“Efetivamente, o que faltou mesmo foi coragem para admitir equívocos e quebra de compromissos do passado”, comenta Osíris Silva.
A Conferência do Clima de Glasgow pouco acrescentou em relação às demandas do Brasil e ao que setores do ambientalismo internacional impunham ao país pelo controle do desmatamento na Amazônia. O assunto, ao que se deduz dos documentos-síntese divulgados, não assumiu o caráter bombástico apregoado por ONGs e linhas da esquerda radical, interna e externamente.
Efetivamente, o que faltou mesmo foi coragem para admitir equívocos e quebra de compromissos do passado, como a verba anual de US$ 100 bilhões aprovada na Paris 2015, até hoje não implementada. Muito significativos, a propósito, os alertas do pesquisador do Inpa, Niro Higuchi, em entrevista concedida à coluna Follow-up, do CIEAM.
Higuchi afirma, sem subterfúgios: “No Brasil, os três poderes da República estão sem estratégias para o cumprimento de acordos sobre o clima. Por justiça, isso não é um privilégio do Brasil em se tratando de mudança do clima global. As soluções para controlar as emissões brasileiras relacionadas com a agropecuária (desmatamento, inclusive) demandam pouco recursos. Com foco, desejo e tecnologia, a solução virá. Talvez, o grande obstáculo seja o excesso de gente se intrometendo; a ilusão do conhecimento é mais séria do que as fake news. Até o papa Francisco resolveu dar palpites sobre a Amazônia. Chegamos em 2021 com a COP 26 preocupados com as emissões de GEEs, que não param de aumentar. Fui ao Web of Science (12/11/2021) para uma busca com “climate change” e encontrei mais de 325 mil artigos publicados; para “Amazon deforestation“, foram 3.517 artigos. E as emissões continuam aumentando. Até quando?”
A COP26 refletiu em certa medida as conclusões do relatório IPCC SR1.5 e IEA net zero, ordenando uma aceleração na ação climática e novos planos até 2022, no contexto do regime voluntário e não vinculante da ONU. Todos os principais emissores serão obrigados a retornar em 12 meses e explicar na ONU como suas políticas e planos para toda a economia estão alinhados com os objetivos da Paris 2015.
Embora a promessa de “eliminação progressiva” dos combustíveis fósseis tenha sido enfraquecida por um acordo de última hora entre a China (o maior consumidor mundial de combustíveis fósseis), os EUA (o maior produtor mundial de combustíveis fósseis), a União Europeia e a Índia, quem os obrigará a honrar seus compromissos?
Apesar da mudança de “eliminação gradual” para a “redução gradual”, pela primeira vez a causa principal da crise climática foi nomeada pelos 198 signatários do Acordo de Paris. União Europeia e Estados Unidos se recusaram a liberar os recursos do fundo Paris 2015 destinados a que países mais pobres pudessem utilizá-los nos ajustes à crise do clima.
Como na pandemia de Covid-19, a solidariedade global para salvar vidas esteve ausente em Glasgow. O acordo sobre as novas regras do mercado de carbono fecha algumas das lacunas escandalosas que haviam sido consideradas e cria um regime de comércio estruturado entre países, mas a linguagem não é suficientemente clara para impedir as empresas de trapacear, reconhecem autoridades signatárias.
Em 2025, os países desenvolvidos precisam duplicar seus fundos coletivos para adaptação à mudança do clima. Ajustes setoriais específicos sobre florestas, carvão, automóveis, metano e um acordo de 24 bilhões de dólares visando parar o financiamento de combustíveis fósseis no exterior têm o potencial de fazer incursões significativas no corte de emissões, mas exigirão ratificação pelos governos nacionais em forma de políticas e planos que devem ser apresentados à COP no Egito em 2022.
Os principais bancos se comprometeram a alinhar seus fundos à meta de emissão zero líquida ainda nesta década e enfrentarão um exame minucioso sobre como vão cumprir suas promessas. A COP26, a propósito, também não definiu o papel dos países sobre os meios tecnológicos e financeiros para o cumprimento das metas. Talvez nas próximas Conferências. Quem sabe?
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