Arqueólogo explica porquê a história da cidade perdida de Ratanabá não é verídica

“Do ponto de vista arqueológico, isso não tem nenhuma base científica. Só para lembrar, há 450 milhões de anos nem os dinossauros estavam na Terra”, explica o diretor e coordenador do Núcleo de Arqueologia e Etnologia do Museu da Amazônia (MUSA), Filippo Stampanoni.

A suposta teoria da cidade perdida de Ratanabá causou um burburinho nas redes sociais. Similar a teorias da conspiração, como das cidades perdidas de ‘Z‘, ‘Akakor‘, ‘Paititi‘, ‘Cidade dos anos 3000‘, que possuem narrativas parecidas, a nova teoria também relata a existência de uma cidade super desenvolvida, com riquezas exuberantes e templos feitos de ouro. No entanto, nenhuma dessas teorias foi comprovada cientificamente.

A teoria de Ratanabá narra que uma cidade existe abaixo da Amazônia brasileira, na divisa entre os Estados do Mato Grosso, Amazonas e Pará. Banhada em ouro, a suposta cidade perdida teria sido fundada por uma civilização batizada pelos autores da teoria de ‘civilização Muril’, a “primeira civilização da humanidade”.

O Portal Amazônia conversou com o diretor e coordenador do Núcleo de Arqueologia e Etnologia do Museu da Amazônia (MUSA), Filippo Stampanoni, para esclarecer os motivos do porquê essa história não é verídica. 

Para contextualizar, Filippo explica que de forma geral, as Américas foram os últimos continentes a serem ocupados pelo Homo sapiens. O tempo seria de alguns poucos milhares de anos e não os 450 milhões conforme espalhado pela teoria.

“Pelas informações que se tem da arqueologia, a gente sabe que as Américas de forma geral foram os últimos continentes a serem ocupados por Homo sapiens. Hoje em dia, se tem de forma geral, tem datas, sítios mais antigos que tem em torno de 40 mil anos, 30 mil anos ,mas são ainda pouquíssimos”,

comenta.

Foto: Reprodução/Imazon

Ao redor da Amazônia, os primeiros sítios a serem datados são de 20 mil anos. Um exemplo deles é o aparecimento de um sítio arqueológico no Mato Grosso em torno de 25 mil anos. Mas, de acordo com o pesquisador, os dados ainda são muito dispersos.

“A gente tem dados extremamente fortes que mostram que há 12 mil anos, a Amazônia já era ocupada pelas populações indígenas que hoje em dia continuam presentes na região. Ou seja, os ancestrais dos grupos indígenas que ocupam ainda a região amazônica. Hoje em dia, o sítio mais antigo conhecido na Amazônia brasileira tem mais ou menos essas datas, 12, 13 mil anos e se encontra no Pará, em Monte Alegre. Uma coisa certa e muito evidente a partir das pesquisas arqueológicas é que nesses períodos mais antigos provavelmente se tinha uma ocupação um pouco menos densa do território, e a Amazônia começa a ser densamente povoada em torno do primeiro milênio depois de Cristo, ou seja, do ano 0 pra frente até o período da chegada da invasão dos europeus, da “conquista””, 

explica o arqueólogo.

Outro ponto que reforça os “furos” históricos da teoria é a mistura imagens de outros locais para justificar sua existência, como fotos do Labirinto de Bahia Redonda, em Costa Marques, município de Rondônia.

Leia também: A verdade sobre os supostos túneis subterrâneos de Ratanabá

Nenhuma das possíveis “provas” a respeito de Ratanabá tem comprovação científica, como reforça Filippo:

“Do ponto de vista arqueológico, isso não tem nenhuma base científica. Só para lembrar, há 450 milhões de anos nem os dinossauros estavam na Terra. Então estamos falando de uma notícia que não tem nenhum tipo de ligação com qualquer dado científico, qualquer teoria científica que exista, que tenha minimamente algo de concreto. Estamos falando de uma invenção. Agora, invenções e fantasias sobre cidades perdidas na floresta, etc, elas acompanham a história desde muito tempo, a gente pode pensar até no continente de Atlântida, na cidade de Atlântida, dos gregos que imaginavam a existência desse continente, dessa cidade. O continente perdido de Mu, o Eldorado, as 7 cidades de Cibola, a cidade perdida de Z. Enfim, existem um monte de histórias que falam de cidades perdidas, é um assunto romântico que sempre conquistou a atenção do público, mas sem nenhuma base científica”,

argumentou o arqueólogo.

Foto: Divulgação

Além disso, existem imagens de figuras rupestres mencionadas como parte das comprovações de presença humana dessas “civilização Muril”, mas existem dados e estudos que mostram onde toda a arte rupestre amazônica foi feita pelas populações indígenas que moravam antigamente na região.

Filippo inclusive informou que existe uma publicação produzida por arqueólogos em conjunto com conhecedores indígenas que foram visitar todos esses locais e realizaram análise arqueológica e uma análise do significado dentro das culturas indígenas.

É possível encontrar cidades “futuristas” perdidas na Amazônia?

Quando se fala de cidades futuristas, com super tecnologias e banhadas em ouro, como visto em filmes por exemplo, a resposta para essa questão não é muito boa para quem acredita nas histórias das famosas cidades perdidas.

De acordo com o arqueólogo, a resposta é “não”, uma vez que não existem evidências de que isso possa ser possível na Amazônia. 

“Em relação à riqueza, se você pensa questões de grande quantidades de ouro, templos, etc, a gente não tem evidências disso na Amazônia. Pouquíssimas semanas atrás foi publicado um estudo feito por uma equipe que trabalha há muito tempo na Amazônia boliviana, na região do Lhamos de Mojos, que demonstra, graças a várias pesquisas de campo e sobretudo o sobrevoo com a tecnologia do Lidar, a ocorrência na região de grandes assentamentos que podem ser quase definidos como cidades de baixa densidade com estruturas de terra como montículos, não diria pirâmides. Mas, enfim, grandes estruturas de terras e caminhos, estradas que ligam um assentamento ao outro, um núcleo ao outro e também estruturas para manejo do ambiente e para com fins econômicos”,

destacou o diretor e coordenador do Núcleo de Arqueologia e Etnologia do Museu da Amazônia (MUSA).

 A comprovação da falsa entrada de Ratanabá

O Portal Amazônia manteve contato com o escritor, mestre em história e pesquisador Lourismar Barroso, que realizou uma visita técnica e com exclusividade para o Portal Amazônia gravou um vídeo esclarecendo a não existência da suposta entrada no Forte Príncipe da Beira, em Costa Marques, Rondônia. Confira:

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