Ela tinha desafios importantes no mercado, mas estava sofrendo pela política interna, própria de qualquer organização. Para ter sucesso, ela precisaria desenvolver competências diversas. Estava sendo aprimorada internamente para lidar com o mercado, onde existia a verdadeira batalha.
Estranho como a nossa mente funciona. De repente, no meio de uma conversa com uma executiva sobre as dificuldades que ela estava enfrentando internamente em sua empresa, veio-me esta frase de minha mãe. Hoje é condenável tal prática e nem sei se é ilegal. No século passado, quando eu era criança, era usual: pais batiam nos filhos para educá-los. Minha mãe era boa nisso. Fazia com o sentido do dever a ser cumprido, principalmente, porque o meu pai não conseguia fazer isto direito. Ele fingia que batia e nós até ríamos nas raras vezes que ele encenava que estava nos batendo. Ao contrário, minha mãe pegava o cinto ou o chinelo e cumpria a sua dolorosa missão. Dolorosa, no caso, para nós, crianças.
Mas a frase que me veio à cabeça foi dita em uma situação muito específica. Ainda pequenos, eu e meu irmão gêmeo Paulo apanhamos de um garoto apenas um pouco mais velho, no pátio do prédio onde morávamos. Chegamos em casa chorando, não pela dor, mas porque éramos crianças. Minha mãe não teve dúvidas: bateu novamente nos dois e mandou que voltássemos para o pátio atrás do garoto. Disse ela: “vocês são dois e não podem apanhar de um. Estão apanhando em casa para não apanhar na rua”. Não lembro se apanhamos de novo do garoto, mas, certamente, não voltamos chorando para casa. Nunca mais.
Sem perceber, incorporei a lição de minha mãe, transformando, talvez, em uma destas crenças que nem temos consciência que temos. Lembro que, já adulto e enfrentando dificuldades políticas na empresa, pensava: “é uma dificuldade interna, a verdadeira batalha é lá fora”. Para quem trabalha em área comercial, não é um pensamento incomum. No meu caso, ele, talvez, viesse reforçado pela crença: “apanhar em casa para não apanhar na rua”. Sim, porque para enfrentar os desafios que o mercado impõe, temos que nos aprimorar como pessoas e na arte de lidar com as outras pessoas. Antes disso, temos os desafios internos nas empresas.
Era o caso desta executiva, cuja conversa me fez lembrar a minha mãe, e me trazer de volta estas memórias. Também ela tinha desafios importantes no mercado, mas estava sofrendo pela política interna, própria de qualquer organização. Para ter sucesso, ela precisaria desenvolver ainda mais competências como: ser uma boa ouvinte, ter empatia, ceder para conquistar, aguardar o tempo certo, gratidão e resiliência, apenas para citar algumas. Ela estava sendo aprimorada internamente para lidar com o mercado, onde existia a verdadeira batalha.
O mesmo raciocínio podemos aplicar nas questões que envolvem os nossos relacionamentos mais próximos, especialmente, a família. Podemos treinar e nos aprimorar com as pessoas que amamos e que nos amam. Isto sempre será útil para nossos relacionamentos com os amigos, com os conhecidos, na empresa e no mercado. Quanto mais perto de nós, mais serão como a nossa casa. Aprender, às vezes, envolve apanhar um pouco. Adequada aos novos tempos, penso que a minha mãe diria: “melhor apanhar, digo, aprimorar em casa do que na rua”.
Sobre o autor
JulioSampaio (PCC,ICF) é idealizador do MCI – Mentoring Coaching Institute, diretor da Resultado Consultoria, Mentoring e Coaching e autor do livro Felicidade, Pessoas e Empresas (Editora Ponto Vital). Texto publicado no Portal Amazônia e no https://mcinstitute.com.br/blog/.
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