Foto: Kátia Matiotti
O mundo dos insetos costuma atrair a curiosidade popular. Um exemplo? Gafanhotos. A espécie costuma ser confundida com os grilos e é considerada por muitos como “vilã das plantações”. Mas será mesmo que os gafanhotos são inimigos das plantações?
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A subordem Caelifera dos gafanhotos é constituída por mais de 2.500 gêneros e mais de 12.400 espécies, das quais 924 são registradas no Brasil. A superfamília Acridoidea possui cerca de 260 espécies. Na Amazônia, segundo a doutora e única taxonomista especialista em gafanhotos do país, Kátia Matiotti, existem 164 espécies e muitas outras ainda não descritas.
O ciclo de vida dos gafanhotos pode ser identificado em três estágios de desenvolvimento: ovo, ninfa e adulto. Neste sentido, que é importante entender sobre o desenvolvimento deles, Kátia aborda um fato curioso: existem dois tipos de metamorfose nos insetos, a completa e incompleta.
De acordo com a especialista, os gafanhotos são caracterizados por apresentarem metamorfose incompleta, sendo o jovem (ninfa) muito similar ao adulto, porém menores e sem asas.
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Um estudo relacionado a algumas espécies de gafanhotos encontrados na região amazônica foi publicado no livro ‘Insetos do Brasil: Diversidade e Taxonomia’ (2ª ed.), do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI):
Hábitos e habitats
Segundo a Dra. Kátia Matiotti, a espécie possui hábitos diurnos, embora muitas atividades como alimentação, acasalamento e muda sejam realizadas à noite.
Preferem ambientes com vegetação aberta e são mais ativos sob sol, ou parcialmente em condições ensolaradas, embora muitas espécies ocorram em florestas da serapilheira ao dossel (camada formada pela deposição dos restos de plantas e acúmulo de material orgânico vivo em diferentes estágios de decomposição).
Você sabia que existem espécies terrestres e semiaquáticas de gafanhotos?
Os gafanhotos terrestres, de acordo com a especialista, utilizam os mais variados ambientes e estratos: desde as vegetações pioneiras rasteiras, campos, arbustos até sub-bosques e vegetação alta das florestas.
Mas além destas, o grupo dos gafanhotos conta com espécies semiaquáticas, de ciclos vitais associados tanto a populações de macrófitas aquáticas (plantas aquáticas que vivem em brejos até ambientes verdadeiramente aquáticos), localizadas às margens da água, como a gramíneas em áreas úmidas e periodicamente alagadas.
Gafanhotos e grilos: como diferenciá-los?
Apesar dos bichinhos parecem idênticos em um primeiro momento, a pesquisadora explica que não é tão difícil diferenciá-los.
“Os gafanhotos apresentam um par de antenas curtas e tímpanos localizados no primeiro segmento abdominal. Essas características podem ser usadas para diferenciá-los dos grilos e esperanças, que apresentam antenas longas e possuem tímpanos na tíbia do primeiro par de pernas”, explica.
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E dão prejuízo?
Ao contrário do que muitos pensam, os gafanhotos não são inimigos do agronegócio, mas dependem de alguns fatores de controle para que não haja prejuízos.
“Não são inimigos se houver o controle visando as ninfas e adultos de espécies consideradas pragas, através de monitoramento, detecção precoce, controle biológico (uso de inimigos naturais dos gafanhotos) e manejo de pragas (prevenção e controle)”, explicou a especialista ao Portal Amazônia.

Espécies mais comuns na Amazônia
Confira a seguir duas das espécies mais comuns de serem avistadas na Amazônia brasileira:
o Tropidacris collaris conhecido popularmente como ‘Tucurão’, encontrados em Tocantins, Rondônia, Acre e Pará;
e o Chromacris speciosa, o popular ‘brasileirinho’ ou ‘gafanhoto soldado’, que pode ser encontrado no Mato Grosso, Rondônia, Tocantins e Pará.
Curiosidades dos gafanhotos amazônicos
- O gafanhotos se comunicam através de sinais acústicos, visuais e movimentos das pernas. A produção de som conhecido como ‘estridulação’ ocorre com a fricção da asa com o fêmur posterior (Acrididae) e o atrito entre asas (Romaleidae). Os sons são emitidos para atração da fêmea e alerta de perigo.
- Em período chuvoso algumas espécies tem presença elevada, em resposta a maior precipitação pluviométrica. Como por exemplo, a grande abundância de Colpolopha waehneri na Amazônia. Os representantes deste gênero possuem baixa valência ecológica e utilizam microhabitats com maior umidade e com menor luminosidade, principalmente no interior das matas.
- A espécie Phaeroparia lineaalba, representante da família Romaleidae, apresenta hábitos graminívoros e distribuição concentrada na região amazônica.
- Os gafanhotos da Amazônia apresentam diferenciais em relação aos demais gafanhotos dos outros biomas do Brasil: coloração do corpo mais chamativa, antenas coloridas, maiores em tamanho corporal e muitas espécies são encontradas em copas de árvores (dossel). A diversidade é bem maior em relação aos demais biomas.

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Nuvem de gafanhotos
Há alguns anos ocorreu um fenômeno que assustou os brasileiros: uma nuvem de gafanhotos se aproximou do país, tornando-se uma ameaça ambiental. A Dra. Kátia, explicou quais principais causas desse tipo de ocorrido:
“A formação da nuvem, ocorre quando os gafanhotos se agrupam em bando para se alimentar e reproduzir. As razões, incluem os fatores ambientais e biológicos, e está intimamente ligada à disponibilidade de recursos. Quando os recursos alimentares são escassos. O desequilíbrio ambiental do clima, favorece a disseminação e a reprodução dos gafanhotos”.
A espécie que constituiu a nuvem foi a Schistocerca cancellata (Serville, 1838), nativa da América do Sul, pertencente à família Acrididae, a mesma da história da praga bíblica.
Esse gênero é considerado migratório e, ao mesmo tempo, tem hábito gregário, isto é, eles formam bandos, nessa fase que ocorre a nuvem.
*Por Karleandria Araújo, estagiária sob supervisão de Clarissa Bacellar