Trabalho e pago as minhas contas

Não é uma questão trivial ou fácil para a maioria das pessoas. O tempo e o dinheiro exigem que os tratemos de forma consciente, planejando, priorizando, organizando, escrevendo (não vale ter tudo na cabeça, um outro tipo de ilusão).

“Como médico, sinto-me muito bem. Além de cardiologista, fiz medicina do trabalho, o que me possibilita atender pacientes em ambulatório e em empresas. Sou registrado em duas delas, grandes companhias, com uma boa política de RH. Além disso, faço os meus plantões, algumas vezes, em prontos-socorros de hospitais públicos. Estes plantões são extremamente tensos, mas geram uma grande realização. Ali, literalmente, eu salvo vidas. Também nunca parei de estudar e são inúmeros os cursos de pós e de especializações.


Fazer tudo isso exige uma extensa carga horária, podendo chegar a mais de 65 horas semanais. Nem tinha percebido isto até que alguém me perguntou e fui fazer a conta. Reconheço que é bem mais do que o normal e penso em diminuir a carga, até porque já são quase 40 anos de profissão, e o corpo começa a reclamar, lembrando que eu já não sou um garoto. Não penso em parar, pois não seria feliz, mas reduzir sensivelmente o trabalho e, talvez, me dedicar a projetos sociais, onde eu continue a fazer diferença. No entanto, não vislumbro isso a curto prazo. Minha renda iria cair sensivelmente e o padrão de vida da família seria afetado. Hoje, além das despesas da casa, ajudo dois filhos que, embora adultos com as suas próprias famílias, ainda não se firmaram profissionalmente.
Foto: Reprodução

Ao longo da vida, construí algum patrimônio, como a casa em que moro e um apartamento que alugo, mas não foi muita coisa. Não daria para ficar sem renda. Outro dia, a minha mulher, que também trabalha, perguntou para mim: quanto nós ganhamos por mês? Ela sabe o ganho dela, mas não o meu. Respondi: ‘ka, ka, ka. Sabe que eu também não sei… Só sei que trabalho e pago as minhas contas’.

Recebo o dinheiro de maneira bem picada ao longo do mês. As duas empresas adiantam a quinzena, o que dá no total quatro datas. Os plantões e atendimentos, eu recebo também de forma parcelada. Os valores vão entrando na conta e saindo para pagar contas. É assim que tem funcionado a vida inteira. É como tirar areia da praia ou um buraco sem fundo. Pensando melhor, mais do que realização profissional, eu venho trabalhando para alimentar a máquina de pagar contas. Acho que vai assim ser até o final”.

Não, não foi assim até o final para o Dr. Luciano. Apenas alguns meses depois deste relato, ele reformulou a sua vida, após uma breve parada para refletir o que estava fazendo e o que desejava fazer de sua vida. Percebeu que a corrida era alienante e que precisaria fazer escolhas quanto ao seu tempo e quanto ao uso de seu dinheiro.

Não é uma questão trivial ou fácil para a maioria das pessoas. Aprendi que o princípio Ordem se manifesta em todos os setores de nossas vidas e que o natural da falta de ordem é mesmo a desordem, o desequilíbrio. O tempo e o dinheiro exigem que os tratemos de forma consciente, planejando, priorizando, organizando, escrevendo (não vale ter tudo na cabeça, um outro tipo de ilusão) e vivendo as nossas escolhas.

Com uma camisa polo e o estetoscópio no ombro, é o próprio Dr. Luciano que encerra este artigo: “me libertei da esteira que me fazia correr sem sair do lugar. A máquina que, sugava meu tempo e meu dinheiro, agora é guiada por mim. Descobri que poderia trabalhar melhor, trabalhando menos, ganhar mais, aparentemente ganhando menos”.

Sobre o autor

JulioSampaio (PCC,ICF) é idealizador do MCI – Mentoring Coaching Institute, diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching e autor do livro Felicidade, Pessoas e Empresas (Editora Ponto Vital). Texto publicado no Portal Amazônia e no https://mcinstitute.com.br/blog/.

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista


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