De acordo com o estudo, em 1985 foram detectados 229 km de rios impactados. Já em 2020, o número aumentou para 2.604 km, ou seja, um aumento de 1037%.
O Instituto Socioambiental (ISA) realizou uma análise em que aponta as consequências do garimpo para a Amazônia. O estudo explica que a exploração mineral não promove o desenvolvimento social, mas que reduz os indicadores sociais da região.
O levantamento aponta que o Índice de Progresso Social (IPS) médio dos municípios amazônicos afetados pelo garimpo é 52,45 menor do que a média para a Amazônia, de 54,59, e bem abaixo da média nacional, de 63,3. O IPS médio dos municípios garimpeiros é 4% menor que a média amazônica e 20,6% menor que a média nacional.
IPS é um indicador internacional que combina três dimensões – “necessidades básicas de sobrevivência”, “fundamentos do bem-estar” e “oportunidades” – por meio de uma série de indicadores sociais e ambientais, provenientes de bases de dados internacionais, além de pesquisas de percepção, com objetivo de identificar o cenário, os desafios e as possibilidades de progresso social dos países.
A área de garimpo na Amazônia Legal cresceu 10 vezes nas últimas três décadas. De acordo com dados do MapBiomas, a Amazônia Legal possui mais de 90% da área de garimpo em território nacional, sendo mais da metade ocorrendo dentro de Terras Indígenas de forma ilegal.
São 9.905,1 hectares (ha) das cicatrizes de garimpo que estão localizadas no interior das Terras Indígenas (TI), que representam 9,4% da área degradada pelo garimpo na Amazônia. A área degradada pelo garimpo de ouro nas TIs soma 9.748,6 ha e se concentra em cinco territórios: Kayapó, Munduruku, Yanomami, Sararé e Sawré Muybu.
Os municípios que mais sofrem influência do garimpo são: Itaituba (1.582,2 ha), São Félix do Xingú (207,2 ha) e Nova Guarita (172,1 ha), e se concentram na região do sul do Pará e norte do Mato Grosso, respectivamente. Estima-se que 6.150.015 de pessoas são afetadas na área de influência dos 216 municípios onde é realizado garimpo, sendo que 44,1% desta população (2.710.054 habitantes) é impactada pelo garimpo do ouro.
E entre um dos impactos que mais prejudicam o bioma está a degradação de recursos hídricos nos rios da Amazônia. De acordo com o levantamento, em 1985, foram detectados 229 km de rios impactados. Já em 2020, o número aumentou para 2.604 km, considerado um aumento de 1037%.
O Portal Amazônia conversou com a professora da Universidade Federal do Pará (UFPA), em Altamira, Tatiana da Silva Pereira, para explicar quais os impactos que o garimpo causa nos rios.
“Primeiramente, para extração de qualquer minério, é necessário grandes quantidades de água para o processo e essa água, após utilizada, é descartada com os químicos utilizados para a retirada do minério. Ainda, para a retirada de um minério, ouro por exemplo, são usados outros elementos químicos, como o mercúrio (apenas para garimpo ilegal, já que ele é proibido de uso desde 2012) e o cadmio. E esses elementos acabam atingindo os rios, já que a retirada do ouro é feita nos corpos hídricos. Outro problema são as lagoas de rejeitos. Qualquer garimpo, legal ou ilegal, possui essas lagoas artificiais onde fica o material após ser processado e retirado o minério. Desastres como os que ocorreram em Mariana e Brumadinho foram devidos aos rompimento dessas lagoas”,
informa a professora.
O que preocupa é que dos Estados da Amazônia Legal, apenas o Acre não possui garimpo. Em 2020, alguns Estados cresceram nesse ranking, como é o caso do Pará, que apareceu em primeiro lugar com 76.633 ha (89% sendo de garimpo de ouro), seguido do Mato Grosso com 20.661 ha (99,5% de garimpo de ouro), Rondônia com 4.452 ha (4% de garimpo de ouro) e Roraima com 480 ha (100% de garimpo de ouro) degradados.
São diferentes compostos químicos usados para a limpeza, segundo Tatiana, considerado um processo complexo de contaminação, o que impede de ser realizado algum tipo de limpeza específica. Ela enfatiza o uso prejudicial do mercúrio.
“O mercúrio é neurotóxico, isso significa que ela atua principalmente no sistema nervoso. Mas também pode causar injúrias em órgãos como fígado e rins”,
alerta.
Uma pesquisa divulgada em abril de 2022 apontou que os 300 km de garimpos ilegais que se concentram no Rio Tapajós, contaminaram as águas com mercúrio. Segundo a pesquisa ‘Mercury Contamination: A Growing Threat to Riverine and Urban Communities in the Brazilian Amazon‘, mais da metade dos moradores da zona urbana de Santarém apresenta níveis de contaminação por mercúrio até quatro vezes superior ao limite recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
A pesquisa foi realizada com 462 moradores da área ribeirinha e urbana da cidade, durante os anos de 2015 e 2019, quando foi coletado sangue para medir os níveis de mercúrio e realizar análises bioquímicas, além da aplicação de um questionário com informações sociodemográficas, saúde e hábitos alimentares.
No início do ano, uma mancha turva acabou surgindo nas águas de Alter do Chão, considerado o “Caribe Amazônico” no Pará. A mancha se iniciou na foz do Rio Tapajós e se estendeu pelos afluentes.
De acordo com a nota técnica divulgada no dia 24 de janeiro de 2022 pelo MapBiomas, além do carregamento de sedimentos que segue pelo Rio Amazonas, na época de enchente, adentrando o Tapajós através de canais que conectam ambos rios, recentemente esse aumento de turbidez tem sido atribuído à exploração garimpeira na Bacia do Tapajós no trecho que vai desde Jacareacanga até Santarém, área de estudo do MapBiomas. Também foram avaliados pontos de descarga ao longo do Rio Tapajós e a foz dos rios Crepori e Jamaxim, dada a intensa atividade garimpeira nestes rios.
O Portal Amazônia realizou em fevereiro deste ano, uma análise do que aconteceu na região, onde conversamos com a bióloga responsável pelo estudo, Heloísa Meneses, da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), onde foi realizado uma pesquisa que avalia os efeitos da exposição mercurial para a saúde humana na região do Baixo Tapajós. Cerca de 80% dos participantes têm níveis de mercúrio (Hg) acima do recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que considera normal o nível de até 10 microgramas por litro de mercúrio no sangue.
Saiba mais: Entenda o que está acontecendo nas águas que banham Alter do Chão, o “Caribe amazônico”
Outro estudo realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em parceria com o World Wide Fund For Nature (WWF-Brasil), apresentado em 30 de outubro de 2020, mostra uma contaminação por mercúrio de 100% dos indígenas Munduruku. De cada dez participantes, seis apresentaram níveis de mercúrio acima de limites seguros: cerca de 57,9% dos participantes apresentaram níveis de mercúrio acima de 6µg.g-1, considerado o limite máximo de segurança estabelecido por agências de saúde.