Conheça a epopeia cinematográfica de ‘Fitzcarraldo’, precursora do cinema amazonense

Baseado em um sonho impossível, o filme mais aclamado do diretor Werner Herzog foi gravado na Amazônia brasileira e na Amazônia peruana. 

Muitos filmes marcam a história de uma geração e deixam legados que permanecem ao longo do tempo. Esse é o caso do filme ‘Fitzcarraldo’, do diretor alemão Werner Herzog. O filme é uma epopeia (que celebra uma ação grandiosa e heroica) cinematográfica gravada no coração da Amazônia no Brasil e no Peru.

Relembre a história do filme que foi precursor do cinema amazonense:

Foto: Reprodução/Acervo Deutsche Kinemathek – Museum für Film und Fernsehen

A busca pelo “sonho impossível”

O enredo do filme se baseia na busca por um “sonho impossível” do personagem Brian Sweeney Fitzgerald, interpretado pelo ator Klaus Kinski, que se choca com a vontade do diretor Werner Herzog de fazer um filme verossimilhante na Amazônia.

Megalomaníaco (desconexo com a realidade), “Fitzcarraldo”, como é chamado pelos nativos da região, tinha um sonho de construir um imenso teatro de ópera no meio da Floresta Amazônica e, na inauguração do teatro, esperava a participação do tenor italiano Enrico Caruso. Para isso, precisava levantar fundos para a construção e conta com a ajuda de nativos indígenas para rebocar um barco pela floresta em busca do látex da borracha.

“Herzog é conhecido por ser um diretor obsessivo, característica que ele transfere para seus personagens, ou alguns de seus personagens. Em especial os personagens de seus filmes amazônicos (Aguirre e Fitzcarraldo). Aguirre veio primeiro, lançado em 1972. Fitzcarraldo foi lançado em 1982. […] Em relação à Fitzcarraldo é importante destacar a grandiosidade da empreitada, algo que o difere de Aguirre. Contudo o projeto sofreu diversos problemas sérios na produção, que foi sendo alterada para seguir em frente. Essa obsessão do diretor fez com que o projeto não fosse abandonado. Do contrário poderia ser mais um dos filmes inacabados da história do cinema que ficam famosos justamente por isto: serem projetos ambiciosos que se perdem pelo caminho”, 

explica o doutor em multimeios e pesquisador em antropologia visual, Gustavo Soranz.

O enredo 

Filmado nas cidades de Iquitos, no Peru e em Tabatinga no Brasil, é um dos filmes mais aclamados de Herzog. ‘Fitzcarraldo’ é um estrangeiro em meio a selva que passa por várias aventuras e está disposto a passar por cima de quem for para cumprir seus objetivos.

Com ajuda da dona de um bordel, interpretada por Claudia Cardinale, que era também sua namorada, ele passa a trabalhar na extração do látex da borracha. Investe tudo que tem na compra de um barco a vapor e sobe o Rio Amazonas em busca de uma região não explorada por seringalistas, pois corria boatos que na região havia uma tribo conhecida por encolher cabeças de quem tentava atravessar a região.

Quando finalmente encontra os indígenas, imagina-se que teria uma batalha longa e sangrenta. Mas ocorre o contrário: na busca por um “salvador” vestido de branco, os indígenas veem no Fitzcarraldo um “Deus” e resolvem ajudá-lo em busca do seu objetivo.

Nesse momento o filme alcança seu clímax ao tocar, no volume máximo, aquilo que ele mais ama: a ópera de Caruso.

Foto: Reprodução/Imdb

Conexão obra-autor

Com características documentais, o diretor retrata a região de maneira delicada e mostra o embate entre o homem e a natureza como é abordado em vários de seus outros filmes, além de apresentar uma cumplicidade e respeito pela natureza. Tudo isso somado com uma trilha sonora cheia de óperas clássicas, dando um efeito ainda maior a cena.

A narrativa, por muitas vezes, funde o autor à obra e une aspectos existenciais com a vastidão da floresta e a ganância do ser humano.

Desafios

Sem computação gráfica ou efeitos especiais, o diretor e equipe enfrentaram várias adversidades no processo. O ator que estava escalado para o papel principal, Jason Robards, acabou adoecendo no meio das filmagens, e foi substituído por Klaus Kinski, e o filme teve que ser recomeçado.

Além disso, para tornar o filme mais verossimilhante, o barco usado foi construído por conta própria. O estúdio que estava financiando a produção rompeu com o diretor e com a ajuda de seu irmão, Herzog pôs de pé um barco a vapor de 130 metros de comprimento, com 160 toneladas de madeira e ferro e fez com que ele fosse puxado por nativos da região.

Foto: Reprodução/Imdb

O pesquisador Gustavo Soranz, que já atuou com produção audiovisual, estética audiovisual, filme documentário e cinema no Amazonas, comenta sobre essa questão:

“Filmar na Amazônia é um desafio até hoje. São inúmeros problemas de logística e de produção. É caro e complicado e como sabemos ele enfrentou diversos desafios. Acho que a ambição do projeto e a grandiosidade do evento contribuíram, sim, para a repercussão do filme, que apesar de todo o problema ‘extra-fílmico’ do qual estamos falando, é um filme central na obra de um dos principais diretores da história do cinema moderno”,

afirma.

Além disso, enfrentou mosquitos, deslizamentos de terra e existiram boatos que muitas pessoas foram mortas por indígenas e que prostitutas eram mantidas reféns para divertimento da equipe. O fato de o filme ser finalizado, mesmo com toda a precariedade da produção, mostra o porquê de ser um dos mais bem recebidos pela crítica.

O legado

Em meio às dificuldades, o filme gravado na Amazônia fez parte da vida de vários amazonenses. Foi um divisor de águas para o cinema amazonense e um precursor para o cinema local. “Acho que o filme permanece interessante enquanto obra mesmo, especialmente para a filmografia na Amazônia, mas também enquanto evento cinematográfico e toda essa situação marcada pelo caráter obsessivo do diretor, que não esmoreceu diante das adversidades e concluiu o filme, executando as ações complexas que planejou”, finaliza Soranz.

‘Fitzcarraldo’ ganhou os prêmios de melhor diretor no Festival de Cannes e no Festival de San Sebastián, ambos em 1982. Assista o trailer:

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