pesquisa acadêmica tradicional, adotando uma prática decolonial e antirracista, na qual o conhecimento científico dialoga de forma horizontal com os saberes tradicionais da comunidade.

Costa Marques, Rondônia
Quilombo Forte Príncipe da Beira, localizado no município de Costa Marques, em Rondônia. Foto: Divulgação/UNIR

Trata-se de uma iniciativa da Associação Quilombola do Forte Príncipe da Beira (ASQFORTE), em parceria com a Universidade Federal de Rondônia (UNIR), por meio do curso de Arqueologia, e está vinculado ao projeto de pesquisa “Arqueologia Histórica em Porto Velho, Rondônia: Coisas, Pessoas, Conflitos, Apagamentos e Resistências”, sob a coordenação da professora Juliana Santi (UNIR).

As escavações ocorrerão em quintais familiares e em uma área coletiva, com participação direta dos quilombolas, transformando-se em um espaço de troca, aprendizado e reconstrução da memória.

“Não estamos apenas procurando fragmentos do passado. Estamos desenterrando as provas materiais da nossa longa existência aqui, resgatando uma história que foi sistematicamente apagada. Cada fragmento encontrado no nosso quintal é um fio que tece a narrativa da nossa resistência e fortalece o nosso direito a esta terra”, afirma Lulu, presidente da ASQFORTE.

Programação aberta à comunidade

Quilombo Forte Príncipe da Beira, localizado no município de Costa Marques, em Rondônia. Foto: Divulgação/UNIR

Além das escavações, o evento contou com uma programação diversificada e aberta ao público. Veja o que aconteceu na programação abaixo:

  • Oficinas de Audiovisual “Nós por Nós Mesmos”: Jovens quilombolas serão capacitados para produzir um documentário contando sua própria história.
  • Círculo de Mulheres “A Força que Vem da Terra”: Um espaço seguro para debater o papel central das mulheres na defesa do território.
  • Cine-Diálogo no Dia da Consciência Negra: Exibição de filmes seguida de debate sobre resistência e cultura negra.
  • Criação de um “Mapa da Memória”: Um painel coletivo que integrará os achados arqueológicos com as histórias de vida e os lugares sagrados da comunidade.

Sobre o Quilombo Forte Príncipe da Beira

É uma comunidade tradicional formada a partir do século XVIII por africanos e africanas escravizados, indígenas que estavam presentes no período da construção do Forte Príncipe da Beira e pessoas que fugiram de outros quilombos destruídos na região, como o Quilombo do Piolho. 

Localizado às margens do Rio Guaporé, na fronteira com a Bolívia, o quilombo é um dos nove territórios quilombolas oficialmente reconhecidos pela Fundação Palmares no estado de Rondônia.

Leia também: Estudo revela 632 territórios quilombolas na Amazônia Legal

Sua história é marcada pela resistência à escravidão e, atualmente, pela luta contínua pela titulação de suas terras tradicionais, essenciais para a preservação de seu modo de vida, que inclui agricultura itinerante, pesca, coleta e a manutenção de saberes ancestrais. O quilombo é, portanto, um guardião vivo da história afro-brasileira e um símbolo de resistência cultural na Amazônia.

*Com informação da Universidade Federal de Rondônia (UNIR)

Oreobates shunkusacha: Nova espécie de rã é descoberta no Parque Nacional Cordillera Azul no Peru

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Rã da espécie Oreobates shunkusacha é considerado em perigo de extinção. Foto: Divulgação/Agência Andina

Uma nova espécie de rã foi descoberta no Peru, graças a uma pesquisa realizada por uma equipe de cientistas peruanos e internacionais. A espécie foi encontrada no Parque Nacional Cordillera Azul e recebeu o nome de Oreobates shunkusacha. Este último termo significa “Coração da floresta” na língua quíchua-lamista.

O trabalho que levou a esse resultado foi liderado por Ernesto Castillo-Urbina, cientista do Departamento de Herpetologia do Museu de História Natural da Universidade Nacional de San Marcos (UNMSM). 

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Cientistas da Universidade Técnica de Brunswick e da Coleção Zoológica do Estado de Munique, na Alemanha, também participaram deste trabalho de descoberta da espécia, que envolveu a Associação Nature Conserv’Action, na França, a organização não governamental Ararankha e comunidades locais organizadas.

