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Sexta, 26 Abril 2024

Onde se encontram perdidos Dom Phillips e Bruno Pereira, no Brasil ou no Peru?

O desaparecimento do jornalista inglês Dom Phillips, colaborador do jornal The Guardian, e do indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira, membro da União das Organizações Indígenas do Vale do Javari (Unijava) e servidor atualmente licenciado da Fundação Nacional do Índio (Funai), em uma viagem que faziam pelo Vale do Javari, no Amazonas, causa profunda preocupação no veículo britânico e tem repercussão na mídia europeia.

Em uma longa matéria publicada nesta segunda-feira (06/06) sobre o caso, que está sendo investigado pela Polícia Federal, o Guardian afirma que Phillips é conhecido "por seu amor pela região amazônica" e viaja com frequência para áreas remotas da floresta, para relatar a crise do meio ambiente e ameaças às comunidades indígenas. Phillips já tinha feito uma expedição com Pereira na mesma região, em 2018.

O texto informa que o repórter estava viajando com o ex-funcionário do governo brasileiro "encarregado de proteger as tribos não contatadas do Brasil, que há muito tempo recebem ameaças de madeireiros e garimpeiros que procuram invadir terras indígenas". "O temor pela segurança do jornalista e do especialista brasileiro aumenta", escreve o diário britânico.

Dom Phillips, um colaborador de longa data do Guardian no Brasil, foi visto pela última vez durante o fim de semana no Vale do Javari — uma vasta região de rios e mata tropical no Estado do Amazonas, perto da fronteira com o Peru. De acordo com o jornal inglês, Phillips trabalha atualmente em um livro sobre o meio ambiente com o apoio da Fundação Alicia Patterson.

Em comunicado, a Unijava relata que Phillips e Pereira se deslocaram de barco, com o objetivo de visitar a equipe de Vigilância Indígena que se encontra perto de uma localidade chamada Lago do Jaburu, perto da Base de Vigilância da Funai, no rio Ituí. O jornalista deveria visitar o local e fazer algumas entrevistas com os indígenas. O inglês e o brasileiro chegaram ao destino na noite de sexta-feira (03/06) e, no dia 05/06, retornaram logo cedo para a cidade de Atalaia do Norte.

O indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips. Foto: Reprodução/TV Globo

Pontos duvidosos 

Diante dos relatos da imprensa, observa-se algumas incoerências e falhas de observância de procedimentos técnicos em relação à missão. Dentre os pontos de maior relevo destaco:

  1. Ao que tudo indica a viagem em caráter eminentemente particular do jornalista Dom Phillips e do funcionário (licenciado) da Funai Bruno Pereira não obedeceu a procedimentos elementares de segurança e logística operacional, exigida em missões do porte, o que leva a crer que estavam por conta própria, desprotegidos das forças militares e da Polícia Federal e órgãos federais e estaduais de gestão e monitoramento de questões alusivas a reservas indígenas.
  2. Sendo a área de alta periculosidade, dada a possível presença de mineradores e outros exploradores clandestinos da reserva, tanto do lado da fronteira brasileira quanto peruana, a viagem teria que ser monitorada por quem de direito. A menos que a responsabilidade estivesse a cargo e sob a proteção de Ongs promotoras do trabalho a que se propuseram Phillips e Pereira.
  3. A repercussão internacional do desaparecimento de ambos soa um tanto exagerada ante outras situações em que jornalistas são mortos ao integrarem-se no front de conflitos beligerantes, como guerras, rebeliões, golpes de estado, etc, sem a mesma reverberação em torno do mundo.
  4. Por quê? Pelo fato desse lamentável evento estar ocorrendo na região amazônica, alvo de manifestos interesses de Ongs e governos estrangeiros, de traficantes de animais silvestres travestidos de exploradores e pesquisadores, de recursos da fauna e flora, de piratas ambientais, contrabandistas de recursos da biodiversidade e oportunistas de toda espécie?
  5. A propósito, o Centro de Comunicação Estratégica e Segurança da Informação da Ucrânia divulgou que cinco jornalistas morreram e foram registrados outros 148 crimes contra profissionais de imprensa e veículos de comunicação desde o início da invasão russa. Entres as vítimas fatais encontram-se o cinegrafista Pierre Zakrzewski, de 55 anos, e a jovem Oleksandra Kuvshinova, de apenas 24, ambos da Fox News.
  6. Na guerra da Síria e do Afeganistão, na invasão do Iraque e Líbia, nos conflitos da Palestina, da Cisjordânia, no Líbano, na Chechênia ou no México, falecimentos de jornalistas ocorrem com bastante frequência. Relato do UOL divulgado esta semana dá conta de que a morte na Cisjordânia da palestina-norte americana Shiren Abu Akleh, 51 anos, somou-se a outros 28 óbitos registrados de jornalistas no exercício da profissão até maio deste ano.

