Uma das maiores plantas aquáticas do mundo, a vitória-régia não surpreende apenas pela sua beleza, a planta é praticamente toda comestível e rende receitas como espaguete, geleia, picles e até mesmo pipoca.
Pode parecer estranho, peculiar e exótico incluir a vitória-régia (Victoria amazonica) na alimentação, mas na verdade é apenas pouco usual em uma sociedade que está acostumada com uma alimentação industrializada. No entanto, a vitória-régia, planta amazônica cuja flor pode chegar a três metros de diâmetro, é considerada uma Planta Alimentícia Não Convencional (PANC).
O Portal Amazônia mostra as particularidades culinárias desta planta, os benefícios de uma PANC e o que esperar para o futuro em relação à uma alimentação biodiversa.
Criado em 2008 pelo botânico e doutor em Fitotecnia-Horticultura, Valdely Kinupp, o termo PANC já é popular entre pesquisadores do mundo e tem ganhado notoriedade na mesa dos brasileiros.
Mais do que comida, para Kinupp, as PANC representam uma causa social, ambiental e econômica que contribuem para evitar o desperdício relacionado ao consumo excessivo e desequilibrado dos recursos naturais.
“Essa conscientização pode ajudar muito contra o desperdício de alimentos.[…] Você pode contribuir para evitar o desperdício dos alimentos convencionais, não convencionais, ou as partes alimentícias subutilizadas, negligenciadas desses alimentos, assim evitando excesso de poluição das lixeiras, dos aterros sanitários, evitando por tabela desmatamento, uso excessivo de agrotóxico, dentre outros”.
Valdely Kinupp
A queridinha das PANC
Conhecida como a “musa das PANC”, a vitória-régia é uma preciosidade gastronômica a ser investigada. Praticamente toda comestível, com exceção da folha, restaurantes do Amazonas já começaram a explorá-la em pratos regionais – que dão água na boca, só de olhar nas fotos.
Confira quais são as partes da vitória-régia utilizadas na alimentação:
Talo ou pecíolo
O talo é o “cabo” da planta. Contém muitos espinhos, por isso deve-se ter cuidado ao retirá-los. Pode ser consumido naturalmente, como explica Valdely Kinupp: “O pecíolo pode ser descascado, consumido in natura, cru, da mão para boca. Ele é crocante, levemente salgadinho, tem bastante cloreto de potássio, é um sal vegetal”.
Kinupp pontua que também pode ser preparado como picles, espaguete e ainda ser utilizado em doces e caldas. Além disso, pode ser servido desidratado, e nessa forma “fica com uma crocância maior”.
Confira a receita de espaguete a partir do talo da vitória-régia feita por Kinupp:
Rizoma
Sementes
Flor
Onde encontrar?
No Amazonas
Localizado no bairro Vieiralves, em Manaus (AM), o restaurante Shin Suzuran propõe a interação entre a culinária japonesa com ingredientes regionais. No cardápio, há um menu-degustação amazônico com três pratos, o sunomono de vitória-régia com lichia, o sushi de vitória-régia e o ankaki de pirarucu com vitória-régia.
No Pará
No Canal do Jari, próximo do município de Alter do Chão, a cozinheira Dulce de Oliveira, conhecida como Dona Dulce, é referência no uso da vitória-régia na gastronomia e seus pratos costumam atrair pessoas do mundo inteiro.
Ela faz receitas de brownie, farofa, pipoca, rabanada, tempurá, geleia e batata frita. Tudo com a vitória-régia.
Melhoria na qualidade de vida
Ademais, o pesquisador afirma que o consumo da vitória-régia – e das PANC, de modo geral – contribuem para uma melhor alimentação e por consequência, em uma melhor qualidade de vida. Valdely Kinupp explica que, de modo geral, as PANC são mais nutritivas:
“Via de regra as PANC são mais nutritivas em termos de vitaminas, especialmente vitamina A, vitamina C, dentre outras. Também é muito rica em minerais, principalmente zinco, molibdênio, boro, cobalto, cobre, que mesmo necessários em mínima quantidade na nossa alimentação, para nossa correta nutrição e o bom funcionamento do corpo humano, como a organização mundial da saúde recomenda, os alimentos ultraprocessados não tem”.
Valdely Kinupp
Acesso à informação
Apesar de seus benefícios sociais e ambientais, não são todas as comunidades, indígenas ou ribeirinhas, que identificam o uso da planta na alimentação. “Muitas vezes eles conhecem um número muito restrito de espécies. As comunidades ribeirinhas amazônicas, em sua maioria desconhecem [as PANC] e se sabem não fazem uso”.
Kinupp reitera que são necessárias políticas públicas para inserção das PANC na alimentação cotidiana e em alguns anos, espera que pessoas ou instituições tenham uma visão empreendedora sobre o assunto.
“A ideia é que as PANC sejam cultivadas de forma orgânica, mas nada impede que a indústria processe isso na forma de sorvete, de farinha, de sucos, de produtos desidratados, e mesmo que tenha uma produção mais comercial, orgânica e de policultivos”, finaliza, afirmando que todo esse conhecimento é fruto da sociobiodiversidade brasileira.