A Cordilheira já é conhecida por abrigar espécies ainda não registradas: relembre AQUI.

Nova espécie de rã é descoberta no Parque Nacional Cordillera Azul no Peru
Oreobates shunkusacha: Nova espécie de rã é descoberta no Parque Nacional Cordillera Azul no Peru

O Parque Nacional Cordillera Azul está localizado entre os departamentos de San Martín, Loreto, Ucayali e Huánuco. A descoberta ocorreu em um de seus corredores ecológicos, localizado na zona de amortecimento.

Características da espécie

Ela habita as florestas primárias de planície das Yungas, localizadas a uma altitude entre 1351 e 1600 metros acima do nível do mar.

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A rã caracteriza-se pela pele dorsal granulosa, ausência de pregas dorsolaterais e de almofadas nupciais nos machos. Seus olhos possuem íris verde-dourada com reticulação preta.

Devido ao espaço que habita – estimado em menos de 500 quilômetros quadrados – esta espécie de rã é considerada em perigo de extinção.

O status foi confirmado por meio de análise genética do DNA mitocondrial e estudos morfológicos. Os detalhes dessa descoberta foram publicados na revista especializada Zenodo.

*Com informações da Agência Andina

Pesquisa destaca rede colaborativa como modelo para avançar o conhecimento sobre a biodiversidade amazônica

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Pesquisa destaca rede colaborativa como modelo. Foto: Reprodução/Arquivo/Secom AM

Uma pesquisa publicada na revista Proceedings of the Royal Society B, dia 25 de novembro, traz evidências inéditas sobre o papel das redes científicas na produção de sínteses integradas da biodiversidade da Amazônia.

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O estudo “Collaborative research networks as a strategy to synthesize knowledge of Amazonian biodiversity”, que apresenta o INCT-SinBiAm como caso de referência, reforça a urgência de políticas ambientais baseadas em ciência e marca um avanço estratégico para a conservação e a ecologia da maior floresta tropical do planeta.

Pesquisa “Collaborative research networks as a strategy to synthesize knowledge of Amazonian biodiversity”. Foto: Unifesspa

A publicação demonstra como redes colaborativas de pesquisa podem transformar a maneira como o conhecimento sobre a Amazônia é produzido, analisado e aplicado. Em um momento em que a região enfrenta pressões crescentes, como desmatamento, degradação de habitats e mudanças climáticas, o artigo destaca que apenas iniciativas científicas de grande escala, integradas e sustentadas por colaboração interinstitucional, são capazes de oferecer respostas consistentes para desafios tão complexos.

O INCT em Síntese da Biodiversidade Amazônica (INCT-SinBiAm) é apresentado como um modelo bem-sucedido dessa abordagem. A rede reúne 47 instituições do Brasil e do exterior, articulando pesquisadores, bases de dados, métodos e diferentes expertises científicas para produzir sínteses robustas e de alta relevância ecológica e política. Seu trabalho integra informações sobre florestas e ecossistemas aquáticos, identifica padrões de biodiversidade, mapeia ameaças e orienta práticas e políticas ambientais e educacionais.

Além de organizar e difundir conhecimento estratégico, a rede também atua na formação de novas gerações de cientistas, educadores e gestores, comprometidos com a conservação e o uso sustentável da Amazônia. Com isso, o INCT-SynBiAm se consolida como uma iniciativa fundamental para enfrentar os desafios socioecológicos das regiões tropicais, servindo de referência internacional para futuras redes de pesquisa colaborativa.

Dados da pesquisa

A UNIFESPA faz parte do INCT SinBiAm e de outras redes colaborativas como o Centro Integrado da Sociobiodiersidade Amazônica (CISAM) e do PPBIO da Amazônia Oriental (PPBIO AmOr), sua posição geográfica, missão institucional e crescente inserção em redes de pesquisa amazônicas reforça sua missão institucional de fazer a diferença com e para a população Amazônida.

Localizada em uma região-chave da Amazônia, marcada por desafios socioambientais complexos e historicamente sub-representada na infraestrutura científica nacional, a universidade desempenha um papel singular ao formar pesquisadores que conhecem o território, as comunidades e seus conflitos de perto.

