Edna Castro, a fortaleza dos Altos Estudos Amazônicos

Estado e concepção de políticas públicas; identidade, territórios, conflitos; populações tradicionais e processos de lutas territoriais estão entre as questões de pesquisa evidenciadas por Edna Castro.

Foto: Alexandre de Moraes

O ensino, a pesquisa e a extensão voltados para a identificação, a descrição, a análise e a interpretação dos problemas amazônicos, sobretudo os de natureza socioeconômica, bem como a proposição e a discussão de soluções possíveis são a marca do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará (NAEA/UFPA). Alçar este trabalho a um patamar de qualidade internacional envolve o esforço de muitas(os) docentes e pesquisadoras(es), como Edna Maria Ramos de Castro: a sétima mulher a quem o Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe/UFPA) concedeu o título de professora emérita, em 23 de julho de 2020.

Nascida em Belém (PA), Edna Castro graduou-se em Ciências Sociais, em 1969, na UFPA. Em 1971, ingressou como docente nesta instituição, na categoria Auxiliar de Ensino. Participou do Curso de Formação de Especialistas em Áreas Amazônicas (Fipam), no início do NAEA, em 1973. Fez um Curso de Aperfeiçoamento em História da Filosofia, sob orientação do professor Benedito Nunes (1929-2011), em 1974. Obteve os títulos de mestre e doutora em Sociologia na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), na França, em 1978 e em 1983, nessa ordem.

Entre 1992 e 1994, desenvolveu os seus estudos em nível de pós-doutorado no Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS), com bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em 1995, concluiu o segundo pós-doutorado, na Universidade de Brasília.

Além de ser responsável por uma vasta literatura acadêmica e científica, Edna Castro destacou-se em cargos de gestão universitária. De 1994 a 1996, foi coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido (PPGDSTU/NAEA/UFPA) e atuou na direção-geral do NAEA por duas gestões (1997-2000; 2005-2009). 

Foto: Alexandre de Moraes

A habilidade gerencial da professora emérita da UFPA esteve, igualmente, a serviço de Associações Científicas. Entre 2007 e 2009, foi presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional (Anpur). De 2011 a 2015, foi diretora da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Esteve ainda na diretoria da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais (Anpocs) por três mandatos (1986-1988; 1994-1996; 2012-2014). Na Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS), ocupa o cargo de presidente desde 2023.

Atualmente, atua como docente voluntária no PPGDSTU/NAEA e no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia (PPGSA) no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH/UFPA). Em breve, deverá publicar dois livros de síntese que resultam de mais de 40 anos de pesquisa na Amazônia. Temas como desenvolvimento, ambiente, globalização e pensamento social latino-americano certamente serão explorados.

“Um intelectual desempenha esse papel de tradutor da realidade e, ao mesmo tempo, enquanto intelectual público que se considera, assume o compromisso de estar implicado com os dilemas de sua sociedade. Esse é o sentido de um intelectual engajado, como se referia Florestan Fernandes, que não se interessa apenas pela carreira, mas pela construção do seu tempo, o que inclui a sociedade, mas também o seu contexto, a natureza”, avalia.

Cores, figuras, motivos

Trabalho, trabalhadoras(es) e lutas referidas ao lugar e significado do trabalho; estado e concepção de políticas públicas; identidade, territórios, conflitos; populações tradicionais e processos de lutas territoriais estão entre as questões de pesquisa evidenciadas por Edna Castro.

“Para mim, a Amazônia foi aparecendo, e se formando na minha percepção, desde a infância, para além da vida urbana, nas margens povoadas de rios e igarapés, como o rio Acará, onde passava as férias na casa de meus avós”, conta. “Há uma diversidade de processos de trabalho na Amazônia e eles estão, de uma ou outra forma, conectados com a biodiversidade da floresta e dos rios”, completa.

Foto: Alexandre de Moraes

Entre as muitas contribuições da professora emérita, destacam-se os estudos sobre o Programa Grande Carajás (PGC) – com destaque para os processos de transformação socioambiental decorrentes do avanço da fronteira agrícola e mineral dos anos 1980 e a instalação de grandes projetos hidrelétricos e minerais, voltados ao mercado exportador, capitalista. Essa temática levou-a a se envolver com a produção de dois filmes documentários: Fronteira Carajás, que evidencia os impactos socioambientais provocados pelo PGC na mina de ferro, na ferrovia, nas carvoarias e nas usinas de ferro-gusa nas cidades de Marabá e Parauapebas (Pará) e em Açailândia (Maranhão); e Marias da Castanha (coproduzido por Simone Raskin), que resulta das pesquisas feitas sobre as relações de trabalho nas fábricas de Belém, sobre inúmeros setores econômicos. 

“É inegável e inquestionável a relevante produção acadêmica de Edna Castro e o compromisso que tem com o desenvolvimento da ciência e com o povo amazônida. Como docente, pesquisadora e cidadã, demonstra que a universidade é o lugar, por essência, da formação acadêmica e da educação cidadã”, afirma o professor Tadeu Oliver Gonçalves, que assinou a relatoria do processo de concessão do título honorífico. 

O recém-lançado site da professora Edna Castro reúne seus trabalhos e seus interesses, bem como abre espaço para o diálogo. “Confesso que passo uma boa parte do meu tempo com meu computador, em casa ou na Universidade. Gosto de escrever, de corrigir, de ler e reler. Agrada a ideia do texto como um artesanato, um trabalho exercido como manufatura e cuidado. Essa perspectiva me embala também na orientação de projetos de discentes do mestrado e do doutorado, de fazer da pesquisa um exercício de busca rigorosa como uma arqueologia do saber”, comenta.

*Com informações da UFPA

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