Estudo revela impactos psicológicos da pandemia da Covid-19 entre os Karajá, no Pará

O estudo mostra como a pandemia da Covid-19 afetou profundamente a saúde mental dos Inỹ Karajá da aldeia Maranduba.

Foto: Werlen Karajá/Acervo pessoal

Um estudo inédito, fruto de uma autoetnografia colaborativa interétnica, revela como a pandemia da Covid-19 afetou profundamente a saúde mental dos Inỹ Karajá da aldeia Maranduba.

A pesquisa foi conduzida por Werlen Pereira Karaja, então estudante de Psicologia na Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), e Caio Maximino, pesquisador da Unifesspa, e propõe uma análise sensível e complexa sobre o sofrimento psíquico vivido pela comunidade durante esse período. A pesquisa foi publicada no periódico “Espaço Ameríndio”.

A investigação parte da experiência pessoal de Werlen Pereira Karajá, que vivenciou a pandemia dentro da aldeia, e entrelaça essa vivência com reflexões teóricas de Caio.

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O estudo mostra que a pandemia intensificou sentimentos de ansiedade e estresse entre os indígenas, revelando como esses estados emocionais são atravessados por modos socioculturais próprios de adoecer e perceber a doença. Na cultura karajá, as fronteiras entre doenças por contágio e doenças por feitiçaria são fluidas, o que complexifica ainda mais a compreensão do sofrimento psicológico.

Estudo mostra processos culturais

A publicação também resgata a figura histórica de Benta Thuary Deru, cuja trajetória está profundamente ligada à história da aldeia e à concepção karajá de doença. A partir dessa perspectiva, os autores exploram como a noção de “doença” na cultura karajá possui dimensões cosmogônicas e está relacionada ao caráter físsil da aldeação, ou seja, à dinâmica de formação e dissolução das comunidades.

Leia também: Como rezas, ervas e saberes tradicionais fortalecem a saúde mental em quilombos e aldeias

Estudo saúde mental Karajá pará
Foto: Werlen Karajá/Acervo pessoal

Um dos principais méritos do estudo é a abordagem metodológica, que permite ao primeiro autor falar de si mesmo como sujeito e objeto da pesquisa. Essa autoetnografia revela sentimentos, expectativas e frustrações vivenciadas durante a pandemia, e oferece uma compreensão profunda da subjetividade no contexto social indígena.

Além disso, o trabalho evidencia como o histórico de contato com os tori (não indígenas), marcado por práticas de necropolítica, se cruza com as narrativas do òwòru — figura central nas narrativas cosmogônicas karajá sobre a doença — para formar uma cosmopolítica da doença. Essa intersecção revela não apenas formas de adoecer, mas também estratégias de resistência cultural e psicológica.

Longe de oferecer uma explicação única para o sofrimento psíquico causado pela pandemia, o estudo apresenta esse fenômeno como amplamente complexo, atravessado por história, política e cultura.

Ao unir saberes indígenas e acadêmicos, os autores contribuem para o fortalecimento da psicologia indígena e para a construção de políticas públicas mais sensíveis às realidades dos povos originários.

*Com informações da Unifesspa

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