Amapá tem maior taxa de violência da Amazônia Legal, aponta estudo

O município de Calçoene teve a maior alta e pesquisadores apontam que região não têm presença de facções criminosas estabelecidas, mas vê garimpo ilegal se expandir.

Foto: Divulgação/Batalhão da Força Tática-AP

O Amapá é o estado com a maior taxa de violência da Amazônia Legal, segundo dados da 3ª edição do estudo Cartografias da Violência na Amazônia, divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em parceria com o Instituto Mãe Crioula (IMC), dia 11 de dezembro. Em 2023, o estado registrou 69,9 vítimas a cada 100 mil habitantes.

Essa foi a taxa mais elevada do país de Mortes Violentas Intencionais (MVI), que incluem homicídios dolosos, latrocínios, mortes decorrentes de intervenção policial e mortes de policiais. Os números representam um crescimento de 39,8% em relação ao ano anterior – em 2021 foram 491 mortes violentas, 367 em 2022 e 513 em 2023 no estado.

O município de Calçoene, que possui 10.612 habitantes segundo o Censo 2022 do IBGE, foi o que registrou a taxa mais alta de MVI do Amapá, com média de 100,8 mortes por grupo de 100 mil habitantes.

Nesse mesmo período, foi também a sétima cidade com as maiores taxas de MVI de toda a Amazônia Legal. Calçoene está distante cerca de 356 Km de Macapá, com acesso pela BR-156 – rodovia que liga o estado de norte a sul e é usada como rota de tráfico de drogas, armas e pessoas, segundo o FBSP.

Fundada em 1956 com o nome de Calçoene, desde o século XIX a região onde se situa o município começou a receber imigrantes no contexto do povoamento do território. Hoje, as principais atividades produtivas ali desenvolvidas são a agropecuária, a silvicultura, a pesca e a mineração de ouro.

Entre 2022 e 2023, o distrito de Lourenço, que pertence a Calçoene, aparece na mídia como um destaque em termos de aumento do garimpo ilegal, com um crescimento de 340% em um ano de uma área desmatada equivalente a mais de 170 campos de futebol. Em 2024, por sua vez, Calçoene foi um dos municípios afetados por incêndios no Amapá: foram 28 focos, representando 6,6% do total do estado.

Municípios mais violentos do Amapá (2021-2023):

Calçoene: 100,8
Macapá: 74,0
Santana: 70,2
Pracuúba: 52,6
Laranjal do Jari: 50,2
Amapá: 42,0
Pedra Branca do Amapari: 41,6
Porto Grande: 41,2
Oiapoque: 36,5
Tartarugalzinho: 30,9

Os dados indicam que dos cinco municípios com as mais altas taxas de MVI do Amapá, incluindo Calçoene, não têm a presença de facções criminosas estabelecidas. Já o garimpo ilegal indica e ser um dos principais vetores da violência na região.

Para Thiago Alan Guedes Sabino, geógrafo e pesquisador do Instituto Mãe Crioula, o crescimento dos garimpos ilegais na região vizinha de Lourenço está associado à expulsão dos garimpeiros que estavam na Terra Indígena Yanomami, em Roraima.

Além disso, Sabino acrescentou que Calçoene possui uma população pequena, e que qualquer alteração eleva significativamente os números proporcionalmente.

Foto: Rafael Aleixo/Rede Amazônica AP

Violência na Região Metropolitana de Macapá

Outro destaque negativo em termos de violência no estado é o município de Santana. O município, que tem a segunda maior população do estado (107,3 mil habitantes) e está distante cerca de 17 quilômetros de Macapá, é o mais violento do país segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

De 2022 para 2023 o aumento percentual foi de 88,2% no número de mortes violentas em Santana (MVI de 92,9). Na época, o governo do Estado atribuiu o crescimento da violência a uma guerra entre facções. As organizações presentes no município são: CV, PCC, FTA e APS.

Para o pesquisador Thiago Sabino, a disputa por territórios na cidade que é uma área portuária na foz do Rio Amazonas, é o principal motivo da “guerra”.

A capital Macapá também ficou entre as dez cidades mais violentas do país, na nona colocação. O MVI da capital foi de 71,3 mortes violentas a cada 100 mil habitantes.

O estudo identificou que ambas as cidades concentram a maior disputa entre as facções criminosas no estado, que possuem um total de cinco facções:

Comando Vermelho (CV)
Primeiro Comando da Capital (PCC)
Família Terror Amapá (FTA)
Amigos Para Sempre (APS)
União Criminosa do Amapá (UCA)

Algumas das organizações locais possuem ligação com facções nacionais, como no caso da FTA com o PCC. O Amapá também se destacou por ter a maior taxa de letalidade policial do país, que chegou a 23,6 mortes por 100 mil apenas em casos de intervenções de policiais.

De acordo com o levantamento, o Amapá foi o segundo estado da Amazônia Legal com mais operações da Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (Ficco), com um total de 16 operações – ficando atrás apenas do Pará (20 operações).

Segundo dados apresentados pelo Governo do Amapá nesta quarta-feira (11), o estado reduziu as taxas de Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI). Conforme o governo, dados divulgados pelo Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp), do Ministério da Justiça (MJSP), mostram queda de 34,2% comparado com o mesmo período do ano passado. Ainda de acordo com os dados do governo, foram 291 vítimas de crimes violentos em 2023, contra 192 neste ano.

As Mortes Violentas Intencionais (MVI) levam em conta os crimes de homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e feminicídio. Entram ainda nas estatísticas os dados envolvendo a atuação policial, tanto a letalidade (quando as polícias matam), quanto a mortalidade (quando agentes de segurança pública são mortos).

Sobre o projeto

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública foi constituído em março de 2006 como uma organização não-governamental, apartidária, e sem fins lucrativos, cujo objetivo é construir um ambiente de referência e cooperação técnica na área de atividade policial e na gestão de segurança pública em todo o País.

O projeto Cartografias da Violência na Região Amazônica visa o cruzamento e a análise de dados sobre ilegalidades, criminalidade e segurança pública na Amazônia com o debate socioambiental. O projeto insere-se na ideia de que a Amazônia é um dos principais ativos estratégicos do Brasil, o que o coloca no centro da discussão geopolítica do clima global e abre caminho para um debate sobre conexões e interfaces entre alguns dos principais problemas da região.

Foram analisados dados de ocorrências criminais nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Maranhão.

*Por Rafael Aleixo, da Rede Amazônica AP

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