O reitor da UNIFESSPA, professor Francisco Ribeiro da Costa, ressalta que, a universidade reúne busca contribuir de forma estratégica com redes colaborativas como o INCT-SinBiAm. Para ele, a presença da instituição no sudeste do Pará, aliada ao seu compromisso com a ciência amazônica, reforça seu papel na produção de conhecimento territorialmente enraizado:“Assim, a universidade não aparece como um mero receptor periférico de redes consolidadas, mas como um ponto de virada: uma instituição amazônica capaz de liderar, propor e articular ciência colaborativa a partir do próprio território, exatamente como defende o artigo.”

A publicação na Proceedings of the Royal Society B reforça, portanto, a importância da ciência produzida de forma integrada, colaborativa e comprometida com a sustentabilidade da Amazônia, um passo decisivo para unir conhecimento, tecnologia e políticas públicas na proteção da biodiversidade.

Leia a pesquisa na íntegra e conheça os resultados completos no link.

*Com informação da UNIFESPA

Banzeiro da Esperança na COP30: Encontro entre ciência e medicina ancestral é necessária para proteger conhecimento tradicional

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Extratos naturais da medicina ancestral. Foto: Fernanda Soares/Rede Amazônica

A Amazônia é uma das maiores farmácias naturais do mundo, já que muito antes da criação de qualquer laboratório, os povos originários preparavam e ensinavam o uso de plantas para aliviar dores, tratar inflamações, combater infecções e enfrentar diversos problemas de saúde.

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Marta Chagas Monteiro, professora do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará (UFPA) e coordenadora do projeto INCT PROBIAN Amazônia, explica que o uso das plantas na medicina ancestral dos povos originários já é algo documentado e amplamente praticado há séculos.

Esse conhecimento constitui um saber que hoje orienta e dialoga com pesquisas científicas que reforçam a importância de valorizar e proteger o conhecimento tradicional.

Para quem nasce na Amazônia, o uso de óleos, extratos e infusões naturais faz parte da rotina como ir ao mercado. No entanto, para estrangeiros e visitantes, essas práticas são vistas como exóticas ou até mesmo como lendas e reforçam a importância de valorizar e certificar esses usos. 

“Eu sou daqui e venho de uma comunidade que se utilizava de produtos naturais. Então, para mim é um orgulho trazer esse saber e unir com a ciência para ver até que ponto, na verdade, de uma certa forma, esses saberes são comprovados cientificamente”, comentou Monteiro. 

Coleta do murumuru, por exemplo, também garante a renda de diversos lares. Foto: Pedro Devani/Secom AC

Leia também: Conheça quais plantas são mais utilizadas na fitoterapia e como remédios naturais

O reconhecimento desse saber ancestral exige não apenas validação científica, mas também processos legais que garantem os direitos das comunidades.

Por isso, o INCT PROBIAN mantém uma advogada especializada em comunidades tradicionais, responsável por mediar e formalizar o processo de utilização do conhecimento e da repartição justa desses benefícios.

Segundo a professora, é preciso ter muito cuidado com os interesses que existem por trás desses conhecimentos, já que muitas vezes as indústrias farmacêuticas e de cosméticos nem sempre possuem a percepção de que esse saber vem de uma comunidade tradicional.

A ciência e o potencial das plantas

Nem toda descoberta científica parte de um saber ancestral, embora muitas delas tenham essa origem. Dessa forma, os estudos desenvolvidos pelas equipes da UFPA e de instituições parceiras, como o Museu Emílio Goeldi e o Instituto Evandro Chagas, combinam a relação entre a ciência e os saberes tradicionais com trabalho de campo e análises laboratoriais. 

Em alguns casos, a pesquisa começa diretamente com o saber ancestral, já em outros casos, começa do zero, por meio de mapeamentos e screenings, testes iniciais que avaliam se um extrato ou óleo apresenta atividade contra bactérias, fungos, vírus ou processos inflamatórios

“Você pode fazer esses screenings baseados, muitas vezes, na característica daquele extrato, daquele óleo. Aí você direciona para uma determinada doença que você imagina, que você tenha essa percepção que possa ter atividade, ou que possa desenvolver uma melhora clínica”, explica a professora. 