Estatísticas assustadoras

Segundo o The International Press Institute (IPI), organização para defesa da liberdade de expressão sediada em Viena, e da Ong Repórteres sem Fronteira, em todo o ano passado foram contabilizados 45 repórteres mortos cobrindo guerras e manifestações ou em trabalhos investigativos. A esses casos se soma os de duas jornalistas mexicanas encontradas mortas no estado de Veracruz, México, em maio passado. Com base em contagem da IPI, só em 2022 são nove mortes de pessoal de imprensa no exercício da profissão em território mexicano.

Depois do México, governado pelo partido de esquerda Movimento Regeneração Nacional (MRN), vêm Ucrânia e Haiti (3), Filipinas (2) e, com um caso cada, Guatemala, Chade, Iêmen, Turquia, Cazaquistão, Bangladesh e Mianmar. O clima de insegurança ronda a imprensa no México, agravado desde a posse do atual presidente Manoel Lopez Obrador. Segundo o IPI, ao menos 35 jornalistas foram mortos nos últimos quatro anos no país. Apenas 10% desses assassinatos foram resolvidos judicialmente.

O Brasil não registra casos de jornalistas mortos em serviço.

Esforço de guerra para localizar os perdidos 

A despeito de não haver sido previamente informado da missão do jornalista inglês na companhia do funcionário licenciado da Funai, o governo brasileiro vem empregando força máxima por meio das Forças Armadas, Polícia Federal, Funai e órgãos de segurança e prevenção de incidentes do governo nas buscas do jornalista inglês Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira, desaparecidos desde domingo (5/6) no Vale do Javari, Alto Solimões, no Amazonas.

São indignas e irresponsáveis, por conseguinte, os esforços de certos setores da imprensa tentando responsabilizar o governo brasileiro pelo desaparecimento de Phillips e Bruno Pereira. O correspondente da BandNews em Genebra, Jamil Chade, tal qual político de oposição, vem diariamente comentando o caso. Refere-se à Amazônia como "terra de ninguém", e à região do rio Javari, especificamente, como de alta periculosidade. Sem disfarce, e desprovido de qualquer prova material, procura imputar responsabilidades e insinuações veladas de culpa do Palácio do Planalto pelo sumiço dos dois profissionais.

O jornalista em questão não tem a menor ideia do que fala. Um simples embusteiro. Será que ao menos já veio à região? Duvido muito. Pois quem conhece a Amazônia não se dá ao trabalho de falar tamanhas asneiras. Na verdade, seus comentários são recorrentemente eivados de referências maldosas ao Brasil. Sequer imagina, nem, certamente, faz questão de levantar o quanto de recursos públicos o governo despende no esforço de encontrar os dois desaparecidos e outros que frequentemente se acidentam ou se perdem nas matas amazônicas. Chade, por certo, é um daqueles brasileiros para os quais quanto pior melhor. O BandNews precisa elevar o nível de sua editoria internacional. Jamil Chade, por outro lado, não tem a menor noção sobre a geografia da região, particularmente em relação ao rio Javari, em que, até Benjamin Constant, de um lado é Brasil e de outro Peru. Por conseguinte, onde efetivamente se encontram perdidos Dom Phillips e Bruno Pereira? No Brasil ou no país fronteiriço?

Sobre o autor

Osíris M. Araújo da Silva é economista, escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), da Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas (ALCEAR), do Grupo de Estudos Estratégicos Amazônicos (GEEA/INPA) e do Conselho Regional de Economia do Amazonas (CORECON-AM).

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista

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