A vida com os búfalos: a relação dos moradores de Soure e Cachoeira do Arari com o símbolo marajoara

Soure e Cachoeira do Arari estão entre os maiores produtores de Búfalos. A relação dos moradores com os animais vai além do lado econômico.

O ″Alemão″ já se tornou conhecido em Soure e sempre atrai a atenção de turistas que visitam a cidade. Foto: Agência Pará

Com 680 mil cabeças, o Pará é o maior produtor de búfalos do Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São mais de 14 mil propriedades distribuídas no Estado que contêm criação do animal. No principal centro de produção do Pará, o arquipélago do Marajó, a relação entre os búfalos e os moradores vai além da vida econômica. Em municípios como Soure e Cachoeira do Arari – que são o segundo e o terceiro  maiores produtores, ficando atrás de Chaves -, a referência ao animal pode ser vista em vários cantos.

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No distrito de Retiro Grande, que fica localizado na extensão da PA-154, que dá acesso à sede de Cachoeira do Arari, a ligação afetiva com o animal vem de berço. A moradora Flávia Alessandra, de 11 anos, tem um carinho especial pelo bezerro que ela batizou carinhosamente de “Nenenzinho”, de um ano. O animal foi rejeitado pela mãe e acabou sendo “adotado” pela família da jovem, surgindo assim uma ligação com o pequeno búfalo, que é considerado como um membro da família.

Flávia tem uma grande estima pelo bezerro batizado pela família de ″Nenenzinho″. Foto: Agência Pará

“Eu gosto bastante dele. Desde mais novo a gente batizou ele assim e agora basta a gente chamar pelo nome que atende”, disse. 

São dos búfalos que a família tira o sustento, como diz a avó, Elma Suane Vidal. A renda vem da  fabricação de queijo e doce artesanal que utiliza o leite de búfala. “É através desse animal que a gente tira o leite e transforma em doces e outros produtos. Então ele é tudo para nós”, disse.

Leia também: Patrulhamento em búfalos: uma modalidade exclusiva de policiamento marajoara

Nomes

É por meio da produção de búfalos à fabricação de queijo, doces e manteiga. Foto: Agência Pará

Os búfalos são importantes, também, na vida dos que lidam diretamente com o animal. Vaqueiros como os amigos Valdir, Sidney e Luciel, da Fazenda Paraíso, localizada no distrito, garantem que não têm nos búfalos apenas como um meio de ganhar renda. Dizem que têm apego e escolhem os nomes para os animais.

Na fazenda, cada animal recebe uma denominação e atende quando chamado. “Quadrilha”, “Vila Rica”, “Medalha” e “Batalha” – que é o maior da fazenda, com 1.200 quilos -, estão entre os nomes escolhidos. “A gente conhece o dia a dia deles, se apega. Eles já nos conhecem e gostamos desses animais. É gratificante a vaqueirice porque lidamos no dia a dia com eles. A gente sempre escolhe um animal preferido”, revelou Sidney.

Acompanhamento

Os veterinários Anelise Ramos e Augusto Peralta, que são lotados na Coordenaria de Produção Animal da Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca (Sedap), e que acompanham os desdobramentos do torneio leiteiro, com visitas a propriedades locais, conversaram com criadores e empreendedores para orientar e ouvir as demandas acerca da atividade bubalina. 

Veterinária da Sedap, Anelise Ramos, destaca a amizade e companheirismo entre os moradores do Marajó e os búfalos. Foto: Agência Pará

O veterinário explica que o trabalho da Sedap e demais instituições parceiras que atuam na pecuária, como a Agência de Defesa Agropecuária do Pará – Adepará, leva em consideração, ao executar suas ações no segmento, a relação que o marajoara, principalmente, tem com o búfalo. “O intuito é atingir o agricultor familiar, dar melhores condições para este pequeno produtor respeitando o que o búfalo representa a ele”, disse Peralta.

A médica veterinária, por sua vez, complementa a informação e fala que a relação do marajoara com os búfalos envolve companheirismo, afetividade e até familiar. “Já me deparei com casos, como de uma senhora, que criava um animal para tração. O búfalo dela morreu e a criadora estava triste porque disse que sentiu como se tivesse perdido alguém da família. É uma relação intimista. Um búfalo pode chegar a viver até 30 anos e há casos em que o animal não vai para o abate e vive muito tempo com o seu dono”, disse. 

O presidente da Associação Paraense de Criadores de Búfalos (APCB), João Rocha, diz que a entidade vê com bons olhos o envolvimento do Estado na bubalinocultura paraense e de valorização do animal símbolo do Marajó. Ele acredita que a realização da COP30 (Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas), trará ao produtor a oportunidade de mostrar o que faz com eficiência e destreza e mostrando o envolvimento social que a bubalinocultura representa ao Marajó.

“O levantamento que nós temos na associação é que 72% dos bubalinocultores são pequenos criadores. Então é uma cadeia que mexe muito com a parte social e com a ilha do Marajó que tem um IDH baixo (Índice de Desenvolvimento Humano) e o búfalo ajuda a levantar”. 

Símbolo

Em Soure a relação com o búfalo pode ser vista também de várias formas. Seja nos nomes dos estabelecimentos comerciais ou através de monumentos espalhados em vários pontos da cidade, eventos culturais, na culinária e como animais de estimação. A relação entre o búfalo com o povo do Marajó já foi até enredo de escola de samba do Rio de Janeiro  – a Paraíso do Tuiuti, em 2023. 

A vida com os búfalos
Pelas ruas de Soure é possível ver referências aos búfalos por toda parte. Foto: Agência Pará

Um dos personagens mais conhecidos da cidade é o “Alemão”, nome carinhoso que o búfalo ganhou do dono. Quem passa pela orla, dificilmente deixará de encontrar com o animal, que já se acostumou com a presença de curiosos ou mesmo de moradores que gostam de fotografar e fazer carinho no animal.

“É incrível a gente encontrar um animal desse porte pelas ruas da cidade e tão dócil”, disse Santiago Caldas, morador do Paraná, que visita a cidade. 

Até o policiamento local conta com a ajuda dos animais. Em função das características locais como solo e clima, o 8º Batalhão de Polícia Militar adotou a prática e parte das rondas ostensivas é feita com o uso do animal. 

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