Lucas Gomes recebe homenagens no Pará

Cerca de cinco mil crianças, mulheres e homens receberam, às 20h54, o corpo do jogador paraense Lucas Gomes no Estádio Olímpico São Benedito, o Diogão. Após cinco horas de cortejo entre o aeroporto de Belém e o município, as pessoas se agitaram ao som das sirenes de sete viaturas que finalmente chegavam às portas do estádio. 

Corpo do jogador Lucas Gomes no Aeroporto de Belém. Foto: Reprodução/CBMPA
Do lado de fora, outra multidão já se apinhava aos pés da grande imagem do padroeiro de Bragança – que se impõe em frente aos portões do estádio Diogão, que comporta sete mil torcedores. Também se espalhavam desde as últimas horas da tarde deste domingo (4) por vários carros, bicicletas e motocicletas, que já tomavam o entorno do estádio – onde não conseguiram acesso. Dentro, da arena, uma onda de emoção então levantou a multidão: o cortejo foi ovacionado pelo estádio, por cinco inesquecíveis minutos, ao som de brados que entoavam “o campeão voltou!!!”.

O estádio Diogão não conta com refletores para abrigar partidas noturnas. Naquele momento, a arena era iluminada apenas por faróis de carros, que se colocaram em campo, focando no lugar onde o caixão do jogador seria finalmente visto pelo povo bragantino.

De repente, uma constelação de câmeras de celulares ligadas rendeu um inesperado espetáculo sob a noite já estrelada: o caixão de Lucas Gomes, finalmente, descia do carro fúnebre rumo ao gramado. Houve forte comoção. Palmas se misturaram a lágrimas e nós na garganta. O povo bragantino prestava seu mais respeitoso reconhecimento a um atleta paraense que, naquele momento, era alçado a patamar de herói nacional pelos feitos no futebol profissional e pelo destino trágico do time catarinense Chapecoense.

Autoridades recebem o corpo de Lucas no Aeroporto de Belém. Foto: Thiago Gomes/Agência Pará
“Esse seria o ano dele”, falou inconformado o representante comercial Toni Monteiro, 36, à beira do campo. Ele aguardava pelo cortejo desde as 15h30, sob um sol impiedoso. “Foi uma tragédia sem precedentes”, entristecia-se.

Honras

Sob a brisa noturna que soprava sobre os momentos alternados de comoção, palmas e silêncio contrito no estádio São Benedito, oito homens do exército carregaram o caixão de Lucas Gomes até o gramado da arena. Lá, pais e outros familiares e amigos se abraçaram ao caixão preto que leva uma faixa verde. Mais palmas e mais lágrimas vieram da multidão, aos brados de “Vamos, vamos Chape!!”, por mais alguns minutos.
 Foto: Reprodução/CBMPA
“Esse é o troféu do primeiro título profissional conquistado por Lucas Gomes pelo Bragantino, em 2011”, diz Wanderlei Ribeiro frente ao caixão. Representante de José Joaquim Diogo, o fundador do estádio e do clube do Bragantino, Ribeiro está à beira do gramado enquanto entrega a grande taça ao pai do atleta. Seu Luiz Gomes, visivelmente emocionado, apenas agradeceu. “Obrigado! Obrigado!”, desabava em lágrimas. Ao lado deles, 16 homens e mulheres de um grupamento da Cruz Vermelha e outros quatro integrantes da Guarda Municipal de Bragança.

“O trajeto do aeroporto de Belém até aqui foi de grande emoção. Não tivemos grandes paradas, mas quase todas as localidades à beira da estrada prestavam homenagens. Tivemos que vir com mais cuidado. Os familiares agradeciam acenando pelas janelas”, contou Joelson Sampaio, 39, motorista que conduziu o carro fúnebre de Lucas Gomes. “As pessoas soltavam fogos, tinham balões às mãos. Foi muito, muito emocionante. Pena que foi uma homenagem numa ocasião tão triste”, resumia.

Cortejo segue até o município de Bragança, no Pará. Foto: Thiago Gomes/Agência Pará
Nas ruas

A emocionante cerimônia no Diogão acabou às 21h30, quando o carro dos Bombeiros onde foi colocado o caixão do jogador deu uma volta olímpica no estádio. O cortejo então retomou as ruas de Bragança, rumo à casa da família, no bairro do Morro.

Bragança parou para ver o cortejo do estádio Diogão até a residência da família. Muitos se revezavam à beira da PA 308 para acompanhar. Um grande engarrafamento de motos e carros se formou. Quando lá chegou, às 22h15, uma multidão, porém, já tomava a vizinhança, subindo nas casas e lotado ruas próximas – apesar de o quarteirão da família estar, desde a tarde, isolado por forças policiais e com o trânsito fechado.

