Compreender o comportamento pode ajudar a cuidar melhor de novos pacientes.
Em 2021, o Amazonas registrou 3.177 acidentes por picada de cobra, desses 1.858 foram por jararaca. Os municípios com maior número de acidentes no ano passado foram Manaus, Maués e Parintins com cerca de 100 acidentes cada, segundo dados do DataSUS (Ministério da Saúde).
Para compreender a forma científica da composição e ação do veneno, além das alterações fisiopatológicas sistêmicas, como lesão renal aguda, uma pesquisa analisou pacientes atendidos pela Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado (FMT-HVD), em Manaus. O estudo recebeu apoio por meio do Programa Amazônidas – Mulheres e Meninas na Ciência, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam).
Após análise de 117 pacientes, o estudo intitulado “Avaliação do perfil clínico-inflamatório dos acidentes botrópicos” apontou que células como neutrófilos (originárias das células-tronco mieloides) e monócitos (leucócitos observados em esfregaços de sangue) desempenham um papel central na defesa do organismo e são importantes na alteração renal após envenenamento.
Conforme o estudo, os pacientes hipertensos e diabéticos picados por jararaca são os de maior risco para desenvolver insuficiência renal, e alguns podem precisar fazer até hemodiálise por um período.
De acordo com a coordenadora da pesquisa, doutora em Doenças Tropicais e Infecciosas, Jacqueline de Almeida Gonçalves Sachett, o perfil se refere em reconhecer as características epidemiológicas dos pacientes acometidos por animais peçonhentos, as manifestações clínicas no local da picada e no organismo, a verificação do padrão de produção de células inflamatórias no sangue e no local da picada, além de analisar a eficiência da ação anti-inflamatória das medicações utilizadas nos pacientes.
“As células como neutrófilos e monócitos desempenham um papel central na defesa do organismo, no entanto, se estiverem desregulados, esse mesmo papel defensivo pode levar a danos e falência de órgãos. Nossos resultados mostraram que essas células são importantes na fisiopatologia renal após envenenamento por jararaca, juntamente com outros marcadores inflamatórios. Assim, essas células demonstram papel importante como biomarcadores para a insuficiência renal aguda nos pacientes de forma precoce, ou seja, elas ajudaram a ver de forma antecipada a alteração nos rins dos pacientes que o veneno causou”,
acrescentou a pesquisadora.
Números
Dos 117 pacientes analisados, sendo a maioria do sexo masculino, com idade entre 14 e 81 anos, 59 foram procedentes do interior do estado, 98 acidentes ocorreram na zona rural, 18 na zona urbana e seis na zona periurbana. A maioria dos casos teve acometimento no pé e seguido de perna, com acidentes moderados e leves, porém foram registrados 19 casos graves.
Impactos
Jacqueline destaca que compreender o comportamento do corpo diante do envenenamento ajuda a cuidar melhor dos novos pacientes que serão atendidos, pois auxiliará a procurar pela forma mais rápida os sinais e sintomas de gravidade causados pelo envenenamento e, assim, usar medicamentos e estabelecer cuidados para prevenção.
“Nós poderemos entender quais são os pacientes com mais riscos de ter complicações e propor tratamentos e avaliações clínicas e laboratoriais mais corretos”, completou.
A pesquisa além de ajudar a cuidar melhor dos pacientes com envenenamento por jararaca, também colaborou para a formação de alunos de mestrado e publicação científica.
Metodologias
A população considerada para o estudo, no período de julho de 2021 a março de 2022, corresponde aos pacientes atendidos pela FMT-HVD com acidentes com serpentes. O tamanho amostral foi definido como no mínimo 100 pacientes. Os pacientes elegíveis para a pesquisa foram todos com diagnóstico de acidentes ofídicos que tenham vindo do interior e da capital do estado, acompanhados por sete dias com avaliação clínico-laboratorial. As serpentes trazidas pelos pacientes também foram avaliadas.