Foto: Edgar Kanaykõ/Greenpeace
Movimentos indígenas convocaram para esta quarta-feira (30), atos em manifestação contra a PEC do Marco Temporal em todo o país. O Greenpeace Brasil destacou que este é um “novo momento de tensão e desafio em relação aos direitos dos povos indígenas, que estão ameaçados por um conjunto de projetos legislativos apelidado de “Pacote Anti-Indígena”” (veja a relação feita pelo Greenpeace abaixo).
Leia também: Portal Amazônia responde: Entenda o que é o ‘marco temporal’ para terras indígenas
De acordo com a publicação: “Ele [o pacote] inclui Propostas de Emenda à Constituição (PECs) e Projetos de Lei (PLs) que querem desmantelar os direitos conquistados ao longo de décadas, ameaçando a convivência harmônica entre os povos indígenas e a natureza existente dentro de suas terras”.
Segundo o Greenpeace Brasil, a esse cenário, soma-se a mesa de negociação convocada pelo Ministro Gilmar Mendes no Supremo Tribunal Federal (STF), cujas reuniões não tem sido satisfatórias para os movimentos indígenas.
“Vale lembrar que o início do processo nessa mesa de negociação foi marcado por uma série de violências simbólicas contra os povos originários. A situação foi tão ruim que a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que representa as populações originárias a nível nacional, se retirou da conversa, alegando que não estava claro o objeto de discussão e que a presença de ruralistas nessa mesa sinalizava que o lobby do agronegócio estava presente nos debates”, destaca.
A principal ameaça aos direitos indígenas, segundo a organização, é a Lei 14.701, promulgada pelo Congresso Nacional no final de 2023. Além de reincorporar a tese do Marco Temporal à legislação brasileira, essa lei impôs novos critérios para a demarcação de Terras Indígenas, erguendo barreiras ainda maiores contra o direito dos povos originários e seus territórios ancestrais.
O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) também publicou informações sobre a convocação ao movimento, que tem ponto principal de concentração em Brasília (DF). O objetivo é fortalecer a defesa dos povos originários e denunciar os ataques contínuos e sistemáticos aos seus direitos e territórios.
O conselho divulgou, na terça-feira (29), uma carta endereçada aos três poderes da República, Legislativo, Executivo e Judiciário.
“Somos guardiões de uma sabedoria ancestral e nutrimos uma relação harmônica com a natureza, da qual somos parte, de tal forma que nossos modos de vida tradicionais prestam serviços ambientais que contribuem para a preservação ambiental, a proteção da biodiversidade, dos recursos hídricos e para o enfrentamento à crise climática no mundo”, afirma a carta divulgada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
“O Estado brasileiro que tem o dever constitucional de demarcar e proteger nossos territórios participa de uma Mesa de Conciliação, no Supremo Tribunal Federal (STF), sobre a Lei nº 14.701/2023, que permanece em vigor dificultando a demarcação das terras indígenas, e na qual outros interesses dos ruralistas, das corporações do agronegócio e da mineração sobre nossas terras se apresentam”, prossegue o documento.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) informou sobre a marcha centralizada em Brasília com o objetivo de entregar a carta aos Três Poderes do Estado Brasileiro.
“O momento é muito delicado. Estamos passando por uma grave ameaça no Senado Federal, que insiste em regulamentar o marco temporal. Quero chamar todos que possam somar à nossa luta, seja em Brasília, nos territórios ou nas redes sociais. Estamos passando por um processo de desconstituinte, ou seja, de um desmonte do texto constitucional. Não podemos permitir que retirem direitos fundamentais dos povos indígenas. Não podemos permitir que retirem direitos fundamentais da população brasileira!”, destacou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.
Conheça as iniciativas que ameaçam os direitos indígenas
PEC 48/2023 – Quer incluir o Marco Temporal na Constituição Federal, o que limitaria o direito dos indígenas às terras que estavam sob sua posse em 5 de outubro de 1988, dia da promulgação da Constituição. Essa proposta desconsidera toda a história de expulsão e violência sofrida por muitos povos antes dessa data.
PEC 59/2023 – Pretende transferir a responsabilidade pela demarcação de Terras Indígenas da União para o Congresso Nacional. Isso pode politizar ainda mais o processo, abrindo brechas para a influência de interesses econômicos no processo de demarcação.
PEC 10/2024 – A proposta quer permitir que povos indígenas realizem atividades agropecuárias e florestais em suas terras e estabeleçam contratos de arrendamento com terceiros, permitindo a comercialização de sua produção. Isso abre caminhos para a exploração econômica de terras indígenas, contrariando o uso sustentável tradicional.
PEC 36/2024 – Bem semelhante à PEC 10, essa proposta amplia as possibilidades para qualquer atividade econômica em terras indígenas, seja feita diretamente ou mediante arrendamento, o que compromete o uso sustentável dessas áreas e abre as portas para atividades que degradam o meio ambiente.
PEC 132/2015 – Quer indenizar os invasores de Terras Indígenas demarcadas até 5 de outubro de 2013. Isso significa que os invasores, em vez de serem responsabilizados, receberão compensações financeiras.
PL 6050/2023 – Propõe liberar atividades de mineração, garimpo e até geração de energia em Terras Indígenas. A exploração dos recursos naturais nessas áreas representa um risco para o meio ambiente e para a vida das comunidades.
PL 6053/2023 – Inclui impedimentos para que antropólogos participem dos processos de demarcação e define que uma comunidade só pode ser considerada indígena se tiver modos de vida distintos das comunidades não-indígenas ao redor. Essa proposta abre caminho para interpretações arbitrárias, comprometendo o reconhecimento de identidades indígenas.
PL 4039/2024 – Modifica a Lei 14.701/2023 para que, em casos de retomadas indígenas em áreas ainda não demarcadas, o poder público indenize proprietários não-indígenas por danos materiais e morais, e suspende os processos de demarcação enquanto essas ocupações continuarem. Na prática, favorece os interesses dos proprietários e penaliza os indígenas que lutam por suas terras.
*Com informações do Greenpeace, CIMI, Apib e Coiab