Foto: Thiago Gomes/Agência Pará
Lá perto, o ginásio já estava tomado desde as 20h30 com mais bragantinos à espera do velório aberto ao público. Ninguém mais entrava ou saía, esperando o corpo do jogador. A multidão começou a se aglomerar em frente ao ginásio já nas últimas horas da tarde deste domingo, mas a movimentação começou ainda pela manhã. Compareciam com balões, bandeirolas e vestes em homenagem às cores verde e branco do time Chapecoense.

O corpo do jogador passou duas horas em velório privado, apenas para familiares, antes de seguir ao ginásio.

Pela manhã o corpo do jogador será homenageado, logo cedo, em cortejo pelas ruas do município. Depois, será levado ao cemitério da localidade de Nova Canindé, em Montenegro (também conhecida como Vila Jessé Guimarães), a 42 quilômetros de Bragança, pela rodovia Dom Eliseu (PA-112). O cemitério abriga um jazigo da família próximo à localidade da Terceira Travessa do Montenegro.

Fãs se despedem do jogador Lucas Gomes. Foto: Márcio Ferreira/Agência Pará
Talento

O atleta paraense de 26 anos foi um dos 71 mortos pelo acidente aéreo ocorrido esta semana com a delegação do clube de futebol Chapecoense, na Colômbia. Os corpos das vítimas brasileiras chegaram ao País na manhã de sábado, 3. As homenagens na Arena Condá, em Chapecó (SC), duraram todo o dia de ontem.

No Estádio Diogão, na entrada do município de Bragança, durante toda a semana bandeiras a meio mastro já indicavam o luto da cidade pela morte do jogador. Foi nesse estádio que Lucas Gomes despontou para a carreira profissional aos 17 anos. O talento foi descoberto por Ivan Almeida, então técnico do Bragantino. O atacante atuou por dois anos no time Sub-20 e lá ainda jogou por mais um ano, como atleta profissional. Depois passou por São Raimundo, de Santarém; Ananindeua; Tuna Luso Brasileira; Castanhal; Sampaio Corrêa (MA); Fluminense (RJ) e Chapecoense (SC). Lucas era o filho caçula dos agricultores Eliete Bezerra, 52, e Luiz Gomes, 69.

Fãs confortam parentes do jogador. Foto: Thiago Gomes/Agência Pará
Espera

Em Bragança, o clima de comoção pelo traslado e enterro do atleta paraense já podia ser sentido desde o início do dia. Desde as nove da manhã já havia movimentação na sede do Senai, no bairro do Morro.

No trecho de 40 quilômetros de estrada, que liga Bragança à comunidade da Terceira Travessa de Montenegro (a vila conhecida por Jessé Guimarães), onde Lucas morou até a adolescência, casas de famílias, centros comunitários, igrejas e escolas colocaram várias faixas em sinal de luto pela morte do jogador, que é muito conhecido e querido ao longo das diversas comunidades situadas na rodovia Dom Eliseu (PA-112). 

Cortejo entra na arena do Estádio São Benedito, em Bragança. Foto: Thiago Gomes/Agência Pará
Lá, jogando em diversos times amadores que atuam nas localidades do Quilômetro Sete, Quilômetro Oito, Quilômetro Doze e Quilômetro Vinte e Um e Nova Canindé, Lucas Gomes iniciou a carreira que, por fim, o levou ao futebol profissional – passando antes por pequenos times mantidos por essas comunidades bragantinas, como o Horizonte, o Flamengo, o Nacional e o União.

A região reúne vários amigos de infância e juventude e muitos colegas de escudos e chuteiras. “A palavra que expressa o que era Lucas é humildade. Ele nunca esqueceu suas origens”, disse o professor Dênis Reis, morador da comunidade Quilômetro Sete e organizador dos campeonatos nos quais o jogador despontou, ainda quando participava da Copa Rural de Montenegro de Futebol Amador. “Ele sempre voltava e falava com todos, mesmo depois de despontar no Fluminense. Sua intenção era montar uma escolinha de futebol aqui em Montenegro”, recorda.

“Vamos todos ao velório e também ao enterro”, lamentava a pensionista Nilza Guimarães. À porta de casa, e à beira da estrada que atravessa Bragança rumo à comunidade de Montenegro, sua família inteira se desdobrou para homenagear o jogador com uma faixa de luto. “Era uma pessoa muito querida para todos”, resumiu.

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