Samuel Isaac Benchimol – Memória da influência cultural, intelectual e social na Amazônia contemporânea

A Amazônia foi a grande paixão intelectual de Benchimol, que a ela dedicou a totalidade de seus 32 livros e mais de 70 artigos.

Jaime Benchimol,
Empresário e filho do Professor Samuel Benchimol

O futuro não acontece por si mesmo. O seu fabrico é produto de ação planejada, da inovação, da iniciativa privada, do desejo político e da sociedade para criar um horizonte de vida, trabalho e bem-estar, que contemple a todos sob o pálio da justiça e da fraternidade. A Amazônia deve estar de braços e olhos abertos para receber esse futuro.

Foto: Divulgação

“Samuel Benchimol, em Desenvolvimento Sustentável da Amazônia, 2012″

Nas páginas a seguir, a professora Alvares faz no artigo “Imensidão Amazônica: Ciência e Vida de Samuel Benchimol”, o que considero ser a melhor e mais completa síntese da obra do professor Benchimol, segmentando-a cronologicamente de forma a facilitar a compreensão do leitor e a permitir a sua contextualização histórica.

A Amazônia foi a grande paixão intelectual de Benchimol, que a ela dedicou a totalidade de seus 32 livros e mais de 70 artigos. Suas publicações sobre a região tiveram escopo extremamente amplo, incluindo, mas não se limitando às áreas de economia, sociologia, antropologia, geografia, história e ecologia. Ainda assim, diante de tão vasta contribuição, é possível destacar cinco conceitos centrais que permeiam o seu pensamento e a sua obra, que comento brevemente nos cinco parágrafos seguintes.

O primeiro apresenta os quatro paradigmas fundamentais para projetos de desenvolvimento da Amazônia: ser economicamente viáveis, ecologicamente adequados, politicamente equilibrados e socialmente justos. Essas visões representam, na minha opinião, o equivalente ao balanced scorecard da sustentabilidade da região. Os paradigmas estabelecem os fundamentos para balizar macropolíticas públicas para a Amazônia sugerindo critérios que permitem filtrar e enquadrar projetos como sustentáveis.

O segundo conceito trata do fato de que a busca da vocação para a nossa região deve colocar o homem no centro, e não à margem, da equação e de nossas preocupações. Em seu livro “Zênite Ecológico e Nadir Econômico e Social”, Benchimol resume seu desconforto com um mundo bipolar que exibe a dissociação entre a sociologia e a ecologia, entre o homem e os recursos naturais. 

Segundo ele, políticas públicas maniqueístas desconsideram a interdependência do homem com a natureza e assim, têm retirado progressivamente a base econômica de sustentação de grande parte das populações do interior da região com a criação de numerosas restrições ambientais que têm promovido o empobrecimento, falta de perspectiva e o êxodo do homem do interior, mesmo daqueles engajados em atividades de baixo impacto ambiental. O movimento ambientalista, a despeito de seus méritos de preservação de recursos e preocupação com o futuro, tem desconsiderado a presença e os direitos de sobrevivência de quase 25 milhões de habitantes da Amazônia.

Em 1990, com a publicação do artigo “O Imposto Internacional Ambiental e a Poluição Nacional Bruta”, temos o terceiro conceito: iniciaram-se as discussões sobre a necessidade de as economias e agentes econômicos geradores de poluição e de carbono compensarem financeiramente aqueles que renunciam ao direito de usufruir de seus recursos naturais para preservar o meio ambiente para as futuras gerações do planeta. O Estado do Amazonas, que conservou intactos cerca de 97% do seu 1,5 milhão de quilômetros quadrados de floresta original, por exemplo, merece ser compensado pelos “serviços ambientais” (fixação de carbono, regulação do ciclo das águas, conservação do patrimônio biogenético da fauna e flora, etc.) que presta aqueles que poluem o meio ambiente ou utilizam um modelo de desenvolvimento emissor de carbono na atmosfera. O conceito de compensação entre poluidores e conservadores da natureza foi apresentado por Benchimol, com destaque, na Eco 92 no Rio de Janeiro, e desde então tomou a forma de créditos por redução na geração de carbono e nas taxas de redução de desmatamento das florestas.

Benchimol argumenta repetidamente em sua obra, sobre o quarto conceito, que a Amazônia é vasta e diferente demais para ser considerada uma só. A sua geodiversidade, biodiversidade e ecodiversidade são tais que necessitamos estudá-las, segmentá-las e compreendê-las para assim promovermos ações e políticas em harmonia com suas verdadeiras vocações. A adoção em 2012 de um novo código florestal para o Brasil que desconsidera as grandes diversidades amazônicas é uma evidência recente de quanto o país desconhece a região, ignora seus sistemas ambientais, desperdiça seu potencial e desconsidera as necessidades de seus habitantes.

Por último, o “Estatuto do Amazônida” (uma analogia ao majestoso poema “Estatutos do Homem” do amazonense Thiago de Mello) representa quase uma síntese do pensamento de Benchimol, e por isso a professora Lillian Alvares o transcreveu integralmente ao final do seu texto (um dos integrantes do livro). Nele, Benchimol faz considerações sobre a grandeza, continentalidade e importância da Amazônia para o Brasil e para os brasileiros, destacando o seu rico potencial natural e humano. Os “Estatutos” atribuem direitos e obrigações aos habitantes da Amazônia de usufruírem desse potencial de forma responsável; de realizarem investimentos em infraestrutura que permitam o desenvolvimento de suas comunidades e economias; de buscarem a educação, a ciência e o conhecimento; de protegerem as populações indígenas assegurando-lhes suas terras e manutenção de suas identidades culturais; de reagirem contra a intervenção internacional, mas aceitarem a cooperação legítima e bem intencionada de cientistas e instituições estrangeiras. Trata-se de um chamado para construirmos com trabalho e responsabilidade o nosso próprio futuro.

*Um dos capítulos da obra a ser lança da esta noite durante a solenidade de outorga dos Prêmios Professor Samuel Benchimol e Banco da Amazônia no Clube do Trabalhador do Sesi.

Sobre o autor

Osíris M. Araújo da Silva é economista, escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), da Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas (ALCEAR), do Grupo de Estudos Estratégicos Amazônicos (GEEA/INPA) e do Conselho Regional de Economia do Amazonas (CORECON-AM).

*O conteúdo é de responsabilidade do colunista 

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