“Euro Tourinho, a Samaúma da Imprensa Amazônica” é o título do livro escrito pelo notável intelectual Silvio Persivo para festejar os 95 anos do mestre, em 2017.
Ah, além dos escritos sobre Euro, ele também inspirou nas belas artes. O pintor Mikeliton Alves, por exemplo, o pincelou num belíssimo e iconográfico óleo sobre tela presente em diversas exposições. Ainda bem que foi em vida, e Euro ficou feliz em ver-se estampado.
“Euro Tourinho, a Samaúma da Imprensa Amazônica” é o título do livro escrito pelo notável intelectual Silvio Persivo para festejar os 95 anos do mestre, em 2017. Uma ótima definição: samaúma. A árvore rainha caraterizada simbolicamente pela generosidade de guardar e distribuir água para outras espécies, além da sua grandeza e imponência. Euro era pequeno em estatura. Mas, o maior que houve em atitudes e ideais, jamais passou desapercebido e não ignorou a ninguém; foi amigo dos artistas, dos cidadãos comuns.
Hoje, 17 de janeiro de 2022, ele comemoraria, literalmente — festeiro que era! —, o seu centenário natalício. Euro era boêmio, pé de valsa, carnavalesco, com suas roupas cheias de personalidade que encantavam os que têm olhos de bardo. Sua compleição física mirrada era o contraponto da sua grandeza existencial, pródigo em memórias afetivas e na arte de construir laços de amizades. Amou e foi muito amado em família e na sociedade.
Carismático, leal, culto e humilde são predicados bastante utilizados para definir aquele que definia a si mesmo como “apenas mais um”, conforme seu depoimento ao Museu de Gente. Foi e catalisou muitas vidas, registrando-as nas páginas do seu jornal. Foram mais de seis décadas dadas ao jornalismo, testemunhando, interagindo, erguendo bandeiras e escrevendo histórias.
Não é possível traduzir em alguns parágrafos o que fora. Euro, afinal, tornou-se muitas poesias para caber em uma prosa. Transcendeu o papel de jornalista à medida em que se fez personagem, desde as suas indumentárias ao uso de objetos icônicos como a máquina de escrever verde que ele usou até o fim, alheio às modernidades. O clássico não morre e nem sai de moda.
Júlio Olivar
Falar do que Euro fez enquanto escriba é repetir-se. Todos que sabem a história da imprensa reiteram seus méritos. Foi ele um braço do que se fazia de mais ousado no jornalismo da América do Sul, considerando que o jornal Alto Madeira compunha a rede dos Diários Associados, presidida por Assis Chateaubriand, o famoso “Rei do Brasil” (definição de Fernando Muraes). Euro e Assis estiveram juntos. Cada qual com o seu código de ética. Nos últimos tempos, já nonagenário, continuou lúcido e afinado, extremamente bem informado, embora avesso à internet.
Euro começou como uma espécie de “foca”. Fez coluna social e pequenas notas no jornal impresso com linotipos. Até tornar-se editor e dono do AM, já nos tempos do offset. É sabido que seu texto era elegante e que sua visão de editorialista e editor estava muito acima do tipo de jornalismo que se fazia nas províncias, mesmo com todas as dificuldades financeiras e logísticas para se concluir um jornal nos confins do mundo. Era bom porque resultava da soma da alma de quem nasceu nos seringais e a cultura que este adquiriu com a observação aguçada e a vivência amazônica. Foi, de fato, um desbravador, uma mente tenaz e um inteligente incontestável.
Euro esteve presente nos momentos cruciais da história, em epílogos interessantes como a inauguração da BR-364, em 1960, pelo então presidente JK. Esteve dentro do poder sem afetar-se por ele. Foi porta-voz da sociedade e de todas as suas contradições para que os governantes a entendessem fora do seus castelos imaginários. Não deixou de ser humano, não fazendo a mínima questão de adulações, cuidando bem do que lhe alimentava o corpo, a alma e o espírito. Sorriu sempre, abraçou a todos e foi capaz de manter suas opiniões sem ferir às dos outros. Viveu, pois, sendo um exemplo de vida-boa, ao som de chorinhos, bebericando na confraria Buraco do Candiru cercado de gente que lhe queria bem.
Euro Tourinho já é nome de rua. Merece estátua, merece odes, música e aplausos. Viva! As lendas não morrem.
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