Museu da Associação Comercial do Amazonas: uma história que se perdeu no tempo

Os museus de origem particulares ou públicos são ou devem ser espaços preservados e privilegiados de uma Instituição.

Em umas sociedades complexas, multiculturais e pluriétnicas, falar dos temas da cultura constituem um desafio enorme. Nessas sociedades, o desenvolvimento passa sempre necessariamente pelo respeito a construção dos museus e pelo exercício de novos direitos, dentre eles a responsabilidade da manutenção de uma história ali construída. E principalmente a memória, ao patrimônio e ao museu ali existente que fora abandonado e perdido em administrações anteriores lá atrás.

Os museus de origem particulares ou públicos são ou devem ser espaços preservados e privilegiados de uma Instituição. Naturalmente estou falando de um passado que não assumiu o desafio da manutenção daquela obra que era orgulho de nossa cidade. Pensá-los por este prisma significa também compreendê-los como lugar de direito de uma população e naturalmente como um lugar de inclusão cultural de nossa cidade.

Comendador Emídio Vaz de Oliveira e diretores observando a exposição de látex no Museu da ACA. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

É claro e evidente que falo das administrações que ficaram lá atrás. Entre os mais diferentes grupos culturais e sociais há uma nítida necessidade e uma vontade de preservação daquela memória, de patrimônio e de história não só da Associação Comercial do Amazonas, mas principalmente de uma cidade e de um povo.

Temos que entender que existe um publico exclusivo do turismo museológico. O Museu da Associação Comercial do Amazonas foi criado em sua época e mantido pela mesma instituição e naturalmente instalado no prédio da mesma. Neste final de semana ao remexer o meu acervo fui reencontrar esse passado e naturalmente tentei encontrar respostas para as motivações que levaram naquela época essa respeitável instituição a desmontá-lo, voltei ao passado com lembranças de velhas tardes ensolaradas aos meus dezenove anos quando trabalhava com propaganda médica lá buscava matar o tempo enquanto aguardava a chegada do Dr. Rayol dos Santos, cujo, consultório era na mesma rua.

Comendador Emídio Vaz de Oliveira exibindo o couro de jacaré no Museu da ACA. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Para nós, o encontro desse universo é tecer lentamente os fios emaranhados e pacientemente trazidos à memória, procurando desatar os nos e reorganizá-los outra vez em formato de carretel que me transportava para dentro deste museu. Esse fato mostra a tecitura que passa cheias de recordações de um passado não muito distante que foram caminhos que atualmente percorremos e já não nos permite vislumbrar o mesmo espaço.

O Museu da Associação Comercial do Amazonas era um acontecimento consagrado que rememorava sistematicamente a nossa Amazônia, projetando no imaginário social do seu visitante uma verdadeira viagem a tudo que se pudesse encontrar na Amazônia.

Aluísio Araújo, Leopoldo Amorim da Silva Neves, Paulo Pinto Nery, Álvaro Maia e demais diretores visitando exposição de madeiras da Amazônia no Museu da ACA. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Associação Comercial do Amazonas 150 anos de História

O envolvimento do Brasil na Segunda Guerra Mundial como fornecedor de materiais estratégicos para os países aliados, trouxe para o primeiro plano dos interesses do governo de Getúlio Vargas uma economia de guerra. A Associação Comercial do Amazonas que por tantas vezes travou batalhas para a sustentação da nossa economia com o período do látex, via-se agora as voltas com o governo federal estimulando a emigração de nordestinos para a Amazônia em especial para o Estado do Amazonas, fato que já houvera ocorrido tempos atrás.

Era novamente a descoberta do outro negro que levara novamente e mão de obra nordestina para o seringal. A Batalha da Borracha, conforme ficou conhecida esse episódio, for administrada pela Comissão de Mobilização Econômica, organismo criado pelo presidente Getúlio Vargas para organizar a economia brasileira no período da guerra e, mediante o Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para Amazônia (Semta), serviço encarregado de garantir a migração para os seringais.

Esta instituição criado na década de 1940, teve sua sede financeira instalada do Rio de Janeiro. Inicialmente sua sede de recrutamento instalou-se em São Luís do Maranhão e, mais tarde, em Janeiro de 1943, foi transferida para Fortaleza.

Leopoldo Neves e Álvaro Maia observando uma vitrine no Museu da ACA. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

[…] As atividades de propaganda de Semta como órgão do governo encarregado do recrutamento e do encaminhamento de nordestinos para a Amazônia, tem como determinantes primários a economia de guerra, na qual a borracha, alçada a categoria de bem estratégicos, sofre um processo brusco de valorização, a ocupação demográfica da Amazônia com intensidade em busca da mão de obra de nordestinos, cuja, razão principal que incentivava essa prática era às secas constantes e a fragilidade e sua economia agraria. Essas bases constituem o cenário da Batalha da Borracha como episódio de guerra.¹

Em meio a tantos problemas que vivianos no Estado do Amazonas ainda em decorrência da queda da borracha, nossa economia procurava sua estabilidade por meio da exportação, da sorva, breu virgem, resina de jutaicica, sarrapilha, piaçava, timbó, sumaúma munguba, guaraná, cumaru, cacau, jarina, puxuri, juta, artefatos de fibras, cipó titica, couros e peles, madeiras, em geral, andiroba, babaçu, bacaba, buriti copaíba e, etc.

Vivíamos naquela época, com forte domínio da Associação Comercial do Amazonas liderando empresariado local na tentativa das exportações de nossos produtos. Tempo em que a convivência empresarial era extremamente importante no contexto da nossa economia, com destaque para O Jornal destacar um jornalista especialmente para cobrir os fatos diários e seu papel informativo, contribuindo sobremaneira para solidificar o empresariado local e as exportações.

Visita de diretores e autoridades ao Museu da ACA. Foto: Abrahim Baze/Acervo pessoal

Apesar de todas as dificuldades a Associação Comercial do Amazonas não limitava-se a conduzir suas ações comerciais que caracterizavam o mundo dos negócios em nossa região, tendo como compromisso um futuro seguro e próspero. Isso explica o intenso trabalho realizado por sua diretoria. A Associação Comercial neste período já não mais promovia exposições internacionais, no entanto mantinha um trabalho de relevância social, com destaque para o seu museu, com um departamento de Propaganda e Museu Comercial, departamento de Estatística, Departamento de Informações Comerciais e Publicidade, Serviço de Assistência à Agricultura, Serviço de Beneficiamento de Cereais, Serviço de Imprensa e Divulgação, Serviço de Pesquisa, Revista da Associação Comercial. Tudo isso, dedicado especialmente as atividades de difusão e conhecimento. Seu museu mostrava a preservação e a riqueza da nossa diversidade, mantendo inclusive um catálogo comercial do que produzia na época e exportava o Amazonas.

O lançamento da Pedra Fundamental da construção do prédio próprio da Associação Comercial do Amazonas ocorreu no dia 21 de abril de 1939, foi uma festa, com nomes importantes presentes com discurso, brindes e a esperança da instalação de sua sede própria. Localizada a Rua Guilherme Moreira esquina da Rua Quintino Bocaiuva a sede nova, foi projetava pelo engenheiro e arquiteto Aluysio Araújo, propiciando acomodações modernas e de funcionalidade, sede em a mesma se encontra até os dias atuais. 

Sobre o autor

Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museugrafia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista


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