O termo Panc vem sendo cada vez mais utilizado e hoje já são mais de 10 mil espécies identificadas no país
Lepidium, caruru, beldroega, peixinho e azedinha são algumas das 351 espécies de Plantas Alimentícias Não Convencionais (Pancs) catalogadas pelo biólogo Valdely Kinupp, o criador da sigla Panc. O nome pode parecer estranho à primeira vista, mas esses alimentos nada mais são que plantas comestíveis que surgem de forma espontânea pelo Brasil afora.
O termo Panc vem sendo cada vez mais utilizado e hoje já são mais de 10 mil espécies identificadas no país.
Kinupp é co-autor de um livro sobre essas plantas. “A gente sistematizou informações das pessoas do passado, de etnias indígenas do Brasil, de conhecedores tradicionais do Brasil e do mundo que estava disperso em artigos, teses, dissertações, livros atuais, livros de 100, 200 anos atrás”, diz.
Segundo ele, o palmito da bananeira e o miolo do mamoeiro, por exemplo, podem ser considerados partes alimentícias não convencionais de plantas convencionais.
A nutricionista Bruna de Oliveira faz diversos preparos com Pancs que encontra em seu quintal e até mesmo no bairro onde mora. Entre as receitas estão chutney de mamão maduro com palma, coração de bananeira em conserva e geleia de hibisco.
Assim, além de serem uma ótima fonte de nutrientes, as Panc são uma forma de cada consumidor reduzir o impacto que sua alimentação tem no meio ambiente, já que o consumo das Panc também é uma boa forma de contribuir para sistemas alimentares mais sustentáveis, já que normalmente elas são sazonais e regionais.
Jemima Andrade é designer de interiores e também descobriu nas Pancs uma alternativa para compor a alimentação diária de toda a família.
As Pancs já são tema de aulas em cursos de gastronomia e também são usadas em pratos especiais servidos em restaurantes. O pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Nuno Rodrigo Madeira ressalta o quanto os alimentos ainda são desperdiçados.
“Dos alimentos convencionais, o desperdício chega a 30%. Se a gente incluir as partes não convencionais, isso deve saltar para 40, 50% da comida que a gente não aproveita. De acordo com Nuno, estudos da Embrapa mostram que as Pancs são nutritivas: o caruru tem alto índice de proteína e a azedinha é rica em vitamina C.
Um estudo da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) mostra que o número de plantas consumidas pelo homem nos últimos cem anos se reduziu de 10 mil para apenas 170.
No Brasil, apesar da riqueza e variedade de espécies encontradas na natureza, a demanda do mercado se concentra em algumas dezenas de itens, esquecendo milhares de outras espécies disponíveis.
Segundo o engenheiro agrônomo Athaualpa Costa, como as Pancs não acompanharam o processo comercial, surgiu certo preconceito com esses alimentos.
“Comer mato é uma coisa que a gente come quando está sem dinheiro, é coisa de pobre: ‘Agora eu tenho dinheiro pra comprar uma alface, agora eu posso comprar um brócolis que é mais caro’. Então, esse processo de abandono total é que é o triste da história. Por que não conhecer mais, por que não buscar isso para o nosso cardápio diário?”.
Mas é necessário cuidado. Comer Panc não significa sair colhendo toda plantinha que surgir no caminho. É importante ler bastante a respeito e ter certeza das características do alimento para a saúde antes de ingerir.