Assim, de acordo com Monteiro, o processo começa com a identificação de componentes e, baseado neles, avalia-se a possibilidade de ter atividade antimicrobiana, antiparasitária e imunológica. Em alguns casos, a ciência apenas comprova aquilo que as comunidades tradicionais já sabem instintivamente, como com a andiroba e a copaíba.

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Andiroba, remédio ancestral, em comércio do Amazonas. Foto: Heloise Bastos/Portal Amazônia

Além disso, o processo de utilização do conhecimento ancestral diz que:

  • Toda pesquisa que utiliza saber comunitário precisa indicar a origem.
  • Sistemas, como o Sistema Nacional de Gestão do Patrimônio Genético e do Conhecimento Tradicional Associado (Sisgen), exigem o cadastro das informações genéticas acessadas e o reconhecimento das comunidades envolvidas.
  • Qualquer benefício gerado – comercial, tecnológico ou intelectual -, precisa ser repartido.

A comprovação científica exige etapas rigorosas, já que antes de um fitoterápico chegar até as pessoas, ele precisa passar por testes de toxicidade, estudos pré-clínicos, desenvolvimento farmacêutico, formulação adequada e avaliação e autorização da Anvisa.  

Proteção do saber ancestral

As diversas propriedades das plantas amazônicas foram estudadas e patenteadas por pesquisadores estrangeiros, muitas vezes sem reconhecimento da origem do conhecimento. Mas, segundo a legislação brasileira, nenhum recurso natural que constitui o conhecimento popular ancestral pode ser patenteado, nem planta, nem extrato e nem óleo.

O que eu posso patentear são as atividades que aquele extrato apresentou, mas não posso patentear os princípios ativos, porque aquilo é intrínseco da planta. A não ser que você faça uma modificação química naquele constituinte, mas aqui no Brasil não há possibilidade de patente de produtos que venham da natureza. Eu não posso patentear uma bactéria, porque ela é fonte desse bioma, então, o que nós patenteamos? O uso”, esclarece Marta. 

Ou seja, o que pode ser patenteado é o uso descoberto pela pesquisa científica, ou uma formulação farmacêutica desenvolvida a partir dele. Isso significa que uma pomada, um comprimido ou uma modificação química inédita pode receber patente, mas a planta, os óleos e os extratos em si, não.

Leia também: A floresta que cura: entre o saber ancestral e a ciência que transforma

Marta explica também que em vários países, como o Japão, patentes desse tipo são permitidas e por isso algumas patentes estrangeiras já foram revertidas após a comprovação que o conhecimento ancestral vinha de comunidades tradicionais.

“Algumas patentes de fora já foram revertidas para a nossa legislação. Porque eles foram, patentearam, e nós provamos que eram produtos provenientes da Amazônia e dos biomas daqui do Brasil, e por isso foi possível reverter”.

Por fatores como esse, ferramentas como o Sisgen e novas exigências legais buscam assegurar que as comunidades tradicionais recebam o reconhecimento e a repartição justa dos benefícios quando seus conhecimentos ancestrais forem utilizados em pesquisas e produtos.

Especial COP30

A entrevista com a coordenadora do projeto INCT PROBIAN Amazônia, Marta Monteiro, faz parte de uma sequência especial dedicada à Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima – Conferência das Partes (COP30) do programa ‘Bate-papo na CBN’, da rádio CBN Amazônia Belém (102,3 FM ).

Com o olhar de quem vive na região, o programa reuniu informações e entrevistas sobre toda a movimentação da 30ª edição do encontro mundial realizado em Belém (PA), realizado entre os dias 10 e 22 de novembro. 

🌱💻 Saiba mais sobre a COP30 aqui

Bate papo CBN especial sobre conhecimento ancestral e ciência
Foto: Reprodução/Youtube-CBN Amazônia

Além da ciência e do conhecimento ancestral, o especial também debateu a diversificação da matriz energética mundial, que segue ainda altamente dependente de combustíveis fósseis nocivos ao meio ambiente.

O doutor em engenharia elétrica e membro do Centro Excelência em Eficiência Energética da Amazônia (Ceamazon), Bruno Albuquerque, explicou o que e quais são os benefícios das fontes de energia renovável, os desafios de cada tecnologia e a importância de combinar diferentes tipos de fontes para melhorar o sistema energético.

