As constatações foram feitas por meio de um estudo realizado por pesquisadores do Brasil e do Reino Unido.
As secas extremas estão se tornando cada vez mais frequentes e intensas devido às mudanças climáticas, o que pode ter grandes impactos na Amazônia. Entre o final de 2015 e o início de 2016, durante o verão, o bioma foi atingido por uma grande estiagem e incêndios florestais associados ao El Niño. Os efeitos do evento climático duraram pelos três anos posteriores, resultando, até 2018, na morte de 3 bilhões de árvores e na emissão de 495 milhões de toneladas de gás carbônico (CO2) – superior à média anual do desmatamento em toda a Amazônia brasileira.
As constatações foram feitas por meio de um estudo realizado por pesquisadores do Brasil e do Reino Unido. Os resultados do trabalho, apoiado pela FAPESP no âmbito do Programa BIOTA, foram publicados ontem (19/07) em artigo na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), dos Estados Unidos.
As análises revelaram que a associação da seca extrema com os megaincêndios desencadeados pelo El Niño causaram a morte de cerca de 3 bilhões de árvores na área estudada, que equivale a 1,2% do território da Amazônia brasileira e 1% de todo o bioma.
Desse total de vegetação morta, 446 milhões foram árvores grandes – com mais de 10 centímetros (cm) de diâmetro na altura do peito (DAP) – e cerca de 2,5 bilhões foram árvores menores, com menos de 10 cm de DAP, estimam os pesquisadores.
“Algumas áreas perderam 75% das árvores. Com isso, a floresta mudou completamente, ficando totalmente aberta”, diz Berenguer.
A perda de árvores foi muito pior nas florestas secundárias e em outras florestas afetadas pela intervenção humana. As árvores com menor densidade de madeira e cascas mais finas foram mais propensas a morrer com a seca e os incêndios. Essas árvores menores são mais comuns em florestas afetadas pelo homem.
Os pesquisadores também compararam o efeito da seca em diferentes tipos de floresta, bem como os estresses combinados da seca e do fogo exacerbado pelo El Niño.
A mortalidade de árvores foi maior nas florestas secundárias, por causa da seca, em comparação com as florestas primárias. O impacto foi maior nas áreas de florestas modificadas pela ação humana que experimentaram uma combinação de seca e fogo.
“Embora estudos anteriores tenham mostrado que as florestas afetadas por perturbações causadas pela interferência humana são mais suscetíveis a incêndios, não se sabia se havia alguma diferença na vulnerabilidade e resiliência das árvores quando ocorrem secas e incêndios florestais”, explica Berenguer.
Os pesquisadores também constataram que plantas em florestas afetadas pela seca, bem como em florestas queimadas, continuaram morrendo em uma taxa acima do normal por até três anos após a seca do El Niño, liberando mais CO2 na atmosfera.
A mortandade de plantas na região do Baixo Tapajós gerou a emissão de 495 milhões de toneladas de CO2 – maior do que a causada pelo desmatamento durante um ano inteiro em toda a Amazônia. Como resultado da seca e dos incêndios, a região liberou uma quantidade de CO2 em um período de três anos equivalente às emissões anuais do gás de efeito estufa de alguns dos países mais poluentes do mundo.
“Essa quantidade de CO2 gerado foi maior do que a emissão anual de países como a Austrália e o Reino Unido”, comparou Berenguer.
As emissões de CO2 das florestas queimadas por incêndios florestais foram quase seis vezes maiores do que as florestas afetadas apenas pela seca.
Após três anos, apenas cerca de um terço (37%) das emissões foi reabsorvido pelo crescimento das plantas na floresta.
“Os resultados do estudo estão em consonância com trabalhos publicados recentemente por outros grupos que mostram que a Amazônia pode deixar de ser um sumidouro e se tornar uma fonte de carbono”, avalia Carlos Joly, professor do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e membro da coordenação do Programa BIOTA-FAPESP.
“Essa conjunção de estudos mostra que a frequência de perturbações humanas na Amazônia está acelerando e pode fazer com que sejam atingidos limites irreversíveis de perda de floresta. Dessa forma, a Amazônia deixaria de ser uma formação florestal fechada para se tornar uma floresta aberta, muito menos densa e exuberante do que é hoje”, indica Joly, que também é um dos autores do estudo.
Parte dos resultados do estudo foram gerados por meio do projeto temático “Ecofor: Biodiversidade e funcionamento dos ecossistemas em áreas alteradas pelo homem nas florestas amazônica e Atlântica”, apoiado pela FAPESP, e coordenado por Joly, na Mata Atlântica, e Jos Barlow, professor da Lancaster University, na Amazônia.
“Não observamos na Mata Atlântica a mesma correlação de fatores verificada na floresta amazônica”, afirma Joly.