Indígena do povo Yanomami é o 1° a se formar na UFRR e celebra: “vou começar a alfabetizar os meus curumins”

Genivaldo Krepuna Yanomami, de 39 anos, se graduou em Licenciatura Intercultural. Cerimônia de colação de grau ocorreu na última quinta-feira (31), no Centro Amazônico de Fronteiras (Caf) da UFRR.

Genivaldo Yanomami. Foto: Evilene Paixão/HAY/Divulgação


Estes são os planos de Genivaldo Krepuna Yanomami, de 39 anos, após se graduar na Universidade Federal de Roraima (UFRR) no curso de Licenciatura Intercultural pelo Instituto Insikiran de Formação Superior Indígena. Ele é o primeiro indígena Yanomami a se formar na instituição.

No dia 2 de novembro, Krepuna afirmou que está muito feliz com a conquista. Agora, ele planeja retornar para a comunidade e repassar os conhecimentos adquiridos na graduação para o seu povo. A cerimônia de colação de grau ocorreu na última quinta-feira (31), no Centro Amazônico de Fronteiras (Caf) da UFRR.

“Eu quero trabalhar na área e ajudar outros Yanomami a estudar na universidade também, porque a dificuldade é muito grande para eles”, contou.

Genivaldo nasceu na região do Papiu, na Terra Yanomami e é morador da comunidade Tihinaki, no território Yanomami em Roraima. A região fica distante a uma hora de Boa Vista, onde as aulas ocorrem, e só é possível acessar através de aeronave.

No Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), ele contou os desafios de ser um Yanomami e estudar em uma universidade pública. Entre as barreiras enfrentadas, além da distância, Krepuna menciona o corte da bolsa permanência para indígenas e pandemia de Covid-19.

No período em que estudou na universidade, o novo graduado relembra que a cada 30 dias saía da Terra Yanomami para Boa Vista para estudar. Em um período, a própria UFRR chegou a fretar avião para trazê-lo às aulas.

“Tinha várias hospedagens que eu ficava, no Silvio Leite, Aparecida, na seda Hutukara [Associação Yanomami] e em algumas casas de apoio também. Trinta dias eu ficava aqui e depois voltava para a comunidade”, conta Krepuna, que em Tihinaki, sustenta os três filhos e a esposa através da roça e da caça.

Foto: Evilene Paixão/HAY/Divulgação

O processo de construção do trabalho de conclusão de curso durou três anos e foi escrito em Yanomami. O plano é ter uma versão bilíngue, em português, da pesquisa. “Graças a Omama [Deus da criação em Yanomami] eu venci”, celebra.

Krepuna se formou no Instituto Insikiran, o primeiro Núcleo de Formação Superior exclusivo para Indígenas no Brasil. O Insikiran surgiu em 2001, após reivindicação do movimento indígena roraimense. O núcleo oferta três cursos: Licenciatura Intercultural Indígena, Gestão Territorial Indígena e Gestão em Saúde Coletiva Indígena.

Antes de se formar na UFRR, ele foi um dos professores formado pelo Magistério Yarapiari, Projeto desenvolvido anos atrás pela Comissão Pró-Yanomami (CCPY), a partir de uma demanda do xamã e presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY), Davi Kopenawa, para que formassem jovens yanomami para defender os direitos e a Terra Indígena Yanomami.

O Magistério Indígena Yarapiari é um curso voltado especificamente para os professores Yanomami, tratando dos saberes tradicionais e da cultura singular, com currículo específico nas escolas e no magistério. Dentre todas as etnias, os Yanomami são o grupo com menor percentual de professores qualificados em Magistério, segundo a Secretaria Estadual de Educação e Desporto.

Em agosto de 2022, a Universidade Federal do Amazonas (UFAM) formou uma turma de 42 professores Yanomami. A cerimônia ocorreu no município de São Gabriel da Cachoeira (AM), o mais indígena do país.

Foto: Evilene Paixão/HAY/Divulgação

Terra Yanomami

Com cerca de 10 milhões de hectares distribuídos no Amazonas e em Roraima, onde fica a maior parte, a Terra Yanomami tem 371 comunidades de difícil acesso espalhadas ao longo da densa floresta amazônica. O povo Yanomami é considerado de recente contato com a população não-indígena. Além disso, no território há, ainda, indígenas isolados, sem contato ou influência externa.

Oficialmente demarcada em 25 de maio de 1992, o processo de avaliação e registro da Terra Indígena Yanomami durou quase 15 anos, o que envolveu uma longa batalha, com articulação internacional, até o governo brasileiro, à época presidido por Fernando Collor, homologar o território.

Nos últimos anos, a Terra Yanomami enfrentou uma crise humanitária e sanitária sem precedentes, com casos graves de indígenas com malária e desnutrição severa – problemas agravados pelo avanço de garimpos ilegais nos últimos quatro anos.

A invasão do garimpo predatório, além de impactar no aumento de doenças no território, causa violência, conflitos armados e devasta o meio ambiente – com o aumento do desmatamento, poluição de rios devido ao uso do mercúrio, e prejuízos para a caça e a pesca, impactando nos recursos naturais essenciais à sobrevivência dos indígenas na floresta.

*Por Samantha Rufino, da Rede Amazônica RR

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