O professor também comentou as pesquisas desenvolvidas pelo Ceamazon envolvendo microredes, mobilidade elétrica e soluções energéticas para comunidades isoladas.

Com oito episódios, os programas da rádio, apresentados pela jornalista Brenda Freitas, também ganharam versões especiais no canal Amazon Sat e no Portal Amazônia.

Assista as entrevistas completas no quarto episódio da edição especial do programa:

Veja outras matérias da série:

Banzeiro da Esperança

A iniciativa Banzeiro da Esperança é uma parceria entre Fundação Amazônia Sustentável (FAS), Fundação Rede Amazônica (FRAM) e Virada Sustentável, com patrocínio do Banco da Amazônia (BASA). Esta edição do Banzeiro da Esperança é uma jornada de conexão, troca de saberes e transformação com foco na COP30.


Festa da Revolução Acreana do bairro 6 de Agosto é patrimônio imaterial de Rio Branco

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Apresentação de comemoração da Revolução Acreana do bairro 6 de Agosto. Foto: Reprodução/Rede Amazônica AC

A comemoração da Revolução Acreana, feita anualmente no bairro 6 de Agosto, em Rio Branco (AC), passa a ser patrimônio cultural imaterial do município. A decisão está na Lei Municipal nº 2.615, sancionada e publicada no dia 25 de novembro no Diário Oficial do Estado, e garante proteção às expressões que marcam a festa histórica, como dança, vestuário, vocabulário, costumes e desfiles.

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O texto aponta que o município deve promover ações de preservação e valorização por meio de políticas públicas, editais, pesquisas, programas culturais e iniciativas que assegurem a continuidade das manifestações.

Além disso, o objetivo é garantir que a tradição permaneça viva e registrada, mantendo as práticas relacionadas à memória da Revolução Acreana e à formação da comunidade local.

O reconhecimento consolida também uma tradição que atravessa décadas e está diretamente ligada à formação do bairro, criado há 121 anos no Segundo Distrito, cujo nome faz referência direta à data em que o conflito começou. A região, inclusive, foi criada dois anos após o início da Revolução Acreana.

Além do desfile cívico, moradores costumam distribuir alimentação gratuita. Foto: Reprodução/Rede Amazônica AC

Uma das festas mais antigas da cidade

Seis de Agosto é um dos primeiros bairros de Rio Branco e foi onde as primeiras comunidades da capital se estruturaram e cresceram. Em 2025, o bairro completou 121 anos.

A comunidade faz, há cerca de 40 anos, uma programação que reúne desfile cívico, atividades culturais, jogos tradicionais e ações comunitárias que mobilizam moradores e reforçam vínculos locais.

Leia também: Consciência Limpa encerra com balanço positivo em Rio Branco: “vimos as crianças engajadas”

A rua principal da região é considerada uma das mais antigas do Acre, elemento que também reforça o valor histórico da celebração. Ao longo dos anos, a festa passou a simbolizar pertencimento e resistência.

Revolucionários sobre o comando de Plácido de Castro - revolução acreana
Revolucionários sobre o comando de Plácido de Castro durante operação na selva acreana em 1903. Foto: A Epopéia do Acre Silvio Augusto de Bastos Meira. 2° edição /Acervo: Liberalino Alves de Souza/ Acervo Digital: Deptº de Patrimônio Histórico e Cultural – FEM

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Ligação com a Revolução Acreana

A escolha da data da festa não é aleatória. No dia 6 de agosto de 1902, há 123 anos, começaram os confrontos que marcaram a Revolução Acreana, movimento liderado por brasileiros que viviam na região e resistiam ao controle boliviano sobre o território.

O conflito teve origem na disputa pela exploração do látex, que desde a década de 1870 atraía migrantes vindos do Nordeste para a área então chamada de “Aquiry”.

Os confrontos se estenderam até 1903, quando o Acre foi incorporado ao Brasil após o Tratado de Petrópolis. A data também coincide com o dia da independência boliviana, o que na época ajudou a surpreender tropas adversárias durante o início da ofensiva.

*Por Jhenyfer de Souza, da Rede Amazônica AC