Desafio da empreitada é agravado pela vastidão geográfica e distanciamento político dos países integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica.
Em qualquer das alternativas que se pense o desenvolvimento regional, além dos aspectos socioculturais e econômicos, sobressai-se a premência de promover ações que visem a difusão de conhecimentos de forma integrada ao conjunto da Pan-Amazônia, a Amazônia sul-americana. Além da vastidão geográfica, a complexidade da empreitada, todavia, é agravada pelo distanciamento político estabelecido entre os diversos países integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica (TCA), de 1978. Por essa razão, o nível de diálogo e cooperação técnica e diplomática é tênue, pobre, distanciado e ineficaz.
Difícil crer, por exemplo, que os diversos órgãos de ensino e pesquisa da região – o Instituto SINCHI, a Universidad Nacional de Colombia, Sede Amazonia (Letícia), o Instituto de Investigación de la Amazonía Peruana (IIAP), o Instituto de Pesquisas da Amazônia (INPA), o CBA, o Museu Goeld; a Universidad Nacional del Perú, além do conjunto das universidades da Amazônia brasileira -, não mantenham vínculos cooperativos objetivamente estruturados por agendas compartidas em setores de ensino, pesquisa e extensão. Fundamental, por outro lado, conforme estabelece o Ponto 7, do Compromisso de Manaus, resultante da XI Reunião de Ministros das Relações Exteriores dos países membros da OTCA, realizada em Manaus em novembro de 2011, “promover a mobilidade acadêmica entre estudantes e docentes de instituições educativas e de pesquisas da região, estabelecido no Programa Regional de Intercâmbio”, que a Secretaria Permanente da OTCA comprometeu se a elaborar ainda em 2012. Corolário dessa proposição, o Ponto 8 do referido Compromisso especificamente apoia “a criação da Universidade Pan-Amazônica”, que, igualmente, perdeu-se no tempo e nas teias burocráticas do Tratado.
O recomendável, penso eu, seria estabelecer currículos comuns de sorte a possibilitar maior troca de informações quanto a resultados de pesquisas de vitais interesses recíprocos. Mas, como viabilizar a ideia se, além de tudo, o brasileiro não fala espanhol e nossos vizinhos não conseguem se expressar em português? Com efeito, a integração universitária e científica pan-amazônica permitiria o alcance de resultados eficazes a cerca de múltiplos problemas resultantes da interação de ações pragmáticas em áreas de interesses comuns: pesquisas sobre malária e doenças tropicais, a construção naval, a navegação fluvial, a produção de alimentos, o estudo de princípios ativos para a indústria de cosméticos ou de produtos medicinais; nanotecnologias, bioeconomia, bioengenharia, o polo petróleo-gás-químico, a mineração e a produção de madeira via manejo florestal sustentável ao amparo de leis específicas, além do ecoturismo.
Tais pontos encontram-se em aberto, seja por falta de verbas, de decisão política ou de estrutura operacional do governo Federal, da Sudam, Suframa, dos governos regionais ou da própria OTCA em favor desta que é de fato a mais promissora região da América do Sul e uma das mais importantes do Planeta. Efetivamente, segundo Bertha Becker, “há três grandes eldorados naturais no mundo contemporâneo: a Antártida, que é um espaço dividido entre as grandes potências; os fundos marinhos, riquíssimos em minerais e vegetais, que são espaços não regulamentados juridicamente; e a Amazônia, região que está sob a soberania de estados nacionais, entre eles o Brasil”.
Criada em 1995, no contexto da “Agenda Amazônia 21”, a OTCA tem objetivo de implantar os princípios reunidos no Tratado de Cooperação Amazônica, assinado em 1978, quase dez anos antes de o relatório “Nosso Futuro Comum”, da ONU, consagrar o conceito de “desenvolvimento sustentável!”. Foi firmado com o objetivo de promover a defesa da preservação do meio ambiente, do uso racional dos recursos naturais da pan-amazônia e de atender à necessidade de integração do imenso potencial científico e biodiverso das economias dos países-membros segundo os 28 pontos resultantes do Compromisso Manaus, firmado em 2011, durante a XI Reunião de Ministros das Relações Exteriores dos países membro da OTCA, realizada em Manaus, em 2011.
Resta, por fim, a questão fundamental sobre qual organismo se responsabilizaria pela governança do sistema e a operacionalização dos programas do TCA, sem o que a efetiva integração pan-amazônica jamais ultrapassará a condição de simples ficção. Presumivelmente a própria OTCA, com sede em Manaus, o centro geopolítico da Amazônia. Independente do ângulo que se investigue, a questão é relevante, imperativa, por dizer respeito a interesses vitais da mais vasta região tropical do Planeta.
Sobre o autor
Osíris M. Araújo da Silva é economista, escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), da Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas (ALCEAR), do Grupo de Estudos Estratégicos Amazônicos (GEEA/INPA) e do Conselho Regional de Economia do Amazonas (CORECON-AM).
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