Voluntários e comunidades participam da limpeza dos rios. Foto: Divulgação/Mangues da Amazônia
O lixo marinho é um dos principais desafios socioambientais na costa amazônica, no Amapá, Pará e Maranhão – região que abriga a maior faixa contínua de manguezais do planeta. Descartados nas cidades, levados até o litoral pelos rios ou trazidos de outras partes do mundo pelas correntes oceânicas, os resíduos – sobretudo plásticos – demandam soluções que mobilizam comunidades costeiras em busca da conservação da biodiversidade e melhor qualidade de vida.
“Com a sensibilização ambiental, há uma maior percepção pública para a necessidade de mudar atitudes em relação ao lixo, prevenindo riscos à fauna e flora, aos meios de sustento e à saúde das pessoas”, afirma Marcus Fernandes, coordenador do Mangues da Amazônia e do Laboratório de Ecologia de Manguezal (LAMA), da Universidade Federal do Pará (UFPA), em Bragança (PA).
No projeto Mangues da Amazônia, realizado pelo Instituto Peabiru e Associação Sarambuí, com apoio do LAMA, a importância da destinação adequada dos resíduos inspira ações coletivas de limpeza de manguezais e praias, no contexto do uso sustentável dos recursos naturais.
Desde 2021, o projeto, que tem patrocínio da Petrobras e do Governo Federal através do Programa Petrobras Socioambiental, mobilizou quase mil pessoas nessa iniciativa, com mais de 5,5 mil quilos de resíduos coletados. Só em 2024, foram realizados dez mutirões de limpeza em diferentes municípios do Pará, no total de 741 participantes.
Com o apoio da Petrobras, “a iniciativa nasceu da importância de trabalhar a educação ambiental não só em salas de aula, mas ir a campo e envolver vários atores e parceiros nas localidades”, explica Dayene Mendes, pesquisadora do LAMA e coordenadora das atividades sobre resíduos no Mangues da Amazônia.
As ações se integram ao movimento global World CleanUp Day, realizado em setembro. Os materiais são coletados por grupos de voluntários em pontos estratégicos da zona costeira e separados para classificação e pesagem. Uma parte é destinada a cooperativas de reciclagem. Entre os resíduos mais comuns incluem-se cordas, redes e outros apetrechos da chamada “pesca fantasma”, na qual esses materiais – descartados no mar por barcos pesqueiros como lixo – acabam atingindo e matando caranguejos nos manguezais e peixes, tartarugas e outros animais nos estuários e no mar.
“Além da limpeza, a iniciativa tem sido importante na sensibilização dos moradores e na mudança de práticas como queimar o lixo nos quintais”, observa Dayene Mendes, pesquisadora voltada a estudos sobre microplásticos no ambiente marinho, tema abordado na sua tese de doutorado, apoiada pelo projeto Mangues da Amazônia.
Expansão das atividades socioambientais nos manguezais
A Amazônia estará sob os holofotes do planeta na COP 30 – a conferência do clima da ONU, no próximo ano, em Belém (PA). Ainda bem conservada, a costa atlântica da região, no Pará, é vitrine de soluções que conciliam uso sustentável da biodiversidade, geração de renda e mitigação climática. “O reconhecimento desse trabalho chega em momento oportuno para dar visibilidade aos manguezais, normalmente esquecidos nas agendas”, pondera John Gomes, gestor do Mangues da Amazônia.
Em 2024, em seu segundo ciclo de atividades, o projeto expandiu a abrangência para quatro municípios paraenses – Bragança, Tracuateua, Augusto Corrêa e Viseu. As ações ambientais, sociais e culturais beneficiam direta e indiretamente cerca de 15 mil pessoas na região, com estratégia de maior aproximação com a sociedade. A etapa atual é de validação científica das ações como frentes transformadoras, de modo a consolidar e replicar o modelo de atuação”, afirma Gomes.
No aspecto ambiental, o trabalho dá continuidade à recuperação de manguezais em áreas degradadas, totalizando 16 hectares até o momento, com uso de tecnologias inovadoras. Além do mapeamento participativo dos locais para plantio de mudas, com apoio das comunidades extrativistas, o trabalho monitora o retorno dos caranguejos às áreas já restauradas no passado.
Amostras de árvores são coletadas em diferentes áreas de pesquisa dos manguezais para o estudo de variabilidade genética, indicando onde estão as sementes que podem apresentar maior resiliência e sucesso no reflorestamento.
No campo social, além dos mutirões contra a poluição por resíduos, o projeto tem como destaque atividades educativas que envolvem mais de mil estudantes de diferentes faixas etárias: o Clube do Recreio (crianças de 4 a 6 anos), o Clube de Ciências (10 a 12 anos), o Protetores do Mangue (13 a 15 anos) e o AlfaMangue, voltado à alfabetização de crianças na idade entre 7 e 9 anos.
A agenda inclui excursões para visita a outras cidades, inclusive a capital, visando à troca de experiências e à abertura de novos horizontes. De igual modo, estudantes das maiores cidades chegam às comunidades e conhecem um novo mundo por meio da iniciativa “Escola Vai ao Mangue”.
“É essencial envolver as novas gerações no debate sobre desenvolvimento sustentável”, afirma Gomes. Há, ainda, o trabalho psicossocial junto aos estudantes e suas famílias, com encaminhamento para redes de apoio nos municípios atendidos pelo Mangues da Amazônia.