Foram escolhidos cinco representantes da AGIR, cinco da OPIROMA e cinco do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia – Foto: Cesar Rosati/Ascom MPI
A 6ª etapa do Ciclo COParente terminou no dia 7 de julho com a escolha dos 15 indígenas que representarão Rondônia na Zona Azul da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 30), marcada para novembro, em Belém (PA). O encontro, ocorrido na Terra Indígena Igarapé Lourdes, reuniu lideranças de diversos povos do estado para definir as indicações para as credenciais de acesso à Blue Zone, alinhar pautas e consolidar um documento de encaminhamentos que será entregue aos negociadores climáticos.
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Ao todo, serão cinco representantes da AGIR (Associação das Guerreiras Indígenas de Rondônia), cinco da OPIROMA (Organização dos Povos Indígenas de Rondônia e Noroeste do Mato-Grosso) e outros cinco do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia. Os 15 delegados eleitos seguirão para a capital paraense com um documento político construído coletivamente durante a etapa do COParente.
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A declaração preparada após o evento reforça o papel dos povos indígenas como vitais para a vida do planeta, especialmente na Amazônia brasileira, e reafirma o compromisso com a defesa da floresta, detalhando em doze pontos as ações consideradas indispensáveis para enfrentar o aquecimento global de maneira justa e eficaz. O documento exige reconhecimento, proteção e demarcação de todos os territórios indígenas, com atenção especial às áreas que abrigam povos isolados ou de recente contato.
O posicionamento reivindica financiamento direto e autonomia financeira, condição que permitiria executar projetos de mitigação e adaptação nos próprios territórios. Os indígenas ainda cobram representação efetiva em todos os espaços de decisão da conferência, garantindo voz plena às delegações indígenas. A pauta de reivindicações que será apresentada durante a Conferência também pede mais proteção de defensores e defensoras que arriscam a vida para resguardar florestas e rios.
A indigenista Ivandeide Bandeira, ou Neidinha Suruí como é mais conhecida, fundadora da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, foi uma das responsáveis pela compilação do documento produzido durante o evento. A ativista do meio ambiente e dos direitos humanos, reconhecida internacionalmente por sua luta em defesa dos povos originários e comunidades tradicionais, reconhece a importância de eventos como o Ciclo COParente e diz ser impossível falar em equilíbrio climático sem garantir os territórios indígenas e a proteção das lideranças que lutam pelos seus direitos.

“É fundamental levar adiante a demarcação dos territórios. Isso é essencial. Por quê? Porque, se você quer um clima equilibrado, precisa ter território. O único lugar onde hoje, ao se observar uma imagem de satélite, ainda se vê floresta é dentro de terra indígena e nas unidades de conservação, como os parques. Então, para mim, o ponto principal é a demarcação”, afirmou.
A declaração também pede que conhecimentos e modos de vida tradicionais sejam reconhecidos como estratégias de mitigação, adaptação e restauração ambiental, contrariando modelos de desenvolvimento que ignoram saberes ancestrais. O documento foi aprovado com amplo consenso na plenária final do evento e recomenda, ainda, que a ONU peça ao Estado brasileiro a revogação da Lei nº 14.701, que trata sobre o marco temporal.
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Formação de lideranças
Além da escolha dos representantes indígenas de Rondônia que vão ser credenciados para a Zona Azul na COP e a elaboração do documento com reivindicações dos povos, a programação do último dia da COParente foi dedicada à formação das lideranças sobre o funcionamento da COP, os avanços históricos da participação indígena nos espaços multilaterais, a importância da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Indígena – PNGATI para a justiça climática e os desafios contemporâneos das negociações climáticas.

Representando a Fundação Nacional dos Povos Indígenas, Francisco Baré, coordenador-geral de Gestão Ambiental, afirmou que o momento vivido em Igarapé Lourdes já integra o processo de construção da COP. “Os povos indígenas não estão apenas se preparando para participar, mas estão dentro da conferência desde agora”, disse durante a palestra.
Ao relembrar os primeiros anos das conferências do clima, Baré destacou a exclusão sistemática dos saberes indígenas nos fóruns internacionais. Segundo ele, nas primeiras COPs o movimento indígena sequer era convidado e a presença nos espaços oficiais e a incorporação do conhecimento tradicional nos documentos das Nações Unidas só começaram a acontecer a partir dos anos 2000.
A expectativa para Belém, segundo o representante da Funai, é elevar a participação a um novo patamar. Os delegados indígenas que estarão na Zona Azul da COP 30 devem pressionar os países a se comprometerem com a redução das emissões de gases de efeito estufa, promover a adaptação às mudanças climáticas, garantir financiamento climático para países em desenvolvimento, fortalecer tecnologias de baixo carbono, preservar florestas e biodiversidade e incorporar os impactos sociais das mudanças climáticas nas decisões políticas.
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A assessora internacional do Ministério dos Povos Indígenas, Nayra Kaxuyana, reforçou que o Ciclo COParente surgiu de uma demanda do próprio movimento indígena, que identificou a urgência de se preparar estrategicamente para influenciar as negociações globais. Para ela, os dados científicos já não deixam dúvidas: os impactos da crise climática se intensificam, os rios secam em ritmo acelerado e o fogo se alastra por áreas cada vez maiores.
Na avaliação da assessora, a COP 30 será um divisor de águas. A meta do MPI, reforça ela, é organizar a maior e melhor participação indígena da história das conferências. Nayra também criticou a lógica desigual do sistema multilateral, que decide por consenso entre mais de 190 países, permitindo que setores resistentes à mudança imponham vetos. “O movimento indígena deve ocupar todos os espaços, não apenas a Zona Azul, mas também os ambientes paralelos e os debates públicos, com protagonismo, clareza de propostas e capacidade de articulação”, disse.
Elis Nascimento, diretora do Departamento de Justiça Climática da Secretaria Nacional de Gestão Ambiental e Territorial Indígena, apresentou os fundamentos da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas (PNGATI) como uma das estratégias centrais de incidência dos povos indígenas na COP 30. Ela ressaltou que a PNGATI é uma política pública construída com o protagonismo dos povos indígenas e voltada à proteção, recuperação e uso sustentável dos recursos naturais dos territórios indígenas. “Sem justiça territorial e garantia dos direitos constitucionais, não é possível falar em justiça climática”, ressaltou.
A próxima etapa do Ciclo COParente acontecerá no Acre.
*Com informações do Ministério dos Povos Indígenas
