Último sobrevivente de comunidade de etnia desconhecida foi encontrado morto em agosto de 2022.
A princípio, a previsão era de que o “Índio do Buraco”, encontrado morto dia 23 de agosto, fosse sepultado em sua terra original, em Chupinguaia (sul de Rondônia), onde viveu isoladamente durante décadas. Na semana passada, porém, o presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), Marcelo Augusto Xavier da Silva, determinou por ofício o cancelamento do enterro do homem cujos ossos estão na Superintendência da Policia Federal, em Vilhena (RO).
Sob a alegação de que falta uma análise genética mais detalhada para determinar sua ancestralidade étnica, a ossada aguarda um destino. O corpo chegou a ficar em Brasília (DF) durante quase um mês, passando por exames, e retornou a Vilhena, cidade polo da região sul-rondoniense.
Leia também: Relembre a história do “índio do buraco”, símbolo da resistência dos indígenas isolados
O indigenista aposentado Marcelo Santos foi quem contatou o “Índio do Buraco”, ainda na década de 1990. Na época, ele trabalhava na Funal na Frente de Contatos com Índios Isolados. Hoje morando no estado de Goiás, Marcelo faz um questionamento acerca da atitude oficial da Funai. “Será que o presidente do órgão quer transferir o sepultamento para outro local e assim liberar a terra [demarcada como indígena] para os fazendeiros?”. Para Marcelo, os restos mortais do “Índio do Buraco” devem ser enterrados onde viveu, assim como todo seu povo. “É inacreditável e revoltante”, resume o sertanista.
Situada entre grandes fazendas de gado, a terra indígena sofre muita pressão de pecuaristas e de políticos influentes, que tentam ocupá-la. Contudo, a Funai desmente a intenção de repassar a terra a fazendeiros, embora não justifique qual o destino será dado aos ossos. O corpo foi submetido à perícia da PF que constatou a morte por causas naturais, “mas resta ainda saber se há alguma possibilidade de descobrir mais sobre a questão genética e étnica”, pondera a Funai, que alega “interesse científico”.
Repercussão internacional
Na BBC de Londres, foi dito que os ancestrais do indígena devem ter morrido no começo dos anos 1970 em assassinatos cometidos por donos de terras da região. Em 1995, diz o texto, seis dos últimos membros foram assassinados e foi assim que “o homem do buraco” se tornou o último da tribo.
Encondido
Para morrer, preparou-se em ritual: cobriu o seu corpo com penas de arara, fez um feixe de flechas e colocou uma espécie de bandana na cabeça. Só depois de morto, na rede, o misterioso e arisco brasileiro foi retirado da terra — cerca de 8 mil hectares — onde nasceu e viveu sempre, às margens das informações no século XXI.
Livros e documentários
A história do sobrevivente — considerado símbolo da resistência dos povos originais da Amazônia — foi assunto em teses acadêmicas e virou pauta para jornalistas ao redor do mundo, que produziram extensas reportagens e documentários audiovisuais sobre sua saga. Também inspirou livros, entre eles, “O último da tribo”, publicado originalmente em 2010, nos Estados Unidos, e traduzido para o português. O autor da obra é o jornalista norte-americano Monte Reel, que trabalhou no The Washington Post.
Sobre o autor
Às ordens em minhas redes sociais e no e-mail: julioolivar@hotmail.com . Todas às segundas-feiras no ar na Rádio CBN Amazônia às 13h20.
*O conteúdo é de responsabilidade do colunista