Pesquisadores registram comportamento inusitado de botos no Rio Tocantins

Durante as observações, uma dupla de botos foi flagrada em um comportamento peculiar: um dos animais virou de barriga para cima, expeliu o pênis para fora da água e urinou para cima.

Foto: Reprodução/YouTube-New Scientist

Um comportamento inusitado de botos (Inia geoffrensis) surpreendeu pesquisadores que estudavam a espécie no Rio Tocantins, na Bacia Tocantins-Araguaia. Durante as observações, uma dupla de botos foi flagrada em um comportamento peculiar: um dos animais virou de barriga para cima, expeliu o pênis para fora da água e urinou para cima.

O jato de urina se espalhou pelo ar, respingando até na cabeça do próprio cetáceo. O registro foi documentado em vídeo e analisado por cientistas. Confira o vídeo:

Leia também: Você sabia que os botos da Amazônia não dormem?

O estudo foi conduzido por uma equipe internacional do Grupo de Pesquisa CetAsia, do Canadá; da Universidade Oregon State, nos Estados Unidos; e da Universidade Trent, também no Canadá. Os achados foram publicados na edição de fevereiro da revista científica Behavioural Processes.

Entre 2014 e 2018, os cientistas passaram 219 horas observando botos selvagens no centro do Brasil. Durante esse período, registraram diversas interações sociais e comportamentos incomuns, incluindo a micção aérea. Em mamíferos terrestres a urina também é usada para marcar território, escolher parceiros ou comunicar informações químicas. No entanto, essa prática nunca havia sido documentada em cetáceos.

Surpresa

O comportamento chamou a atenção até mesmo de pesquisadores experientes. Gabriel Melo-Santos do grupo de pesquisa Biologia e Conservação de Mamíferos Aquáticos da Amazônia da Universidade Federal Rural da Amazônia (BioMA) e atualmente pós-doutorando na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que estuda botos há mais de 15 anos, declarou ao Portal Amazônia que ficou surpreso com a descoberta:

“Nessa região pode ser um pouco mais comum, mas mesmo assim, não houve muitos registros ao longo de quatro anos de estudo”, afirmou.

Para Melo-Santos, é improvável que a urina seja usada para marcar território, pois a correnteza do rio dispersaria rapidamente qualquer pista química contida na urina/excreta. Além disso, os cetáceos possuem um nervo olfativo reduzido ou ausente, tornando a comunicação química por odores improvável.

Leia também: Segredos do comportamento de botos na Amazônia são revelados por inteligência artificial

Sociáveis

Os botos são conhecidos por seu comportamento social. Eles interagem em grupo, se tocam frequentemente e se comunicam por meio de sons. Em ambientes onde estão habituados ao contato humano, também demonstram interações lúdicas.

“Eles são sociáveis e engajam em brincadeiras”, explica Melo-Santos. “Isso é comum entre mamíferos com alto poder cognitivo, pois a brincadeira funciona como um treinamento para a vida adulta. Eles pegam objetos no rio e os exibem na superfície, o que na vida adulta funciona como um display sócio-sexual, tanto para socialização quanto para atrair parceiros”, explicou.

Leia também: Entenda a diferença de comportamento entre os botos da Amazônia e se eles são mesmo “implicantes”

Em Mocajuba, no Pará, onde Melo-Santos trabalha com um grupo de botos há mais de 10 anos, é comum ver filhotes pegando objetos e os oferecendo a outros botos ou humanos. Entre os itens usados estão pedras, pedaços de vegetação e até lixo descartado no rio, o que representa um risco para a espécie.

O estudo abre novas perspectivas sobre a complexidade do comportamento dos botos, reforçando a necessidade de mais pesquisas para compreender suas interações sociais e os impactos ambientais que enfrentam.

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