Historicamente, a região, que abriga a maior Terra Indígena no Brasil, é alvo do garimpo ilegal, com forte resistência de comunidades indígenas
Desde o início da última semana, lideranças indígenas da Terra Indígena Yanomami, entre o Amazonas e Roraima, tem denunciado a presença armada de garimpeiros no território, que é protegido por lei, com relatos de confrontos entre garimpeiros e indígenas ganhando espaço no noticiário.
Historicamente, a região, que abriga a maior Terra Indígena no Brasil, é alvo do garimpo ilegal, com forte resistência de comunidades indígenas. O estado de Roraima é um dos mais ricos em recursos minerais.
Entenda o conflito:
O início
Garimpeiros a bordo de uma embarcação fizeram disparos de armas de fogo contra a equipe de policiais federais que estava na Comunidade Palimiú, dentro da Terra Indígena (TI) Yanomami em Roraima. Os policiais estavam no local apurando o ataque ocorrido na manhã de ontem (10), também por garimpeiros em uma embarcação, conforme denúncia realizada pelos Yanomami.
Segundo informações da Polícia Federal, após a apuração, quando a equipe de policiais federais estava prestes a embarcar de volta a Boa Vista, garimpeiros passaram em uma embarcação no Rio Uraricoera efetuando os disparos. A equipe se abrigou e respondeu à agressão, mas não houve registro de atingidos de nenhum dos lados.
De acordo com informações da Associação Yanomami Hutukara, o ataque de garimpeiros com armas de fogo contra a comunidade ocorrido ontem deixou ao menos cinco pessoas ficaram feridas, sendo quatro garimpeiros e um indígena. Ainda de acordo com a associação, os servidores do posto de saúde do território da comunidade Palimiú, local do ataque, foram removidos na própria segunda-feira.
O Ministério da Saúde confirmou que os profissionais da Equipe Multidisciplinar de Saúde Indígena no Polo Base da Comunidade Palimiú estavam sendo retirados do local e que a unidade de atendimento será reaberta tão logo seja possível atuar em segurança.
Os motivos
A alta da cotação do ouro e a crise socioeconômica decorrente da pandemia multiplicaram a atividade garimpeira no território, segundo avaliação do Instituto Socioambiental. O avanço do garimpo ilegal foi detectado pelo sistema de monitoramento por radar do ISA, o Sirad. Os resultados mostram cerca de dois mil hectares de floresta na TI Yanomami degradados pelo garimpo até março deste ano. Somente em março, são 114 hectares de floresta destruídos por essa atividade.
O MPF já alertou para os riscos dos indígenas na região. “Esse tipo de conflito tem sido alertado pelo MPF em diversos procedimentos, inclusive com ações na Justiça Federal pedindo um plano de retirada de garimpeiros, temendo possível genocídio. A Justiça já até decidiu a favor do MPF e da retirada do garimpo ilegal na TIY”, disse o MPF.
Estima-se que cerca de 14 mil indígenas deste território morem em comunidades a menos de cinco quilômetros de uma zona de garimpo, segundo levantamento divulgado pelo Instituto Socioambiental. A estimativa é que mais de 20 mil garimpeiros entram e saem dos territórios indígenas yanomami sem nenhum controle.
Segurança
Em ofício enviado à Polícia Federal, ao Ministério Público Federal (MPF), ao Exército e à Funai, a associação pediu que os órgãos atuem para “impedir a continuidade da espiral de violência no local e garantir a segurança para a comunidade Yanomami de Palimiú”. Segundo a entidade, os garimpeiros deixaram o local, mas ameaçaram se vingar.
A Funai divulgou nota dizendo que “acompanha, junto às autoridades policiais, a apuração de suposto conflito ocorrido na segunda-feira na Terra Indígena Yanomami, em Roraima.”
A fundação acrescentou que o documento foi elaborado em âmbito interno, de forma preliminar, e que não reflete a posição oficial da fundação. “O relatório apresenta versão unilateral sobre o ocorrido, com base em informações iniciais fornecidas por terceiro, carecendo, portanto, de apuração, o que já está a cargo das instituições policiais”, diz a nota.
Pandemia
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) protocolou petição no Supremo Tribunal Federal (STF) apontando a necessidade de retirada de invasores da Terra Indígena (TI) Yanomami, em Roraima.
Além da violência armada, as comunidades yanomami correm riscos sanitários. “O garimpo nunca chega sozinho. Junto dele chegam conflitos, doenças, contaminação da água, violação de direitos. Por isso, é preciso adotar medidas urgentes para retirar os invasores, o direito à vida do povo Yanomami está seriamente ameaçado de várias formas”, alertou Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib.
Reserva
Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Indígena Yanomami tem 9,6 milhões de hectares entre os estados de Roraima e Amazonas, onde vivem mais de 27 mil indígenas espalhados em cerca de 331 comunidades. Essa terra indígena foi homologada em 1992, e a atividade de garimpo nela é ilegal.
Metade da população desse território – um total de 13.889 indígenas – mora em comunidades a menos de 5 quilômetros de uma zona de garimpo, segundo levantamento divulgado pelo Instituto Socioambiental. A estimativa é que mais de 20 mil garimpeiros entrem e saiam dos territórios indígenas yanomami sem nenhum controle.
Na região de Palimiú, mesma região dos ataques, as lideranças indígenas denunciaram em abril outro tiroteio por parte de garimpeiros, após a interceptação pelos indígenas de uma carga de quase 990 litros de combustível. Em fevereiro de 2021, a Associação Yanomami Hutukara denunciou um conflito na Aldeia Helepi, também na região do Rio Uraricoera, envolvendo grupos de garimpeiros armados.