Qual a importância dos igarapés para a Amazônia?

Grandes cidades surgiram nos arredores de rios e igarapés, que até hoje possuem funções sociais e econômicas na vida de ribeirinhos.

‘Cidades nascem abraçadas a seus rios, mas lhe viram as costas no crescimento’ é o título de uma artigo da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). De fato, historicamente, grandes cidades surgem aos arredores de rios. Isso acontece por uma série de fatores que possibilitam o uso da água para desenvolvimento da cidade desde o consumo humano até o aproveitamento industrial por meio da irrigação, criação animal, pesca, aquicultura e piscicultura, turismo, recreação, dentre outros.

Nesse contexto, estão presentes os igarapés. Do tupi, conhecidos como ‘caminho de canoa’, o igarapé representa um curso d’água que possui um longo braço de canal ou rio.

Leia também: Você sabia que grandes avenidas de Manaus já foram igarapés?

O Portal Amazônia contextualiza a presença dos igarapés na Amazônia e sua importância. Confira:

Foto: Divulgação/Arch Daily

Contexto histórico e social

Como dito anteriormente, grandes cidades surgem no entorno de rios e em Manaus não poderia ser diferente, pois a cidade foi construída próxima ao rio  e desenvolveu-se no ciclo da borracha. Na tese de mestrado intitulada ‘Manaus e seus Igarapés: A construção e suas representações’, a pesquisadora Cristiana Maria Petersen Grobe explica como a história da cidade está atrelada aos igarapés:

“A história de Manaus se confunde com a própria história de ocupação de seus igarapés. Foram estes elementos naturais, o rio e os igarapés, que orientaram a formação e a construção da cidade e de seu imaginário social. A união do homem ao rio é demonstrada na condição mística e geradora das vivências e das experiências humanas na Amazônia”,

contextualiza.

Entre o final do século XIX e o início do XX, a cidade começou a passar por um grande crescimento por meio da exploração e da importação da borracha, o que proporcionou riqueza econômica e uma série de transformações que modificaram a imagem e a estrutura física da cidade.

Isso com a intenção de transformar Manaus em uma “Veneza” através de obras arquitetônicas e intervenções urbanísticas que passavam uma imagem moderna e civilizada, vinculadas pelos discursos e experiências vindos das cidades europeias, principalmente de Paris.

Para Cristiana, esse “ideal moderno” afastava a população de uma identidade cultural própria e a pesquisadora ressalta a importância do igarapé no imaginário popular.

“O olhar que se foca nos igarapés, não pretende a leitura de suas condicionantes ambientais e naturais que evidenciem o sentido biológico e ecológico que estes elementos geográficos desempenham na paisagem e na topografia da cidade, mas, sim como patrimônio cultural, onde o interesse se dá através da leitura de suas sociabilidades, de sua representação criada, gerida e consumida, enquanto elementos proliferadores de cultura, que significam a vida e que constroem imaginários”,

explica em sua dissertação.

Cartão postal do Igarapé do Tarumã. Foto: Reprodução/Acervo/JCAM

Importância econômica

Em meados da década de 60, com a implantação de numerosas palafitas no entorno da cidade, que formavam a extinta ‘Cidade Flutuante‘ e a manutenção de igarapés era – ainda é – fundamental para a rotina econômica da sociedade.

Fundamental para o fornecimento de água potável (evitando a proliferação de doenças vindas da poluição da água), os igarapés propiciam a irrigação de cultivos em comunidades ribeirinhas, fornece peixes para consumo e ornamentação além de serem vias para as canoas e também áreas de lazer.  

Igarapés são fonte de subsistência para comunidades ribeirinhas. Foto: Reprodução/YouTube/Mellquisedeque Allmeida

Importância ambiental

Além da importância social e econômica, os igarapés possuem reconhecida importância ambiental, proporcionando equilíbrio ecológico das microbacias hidrográficas das quais fazem parte.

Também foi constatado uma vasta biodiversidade de animais. De acordo com um estudo da Rede Amazônia Sustentável, em um trecho de 150 metros de um igarapé, onde foram encontradas cerca de 44 espécies de peixes. Nessa mesma pesquisa, foi descoberta uma nova espécie. Os exemplares coletados foram depositados nas coleções do Museu Goeldi, em Belém (PA), e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM).

O que mata um igarapé?

Entre as ações humanas que provocam o desgaste de um igarapé e a posterior “morte” do mesmo, estão:

– Redução da cobertura florestal na microbacia de drenagem, o que provoca o aumento de temperatura da água; 

– A queda na disponibilidade de oxigênio; 

– O aumento de sedimentos nos igarapés, provocando turbidez da água, reduzindo a profundidade do canal e alterando habitats importantes para os animais aquáticos;

– A perda de conectividade aquática que resulta de construções de estradas de terra.

Atualmente, os mecanismos legais que o Brasil dispõe atualmente não protegem adequadamente os igarapés. No Código Florestal, a previsão de Áreas de Preservação Permanente (APPs) de mata ciliar nas propriedades privadas busca preservar os cursos d’água, no entanto, ignoram impactos provocados por ações que ocorrem distantes das margens dos igarapés e que também ameaçam a fauna aquática.

Último igarapé limpo em Manaus

Considerado o último igarapé limpo existente em área urbana em Manaus, o igarapé da Água Branca, é considerado 100% urbano porque as nascentes estão dentro da cidade. Contudo, fatores como urbanização, o desmatamento da área verde e a poluição causaram graves consequências ao meio ambiente, mas principalmente, ameaçaram a qualidade de vida desses cursos d’água.

O igarapé é um importante contribuinte de água limpa e fria para a Bacia Hidrográfica do Rio Tarumã-Açú, extremamente poluída porque recebe águas de igarapés da Ponte da Bolívia, Cachoeira Baixa, Cachoeira Alta e Cachoeira das Almas, todos tomados por lixo, esgotos e poluentes químicos.

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