Conheça as misteriosas pedras pintadas por povos nativos da Amazônia

Através de pinturas e gravuras sobre as superfícies rochosas, esses primeiros povos descreviam elementos do seu cotidiano

Dentre as diversas formas de registros arqueológicos, a arte rupestre atravessa gerações sendo considerada uma das principais formas de expressão das primeiras civilizações que habitaram a terra. Na Amazônia não poderia ser diferente, a região possui inúmeros sítios arqueológicos. Desde o período anterior à colonização, os povos indígenas retrataram a cosmologia, mitos de criação e ancestralidade, deixando um legado nesses sítios.

Esses sítios são amparados pela Constituição Federal, conforme lei nº 3924 de 1961, os monumentos arqueológicos que existem em todo território nacional ficam sob proteção do poder público, sendo considerado um bem da união, patrimônio que deve ser preservado por todos.

Pensando em conhecer mais sobre a história por trás dessas pedras misteriosas, o Portal Amazônia conversou com a arqueóloga Marcela Andrade, da Universidade Federal do Pará (UFPA), especialista em arte rupestre e patrimônio cultural. Também conversamos com o antropólogo Irmânio Sarmento, da Universidade Federal de Roraima (UFRR), que trabalha com povos indígenas.

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Pedra Pintada do Perdiz (RR). Foto: Cedida/ Jorge Macêdo

Essas pedras pintadas são designadas como arte rupestre, esse termo é utilizado para descrever desenhos feitos por povos antigos, que utilizavam superfícies rochosas para expressar suas crenças através de pinturas e também de gravuras. Essas pedras pintadas ou gravuras são consideradas sítios arqueológicos.

“É importante destacar que alguns desses sítios também estão localizados em áreas indígenas, fazendo parte da cosmologia desses povos que são ligados aos mitos da criação. Existe uma relação desses povos originários de respeito e ancestralidade com esses desenhos que são deixados na rocha. Também é importante destacar a relação das pessoas e comunidades que moram ao redor desse patrimônio, que vivem ali diariamente com esses sítios e a importância delas preservarem esse patrimônio, assim como todos nós”, 

destacou a arqueóloga.

As pinturas das pedras pintadas na Amazônia foram feitas a partir de um pigmento com acréscimo de algum tipo de aglutinante, por exemplo água, gordura ou clara de ovo. Já as gravuras foram feitas com a retirada das rochas com o auxílio de ferramentas, é possível gerar um sulco na superfície rochosa.

“Para os pigmentos vermelho e amarelo, geralmente são utilizados óxidos de ferros, como a hematita para o vermelho e a goethita para pigmento amarelo. Para o pigmento preto são utilizados o carvão ou manganês, já o pigmento branco o caulim ou argila. Esses pigmentos são triturados e raspados, formando um pó e ele é acrescentado em uma substância líquida ou gelatinosa para unir esses grãos e formar um pigmento”, revelou a especialista. 

Posteriormente, essa tinta é aplicada na rocha para fazer a pintura. As pinturas são feitas a mão, esses povos antigos também fabricavam pincéis a partir das cerdas do pelo de animais.

“Com base nos estudos de Edithe Pereira, que realizou pesquisas em centenas de sítios rupestres no Pará, foram identificados motivos geométricos como círculos, cruzes e volutas. Outros motivos são o que chamamos de antropomorfos, que é a representação da figura humana. Então, temos antropomorfos inteiros, a representação só da cabeça ou registros das mãos desses antropomorfos. Também tem registro de zoomorfos, que são relacionados às formas de animais. Conseguimos reconhecer peixe-boi, cobra, sapo, pássaro, também temos a identificação de biomorfos”, esclareceu a arqueóloga Marcela Andrade

Em toda a Amazônia existem registros de inúmeros sítios arqueológicos com pinturas rupestres. Algumas das mais conhecidas ficam no Pará e em Roraima, conforme estudos o Pará concentra mais de 130 sítios somente de arte rupestre. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) registrou mais de 87 sítios em Roraima. 

Sítios abertos à visitação

Pará

O Pará possui uma variedade de sítios em seus municípios, as gravuras geralmente estão localizadas ao longo do curso dos rios, e as pinturas geralmente estão em cavernas ou em paredões rochosos. Os sítios arqueológicos mais famosos por suas pinturas são a Pedra do Coração, Pedra da Sentinela, Pedra da Tartaruga, Serra da Lua e Gruta da Itatupaoca. Na região, também existe o Parque Estadual de Monte Alegre que abriga a Caverna da Pedra Pintada, Pedra do Mirante, Painel do Pilão e Pedra do Pilão.

Dentre esses sítios, existem dois que são abertos à visitação com estruturas preparadas para receber os visitantes, sendo eles a Serra da Lua e a Pedra do Mirante.

Considerada a primeira ação e musealização de sítio arqueológico de arte rupestre no Pará, o Parque Estadual Monte Alegre foi inaugurado em 2018. Conforme estudos, a Pedra Pintada que fica dentro do Parque possui pinturas que datam cerca de 10.450 anos antes de Cristo (a.C).

“Existem estudos que explicam que parte das figuras rupestres em Monte Alegre também estão associadas a grupos ceramistas, então elas não estão associadas apenas às primeiras ocupações. Temos a datação relativa que comprova a associação da fabricação desses pigmentos, desde a primeira ocupação e sua intensificação a partir dos grupos ceramistas”, contou a arqueóloga Marcela.

Roraima

Em Roraima, dentre as diversas pedras pintadas, existem algumas que ficaram mais conhecidas. São elas a Pedra do Pertiz, a Pedra do Pereira e a Pedra Pintada, que ficam na Terra Indígena São Marcos, que ainda estão em processo de estudos para fins turísticos. Uma das únicas abertas ao público é o Petróglifo de São Luiz do Anauá, no Sítio Arqueológico Arara Vermelha.

“Todos os sítios têm igual importância para compreender o processo antigo de ocupação humana na Amazônia. Ainda estou em processo de pesquisa, mas tenho a teoria de que Roraima possui no Lavrado esse aspecto geomorfológico que abriga o maior parque cerâmico associado à arte rupestre e lítico em bom estado de conservação do Brasil”, finalizou o antropólogo Irmânio Sarmento. 

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