Sobrevoo flagra focos de queimadas na região entre Amazonas e Rondônia; Veja fotos

Análise do Greenpeace Brasil aponta que, com o aumento do desmatamento em Rondônia, “naturalmente” a fronteira vai se movendo, entrando no Sul do Amazonas e se aproximando de áreas essenciais para a biodiversidade do planeta.

Um sobrevoo realizado por uma equipe do Grupo Rede Amazônica e entidades ligadas ao meio ambiente flagrou várias áreas de desmatamento na floresta amazônica na última semana. Uma delas foi vista dentro do Parque Nacional Mapinguari, localizado entre Porto Velho (RO) e Lábrea (AM), ao lado de uma região de pastagem. A devastação neste ponto já chega a 1,3 mil hectares, conforme análise feita pelo Greenpeace Brasil com base em satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

A viagem começou no Aeroporto Internacional Governador Jorge Teixeira, em Porto Velho (RO), e seguiu em direção ao Sul do Estado do Amazonas. Durante as três horas de voo foi possível ver a floresta com cicatrizes de queimadas e desmatamentos recentes.

“As pessoas [grileiros] que estão chegando no Sul de Lábrea geralmente não são pessoas do Amazonas, mas de Rondônia e até de Mato Grosso. É o Arco do Desmatamento que está cada vez mais pressionando a floresta e subindo para essas novas fronteiras”, 

explicou Carolina Pasquali, diretora executiva do Greenpeace Brasil, que acompanhou o sobrevoo.

O Arco do Desmatamento é o termo dado para a área onde a agricultura avança em direção à floresta e também onde se encontram os maiores índices de desmatamento da Amazônia. As rodovias Belém-Brasília (BR-010) e Cuiabá-Porto Velho (BR-364), por exemplo, integram os 500 km² do Arco do Desmatamento.

Ainda segundo análise do Greenpeace Brasil, com o aumento do desmatamento em Rondônia, “naturalmente” a fronteira vai se movendo, entrando no Sul do Amazonas e se aproximando de áreas essenciais para a biodiversidade do planeta.

“Além do desmatamento, a retirada predatória de madeira e abertura de estradas são elementos que perturbam a floresta e comprometem o ecossistema”, comentou Pasquali.

Imagem aérea feita dia 16 de agosto de 2022 mostra desmatamento no Sul do Amazonas. Foto: Ruan Gabriel/Rede Amazônica RO

O sobrevoo também foi realizado em uma Floresta Pública Não Destinada localizada no Sul do município de Lábrea (AM). Nesse ponto da viagem foi encontrado um desmatamento ilegal de aproximadamente 2,3 mil hectares. Conforme dados de satélites analisados pelo Greenpeace Brasil essa área foi aberta em menos de quatro meses — entre fevereiro e junho de 2022.

As Florestas Públicas Não Destinadas são compostas, principalmente, por territórios pertencentes aos estados ou à União e que deveriam ser dedicadas à proteção ou ao uso sustentável, mas por não possuírem destinação específica são alvo constante de grilagem.

“Um terço de todo o desmatamento na Amazônia acontece em terras públicas não destinadas e a grilagem está diretamente relacionada a isso. Há omissão do estado brasileiro na destinação dessas terras, combinada a fiscalização sem efetividade e sinais de enfraquecimento legal enviados pelas autoridades, que permitem que grileiros aguardem por uma espécie de legalização das terras griladas… tudo isso junto vai se transformando nesse caldeirão que literalmente coloca fogo na floresta”, explicou Pasquali.

Floresta em chamas

Os incêndios na floresta são outro tipo de crime ambiental ligado ao desmatamento. Durante o sobrevoo, focos ativos de queimadas foram registradas em Lábrea (AM).

Turbulências são sentidas enquanto o avião sobrevoa a floresta em chamas. A equipe de reportagem também consegue sentir o aumento da temperatura dentro da aeronave conforme encontra queimadas pelo caminho. A fumaça é intensa, olhando para cima a visão é de um céu completamente cinza. No chão a coloração é preta.

“O céu aqui em Porto Velho não é mais azul, ele é cinza. E quando a gente voa, percebemos claramente essa mudança. A fumaça não se dissipa e é esse ar que todos os habitantes da região estão respirando diariamente”, disse Carolina. “É sempre muito impactante e triste a gente testemunhar aquilo que a gente já sabe por conta das imagens de satélite que acompanhamos. Quando a gente vê a extensão das áreas desmatadas e a proximidade do fogo isso realmente traz um impacto muito grande”, completa.

