Miriti: palmeira da Amazônia tem diversas utilidades, desde a criação de brinquedos a isolamento térmico

As funções da planta amazônida englobam isolamento térmico e acústico, cosmético, acessório, alimento e até filtro natural de água

Miriti é uma palmeira bem conhecida na região amazônica. Também chamada de buriti, é no mês de outubro, quando a capital do Estado do Pará inicia as celebrações da festa católica do Círio de Nazaré, que os brinquedos feitos a partir da planta chamam ainda mais atenção de quem passa pela cidade. Pelas mãos dos artesãos, as folhas do miritizeiro vão se transformando em coloridas rodas gigantes, pássaros, barcos e o que a imaginação permitir.

Leia também: Portal Amazônia responde: o que é miriti?

Mas Miriti não é só brinquedo. Com o nome cientifico de Mauritia flexuosa Mart, o miriti é também fonte de renda, isolante térmico e acústico, cosmético, acessório, alimento e até filtro natural de água.

“A presença da planta em áreas alagadas é um indicador de qualidade de águas, pois seu sistema radicular é formado por raízes secundárias muito finas (pelos) que auxiliam na filtragem da água, deixando-a limpa e potável. Então, onde há miriti significa que a água é boa para consumo, porque ele filtra a água e mantém a umidade no ambiente”,

explica a professora Gracialda Ferreira, doutora em botânica e docente da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), campus Belém.

Professora Gracialda Ferreira explica que a presença de palmeiras de miriti em um local são um indicativo de qualidade de água. Foto: Vanessa Monteiro

A professora explica que da palmeira do Miriti, tudo se aproveita. Caule, folha e fruto. “Já existem pesquisas e testes de resistência e qualidade mostrando as possibilidade de usos na até na construção civil. O miolo do pecíolo da folha do miriti também possui alta capacidade de isolamento acústico e térmico, que não deixa a desejar ao isopor ou gesso”, explica. Das folhas ainda são feitas cestarias, bolsas e artesanatos. 

E a indústria de cosméticos vem usando o óleo do fruto para produção de cosméticos. O fruto é utilizado como alimento por várias espécies de aves, e também na alimentação humana. 

“Um cacho de miriti tem em torno de 100 ou 150 kg de fruto, então cerca de metade disso é polpa, ou seja, é muito alimento fornecido”,

diz a professora.

Fruto do miriti é alimento para aves e também para humanos. Palmeira também é conhecida pelo nome de buriti. Foto: Vanessa Monteiro

No município de Abaetetuba, também conhecido como a capital do Miriti, há a safra do açaí e também a do miriti. Se costumeiramente é erguida uma bandeira vermelha para identificar que naquele local há venda de açaí, para identificar que há miriti a bandeira é laranja, mesma cor da polpa do fruto.

É também em Abaetetuba o município onde são produzidos os brinquedos comercializados durante o período do Círio. Mas o local já teve uma perda significativa de miritizeiros, por uma falta de entendimento sobre o manejo da planta. Em 2005 os pesquisadores da universidade foram procurados por um grupo de artesãos para que ajudassem a identificar o porquê de não estarem brotando novas plantas na região.

“Chegando lá, percebemos que haviam várias palmeiras no chão, derrubadas, porque eles identificaram que aquelas plantas não davam fruto. Acontece que o miritizeiro possui o sistema reprodutivo em plantas diferentes, ou seja, há miriti macho e miriti fêmea. Ao derrubarem as plantas masculinas não houve mais polinização. As flores femininas até abriam, mas não convertiam em fruto porque não tinha o pólen que vem da flor masculina”,

diz.

Ela explica que ambas as plantas florescem, mas tem estrutura morfológica e cores diferentes. A fecundação ocorre com a ajuda de um polinizador, como a abelha.

“Eles fizeram esse processo por uns três anos. Entre identificarmos o problema e conseguirmos recuperar a produção do miriti localmente, levou uns 15 anos. Hoje em dia já existe uma excelente produção local, mas é importante percebermos o que o manejo inadequado da planta pode impactar na natureza e a importância de preservar os polinizadores”,

alerta a professora.

O miritizeiro possui o sistema reprodutivo em plantas diferentes, ou seja, há miriti macho e miriti fêmea. Fecundação ocorre com a ajuda de polinizadores. Na imagem há a flor do miriti macho e a flor da fêmea, já fecundada. Foto: Vanessa Monteiro

Os brinquedos do miriti são produzidos a partir da parte interna da folha, mais especificamente da parte de dentro do “talo da folha”, o parênquima. “Uma folha completa possui limbo e pecíolo. O limbo é arredondado, grande, que fornece fibra muito utilizada para fazer bolsas. E aquele talo comprido é o pecíolo da folha, é essa parte que é utilizada para fazer o artesanato de tala, cestaria. A parte interna, o parênquima, a fibra, é usada para fazer os brinquedos”, explica. 

Para conseguir esculpir os brinquedos, os artesão precisam que a planta ainda seja jovem, até seis anos, quando o caule ainda não está formado. Após esse período, o caule, que estava submerso, começa a aparecer, com isso as folhas já estão mais altas e distantes do chão, dificultando a coleta quando tem fibras mais resistentes, deixando esse material interno mais endurecido, difícil de cortar e manejar.

“Eles precisam de um material macio, pra cortar e fazer as peças. Por isso utilizam a planta até essa idade, para obter o pecíolo. A planta tem de 12 a 15 folhas. No manejo adequado, os artesão tiram três, então novas folhas nascem, seis meses depois tiram mais três. Com isso a planta nunca fica com menos de seis folhas. A medida que a planta vai crescendo precisamos ter outras mais jovens que tenham o lançamento de folhas ideais”,

diz.

Com manejo adequado, demanda e qualidade do produto, a meta é conseguir certificação. Pesquisadores e artesão estão se reunindo para obtenção do selo de identificação geográfica, registro conferido a produtos ou serviços que são característicos de um determinado local de origem. O registro é um indicativo de qualidade, reputação e identidade própria de um produto.

Pesquisadores e artesãos agora buscam obtenção do selo de indicação geográfica. Foto: Vanessa Monteiro

Com manejo adequado, demanda e qualidade do produto, a meta é conseguir certificação. Pesquisadores e artesão estão se reunindo para obtenção do selo de identificação geográfica, registro conferido a produtos ou serviços que são característicos de um determinado local de origem. O registro é um indicativo de qualidade, reputação e identidade própria de um produto. 

“A obtenção do selo demanda uma única organização social que os represente, já que existem várias. Após esse processo de obtenção é preciso fazer a manutenção do selo. Que inclui desde o manejo até o produto finalizado. O selo de indicação geográfica agrega valor ao produto, traz reconhecimento em uma escala nacional e internacional, e traz a referência para o estado do Pará, que passa a ter Abaetetuba reconhecida nacional e internacionalmente como a capital do brinquedo de miriti”,

atesta.

Com a certificação há também aumento da demanda do produto. O que tornam necessárias ações que garantam o cultivo da planta, já que até então a retirada é extrativista, ou seja, as folhas são retiradas de plantas existentes na floresta. 

“Juntos nós estamos formatando um projeto para Implantação de áreas para manejo do miriti, áreas plantadas, para cultivo que atenda a demanda do artesanato aliado à recuperação de áreas degradadas. Mas para isso precisamos de mais pesquisas”,

finaliza.

*Por Vanessa Monteiro, jornalista da UFRA 

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