​Água gelada, beleza natural e refúgio: entenda como se formam os igarapés

Além dessas características, comuns quando se pensa nos igarapés, o que mais você sabe sobre os igarapés?

No dicionário da língua indígena Tupi, igarapé é uma palavra formada pela junção de ‘ygara’ (canoa) e ‘apé’ (caminho). “Significa ‘caminho de canoa’. Como ela é uma palavra de origem tupi, vai estar presente em dezenas de línguas do tronco tupi, como Tembé, Guajajára, Suruí, Asuriní, entre outras”, explica o professor Regis José da Cunha Guedes, linguista e docente da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) campus de Tomé-Açu.

Mas como se formam? Por que a água é gelada? Como conservá-los? 

Foto: Érico Xavier/Fapeam

Quem explica é a bióloga Vania Neu, docente da Ufra campus Belém. Segundo a professora, esses rios de menor porte se formam quando há um afloramento do lençol freático. Ela diz que quando chove a água infiltra no solo, recarrega o lençol freático e dá origem ao igarapé.

“Na Amazônia temos muitos rios, de vários portes. Uma das explicações para essa grande quantidade de rios é o relevo plano da bacia. Ao longo dos anos ocorreram mudanças na geologia da América do sul, o choque entre placas tectônicas fez com que se elevasse a Cordilheira dos Andes, mexendo com todo o relevo da América do Sul. A Amazônia é uma grande planície que facilita a origem a inúmeros canais, rios e igarapés. Essa é uma das teorias que explicam essa grande quantidade de rios”, 

diz.

E por que a água do igarapé é gelada? Ela explica que é porque a água que forma o igarapé “brota” da terra. “Essa água está protegida pelo solo, que por sua vez protege o lençol freático e dessa forma a água fica gelada. Ao brotar do solo, a água normalmente percorre longas distâncias protegida pela floresta. Ou seja, além de nascer do solo, que está coberto e agindo como isolante térmico, ainda tem a floresta que a protege”, diz.

Para continuar desfrutando dos benefícios que os igarapés trazem, é necessário mantê-los protegidos, principalmente a mata ciliar ou riparia, que é a mata que fica no entorno, nas margens, e que evitam a chegada de sedimentos, agrotóxicos e lixo ao rio, como explica Vania Neu.

“Para sua proteção é de extrema importância preservar a mata ciliar, ou seja, deixá-la intocada. Devido sua grande importância, o código florestal denominou essas áreas como de proteção permanente, que devem ser preservadas. Já a conservação da mata ciliar é seu uso sustentável. Para manter a saúde do rio é preciso preservar a mata ciliar e principalmente as nascentes, o que está muito claro na legislação”, diz.

A professora explica que a preservação inclui a manutenção da floresta, sem interferência antrópica, sem lançamento de esgotos ou qualquer tipo de contaminante no rio, seja ele industrial, agrícola ou doméstico.

“Caso a pessoa necessite ter acesso ao igarapé o ideal é fazer um caminho protegido para chegar até um ponto do rio. Infelizmente o que vemos frequentemente é um descuido e descaso com as áreas em torno dos igarapés, por diversos usos, sejam eles para uso agropecuário, para turismo, para construção de habitações, área de descarte de lixo, ou qualquer outro uso”, 

alerta.

Foto: Eduardo Rios Villamizar/Acervo do pesquisador

Uma das consequências do uso incorreto dessas áreas é o impedimento da infiltração da água, o que pode levar ao desaparecimento desse igarapé. Vania Neu explica que uma das consequências é a compactação do solo, que leva a processos erosivos, trazendo inúmeros problemas ao rio, como o assoreamento e a elevada turbidez da água, o que interfere em toda vida aquática. 

“Em algumas situações percebemos até a impermeabilização completa das margens, com uso de cimento. Não devemos esquecer que para um igarapé surgir é fundamental que o lençol freático seja abastecido frequentemente e para isso, o solo necessita estar permeável. Todas as ações negativas na mata ciliar degradam o rio. Assim como o ato de aterrar um rio, isso mata e enterra um rio”, afirma.

Outro fator para se atentar e evitar é a construção de banheiros com fossas sépticas próximos aos igarapés. “Fossas sépticas em solos de baixa drenagem acabam sendo uma fonte direta de esgoto o lençol freático e consequentemente para os igarapés. Na Amazônia, o lençol freático é muito raso, está muito próximo à superfície. A proximidade do igarapé significa que o lençol freático está próximo. A construção de banheiros e fossas inadequadas, trazem uma série de problemas para a saúde humana, desde problemas de pele, diarréias, verminoses, dentre uma série de outras que se originam da contaminação da água”, finaliza.

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