Encabeçada pelo Ministério Público Federal (MPF), uma mobilização contra o que os participantes classificam como o “avanço do retrocesso ambiental” ganhou as redes sociais nas últimas horas, ganhando a adesão de milhares de internautas, entre eles integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato e da modelo Gisele Bündchen.
O principal alvo do tuitaço são duas medidas provisórias que alteram as dimensões de unidades de conservação ambiental. As medidas provisórias 756 e 758, ambas de 2016, foram aprovadas pela Câmara dos Deputados, no dia 16 de maio, e pelo Senado, no dia 24. Segundo o MPF, a hashtag #retrocessoambientalnao chegou a ocupar, por cerca de uma hora, o quarto lugar entre os temas mais comentados por brasileiros no Twitter, alcançando, em cinco horas, mais de 10 milhões de impressões (número de vezes que um tweet foi veiculado na timeline ou nos resultados de busca).
A MP 756 altera os limites do Parque Nacional do Rio Novo, localizado nos municípios paraenses de Itaituba e Novo Progresso, e da Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim, também em Novo Progresso, desmembrando parte da área da floresta nacional para a criação da Área de Proteção Ambiental (APA) do Jamanxim, no Pará.
A MP 758 modifica os limites do Parque Nacional do Jamanxim, em Itaituba e Trairão, no Pará, e da Área de Proteção Ambiental do Tapajós, que abrange partes dos territórios das cidades paraenses de Itaituba, Jacareacanga, Novo Progresso e Trairão. Os textos, aprovados pela Câmara e pelo Senado, aguardam a sanção presidencial.
Entre outras coisas, os textos aprovados permitem ao governo realocar, em terras disponíveis da União ou do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), na Amazônia Legal, os ocupantes de áreas rurais dentro da Floresta Nacional do Jamanxim e do Parque Nacional do Rio Novo. Até assumir a posse das novas áreas, os ocupantes poderão continuar a exercer suas atividades econômicas. Os imóveis rurais privados existentes no interior do Parque Nacional do Jamanxim passam a ser declarados de utilidade pública para fins de desapropriação pelo Instituto Chico Mendes.
Contrário às medidas, o MPF convidou membros dos ministérios públicos estaduais, de organizações não governamentais como Greenpeace e WWF (sigla em inglês para Fundo Mundial para a Natureza) e internautas a participarem do tuitaço. Só o MPF publicou mais de 50 comentários críticos às mudanças nas leis em sua página oficial no Twitter.
Críticas
Procuradorias federais de vários estados também aderiram à campanha. O coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, foi um dos procuradores que usaram sua conta pessoal no microblog para criticar a aprovação das MPs 756 e 758 e o teor de outras propostas em análise no Congresso.
Para Dallagnol, a eventual aprovação da Lei Geral de Licenciamento Ambiental (PL 3.729), em discussão na Câmara, enfraquecerá o processo de licenciamento ambiental. O procurador defende que, depois do rompimento da Barragem de Fundão, que liberou no ambiente mais de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos de uma barragem da mineradora Samarco, as regras do licenciamento ambiental “deveriam ser mais rigorosas, e não mais frágeis”.
A embaixadora da Boa Vontade do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), a modelo Gisele Bündchen, aderiu à campanha, postando vários comentários ligados à preservação ambiental e à promoção da qualidade de vida. “Cada brasileiro consome [em média] 5,2 kg de agrotóxicos por ano e querem flexibilizar as regras”, escreveu a modelo.
Entidades
Na avaliação do Instituto Socioambiental (ISA), se sancionadas, as duas medidas provisórias vão “mutilar” as unidades de conservação paraenses, liberando cerca de 598 mil hectares de áreas de proteção da flora e da fauna em benefício de desmatadores, grileiros, garimpeiros e do agronegócio. Cada hectare corresponde aproximadamente às medidas de um campo de futebol oficial.
A Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF teme que, se forem sancionadas conforme o texto aprovado pelo Congresso, as duas MPs colocarão em risco 2,2 milhões de hectares protegidos não só no Pará, mas também no Amazonas.
Outro lado
Quando a MP 756 foi aprovada na Câmara, o deputado Alceu Moreira (PMDB-RS) disse que a medida pode ajudar a resolver problemas de extração ilegal de madeira, grilagem de terras e garimpo na região do Parque Nacional do Rio Novo e no Parque Nacional do Jamanxim e estabelecer um “convívio harmônico e solidário entre o social, o ambiental e o econômico”.
A MP 758 altera área de proteção ambiental para dar passagem à Estrada de Ferro (EF)170, também chamada de Ferrogrão, que está em fase de construção próxima à BR-163, no Pará. Segundo o governo, a intenção é compor, com a EF-170, um corredor de exportação de grãos unindo Sinop (MT) a Miritituba (PA) para possibilitar o uso de portos da Bacia Amazônica e servir de alternativa ao transporte na BR-163.
Os dois textos foram votados e aprovados no Senado sem alterações, mas durante as votações, nas duas Casas, houve protesto e obstrução por parte de parlamentares da oposição.