Dados do Inpe apontam que apenas nos 15 primeiros dias de agosto deste ano 267 focos de queimada foram registrados em Porto Velho. Já em Lábrea foram 140. O município de Lábrea está em uma área que reúne o sul do Amazonas, o leste do Acre e o norte de Rondônia. Segundo os ambientalistas é uma região muito pressionada e por isso chamada de “a nova fronteira do desmatamento”.

“Nesta época do ano os grileiros aproveitam para queimar, abrir e consolidar as áreas desmatadas. É isso que a gente vem testemunhando aqui [no Sul do Amazonas] e é muito preocupante. Essa devastação começa a se aproximar do maior bloco de floresta ainda conservada da Amazônia, um bloco que tem uma biodiversidade que a gente não pode perder. Ela é importante para a garantia do equilíbrio climático”, comentou Carolina.

4 mil pessoas 

Durante o sobrevoo, o Greenpeace Brasil registrou imagens de uma área de mais de 1,8 mil hectares sendo destruída pelo fogo no dia 18 de agosto. As queimadas acontecem dentro da área demarcada pela Concessão de Direito Real de Uso (CDRU), dada pelo Governo do Amazonas às comunidades tradicionais do rio Manicoré. O território abriga quatro mil moradores em 15 comunidades.

De acordo com o Greenpeace, há mais de 10 anos as comunidades que vivem na área do Rio Manicoré lutam pela criação de uma Unidade de Conservação (UC), que vem sendo ameaçada por invasões de terra, exploração ilegal de madeira e caça predatória. A área desmatada está localizada perto do igarapé do Tracajá, a 7km do rio Manicoré, próxima ao Alto Marmelos.

E não é a primeira vez que acontecem crimes ambientais na região. O desmatamento no rio Manicoré já foi denunciado pelo Observatório da BR-319 ao Ministério Público Federal (MPF), em junho deste ano, a partir de relatório que apontou quase três mil hectares de área explorada por madeireiras dentro da região da CDRU, segundo o Greenpeace.

A denúncia também apontou exploração ilegal de madeira de loteamento ilegal de terras, o desmatamento não autorizado e a abertura de ramais nas imediações, além de episódios de ameaças à população local.

“Durante o sobrevoo, realizado no último dia 18, flagramos essa queimada de uma área que vinha sendo monitorada desde março e o desmatamento vem avançando mais de 100 hectares por semana. Esse é um grande problema, que vem corroendo as florestas antes intactas do Sul do Amazonas”, comentou Rômulo Batista, que atua na campanha de Amazônia do Greenpeace Brasil.

Segundo a articuladora da Rede Transdisciplinar da Amazônia (Reta), Dioneia Ferreira, o incêndio criminoso na área da CDRU foi previsto pelos parceiros da Central de Associações Agroextrativistas do Rio Manicoré (Caarim), que lutam pela conservação dos lugares e modos de vida da população local.

“Foram realizadas várias denúncias em diferentes canais de gestão e comando, e controle ambiental dando conta do desmatamento alarmante na área. Os grupos criminosos operam de um modo muito similar na nossa região, o Sul do Amazonas, desmatam o quanto possível e ateiam fogo no período de estiagem. Se as denúncias de invasões e desmatamento na área da CDRU não surtiram uma ação dos órgãos competentes, era sabido que o próximo passo seria a queima na área”, afirma.

Dioneia ressalta que não houve ação efetiva do governo para proteger a CRDU, apesar das denúncias e alertas aos órgãos competentes desde o início do incêndio, em 16 de agosto.

*Por Ana Kézia Gomes, com a colaboração de Alexandre Hisayasu, Fábio Diniz, Ruan Gabriel e Mayara Subtil (Grupo Rede Amazônica); e Divulgação do Greenpeace

Publicidade
Publicidade

Relacionadas:

Mais acessadas:

75% das cidades no Amapá despejam resíduos sólidos em lixões, aponta IBGE

Apenas quatro municípios do estado não registraram a presença destes resíduos em lixões, devido ao aterro controlado como destinação final, são eles: Itaubal, Macapá, Pedra Branca do Amapari e Santana.

Leia também

Publicidade